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Religioso é condenado por pedofilia

Agenda 20/12/2005 às 00:00

Sentença condenatória de religioso por crime de atentado violento ao pudor contra três crianças, praticado no interior de Sergipe.

PROC. Nº: 596/03

RÉU: JOSÉ MARIA RIBEIRO

VÍTIMAS: J. G. S. J.; E. V. D. S. e Y. L. S. D. C.

AÇÃO PENAL: PÚBLICA CONDICIONADA

CAPITULAÇÃO: ARTIGO 214 c/c ARTIGO 224 e 71 DO CÓDIGO PENAL

R. hoje.


SENTENÇA

Vistos etc,

O Ministério Público, por conduto de seu ilustre Representante, denunciou o réu JOSÉ MARIA RIBEIRO, brasileiro, solteiro, religioso, com 39 anos de idade, natural de... , filho de... e de... , residente na... , atualmente recolhido no Quartel da Polícia Militar em Aracaju/SE, imputando-lhe os delitos previstos nos artigos 214 c/c art. 224 e 71 todos do Código Penal.

Segundo a denúncia "no período final de fevereiro e início de março de 2003, o denunciado José Maria Ribeiro, que é padre da Igreja Católica Brasileira, abusou sexualmente dos menores J. G. S. J., de 12 anos de idade, E. V. S., 06 anos de idade, Y. L. S. C., também 06 anos de idade. Pois, o denunciado levou os meninos um a um, para o escritório de sua casa, e lá chegando acariciou os dois últimos menores, E. V. S. e Y. L. S. C., tirando-lhes as roupas, beijando, cheirando e tocando-lhes os órgãos genitais e o resto do corpo; quanto ao primeiro menor J. G. S. J., o agarrou pelas costas, porém, este reagiu dando-lhe uma cotovelada evadindo-se do local. Vela ressaltar, que sempre depois do ato libidinoso ameaçava os menores dizendo que se os mesmos contassem o ocorrido para os seus pais ou avós iria arrancar a "PINTINHA", o órgão genital dos menores.

A ação penal iniciou-se na 2ª Vara Criminal, tendo a denúncia sido oferecida em 30/06/03, e recebida em 01/07/2003, conforme fls. 78v e79, respectivamente.

Às fls.06/65 vê-se inquérito policial, instaurado mediante portaria, distribuído para o Juízo da 2ª Vara Criminal 07/04/03 (fls. 66).

Às fls. 08 vê-se boletim de ocorrência, datado de 05/03/2003, servindo o boletim de ocorrência de nº 003/2003 (fls. 08) como sendo uma representação, a teor do art. 225 § 1º inciso I do CP.

Às fls. 76 vê-se representação criminal firmada pela genitora de duas das vítimas e tia de uma delas.

Às fls. 62 vê-se Parecer da Psicologia Clínica Policial, atestando quanto à veracidade da narrativa dos menores vítimas, informando ainda sobre o fato de o réu Padre conviver com uma menor de 13 anos de idade, o que se caracteriza em Pedofilia Preferencial.

Recebida a denúncia em 01 de julho de 2003 e designado interrogatório para o dia 29 de outubro de 2003, o réu não foi citado (fls. 94), tendo o seu patrono constituído (fls. 82/83) pedido adiamento da audiência, por ter assumido compromisso anterior em outro Estado (fls. 90).

Às fls. 93 vê-se termo de audiência, datado de 29 de outubro de 2003, tendo o Juízo da 2ª Vara Criminal suspendido a audiência, à vista da não citação do réu, bem como consignado que "considerando que a presente Vara foi transformada em Vara Privativa de Assistência Judiciária, e que todos os feitos serão redistribuídos em data próxima, foi determinado que se aguardasse a distribuição, a fim de novo titular designe nova data para audiência".

Em 16/12/2003 o presente processo foi redistribuído para este Juízo haja vista a extinção da 2ª Vara Criminal, conforme termo de recebimento constante às fls. 94v e autuação de fls. 01.

Validamente citado o réu e intimado seu defensor (fls. 99 e 100), o acusado foi qualificado e interrogado neste Juízo em 03 de maio de 2004 (fls. 101/103), tendo no interrogatório sido juntados os documentos apresentados pela Defesa às fls. 104/128.

Às fls. 130 vê-se defesa prévia, com rol de testemunhas.

