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Constituição Federal, trabalho & Democracia.

Agenda 11/08/2022 às 07:44

Resumo:

O STF anulou alguns trechos da Reforma Trabalhista considerando-os inconstitucionais. Em verdade, derrubou poucos itens da dita reforma, mas ratificou o valor do trabalho e proteção jurídica do trabalhador.

Palavras-Chave. Direito do Trabalho. CLT. Proteção do Trabalhador. Reforma Trabalhista. Flexibilização.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 rompeu o paradigma jurídico e político, representando importante da restauração democrática e a institucionalização dos direitos fundamentais.

Desde seu artigo inaugural, o texto consagrou o valor social do trabalho como um dos fundamentos da república brasileira, ao lado da cidadania e da dignidade da pessoa humana trazendo, portanto, ressignificação do atuar do Estado.

No plano axiológico emerge o trabalho como um dos valores-fonte do sistema constitucional, irradiando seu conteúdo para todo o ordenamento jurídico, traduzindo uma tarefa dos poderes estatais e de toda sociedade.

O caput do artigo 170 do CFRB/1988 dispõe que a ordem econômica que se funda na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa e visa assegurar a todos, uma existência digna conforme os ditames da justiça social[1] e, observado dentre outros, o princípio da busca do pleno emprego (artigo 170, VIII, CFRB/1988).

Destaca-se, também, a primazia do trabalho na ordem social e o artigo 205 do texto constitucional vigente enunciou que um dos objetivos da educação é a qualificação para o trabalho, bem como o pleno desenvolvimento da pessoa e de seu preparo para o exercício da cidadania, afirmando-se a íntima relação entre o trabalho, autonomia, cidadania e dignidade humana[2].

Enfim, o atual texto constitucional brasileiro vigente revela-se ser o mais avançado, sendo pormenorizado na consolidação de direitos e garantias fundamentais da história constitucional brasileira.

Diante do acúmulo de graves desigualdades sociais e econômicas e à constatação de que a liberdade e a igualdade formais eram insuficientes, avolumaram-se os movimentos pelo reconhecimento de direitos que reclamavam postura ativa do Estado[3] (como saúde, educação, assistência social, previdência social, trabalho e, etc.).

Para ver realizada a justiça social, sendo então consagrados os direitos fundamentais da segunda dimensão. No vasto catálogo aberto de direitos fundamentais assegura a liberdade no exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, devendo ser atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. Eis que se consagra a livre escolha e exercício do trabalho.

De modo inédito, o artigo 6º do texto constitucional vigente consagrou o trabalho como direito fundamental social e que deve obter progressiva melhoria nas condições de trabalho e da condição social do trabalhador, conforme os artigos 7º ao 11.

Percebe-se pelo conjunto de normas de valorização e proteção, a inegável primazia axiológica do trabalho na Constituição Federal brasileira de 1988. Após os princípios objetivos fundamentais e os direitos e garantias fundamentais, a CFRB trata da organização do Estado e dos Poderes desenhada para a realização do até então enunciado.

O caput do artigo 127 CFRB/1988 enuncia: O Ministério Público é instituição permanente essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-se a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

A defesa da ordem jurídica não se confunde com o papel de fiscal da lei (custos legis) em processos judiciais pois, permeia todos os âmbitos de atuação ministerial judicial (na condição de órgão, agente ou interveniente), extrajudicial, preventivo, repressivo, promocional e, etc.

Também não significa defesa pura da lei, mas salvaguarda do ordenamento jurídico como um todo, atuando como alavanca de acesso à justiça, visando dar efetivo cumprimento das normas, princípios e ideais que fundamentam o Estado Democrático de Direito brasileiro. Defender o sistema jurídico é preservar a supremacia constitucional.

Toma-se sistema jurídico como sendo uma rede axiológica de princípios gerais e tópicos, de normas e de valores jurídicos cuja função é a de evitar ou superar a antinomia, dando-lhe cumprimento aos princípios e objetivos fundamentais do Estado de Direito, assim como se encontram consubstanciado, expressa ou implicitamente na Lei Maior (Freitas, Juarez. A interpretação sistemática do direito. São Paulo: Malheiros, 1995, p.44).

