SUMÁRIO: I. INTRODUÇÃO. II. SOLIDARIEDADE: UMA IDÉIA EM PERMANENTE CONSTRUÇÃO. III. SOLIDARISMO CONTRATUAL.VI. CONCLUSÃO.
I. INTRODUÇÃO
No campo dos contratos, um novo debate vem aflorando. Atualmente, podemos claramente definir duas concepções opostas sobre este instituto: uma tradicional, focada no liberalismo econômico, que o enxerga como um compromisso de interesses divergentes (antagônicos); e outra mais inclinada a entendê-lo como um ato de auxílio mútuo (colaboração), a partir de uma perspectiva solidarista.
Ingressamos então numa das questões mais tormentosas para o jurista: o problema da legitimação do direito, que passa pela delimitação do sentido de Justiça. Para a nova dinâmica das relações sociais, a Justiça, enquanto código formal, racional e genérico, calcado na noção de igualdade, revela-se insuficiente, uma vez que a preocupação do intérprete e aplicador do direito deve estar voltada para o aspecto material e concreto do conceito, que se expressa nas indagações acerca daquilo que deverá ser repartido (proporcionalmente) e com quem.
Dentre as opções disponíveis, caberá ao julgador buscar o equilíbrio entre aquelas que aproveitem ao máximo as circunstâncias particulares, só se justificando desigualdade de tratamento quando vantajosas a todos, ou seja, quando interessem à coletividade. Neste sentido cumpre analisar os traços distintivos do princípio da solidariedade, diante deste novo pensar acerca da teoria contratual em nosso sistema jurídico.
II. SOLIDARIEDADE: UMA IDÉIA EM PERMANENTE CONSTRUÇÃO.
Por muito tempo as tentativas de se estabelecer os contornos de um princípio que consagrasse o valor solidariedade eram sempre rotuladas de idéias socialistas e meramente afastadas por conta de uma pré-compreensão equivocada sobre os objetivos de seus formuladores. Alguns juristas buscaram encontrar alternativas para o liberalismo que historicamente impregnava o estudo do direito privado, sem, contudo, aproximar-se das idéias do socialismo político. Apenas se afirmava a primazia do social e a correlativa necessidade de ver o contrato como um vínculo que impunha aos contratantes o dever mútuo de ajudar ao outro. Neste diapasão, Léon Duguit sustentava que
[...] o ser humano nasce integrando uma coletividade; vive sempre em sociedade e assim considerando só pode viver em sociedade [...] o fundamento do direito deve basear-se, sem dúvida, [...] [no] indivíduo comprometido com os vínculos da solidariedade social. Não é razoável afirmar que os homens nascem livres e iguais em direitos, mas sim que nascem partícipes de uma coletividade e sujeitos, assim, a todas as obrigações que subentendem a manutenção e desenvolvimento da vida coletiva. [...] Se uma doutrina adota como lógica definida a igualdade absoluta e matemática dos homens, ela se opõe à realidade e por isso deve ser prescindida. [01]
Duguit entendia o homem enquanto ser social, derivando os seus direitos subjetivos das suas obrigações sociais [02], por isso acreditava que "a consciência de uma sociabilidade sempre esteve presente, enquanto dependência do homem em relação à comunidade; e também a consciência da sua individualidade". [03]
Durante todo o século XX a noção de solidariedade social era sempre reduzida à perspectiva da caridade, do auxílio ao próximo motivado por pura liberalidade, aproximando-se, pois, da filantropia. No entanto, não é nosso objetivo colaborar para manter a noção de solidariedade como um sentimento genérico de fraternidade. Neste sentido:
A solidariedade é a expressão mais profunda da sociabilidade que caracteriza a pessoa humana. No contexto atual, a lei maior determina – ou melhor, exige – que nos ajudemos, mutuamente, a conservar nossa humanidade, porque a construção de uma sociedade livre, justa e solidária cabe a todos e a cada um de nós. [04]
Neste ponto é preciso anotar que a adoção do discurso de Duguit não serve para legitimar violações da dignidade humana sob pretexto de atendimento às necessidades do grupo social. Em sua dimensão ontológica a dignidade é compreendida como qualidade intrínseca, irrenunciável e inalienável, já que existe em cada ser humano como algo que lhe é inerente, não podendo ser criada ou retirada, embora possa ver violada. Desse modo, a dignidade não poderia ser objeto de desconsideração, mesmo que em relação a pessoas incapazes, indignas ou infames, por se tratar de um dado prévio.