Designado o início do sumário de culpa, a primeira audiência não se realizou tendo em vista a ausência do Promotor de Justiça, por motivo de doença. (fls. 149).

No curso da instrução, a primeira audiência criminal foi realizada no dia 20 de outubro de 2004 oportunidade em que o Ministério Público, por conduto do ilustre representante neste Juízo, Dr. Luiz Alberto Moura Araújo, requereu a Prisão Preventiva do acusado, tendo o pleito sido deferido por este Juízo às fls. 155/161, isto é, em 20 de outubro de 2004, data do decreto e prisão preventiva do réu, tendo o mesmo sido recolhido junto ao Quartel da Polícia Militar do Estado.

Na primeira audiência de instrução (dia 20/10/2004), foram ouvidas as três vítimas e uma declarante (fls. 162/173), esta última na condição de mãe e tia.

Às fls. 179 vê-se o mandado de prisão preventiva do réu, datado de 20 de outubro de 2004, devidamente cumprido no mesmo dia, e às fls. 181/182 vê-se ofício endereçado ao Comandante da Polícia Militar encaminhando o mandado de prisão preventiva e outros documentos, bem como informando que o réu, por ser ministro religioso, tem direito à prisão especial, devendo assim permanecer no Quartel da Polícia Militar até ulterior deliberação deste Juízo.

Por lapso, a Escrivania não cumpriu o despacho de fls. 183/184, quando este Julgador determinara que fossem oficiados outros Estados acerca dos antecedentes criminais do indigitado.

Às fls. 196/204 vê-se Hábeas-Corpus impetrado pelo patrono do réu, tendo este Juízo prestado as informações às fls. 206/207, cujo HC foi denegado pelo Tribunal de Justiça conforme Acórdão nº 4756/2005 (fls.229/237).

Na segunda audiência de instrução (fls. 210/211), ocorrida em 26 de novembro de 2004, foram ouvidas uma declarante e uma testemunha acusatória (fls. 212/216).

Na terceira audiência de instrução (fls. 247/249), foram ouvidas duas pessoas pela defesa (fls. 250/254), tendo a Defesa pugnado pela revogação da prisão preventiva, posteriormente indeferida em 14/03/2005 (fls. 256/257)

Na quarta audiência de instrução (fls. 264/265), foi ouvida a derradeira testemunha da defesa (fls. 266/269).

Na fase do artigo 499 do CPP, o Ministério Público nada requereu (fls. 264/265), tendo a Defesa requerido a ouvida da testemunha referida, Severino José de Oliveira, vulgo "BiBiu", e que este Juízo deferiu o pleito, com base no Princípio da Ampla Defesa, não tendo contudo a testemunha sido ouvida, apesar de intimada, mas que a Defesa desistiu de sua oitiva (fls. 287).

Às fls. 273/278 vê-se parecer promotorial pugnando pela declaração de nulidade absoluta de todos os atos judiciais promovidos pelo Juízo da antiga 2ª Vara Criminal depois de ter sido transformada em 6ª Vara Privativa de Assistência.

Às 291/298 vêm-se alegações finais da Acusação, pugnando pela condenação do réu nas reprimendas dos artigos 214 c/c art. 224 alínea "a" e art. 71, todos do Código Penal, entendo comprovadas a autoria e a materialidade delitógenas.

Às fls. 300/305, vêm-se alegações finais da Defesa, datada de 01 de setembro de 2005 pugnando pela absolvição do réu, alegando a insuficiência da prova, quer seja pela fragilidade, pela contradição e pela dúvida.

Às fls. 306/307, vêm-se extratos processuais dando conta de que o réu não possui antecedentes criminais.

É o relatório, decido.


II - MOTIVAÇÃO

Cuida-se de ação penal pública dependente de representação, nos moldes do artigo 225 § 1º inciso I c/c § 2º do Estatuto Penal.

De início, observo que a ação penal tramitou regularmente, valendo-se ressaltar, contudo, que até 28 de maio de 2003 a 2ª Vara Criminal ainda existia, vez que a Lei Complementar nº 84, de 27 de maio de 2003, e que extinguiu ambas (2ª e 8ª Varas), entrou em vigor no dia 28 de maio de 2003.

