Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Prescrição quanto à reparação de dano ambiental individual

Agenda 09/05/2022 às 17:43

Qualidade do meio ambiente em função da qualidade de vida. As sanções penais e administrativas, independem da obrigação de reparar os danos causados. Dano ambiental.

Artigo original em https://advambiental.com.br/o-que-e-dano-ambiental-individual-e-o-direito-a-reparacao/

 

O Direito ambiental sempre foi muito visto como um direito difuso, onde tão somente o Ministério Público poderia buscar a tutela judicial, mas nos últimos anos, as pessoas passaram a litigar em busca de seus direitos.

De início, importante destacar que o artigo 225 da Constituição Federal, o qual dispõe sobre meio ambiente, assegura direito de todos ao meio ambiente equilibrado:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Seguindo essa linha o § 3º do mesmo artigo ensina que os poluidores deverão reparar os danos causados:

3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados

Nesse sentido, o grande doutrinador constitucional José Afonso da Silva[1], explica de maneira suscinta qual a razão jurídica do direito ambiental:

O Objetivo de tutela jurídica (ambiental) não é tanto o meio ambiente considerado nos seus elementos constitutivos. O que o Direito visa a proteger é a qualidade do meio ambiente em função da qualidade de vida. Pode-se dizer que há dois objetivos de tutela, no caso: um imediato, que é a qualidade do meio ambiente; e outro mediato, que é a saúde, o bem estar e a segurança da população, que se vem sintetizando na expressão qualidade de vida.

A descrição de poluição está explicada pelo art. 3º, inciso III, da Política Nacional do Meio Ambiental, que buscou de maneira taxativa demonstrar quando ocorre, de fato, a poluição:

Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;

c) afetem desfavoravelmente a biota;

d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;

e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;

IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;

V - recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora.

Para o Ministro Hermen Benjamin, do STJ, equiparam-se (a poluidor) quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa de fazer, quem não se importa que façam, quem financia para que façam, e quem se beneficia quando outros fazem. REsp 1090968/SP.

Além disso, podemos trazer ainda o poluidor indireto, sendo que o STJ entende que caracteriza a responsabilidade objetiva para os casos de omissão do poder público, ou do próprio órgão fiscalizador, quando deixam de fazer.

Poluição e o dano ambiental individual

Visto isso, passa-se a entender que a poluição está caracterizada em várias situações, mas quando pode ser considerado um dano ambiental individual?

O direito difuso é aquele que busca primar pelo meio ambiente de modo geral, enquanto o direito individual a um meio ambiente equilibrado, a qualidade de vida em si, diz respeito aos prejuízos e a degradação da saúde, ou até mesmo do lazer de cada ser humano.

Portanto, quando for caracterizado uma situação de poluição que esteja prejudicando a qualidade de vida de uma pessoa, resta caracterizado uma possibilidade de um dano ambiental individual.

Para elucidar melhor a questão, vale citar o art. 4º, inciso VII, também da PNMA:

Art 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará:

VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.

A título de exemplo de poluição que pode caracterizar um dano ambiental individual, podemos mencionar:

  1. fábrica que gera fumaça, odor, ou fuligem, que ultrapassem suas cercanias, causando degradação a qualidade de vida de seus vizinhos;

    Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
    Publique seus artigos
  2. empresa de atua durante 24 horas gerando um barulho que atrapalhe a qualidade de vida dos moradores do entorno;

  3. esgoto a céu aberto, devido a baixa qualidade do saneamento da rua, atrapalhando a rotina das pessoas;

  4. alagamento da residência, causado pela omissão do munícipio, dentre outros.

Importante destacar o fato de que, para os casos em que existam empreendimentos poluidores, esses não podem se valer do fato de estarem no local a mais tempo que os moradores, pois a teoria da pré-ocupação já foi debatida pela doutrina ambiental e foi desconsiderada, com o fundamento do princípio in dubio pro natura.

Conclusão

Conforme demonstrado, ficou evidente que a legislação prevê a obrigação tanto do particular, quanto do poder público em zelar pelo meio ambiente equilibrado, sendo que nos casos de desrespeito pode ser tutelado o dano ambiental individual. Vejamos o caso a seguir:

Assiste razão aos autores em sua pretensão ao pagamento de indenização pelo mau cheiro e proliferação de insetos ocasionado pelo descarte irregular de esgoto cloacal na rede pluvial a céu aberto pela ausência de canalização e fiscalização adequadas, o que é responsabilidade solidária, como anteriormente visto, do Município como titular do serviço público e da CORSAN (Companhia de Saneamento Básico).

Em outro caso, mas referente a poluição gerada por uma empresa, a qual estava atuando de modo irregular, ao descartar produtos químicos, sem filtragem, em sua Estação de Tratamento de Efluentes:

No caso em comento, recordo que os autores vinham sofrendo com desconforto, irritação nos olhos, náuseas, dores de cabeça, dores no estômago, por diversos meses, sem que a demandada tomasse qualquer providência.

Desta forma, as condições de degradação e insalubridade advindas da poluição ambiental gerada pela ré, que diminuiu a qualidade de vida dos autores, com certeza configura verdadeiro e profundo abalo psicológico.

Portanto, correto o juízo de procedência do feito, uma vez que há nos autos farta documentação capaz de amparar as alegações da parte requerente, estando perfeitamente configurados o dano e o nexo de causalidade entre a conduta e dano ambiental.

Por conseguinte, para a justa quantificação do dano moral, o magistrado deve avaliar o grau de sequela produzido, que diverge de indivíduo a indivíduo, assim como a repercussão negativa em suas atividades, a duração da ilicitude, a situação econômico/financeira das partes, a ocorrência de ofensa coletiva e repetitiva, a existência de pedido administrativo para a regularização ou cessação da ilicitude, a existência ou não de outras circunstâncias em favor ou em desfavor do ofendido, enfim, deve o magistrado avaliar concretamente todas as circunstâncias para fixar de forma justa e equilibrada o valor do dano moral. [2]

Portanto, nada mais justo as partes que sofrem com a degradação da sua saúde, ou ainda prejuízos na qualidade de vida e no próprio lazer, com a alteração da rotina diária, devido a poluição gerada por empresas ou pelo próprio poder público, lutar por seus direitos.

Quem não luta por seus direitos, não é digno deles. (Rui Costa.)

[1]SILVA, José Afonso da, Direito Ambiental Constitucional, Malheiros Editores Ltda, 10ª Ed., São Paulo, 2013.

[2] (TJ/RS - 021/1.15.0013996-5)

[3] (TJ/RS 70079769386)


Leia mais

A responsabilidade por dano ambiental e a Teoria do Risco Integral

Morador que sofre com alagamento ou enchente tem direito à indenização

Poluição do ar por odor ou mau cheiro gera indenização?

Ressaca em Florianópolis: TRF-4 aumenta multa contra Prefeitura

Sobre o autor
Cláudio Farenzena

Escritório de Advocacia especializado e com atuação exclusiva em Direito Ambiental, nas esferas administrativa, cível e penal. Telefone e Whatsapp Business +55 (48) 3211-8488. E-mail: contato@advambiental.com.br.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!