Considere-se ainda a dimensão comunicativa e relacional do princípio da dignidade humana, já que sempre se analisa a noção de dignidade partindo de relações interpessoais, vez que a intersubjetividade implica necessidade de reconhecimento pelo outro. Neste ponto, vale anotar que sob esta perspectiva, a dignidade "implica numa obrigação geral de respeito pela pessoa, traduzida num feixe de deveres e direitos correlativos" [05], garantindo-se o mesmo nível de consideração e respeito a todos, sem que isso sirva para legitimar a tese de que é possível sacrificar a dignidade pessoal em benefício do corpo social.
No campo do direito privado é fundamental esclarecer que tal compreensão da dignidade não implica impossibilidade de se colocar alguém "em situação de desvantagem em prol de outrem", mas sim que as pessoas nunca poderão ser "tratadas de tal forma que se venha a negar importância distintiva de suas próprias vidas" [06] Para Duguit, portanto, a "solidariedade social é que constitui os liames que mantêm os homens unidos". Entretanto, o homem procura sempre dirigir a sua solidariedade para os membros de um grupo determinado [07].
Destarte, a noção de dignidade apresenta, uma dimensão dúplice, ao mesmo tempo defensiva (serve como limite, ao orientar direitos fundamentais) e prestacional (cria tarefas, ou seja, deveres cometidos ao Estado). Não percamos de vista a dimensão histórico-cultural deste conceito, que reclama concretização e permanece em processo de contínuo desenvolvimento. Desse modo, as dimensões cultural e natural da dignidade humana interagem e se complementam, permitindo a construção de um conceito objetivo da noção, de matiz secularizada e universal.
Pelo exposto acima, fica evidente que as noções de dignidade humana e solidariedade são complementares e não reciprocamente excludentes. A partir da síntese de tais noções, através de um juízo de ponderação, é possível avançar na busca de um sentido social de contrato, vinculado às idéias de justiça social preconizadas no texto constitucional.
III. SOLIDARISMO CONTRATUAL.
O "solidarismo" é uma expressão polissêmica no campo do direito [08]. Pode referir-se, por exemplo, no campo das obrigações, à solidariedade ativa ou passiva, em que duas ou mais pessoas se obrigam ao cumprimento integral da prestação. No campo dos contratos quer significar a obrigação imposta aos contratantes de colaboração mútua, sobretudo para melhor deslinde de relações cada vez mais complexas entre as pessoas. Não se trata de uma pluralidade de deveres, mas de uma obrigação recíproca entre as partes, a ser observada durante toda a execução do contrato.
O solidarismo contratual pode ser descrito como a doutrina que erige como princípio do direito dos contratos a exigência de lealdade, solidariedade ou boa-fé e impõe aos contratantes a obrigação de colaborar [09]. A jurisprudência permanece reticente com o instituto, enquanto que a doutrina mais tradicional, impregnada dos valores clássicos do liberalismo, praticamente desconsidera a importância desse formato de socialização da relação contratual. Só há poucos anos é que a doutrina do solidarismo contratual passou a ser aceita por um maior número de pessoas. O potencial polêmico da matéria é enorme. Alguns ressaltaram a impossibilidade de sua utilização por conta da segurança jurídica que ficaria ameaçada, vez que o conteúdo da avença ver-se-ia passível de alteração pelo magistrado a qualquer momento.
Para Nelson Rosenvald o direito de solidariedade se desvincula de uma mera referência a valores éticos transcendentes, "adquirindo fundamentação e a legitimidade política nas relações sociais concretas, nas quais se articula uma convivência entre o individual e o coletivo, à procura do bem comum" [10]. E prossegue afirmando que:
Longe de representar uma simples carta programática, ou um vago programa político, a solidariedade será padrão interpretativo-integrativo do sistema, referência de leitura para as outras normas constitucionais e o ordenamento. O art. 3º [CF/88] enceta na solidariedade a teleologia da justiça distributiva com referência à igualdade substancial. O princípio da solidariedade provoca a transposição do indivíduo para a pessoa. A liberdade absoluta que permitia a cada um atingir o máximo de suas potencialidades cede espaço para a projeção da pessoa que coexiste em sociedade [11].