O Ministério Público dentro do paradigma do Estado democrático de direito, está vinculado à Constituição. Seus princípios institucionais, funções, instrumentos de atuação, garantias, prerrogativas e deveres, deverão abeberar-se na fonte constitucional e desta extrair seu direcionamento e fundamento hermenêutico.

Entretanto, em defesa dos preceitos constitucionais, a atuação ministerial pode se opor as decisões democráticas da maioria. Daí, a ideia dos direitos fundamentais como trunfos contra a maioria constituindo limites às decisões dos poderes constituídos.

Alude-se ao caráter contramajoritário das atuações que buscam impedir/reparar excessos decorrentes de decisões democráticas em prol da salvaguarda de preceitos fundamentais.

Enfim, ao parquet caberá a defesa da democracia, mas pautada pelo constitucionalismo, em processo de tensão contínua, até porque advogar o regime democrático materializa também respeita ao Estado de Direito, e sustentar a manutenção da democracia, por efeito, fortificará o direito, em processo dinâmico e dialético.

Democracia e respeito ao direito devem seguir e estar alinhados. Assim, a vontade da maioria não pode servir de pretexto para desconsideração de direitos individuais de minorias eventuais e, nesse momento, os direitos humanos e fundamentais atuarão como trunfos na defesa dos hipossuficientes. Isso também fortalecerá a defesa dos direitos sociais coletivos igualmente legitimados pelo sistema democrático constitucional.

É robusta a atuação do Ministério Público do Trabalho[4] em razão da Lei 13.467/2017, a chamada Reforma Trabalhista, pois em diversas disposições operou-se a supressão e/ou restrição ilegítima de direitos fundamentais sociais, reduzindo ou eliminando a proteção jurídica deferida aos trabalhadores e enfraquecendo a noção de trabalho digno, em afronta direta às regras, princípios e valores constitucionais vigentes.

Outra atuação em defesa da ordem jurídica foi o repúdio do MPT a Portaria 1.129/2017 do Ministério do Trabalho, que alterou e dificultou regras de fiscalização do combate ao trabalho escravo e, criou definição (bastante restritiva) para os conceitos de trabalho forçado, jornada exaustiva e condições análogas às de escravo.

Por se tratar de afronta direta ao sistema constitucional e internacional de proteção ao trabalho digno, dificultando seu combate, foi expedida recomendação para a revogação da Portaria.

O esforço ministerial, somado à decisão liminar proferida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 489 que levou à suspensão da norma.

Trata-se de atuação contra o ato emanado do Executivo que não apenas exorbitou o poder de regulamentar, mas atingiu seriamente os pilares da proteção constitucional ao trabalho digno.

Foi belíssimo o voto dado pela Ministra Rosa Weber[5] disponível em: https// www.conjur.com.br/voto-fachin-reforma-trabalhista.pdf.

Liminar da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspende a Portaria 1.129/2017 do Ministério do Trabalho que altera regras de fiscalização no combate ao trabalho escravo e cria nova definição aos conceitos de trabalho forçado, jornada exaustiva e condições análogas à de escravo, para, entre outros fins, a concessão de seguro-desemprego.

A liminar foi deferida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 489, ajuizada pelo partido Rede Sustentabilidade. Tramita ainda no STF ação semelhante (ADPF 491) ajuizada pela Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL), também sob relatoria da ministra Rosa Weber.

Em sua decisão na ação proposta pela Rede, a ministra considera cabível a ADPF, observando que a definição conceitual proposta na portaria ministerial afeta as ações e políticas públicas do Estado brasileiro, no tocante ao combate ao trabalho escravo, em três dimensões: repressiva (ao repercutir nas fiscalizações procedidas pelo Ministério do Trabalho), pedagógico-preventiva (ao disciplinar a inclusão de nomes no Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo) e reparativa (concessão de seguro-desemprego ao trabalhador resgatado).