Assim, como o inquérito foi distribuído para a 2ª Vara Criminal em 07 de abril de 2003 (fls. 66), antes, pois, da extinção da mesma, não há qualquer nulidade a reconhecer, sendo que apenas o oferecimento da denúncia e o seu recebimento ocorreram já com a 2ª Vara Criminal extinta, pois tais atos se deram em 30/06/2003 e 01/07/2003, e que em seguida o processo foi redistribuído para esse Juízo em 16 de dezembro de 2003, tendo aqui se dado o interrogatório e demais atos processuais.

De sorte que, a meu juízo, a eiva de nulidade foi pequeníssima, materializada apenas pela oferta da denúncia e seu recebimento – razão pela qual, a meu juízo, a ofensa ao interesse público foi de pequena monta, de reduzido espectro de incidência, ensejando sim apenas nulidade relativa e não absoluta, diante do pequeníssimo número de atos processuais praticados perante a extinta 2ª Vara Criminal (apenas dois), perfeitamente sanados e ratificados por este Juízo, após a redistribuição do feito, inclusive com base na melhor política criminal aplicável ao caso vertente.

Por tais razões, afasto e excluo a preliminar de nulidade absoluta aventada pelo Ministério Público às fls. 273/278, entendendo que houve apenas uma nulidade relativa atinente a apenas dois atos processuais – já devidamente ratificados, saneados e revalidados por este Juízo.

Doravante, passo a analisar o mérito da casuística.

À luz da denúncia, em tese os crimes de atentado violento ao pudor foram praticados no período final de fevereiro e início de março de 2003, de forma continuada, figurando como vítimas os menores, J. G. S. J., de 12 anos de idade, E. V. S., 06 anos de idade, Y. L. S. C., também 06 anos de idade, com a incidência da presunção de violência, à vista da idade das vítimas, bem como em caráter contínuo.

Doutrinariamente, o delito imputado ao réu – atentado violento ao pudor -- é considerado crime hediondo, a teor do art. 1º incisos V e VI da Lei 8072/90, em conformidade com o art. 5º inciso XLIII da Constituição Federal de 1988, cujo bem jurídico tutelado é a liberdade sexual do homem e da mulher, figurando como sujeitos ativo e passivo qualquer pessoa, mulher ou homem e cujo tipo objetivo é constranger, isto é, forçar ou compelir a prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal. Dessarte, a presunção violência se opera e se aplica à casuística, vez que duas vítimas eram menores de catorze (14) anos à época dos fatos, restando assim analisado a norma do artigo 224 alínea "a" do Código Penal, bem como o caráter contínuo dos delitos, nos moldes do artigo 71 do Código Penal.

Feita a análise do tipo penal, passo a analisar os fatos.

A vítima J. G. S. J., com 12 anos de idade à época, disse em Juízo (fls. 162/165) que, em sumário, começou a freqüentar as missas celebradas pelo réu em companhia de sua avó M. I. S. [avó] e que a mesma, certa feita, disse ao réu que o declarante queria ser "Coroinha" e que ele concordou, a partir desse dia o declarante ajudou o réu duas ou três vezes usando uma batina emprestada. Afirmou que um dia o acusado levou o declarante para uma sala da igreja e trancando a porta disse que iria medir a batina do declarante usando uma corda. Alegou que o acusado começou a medir a batina com a corda e que depois acariciou o corpo do declarante ficando inclusive por trás do mesmo sendo que o declarante deu uma cotovelada no acusado e correu para a porta, mas não conseguiu sair porque a porta estava trancada, todavia neste momento o filho do acusado, de nome Roberto, chamou o acusado informando que havia uma pessoa querendo falar com o acusado, em seguida ele abriu a porta e o declarante foi embora. Informou que esse fato ocorreu durante à tarde e que no mesmo dia à noite ele foi, em companhia do réu, para a rádio onde o mesmo celebrava missa e que até aquele momento não havia comunicado o fato a ninguém. Ao retornar para casa a noite o declarante resolveu contar a sua avó o acontecido e ela o pediu que ele não contasse a mais ninguém, pois ela falaria com o réu. Afirmou que depois disso não mais voltou a freqüentar a igreja e que certa feita o réu ligou para o declarante perguntando se ele queria ir a uma missa gravada na televisão, mas o mesmo inventou uma desculpa porque não queria se envolver mais com o réu. Informou, ainda, que soube depois que o mesmo fato havia acontecido anteriormente com um menino chamado M. que morava na igreja, com o irmão do declarante E. V. S. e com seu primo Y. L. S. C. Alegou que seu irmão E. V. S. lhe disse que o réu teria levado-o, juntamente com seu primo Y. L. S. C., para a mesma sala da igreja e que ao chegarem lá o acusado fechou a porta, tirou a roupa dos meninos e começou a acariciá-los e em seguida os ameaçou afirmando que se contassem o fato a alguém iria cortar as "pintinhas" deles. Alegou, também, que sua mãe não freqüentava as missas realizadas pelo acusado e que só foi uma vez, mas que quando o viu afirmou que "é como se tivesse visto o satanás na frente dela", afirmou que a sua mãe fez esse comentário antes do fato.