Daniel Sarmento aduz que a solidariedade "implica o reconhecimento de que, embora cada um de nós componha uma individualidade, irredutível ao todo, estamos também todos juntos, de alguma forma irmanados por um destino comum" [12] e prossegue afirmando que:
Ela [a solidariedade] significa que a sociedade não deve ser o locus da concorrência entre indivíduos isolados, perseguindo projetos pessoais antagônicos, mas sim um espaço de diálogo, cooperação e colaboração entre pessoas livres e iguais, que se reconheçam como tais [13].
No sistema jurídico brasileiro, a perspectiva solidarista encontra fundamento no art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil e no inciso XXIII de nossa Constituição Federal, que torna imperiosa a tentativa de conciliação entre duas idéias aparentemente antagônicas: individualidade e dimensão social, que num processo dialético devem orientar o conteúdo e a direção das normas que regem as relações privadas [14].
Limitando tais idéias ao âmbito do direito das obrigações, adentramos no campo do que Ian Macneil [15] costumava denominar contratos relacionais, categoria para a qual, segundo o citado autor, o simples consenso não é suficiente para a criação de obrigações contratuais. A existência do contrato não depende apenas e tão-somente do consentimento, mas também de uma expectativa de confiança entre as partes [16], que significa a adoção de um comportamento que possa ser previsível à outra parte, estando assim apto a concretizar o princípio da função social previsto no texto constitucional.
Há de se vislumbrar que em alguns contratos de longo prazo a sanção não será imposta, mas, como o resto, negociada, pois os contratantes não disciplinaram exaustivamente os eventos futuros, pelo que, durante a execução, ajustes serão necessários. A disputa nestes casos dirige-se ao que ainda irá acontecer, e não ao que já ocorreu.
No entanto, o cuidado que devemos ter é para que tal doutrina não se torne uma justificativa ideológica a um intervencionismo desorientado [17]. Ainda não houve uma grande confrontação ou qualquer trabalho de síntese dessas correntes acima mencionadas. Há quem defenda um solidarismo voluntário (não-cogente), em que as próprias partes acordam em colaborar mutuamente. E outra que coloca o solidarismo como um imperativo social, um solidarismo cogente, no qual competiria à lei ou ao magistrado aplicá-lo nas relações contratuais, até mesmo reescrevendo cláusulas contratuais. Neste sentido, lembra Daniel Sarmento que se o Direito não pode penetrar no psiquismo das pessoas para obrigá-las a ser solidárias, exigindo-lhes um sentimento fraterno em relação aos seus semelhantes, pode "condicionar o comportamento externos dos agentes, vinculando-os a obrigações jurídicas" [18].
Cabe aqui lembrar lições de Pietro Perlingieri, para quem as situações patrimoniais demandam a indispensável cooperação entre os seus partícipes. [19] É este espírito de cooperação que densifica o primado da solidariedade social, apontando o rumo a ser seguido em qualquer relação contratual, limitando atos de autonomia privada que desviem desta rota. Nem é necessário sublinhar que a perspectiva solidarista impõe o dever de não agir contra ato próprio [20]. O Direito civil que se desenha hoje é pautado pela "colaboração intersubjetiva no tráfego negocial". [21]
IV. CONCLUSÃO.
Independentemente do resultado, o embate entre estas visões antagonistas de contrato faz renascer as discussões em torno do assunto. E, no sistema brasileiro, já se pode começar a questionar se o solidarismo contratual é apenas um mito ou representa a realidade que necessita ser conformada. Para a doutrina solidarista, o que deve dirigir as partes na celebração do negócio, durante sua duração e mesmo após o término da mesma, são a boa-fé, a lealdade e a solidariedade. A solidariedade repousa num único dever que gera uma multiplicidade de deveres de conduta exigíveis de qualquer das partes.