Nesse sentido, a relatora afirma que tais definições conceituais, sobremodo restritivas, não se coadunam com o que exige o ordenamento jurídico brasileiro, os tratados internacionais celebrados pelo Brasil e a jurisprudência dos tribunais sobre a matéria.

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Como revela a evolução[6] do direito internacional sobre o tema, afirma a ministra em sua decisão, "a 'escravidão moderna' é mais sutil e o cerceamento da liberdade pode decorrer de diversos constrangimentos econômicos e não necessariamente físicos.

A violação do direito ao trabalho digno, com impacto na capacidade da vítima de realizar escolhas segundo a sua livre determinação, também significa reduzir alguém a condição análoga à de escravo, prossegue a relatora em sua decisão.

Por evidente, não é qualquer violação dos direitos trabalhistas que configura trabalho escravo, diz a ministra. Entretanto, acrescenta que, se atinge níveis gritantes e se submetidos os trabalhadores a trabalhos forçados, jornadas exaustivas ou a condições degradantes, com a privação de sua liberdade e de sua dignidade, resulta configurada, mesmo na ausência de coação direta contra a liberdade de ir e vir, hipótese de sujeição de trabalhadores a tratamento análogo ao de escravos, nos moldes do artigo 149 do Código Penal, com a redação que lhe foi conferida pela Lei nº 10.803/2003, afirma.

Na avaliação da ministra, a portaria ministerial esvazia o conceito de jornada exaustiva de trabalho e trabalho forçado; introduz, sem base legal, o isolamento geográfico como elemento necessário à configuração de hipótese de cerceamento do uso de meios de transporte pelo trabalhador; e coloca a presença de segurança armada, como requisito da caracterização da retenção coercitiva do trabalhador no local de trabalho em razão de dívida contraída.

Toda essa mudança de conceito, segundo a relatora, atenua o alcance das políticas de repressão, de prevenção e de reparação às vítimas do trabalho em condições análogas à de escravo e contraria 20 anos de trajetória jurídica e administrativa realizada pelo Brasil no sentido do combate à escravidão contemporânea, com instrumentos e mecanismos técnicos reconhecidos internacionalmente.

Tais mecanismos e instrumentos estavam configurados justamente na lista suja, na forma da inspeção do trabalho e no enfrentamento da impunidade pelos Grupos Especiais de Fiscalização Móvel, por meio da atividade de investigação, processamento e punição dos responsáveis pelos delitos, conforme nota divulgada pela Organização Internacional do Trabalho.

A relatora lembra que mesmo esses mecanismos ainda não foram suficientes para coibir a prática do trabalho escravo moderno e o tráfico de pessoas em algumas regiões do país, levando o Brasil à condenação pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Fazenda Brasil Verde.

Para a concessão da liminar a relatora considerou presentes os pressupostos da plausibilidade jurídica do pedido (fumus boni juris) e perigo de demora na decisão (periculum in mora), diante do risco de comprometimento dos resultados alcançados durante anos de desenvolvimento de políticas públicas de combate à odiosa prática de sujeitar trabalhadores à condição análoga à de escravo, caso a portaria produza efeitos.

Segundo a Ministra, a Portaria 1.129/2017 do Ministério do Trabalho tem como provável efeito prático a ampliação do lapso temporal durante o qual ainda persistirá aberta no Brasil a chaga do trabalho escravo, trazendo danos contínuos à dignidade das pessoas.

Assim, a Ministra Rosa Weber deferiu a liminar, a ser referendada pelo Plenário, com o caráter precário próprio aos juízos perfunctórios e sem prejuízo de exame mais aprofundado quando do julgamento do mérito para suspender os efeitos da portaria ministerial.

Em seguida, a Ministra requisitou informações ao ministro do Trabalho, e pareceres da Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República.

Posteriormente, MTb 1.208 de 28.12.2017, em substituição à portaria impugnada. O texto traz novidades como a definição de jornada exaustiva e a condição degradante, seguindo o defendido pelo MPT e pela OIT de que não é necessária restrição direta Ministro do Trabalho para divulgação da lista das empresas autuadas por manter trabalhadores em condições análogas às de escravo.