A vítima E. V. S., com 06 anos à época do fato, disse em Juízo (fls. 166/167), que freqüentava a igreja e que, certa feita, o declarante, seu primo Y. L. S. C., M. e mais dois meninos estavam na igreja quando o réu os convidou para fazer um piquenique chamando primeiramente Y. L. S. C. para uma sala da igreja, que após um tempo saiu e o acusado o chamou. Afirma que ao chegar na sala o réu fechou a porta e tirou toda a roupa do declarante deixando-o nu e, em seguida, "começou a alisar o declarante e que passou a mão na pinta do declarante e depois o Padre mandou que o declarante botasse a mão na pinta dele e que o declarante botou a mão e ficou segurando um tempozinho e que não ficou balançando". Informou, ainda, que o acusado ameaçou o declarante afirmando que caso ele contasse a mãe o acontecido "ele iria cortar a pinta do declarante", que seu primo Y. L. S. C. disse-lhe que com ele havia acontecido a mesma coisa e que M. disse ter visto o acontecido com o declarante e com Y. L. S. C. porque olhou pelas janelas dos fundos da igreja. Afirmou que dias após contou o fato a sua mãe "mas não contou em relação à pinta que só contou depois".

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A vítima Y. L. S. C., com 06 anos de idade à época do fato, disse em Juízo (fls. 168/169) que, no dia do fato, durante à tarde, estava no sítio do acusado em companhia de M., E. V. S., "Neguinho" e o irmão de "Neguinho" quando o acusado os chamou para fazer um piquenique levando o declarante para uma salinha que fica ao lado da igreja, lá chegando fechou a porta e disse que: " em seguida o Padre tirou a roupa do declarante e que o declarante ficou nu e o Padre começou a alisar o corpo do declarante e que passou a mão na pinta do declarante e que não passou a mão na bunda do declarante e que o Padre mandou o declarante botar a mão na pinta dele e que o Padre estava de short; que o Padre segurou a mão do declarante botou por dentro do short dele e que o declarante pegou na pinta do Padre e que o Padre ficou segurando a mão do declarante na pinta dele e que ficou balançando a pinta e que o declarante tentou tirar a mão e ele ficava segurando a força". Informou, ainda, que ao final o acusado disse "que era para o declarante não contar o ocorrido a mãe e que se contasse iria torar a pinta do declarante" e que no outro dia contou a sua mãe o ocorrido.