O Superior Tribunal de Justiça já manifestou entendimento consentâneo com o primado do solidarismo contratual, ao reconhecer em diversos casos, que ao lado da tradicional dicotomia entre inadimplemento absoluto e inadimplemento relativo (mora), há que se reconhecer a possibilidade de ocorrência de adimplemento substancial, quando a parcela do descumprimento da avença é de pequena monta em relação ao objeto contratado, o que acarreta a impossibilidade do credor de pleitear a resolução do pacto, limitando-se sua pretensão ao cumprimento específico do acordado ou indenização pelas perdas e danos eventualmente apuradas no caso concreto. Neste sentido, vale transcrever as seguintes ementas, para ilustrar tal entendimento:
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. Busca e apreensão. Deferimento liminar. Adimplemento substancial. Não viola a lei a decisão que indefere o pedido liminar de busca e apreensão considerando o pequeno valor da dívida em relação ao valor do bem e o fato de que este é essencial à atividade da devedora. Recurso não conhecido. (REsp 469.577/SC, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 25.03.2003, DJ 05.05.2003 p. 310)
AGRAVO REGIMENTAL. VENDA COM RESERVA DE DOMÍNIO. BUSCA E APREENSÃO.
INDEFERIMENTO. ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL DO CONTRATO. COMPROVAÇÃO.
REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ.
1. Tendo o decisum do Tribunal de origem reconhecido o não cabimento da busca e apreensão em razão do adimplemento substancial do contrato, a apreciação da controvérsia importa em reexame do conjunto probatório dos autos, razão por que não pode ser conhecida em sede de recurso especial, ut súmula 07/STJ.
2. Agravo regimental não provido.
(AgRg no Ag 607.406/RS, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 09.11.2004, DJ 29.11.2004 p. 346)
Esta mitigação do direito de resolução do contrato, até então encarado como prerrogativa de caráter absoluto estipulada em benefício dos interesses do credor é uma demonstração inequívoca que vivemos novos tempos na teoria contratual pátria, que certamente exigirão dos operadores jurídico especial cuidado com a interpretação das disposições contratuais em atenção ao ideário de justiça material extraído das noções de dignidade humana e solidariedade social que promanam do texto constitucional.
Notas
01
DUGUIT, Pierre M. N. Léon. Fundamentos do Direito. São Paulo: Ícone, 1996, p. 15/17.02
Idem, p. 19.03
DUGUIT, Pierre M. N. Op. cit, p. 21. Aduz ainda o mencionado autor que "O homem desfruta o direito de desenvolver sua atividade com liberdade, mas, ao mesmo tempo, só possui esse direito enquanto consagra seu exercício à realização da solidariedade social" (p. 28).04
MORAES, Maria Celina Bodin de. O princípio da solidariedade, In: PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabela Franco; NASCIMENTO FILHO, Firly. (coord.), Os princípios da Constituição de 1988, p. 178. Apud ROSENVALD, Nelson. Dignidade Humana e Boa-fé no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 173.05
SARLET, Ingo Wolfgang. As Dimensões da Dignidade da Pessoa Humana: Construindo uma compreensão jurídico-constitucional necessária e possível, p. 23/24.06
SARLET, Ingo Wolfgang. As Dimensões da Dignidade da Pessoa Humana: Construindo uma compreensão jurídico-constitucional necessária e possível, p. 36.07
DUGUIT, Pierre M. N. Léon. Op. cit., p. 22-3. Tem-se aqui o conceito de "solidariedade por semelhança". Para o autor, o direito fundado na solidariedade social impõe aos indivíduos o dever de não atentar contra a solidariedade, além de dirigir sua atividade a fim de desenvolvê-la organicamente. Ocorre que se devem impor deveres diferentes para as pessoas de acordo com seu potencial.08
Importante destacar que tal expressão "solidarismo" não deve ser confundida com a noção de "solidariedade". Este movimento não se limita ao direito dos contratos, existindo uma perspectiva geral do tema e uma mais estrita, forjada no campo contratual. Philippe Remy registra que tal corrente de pensamento conforma-se a partir da obra de Léon Bourgeois, publicada em 1896, mas que o neologismo "solidarismo" acabou sendo popularizado por Célestin Bouglé, após a publicação de obras que tratava do solidarismo, por volta de 1907. O referido autor aponta ainda os trabalhos do economista Charles Gide (1847-1932) e do filósofo Alfred Fouillée (1838-1912) como os precursores das idéias depois defendidas por Bourgeois e Bouglé. Curioso