A mais balzaquiana Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 está calejada e abatida pelas inúmeras frustrações e ataques sofridos, e suas promessas não mais encantam em face da infeliz realidade pátria[7].

Apesar de amadurecida e consciente de seus desafios constantes e consideráveis avanços, é que nos desperta coragem e liberdade para alterar o rumo da história.

Tanto a Constituição e seus intérpretes estão a renovar, não passando incólume às amargas experiências de quem se propõe a caminhar.

A propósito, o plenário do STF, por maioria de votos, julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5938 para declarar inconstitucionais trechos de dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) inseridos pela Reforma Trabalhista, a Lei 13.467/2017 que admitiam a possibilidade de trabalhadoras grávidas e lactantes desempenharem atividades insalubres em algumas hipóteses. Enfim, para a corrente majoritária, a expressão quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, contida nos incisos II e III do artigo 394-A da CLT, afronta a proteção constitucional à maternidade e à criança.

A referida ação fora ajuizada no STF pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos. Tal previsão legal, segundo a entidade autora, afronta a proteção que a Constituição Federal atribui à maternidade, à gestação, à saúde, à mulher, ao nascituro, aos recém-nascidos, ao trabalho e ao meio ambiente de trabalho equilibrado. A eficácia dos dispositivos estava suspensa desde o fim do mês passado por liminar deferida pelo relator, ministro Alexandre de Moraes.

Em seu voto, a ministra Rosa Weber apresentou apanhado histórico legislativo dos direitos trabalhistas das mulheres no Brasil e no mundo. Segundo a ministra, contam-se 96 anos desde a primeira norma de proteção ao trabalho da gestante no país. Isso revela, a seu ver, quase um século de afirmação histórica do compromisso da nação com a salvaguarda das futuras gerações.

A Constituição brasileira de 1988, por sua vez, priorizou a higidez física e mental do trabalhador ao exigir, no inciso XXII do artigo 7º, a redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança.

A ministra afirmou ainda que a maternidade representa para a trabalhadora um período de maior vulnerabilidade devido às contingências próprias de conciliação dos projetos de vida pessoal, familiar e laboral.

Dessa forma, os direitos fundamentais do trabalhador elencados no artigo 7º impõem limites à liberdade de organização e administração do empregador de forma a concretizar, para a empregada mãe, merecida segurança do exercício do direito ao equilíbrio entre trabalho e família. A alteração promovida pela Reforma Trabalhista, concluiu a ministra, implicou inegável retrocesso social.

Também votaram pela procedência da ação os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Carmen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e o presidente da Corte, ministro Dias Toffoli.

Com relação a terceirização das relações de trabalho, cumpre analisar os votos do STF na ADPF 324 e RE 958.252 em prol dos valores sociais do trabalho como limites à livre iniciativa.

Venceu por maioria de sete (7) votos a quatro (4) o entendimento de que: [...] é lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante.

Para esse desiderato, ocorreu um debate com vários argumentos relevantes sobre o trabalho terceirizado, tanto dos que militam no sentido da proibição quanto os que desejam sua ampla liberação. Esses vários enfoques, trazidos ao Plenário do STF, valem a pena registar e ponderar criticamente nesta pesquisa.

Nada obstante o aporte descritivo dos vários debates e posicionamentos oriundos do processo decisório do STF, o presente estudo segue a linha do entendimento vencido, o qual reflete que a terceirização das relações de trabalho, ao menos no tocante à atividade-fim da empresa tomadora de serviços, deve ser proibida pela via legal, evitando-se essas relações na prática, visando preservar e promover os valores sociais que permeiam o trabalho humano, tais como definidos na constituição brasileira.

O problema é: Qual foi o entendimento preponderante dos Ministros do STF ao julgarem inconstitucional a ilicitude da terceirização na atividade-fim? O objetivo geral é compreender os fundamentos utilizados pelo STF no julgamento sobre a terceirização das relações de trabalho. E, os objetivos específicos são o levantamento do contexto histórico jurídico do mundo do trabalho, analisar os votos dos Ministros nos julgamentos da RE nº 958.252 e a ADPF nº 324 e, por fim, estabelecer uma análise crítica sobre o entendimento que preponderou no julgamento das relações de trabalho terceirizadas.