A declarante M. I. S. [mãe], na condição de genitora das vítimas J. G. S. J. e E. V. S. e de tia da vítima Y. L. S. C., disse em Juízo (fls. 170/173), que a mãe da declarante M. I. S. [avó] freqüentava a igreja e que mantinha um relacionamento de amizade com o réu, a ponto de cozinhar, lavar e passar a bata do mesmo. Afirmou que só foi ao culto uma vez em companhia de sua mãe e antes de terminar comentou com sua mãe que o réu não era Padre e que era do conhecimento de todos que o mesmo convivia com uma menina de 15 anos, mas que sua mãe não levou o comentário em consideração. Informou que várias crianças freqüentavam a igreja inclusive seus filhos e que certo dia ao retornar da praia com seus filhos um deles Y. F. S. chamou a declarante e disse que seu irmão E. V. S., tinha algo para dizer. Então seu filho E. V. S. contou que o acusado, certa feita, o teria acariciado e beijado seu corpo e que em seguida o ameaçou afirmando que se contasse algo à mãe ele iria "cortar a pintinha dele", E. V. S. afirmou que o réu teria agido da mesma forma com seu primo Y. L. S. C. e que, logo após, a declarante teria ouvido seu sobrinho e ele confirmou que o acusado havia beijado e acariciado seu corpo e também havia feito a mesma ameaça de "cortar a pintinha dele".Afirmou que, em seguida, participou o fato ao pai de Y. L. S. C. e que se dirigiram a igreja, mas como não o encontraram foram, então, à Terceira Delegacia onde comunicaram o ocorrido. Ao retornaram da delegacia informou que a mãe da declarante lhe disse que o réu teria feito a mesma coisa com o outro filho da declarante, à época com 13 anos, J. G. S. J.. Conversando com J. G. S. J. ele disse que o acusado, certo dia, numa sala da igreja, lhe abraçou pelas costas enquanto media o cordão da bata quando J. G. S. J. estranhou o fato e perguntou ao réu o que era aquilo, em seguida deu uma cotovelada no acusado e saiu correndo. Esclarece, ainda, que procurou o delegado Dr. Aciole mas ele disse para não dar importância ao caso, por esse motivo levou o caso para o Jornal da Cidade, o programa de Gilmar Carvalho, para a jornalista Magna Santana da TV Sergipe e finalmente para a Corregedoria de Polícia. Informou, ainda, que depois do fato não houve mais missa no Galpão.

A testemunha Carlos Jorge de Souza, disse em Juízo (fls. 212/213) que "certa feita, o depoente estava em uma pescaria e ouviu quando o menino S. lhe disse que o Padre costumava tirar a roupa dos meninos, pra olhar a pinta dos meninos; Que S. também lhe disse que não contava esse fato ao pai dele com medo de o pai bater nele S. e que o pai de S. era amigo do Padre; Que conhece o réu de vista e que o depoente e outras pessoas ajudavam com alimentos a mulher do Padre". Esclarece que S. tem entre 09 e 10 anos, e que após saber do ocorrido comunicou o fato a M. I. S. [mãe], pois a história era grave e sabia que os filhos da mesma freqüentavam a igreja, todavia M. I. S. [mãe] ao ser comunicada do acontecido não comentou sobre o que havia acontecido com seus filhos. Informa, ainda, que o depoente não contou o relato feito por S. ao pai dele porque não queria se envolver.

A declarante M. I. S. [avó], na condição de avó das vítimas J. G. S. J., E. V. S. e Y. L. S. C., disse em Juízo (fls. 214/216), que passou a freqüentar a igreja do acusado quando, certo dia, um rapazinho veio até sua residência pedindo que lhe vendesse geladinho e tubaina fiados comunicando que o interessado era o Padre que morava próximo. Informa que nesse mesmo dia foi até a igreja na companhia de seus netos e assistiu ao culto, em seguida o acusado solicitou a declarante que seu neto J. G. S. J. o ajudasse como "coroinha", e ela concordou. Afirma que "mais ou menos um mês após ter concordado em J. G. S. J. virar ‘coroinha’ deu-se o fato envolvendo J. G. S. J., ou seja, seu neto J. G. S. J. chegou em casa assustado e reclamando que o Padre tinha chamado ele para uma sala fim de medir uma batina e que o réu fechou a porta da sala e ai o acusado começou a acariciar J. G. S. J. nas costas ai J. G. S. J. empurrou o réu e nesse momento alguém bateu na porta e o réu abriu a porta e ai a vitima J. G. S. J. saiu; Que a declarante ouviu seu neto J. G. S. J. e pediu para o mesmo não contar o fato a ninguém, inclusive aos parentes, pois caso soubesse do fato algo ruim iria acontecer e que J. G. S. J. não contou isso a ninguém; Que depois disso a declarante se afastou da igreja do réu, assim como J. G. S. J., sendo que os outros dois netos menores continuaram a freqüentando a igreja juntamente com os demais meninos da região e que posteriormente deu-se o fato envolvendo os dois netos menores, Y. L. S. C. e E. V. S.; Que o fato envolvendo seus netos Y. L. S. C. e E. V. S. se deu mais ou menos 15 dias após o fato envolvendo a vítima J. G. S. J. e que seus dois netos menores chegaram em casa dizendo que o Padre chamou eles para um pic nic e que tirou a roupa deles e botou a mão dos meninos, no pênis do Padre; Que em razão disso a declarante não deu mais chance ao Padre, pois agora o fato se repetiu com os dois netos menores e então o caso foi levado a mãe dos meninos". Informou a declarante sobre uma missa festiva que foi celebrada por Dom Edson Luiz Campos da Silva e que segundo o réu esse seria o bispo da igreja dele. Esclarece, ainda, que a declarante teve um desentendimento com sua filha por causa do acusado mas foi apenas uma vez e antes do acontecido com seus netos. Afirma que após o acontecido com seu neto J. G. S. J. autorizou que o mesmo duas ou três vezes fosse auxiliar o acusado na missa em uma rádio, porque J. G. S. J. retornaria para casa ao lado da mulher, da filha do réu e de Edson Luiz.

