A redução do IPI, promovida recentemente pelo Palácio do Planalto, afeta as empresas da ZFM. Entenda, neste artigo, o porquê dessa medida ser inconstitucional.
Para que seja possível entender como e por que a recente redução do IPI afeta a ZFM é necessário compreender, antes, o que é esse modelo e como ele funciona.
A ZFM é um instrumento de diversas políticas públicas de Estado. Essas políticas públicas consistem em reduzir as desigualdades regionais, integrar a região amazônica ao restante do país e, especialmente, afirmar a soberania do Brasil sobre esse vasto e rico território.
Embora concebida antes de 1988, os objetivos buscados pela ZFM estão perfeitamente alinhados com aqueles concebidos pela atual Constituição Federal, cujo texto reafirmou essas políticas públicas.
A ZFM, enquanto instrumento dessas políticas públicas de Estado, oferece uma série de incentivos fiscais como forma de atrair empresas para a região amazônica. As empresas estabelecidas na ZFM contribuem para os objetivos traçados pela Constituição Federal, gerando renda, empregos e contribuindo para a infraestrutura da região.
E tudo indica que o modelo tem sido extremamente eficiente naquilo que se propõe a fazer: de acordo com um estudo realizado, em 2019, pela Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, o modelo da ZFM contribuiu para a criação de um moderno parque industrial no interior da Amazônia que, ao mesmo tempo, promoveu o crescimento da renda per capita da região acima da média nacional, melhorou as condições de moradia da população da região e colaborou para conter o desmatamento no estado do Amazonas.
Sim, dentre os estados da Região Norte, o Amazonas é o que possui os menores índices de desmatamento. Os dados são da MapBiomas.
Portanto, como bem destacou o procurador-geral do estado do Amazonas, Giordano Bruno Costa da Cruz, a ZFM é uma escolha nacional.
Dentro desse contexto, os principais incentivos oferecidos pelo modelo estão relacionados ao IPI. O IPI é um imposto que incide sobre a importação e sobre a fabricação de produtos (saída do produto industrializado do estabelecimento industrial).
As indústrias instaladas na ZFM, e que possuem projetos aprovados no âmbito da SUFRAMA, podem adquirir matérias-primas e produtos intermediários (nacionais e importados), destinados à industrialização nessa região, com isenção do IPI.
Por outro lado, o produto fabricado na ZFM, seja ele um bem intermediário ou final, sai dessa região com isenção do IPI.
Ou seja, o produto fabricado na ZFM é desonerado desse imposto federal. Essa desoneração tem o objetivo de tornar o produto fabricado no PIM Polo Industrial de Manaus mais competitivo se comparado àqueles produzidos nas demais regiões do Brasil, mais próximas dos principais centros consumidores do país.
Então, a redução linear do IPI (agora suspensa) abreviou a distância existente entre o custo tributário dos produtos fabricados na ZFM e daqueles produzidos nas demais regiões do país.
A redução promovida pelos decretos, importante esclarecer, afeta não somente o IPI incidente na venda, mas aquele que onera a importação. Com isso, a importação realizada pela ZFM, hoje isenta, perde parte da sua atratividade, na medida em que o IPI será reduzido para todos os insumos importados pelas demais regiões do Brasil.
Tudo isso afeta negativamente a ZFM e a política pública de Estado por ela instrumentalizada.
O objetivo da decisão do STF, portanto, é reestabelecer a competitividade do produto fabricado na ZFM, afetada pela redução do IPI para os produtos fabricados nas demais regiões do país.
Tudo isso significa dizer que o IPI não pode ser reduzido para todas as empresas do país, em hipótese alguma?
Não. Significa que a redução linear do IPI, aplicada de forma geral para todas as empresas do país, deveria ser acompanhada de medidas compensatórias para as empresas situadas na ZFM, garantindo a competitividade do produto fabricado nessa região.
A redução do IPI é uma política pública de governo, cuja implementação deve respeitar todas as demais políticas públicas de Estado previstas na Constituição.
Artigo por Thiago Mancini Milanese - Advogado e sócio do escritório GRM Advogados, especialista em Direito Tributário pela Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas.
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