O projeto neoliberal[8], como aplicação de política de Estado, vem desde da década de 1980 assombrando o Brasil, todavia sendo suavizada com a palavra modernização da CLT, cujas reformas legais ocorridas em 2017 - Lei nº 13.429/17 seguida da Lei nº 13.467/17 - a fim de cortar direitos sociais - são novidades antigas, afinal, antes da reforma trabalhista de 2017, a legislação trabalhista passou por mudanças no que se refere a garantia de emprego, salários-mínimos e previdência social, e ainda, o grande enfraquecimento do sindicato, que demonstrou ser a causa e a consequência de mais flexibilização de direitos trabalhistas,

O Ministro Roberto Barroso relatou a ADPF nº 324, na qual a pleiteante DA AÇÃO tendo como objeto o de discutir a aplicação da Súmula nº 331 do TST no conjunto de decisões da Justiça do Trabalho acerca da terceirização de serviço. No pedido inicial afirmou-se que tal entendimento inviabiliza a terceirização sem a devida previsão legal, constituindo em uma violação aos preceitos constitucionais fundamentais garantidores da legalidade.

Em resumo, essa ação nasceu em 2014. Seu principal argumento é o de que o alcance da súmula formulada pelo TST impede a terceirização, comprometendo a contratação de empregos formais; logo, a competição de produtos brasileiros (tanto no mercado interno e externo), e ainda, o tratamento isonômico com concorrentes no mercado. Em contraponto a essa ação, veio a defesa pelo TST, manifestando-se que justamente por não ter previsão legal é que a súmula deve ser utilizada. Eis o teor do relatório:

No mérito, o TST esclarece que, em virtude da inexistência de lei regulamentadora da prática de terceirização, o tribunal houve por bem editar o referido verbete, no intuito de proteger os trabalhadores terceirizados e de assegurar a igualdade de tratamento entre os jurisdicionados.

E observa que a previsão, constante da Súmula 331, que reconhece a legalidade da terceirização em caso de trabalho temporário e nos casos de serviços de vigilância, conservação e limpeza, baseia-se no teor da Lei 6.019/1974 e da Lei 7.102/1983, cuja ratio autorizaria a contratação de serviços temporários ou ligados à atividade-meio da empresa. Por fim, a vedação à terceirização de serviços ligados à atividade-fim ou à atividade essencial, prevista no verbete, decorreria da inexistência de previsão legal que expressamente a autorize, diferentemente dos demais casos. Por essas razões, entende o TST que a Súmula 331 do TST não configura exercício ilegítimo de atividade legislativa pelo Judiciário (STF, 2018).

A terceirização, de acordo com o Ministro Barroso, permite uma maior competitividade já que com ela captam-se empresas com maior especialidade, bem como está de acordo com a livre iniciativa, desde que respeitados os mínimos parâmetros legais instituídos. Logo, não está em descompasso com a Constituição.

Esse modelo de produção flexível, de acordo com o Ministro, é hoje uma realidade em todo mundo e, em virtude da globalização[9] de mercados, constitui um elemento essencial para a preservação da competitividade de todas as empresas. Tanto é assim que a terceirização foi adotada por um conjunto extenso de países.

É amplamente praticada nos Estados Unidos, na Alemanha, na Áustria, nos países escandinavos, na Espanha e no Uruguai. É praticada com limitações semelhantes às que devem vigorar no Brasil: na França, no Reino Unido, na Itália, no Chile, na Argentina, no México, na Colômbia, no Peru e em diversos outros países da América Latina.

A última etapa do julgamento ocorreu no dia 30 de agosto de 2019, tratando-se da quarta sessão de julgamento, faltando, na altura, apenas dois votos: do Ministro Celso de Mello e da Ministra Cármen Lúcia, ambos com a mesma linha de decisão nos seus votos, reconhecendo a história de lutas da classe trabalhadora, sendo a CLT resultado de direitos sólidos dos trabalhadores, e a terceirização como um retrocesso no sentido de direitos sociais. Todavia, segundo eles, como se está no meio de uma crise de desemprego, a terceirização, que seria um retrocesso, passa a ser a solução. Por isso não se pode proibi-la.