anotar que as idéias solidaristas diferem em intensidade nas obras de Bourgeois e Bouglé, sobretudo pelas diferenças em sua atuação profissional. Léon Bourgeois Victor-August (1851-1925) era um político extremista, enquanto que Célestin Bouglé era um professor de filosofia social da universidade de Toulouse. No início, as idéias defendidas por ambos os autores inspiraram seguidores, dentre os quais se podem destacar Duguit e Saleilles entre os privatistas. A visão civilista de solidarismo que se encontra em Saleilles, embora mais complexa é mais moderada que a defendida por Duguit, o que nas gerações seguintes acabou influenciando Demogue em seu tratado das obrigações, onde encontramos expressões como "ordem social", cooperação social. Tal doutrina sai de cena em 1930. (Cf. La gênese du solidarisme. In GRYBAUM, Luc; NICOD, Marc. Le solidarisme Contratuel. Paris, no primeiro capítulo da obra).09
Com a adoção desta expressão, procura-se evitar as dificuldades de apreensão de seu conteúdo, tão comuns quando utilizada o termo "solidariedade social". No entanto, ao longo do texto, tais expressões por vezes foram utilizadas como sinônimos.10
ROSENVALD, Nelson. Dignidade Humana e Boa-fé no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 173.11
Idem, p. 179.12
SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 338.13
Idem, ibidem.14
Gerson Luiz Carlos Branco sustenta que a "dimensão da socialidade também é reconhecida pelo forte poder normativo que os valores sociais produzem em relação ao direito e, nesse aspecto, as disposições e referências constantes aos usos (arts. 113, 429 e 432 do CC/02), aos costumes ou costumes do lugar (arts. 596, 615, 695, 701, 872 do CC/02) são reveladores dessa dimensão. Cf. "Culturalismo de Miguel Reale e sua Expressão no Novo Código Civil". In: MARTINS-COSTA, Judith; BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 69/70.15
CAMPBELL, David. Ian Macneil and the Relational Theory of Contract. Discussion Paper 04/1E. Center for Legal Dynamics of Advanced Market Soceties: Kobe University, 2004. A teoria dos contratos relacionais surge com os trabalhos de Ian Macneil publicados na década de 1960, onde ele contrapõe duas formas de contratar: (a) discret contract e (b) relational contract. Seu trabalho não exclui a importância da doutrina tradicional, mas introduz uma nova perspectiva nas relações negociais. Para Macneil, os contratos relacionais envolvem pessoas que trabalhavam em conjunto numa relação de co-operação. Esta cooperação na maioria dos casos não está vinculada aos objetivos da outra parte, mas sim à própria atividade negocial.16
Aqui vale reportar-nos ao capítulo relativo aos deveres gerais de conduta para ressaltar que essa expectativa de confiança deve estar presente em qualquer forma contratual em face do imperativo da boa-fé que rege as relações negociais.17
Cf. La gênese du solidarisme. In: GRYBAUM, Luc; NICOD, Marc. Le solidarisme Contratuel. Paris, no primeiro capítulo da obra.18
Cf. SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 339. O autor cita Maria Celina Bodin de Moraes para explicar que "não se faz necessário exigir que alguém sinta algo de bom pelo outro; apenas que se comporte como se sentisse". (p. 339, nota 833).19
PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: introdução ao Dirieto Civil Constitucional. Trad. Maria Cristina De Cicco. 2.ed. São Paulo: Renovar, 2002, p. 121/122.20
O "venire contra factum proprium" é uma vedação decorrente do princípio da confiança. Trata-se de um tipo de ato abusivo de direito. Referida vedação assegura a manutenção da situação de confiança legitimamente criada nas relações jurídicas contratuais, onde não se admite a adoção de condutas contraditórias. Trata-se de "uma regra de coerência, por meio do qual se veda que se aja em determinado momento de uma certa maneira e, ulteriormente, adote-se um comportamento que frustra, vai contra aquela conduta tomada em primeiro lugar". Portanto, o "venire contra factum proprium no potest" significa a proibição de ir contra fatos próprios já praticados. (RODRIGUES, Marcelo Capi. Da incindência do princípio da boa-fé objetiva no pagamento fracionado conforme o art.314 do novo Código Civil. Disponível on line http://www.intelligentiajuridica.com.br/old-set2004/artigo5.html. Acesso em 08.11.2006)21
MARTINS-COSTA, Judith. O novo Código Civil Brasileiro: em Busca da "Ética da situação" In: Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil, p. 132.