O declarante Paulo Sergio Ribeiro de Medeiros, na condição de filho do réu, disse em Juízo (fls. 250/251) que a família do réu instalou-se no Bairro Santos Dumont e dias após conheceu a avó das vítimas, sendo que no domingo posterior a mesma foi assistir a missa em companhia dos netos. Informou que no outro domingo a avó e a mãe das vítimas foram assistir a missa que foi interrompida pela mãe dos meninos que alegou que o réu "parecia a imagem do capeta e só faltava chifre e rabo", alega que posteriormente o acusado começou a receber ligações anônimas durante a madrugada onde alguém dava risadas e mandava que ele se mudasse do local. Afirma, também que "seu pai, o réu, chamou os três meninos para a sala e foi fazer a medição da túnica deles e que foi um menino de cada vez e depois da medição cada um saiu para um canto, ficando esclarecido que o declarante não presenciou as medições e que as medições se deram a tardezinha; Que ouviu dizer sobre a acusação e que a acusação partiu da família dos meninos e que segundo a acusação o réu tinha aliciado os meninos e pegado na pinta dos meninos, mas o declarante não desconfia do acusado porque uma porta que da acesso ao quarto e a sala do réu estava entreaberta". Informa que soube da acusação depois das ligações e que o tio dos meninos invadiu a casa de seu pai no intuito de matá-lo por causa da acusação. Disse, ainda, "que certa feita seu pai disse a alguns meninos que se eles comparecem ao quadro de coroinhas ele iria fazer um piquenique e que neste mesmo dia o réu flagrou um menino vendo uma revista de mulher nua e que seu pai reclamou; Que o declarante esclarece que quando um menino saia da sala já se encontrava com outro do lado de fora da porta; Que o menino que saia já se dirigia a partida de futebol e que saia normalmente... Que quando o menino maior saiu da sala do acusado não foi jogar bola e foi para uma sala ensaiar dança com as meninas". Informou, que mesmo após a acusação a vítima J. G. S. J. continuou a freqüentar a igreja e a missa no rádio. Alegou, também, que existia outro compartimento próximo a sala onde se encontrava a irmã e a madrasta do declarante e que a porta deste compartimento estava aberta.