Por isso, neste julgamento ocorreu perfilhação a uma linha hegemônica de pensamento, radicada em dogmas social e politicamente definidos conforme aponta Tiago Muniz Cavalcanti, o qual analisa que a decisão produzida no julgamento da RE nº 958.252 e ADPF nº 324 pelo STF admite uma concepção totalmente política de sentido neoliberal.

Diante da linha liberal que motivou a decisão em favor de uma terceirização sem limites pelo STF, cabe-se recapitular o porquê e para que o direito do trabalho encontra o seu lugar no ordenamento jurídico brasileiro, para assim contrastar com as motivações do julgado.

Com efeito, o direito do trabalho brasileiro vem de uma Constituição Federal brasileira vigente que optou por colocar os valores do trabalho e da livre iniciativa no mesmo patamar, ambos antecedidos e iluminados pelo respeito e promoção da dignidade humana[10].

Ex positivis, o neoliberalismo não pode suplantar esse substrato sobre o qual se assenta o Estado brasileiro, dando prevalência ao desenvolvimento econômico em detrimento do desenvolvimento social.

Encerrou-se o julgamento da RE nº 958.252 e ADPF nº 324 com a seguinte decisão: É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante.

Em um primo momentum, o direito brasileiro acompanha essa tendência e incorpora no seu sistema a terceirização através da Súmula 256 do TST, sendo essa posteriormente substituída pela Súmula nº 331 TST, na intenção de limitar a terceirização que estava ocorrendo na vida prática dos trabalhadores.

Mais, recentemente, houve a modificação da legislação complementar com intuito de contrariar essa limitação que antes havia feito o TST para, com a Lei nº 13.429/17, seguida da Lei nº 13.467/2017 - dar amplo espectro para a contratação de serviços terceirizados.

Na conjuntura de fortes críticas sociais sobre a possibilidade de ampla contratação de serviços terceirizados, o STF abriu o julgamento de ações (ADPF nº 324 e RE nº 958.252) que questionavam a constitucionalidade e os limites da terceirização. No âmbito de tais ações, os Ministros do STF, por intermédio de seus respectivos votos, apresentaram vários argumentos, pró e contra a licitude da terceirização.

Por fim, o STF por maioria de sete (7) a quatro (4) votos alinhou-se a um pensamento de cunho neoliberal, embasando o julgamento em fatores como o desemprego, o novo mundo tecnológico, a competitividade externa e a prevalência da livre iniciativa.

Em ciosa análise deste julgamento, entende-se que a decisão proferida pelo STF contrariou princípios e fundamentos da Constituição Federal brasileira de 1988, que enaltece os valores da justiça social e da dignidade do ser humano como verdadeiros limites à livre iniciativa.

Nesse vetor, o processo terceirizante, sem limites, parece contrariar o plano da Constituição, uma vez que privilegia a livre iniciativa e dá azo a precarização das relações de trabalho, em desacordo com o artigo 7º da CFRB, que pugna pela melhoria da condição social do trabalhador, vedando, por conseguinte, o retrocesso.

A reforma trabalhista[11] foi defendida pelo governo Michel Temer como uma forma de regularizar as contas públicas, estimular a economia e criar empregos. E, para os empresários, a reforma reforça um ambiente competitivo, com a diminuição de encargos trabalhistas, além dar segurança jurídica ao empregador.

A expectativa para as novas leis trabalhistas de 2022 é que o trabalhador possa ter direito a folga aos domingos apenas uma vez a cada dois meses. Isso, independente, de sua área de atuação.

Ressalvando, fundamentalmente, considerar como majoração da jornada pode impactar a motivação e engajamento dos colaboradores.

A Reforma Trabalhista entrou em vigor em 11 de novembro de 2017 e o STF retomou em maio de 2022 o julgamento da ação que questiona decisões da Justiça do Trabalho que invalidaram as Convenções Coletivas pactuadas entre patrões e empregados e validaram o que está expresso na lei.[12] Tal ponto polêmico da reforma trabalhista poderá suprimir a legislação e validar plenamente o que fora negociado entre patrão e empregado, o que prejudicará os trabalhadores.

Convém ressaltar, contudo, que a prevalência do negociado sobre o legislado não é inovação na seara jurídica, pois o instituto fora criado com intuito de proteção, para favorecer a classe obreira com concessão de direitos não previstos na legislação, majorando o patamar mínimo dos direitos garantidos em lei.

No julgamento do STF, por maioria de votos, com placar de 5 votos a 4, decidiu que a legislação tem maior valor do que o acordo. No caso específico, houve prevalência do negociado sobre o legislado, mas o TST derrubou o acordo. E, nas questões da reforma trabalhista, o TST tem se posicionado a favor do trabalhador.

O Supremo Tribunal Federal (STF) invalidou regras da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) que determinavam o pagamento dos honorários periciais e advocatícios por beneficiários da justiça gratuita, caso perdessem a ação, mas obtivessem créditos ​suficientes para o pagamento dessas custas em outra demanda trabalhista. Também por maioria, foi considerada válida a imposição do pagamento de custas pelo beneficiário da justiça gratuita que faltar à audiência inicial e não apresentar justificativa legal no prazo de 15 (quinze) dias.

A questão foi discutida na Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI) 5766, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Para a PGR, as normas violam as garantias processuais e o direito fundamental dos trabalhadores pobres à gratuidade judiciária para acesso à justiça trabalhista.

Por maioria de votos, o colegiado considerou inconstitucionais os dispositivos que estabelecem a necessidade de pagamento de honorários periciais e advocatícios pela parte derrotada (honorários de sucumbência), mesmo que esta seja beneficiária da Justiça gratuita (artigo 790-B, caput e parágrafo 4º, da CLT) e o que autoriza o uso de créditos trabalhistas devidos ao beneficiário de justiça gratuita, em outro processo, para o pagamento desses honorários (artigo 791-A, parágrafo 4º). Integraram essa corrente os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber.

Também por maioria, foi considerada válida a regra (artigo 844, parágrafo 2º da CLT) que impõe o pagamento de custas pelo beneficiário da justiça gratuita que faltar à audiência inicial de julgamento e não apresente justificativa legal no prazo de 15 dias. Esse entendimento foi seguido pelos ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Roberto Barroso, Nunes Marques, Gilmar Mendes e Luiz Fux (presidente) e pela ministra Cármen Lúcia.

Portanto, os direitos dos trabalhadores, além de serem materialmente fundamentais, possuem nítido status constitucional, no Brasil desde 1934. E, são objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal, um ramo do Poder Judiciário especializado na solução dos conflitos trabalhistas, com competência inclusive para decidir sobre as matérias constitucionais[13].

A dita reforma não se limitou ao âmbito do Legislativo, mas alcançou os três poderes da república brasileira, e transita no Judiciário em face de recentes decisões do órgão máximo da Justiça brasileira.

O STF derrubou poucos itens da reforma trabalhista, em que destaca a permissão da gestante e da lactante de trabalharem em local insalubre e as alterações na Justiça gratuita. Conclui-se que o STF anulou dispositivos da Reforma Trabalhista que mais precarizavam o trabalho e vilipendiavam a dignidade humana.

Referências

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Sobre a autora
Gisele Leite

Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Pesquisadora - Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Presidente da Seccional Rio de Janeiro, ABRADE Associação Brasileira de Direito Educacional. Vinte e nove obras jurídicas publicadas. Articulistas dos sites JURID, Lex Magister. Portal Investidura, Letras Jurídicas. Membro do ABDPC Associação Brasileira do Direito Processual Civil. Pedagoga. Conselheira das Revistas de Direito Civil e Processual Civil, Trabalhista e Previdenciária, da Paixão Editores POA -RS.

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