A declarante Lidiane Guedes da Silva, na condição de companheira do acusado disse em Juízo (fls. 252/254) que, certo dia, por volta das 19:00 horas seis ou sete pessoas chagaram na casa do réu alguns deles armados com facas a procura do acusado alegando que o mesmo teria abusado sexualmente de dois meninos, todavia o acusado não apareceu em sua residência haja vista a declarante ter ligado para avisar do acontecido, em seguida procurou a avó dos meninos que depois de muita insistência disse que o réu teria abusado sexualmente de seus netos. Informou que dias após a notícia foi veiculada na imprensa falada. Esclarece que "se encontrava em uma sala próxima a sala do Padre e que estava com a filha do Padre e ele mandou a declarante chamar os meninos que naquele momento jogavam futebol e que a declarante inicialmente chamou E. V. S. e que ele entrou na sala e demorou entre dois e três minutos e que a porta da sala do Padre ficou entreaberta e que depois E. V. S. saiu e daí entrou Y. L. S. D. C. e que ficou na sala pouco tempo e depois saiu e os dois meninos voltaram a jogar futebol; Que a declarante ouviu dizer que o acusado pegou na pinta dos meninos e que acariciou e beijou". A declarante ainda afirmou que fugiu com o réu quando tinha 14 (quatorze anos) e esse fato gerou problemas no município de Gravatá onde residia sendo necessário fazer o suprimento da idade nupcial, informando também que somente casou no religioso. Alegou que certa feita a mãe dos meninos declarou na missa que o réu "para o diabo só faltava um rabinho e duas pontas" e depois desse fato disse que ela teria proibido os meninos a freqüentar a igreja, todavia eles continuaram freqüentando em companhia da avó. Informou que em determinada oportunidade ouviu quando um dos meninos disse ao Padre que eles estavam com uma revista pornográfica e que o acusado não gostou a jogou no telhado e disse que "se aparecesse outra revista daquela iria cortar as pintinhas dos meninos e também disse que se os meninos freqüentassem a igreja ele iria marcar um pic nic em outro local". Afirmou que "conhece a vítima J. G. S. J. e que certa feita ele lhe chamou para fazer parte do grupo de dança onde também participavam Y. L. S. D. C., E. V. S. e Roberto, filho do réu, além de outras crianças e que a declarante presenciou algumas danças, ficando esclarecido que o menino J. G. S. J. não gostava de se enturmar com meninos e que as vezes dava palpite nas roupas da declarante; Que J. G. S. J. ajudava o Padre nas missas e demonstrou interesse em ser coroinha e a declarante mandou que ele consultasse a mãe e avó e se ambas concordassem o Padre iria tirar as medidas dele para fazer a túnica; Que um ou dois dias após a avó D. M. I. S. [avó], esteve na igreja e disse que gostaria que o neto J. G. S. J. fosse coroinha e que seria um prazer e então o acusado tirou as medidas dele." Esclarece, ainda, que a declarante não estava presente na oportunidade em que o acusado tirou as medidas da vítima J. G. S. J. e que depois desse fato as crianças não mudaram o comportamento.

A testemunha, Joseni Luiz da Silva, disse em Juízo (fls. 266/269) que no dia do fato estava na igreja limpando o escritório quando "a esposa do réu mandou uma criança menor, a primeira a entrar no escritório onde o réu guardava as coisas dele, isto é, o material da igreja e que a conversa entre o réu e esta primeira criança não durou dois minutos e em seguida a esposa do réu chamou a segunda criança a mais velha e ela entrou no escritório do réu e que em seguida esta segunda criança saiu e foi imediatamente jogar futebol e então entrou a terceira criança a mais velha e foi esta criança que o réu foi, exclusivamente, tirar a medida da batina e que esta terceira criança se chama J. G. S. J.; Que a depoente esclarece que não viu a conversa do réu com as três crianças, mas ouviu a conversa; Que a depoente ouviu as conversas e que o réu dizia para as crianças não irem mais lá para evitar problema coma a mãe das crianças". Afirma, que depois da referida conversa o acusado chamou seus filhos Roberto e Paulo e pediu que eles se afastassem dos meninos, todavia as crianças continuaram a freqüentar a igreja, inclusive a terceira criança de prenome Junior que era coroinha. Informa a depoente que os meninos estavam, certa feita, com uma revista de mulher nua e que quando o acusado soube disse para os meninos que "se aparecesse outra revista daquela ele iria cortar a pinta de todo mundo e ai tocou fogo na revista e depois foi descoberto que a revista foi trazida pelo filho do acusado de prenome Roberto". Esclarece, ainda, que "no momento das conversas com as crianças a porta do ambiente onde o Padre recebia as crianças estava encostada ou es corada e que estava fechada, isto é, sem trinco, mas estava fechada; Que a depoente esclarece que a porta era aberta para a criança sair e era fechada quando outra criança entrava; Que o ambiente em que se deu as conversas do Padre com as crianças era de forro de isopor".

Doravante, vejamos a versão do réu.

Em juízo (fls. 101/103), o réu alegou que é falsa a imputação. Disse que conhecia as vítimas e duas testemunhas M. I. S. [mãe] e M. I. S. [avó] e que desconhece as demais testemunhas. Afirmou que chegou ao bairro Santos Dumont em 2002 quando instalou a igreja católica brasileira e que a avó das crianças M. I. S. [avó] ajudava muito na igreja, certa feita a referida testemunha lhe disse que sua filha M. I. S. [mãe] tinha dito que o acusado parecia com o capeta e que nessa oportunidade deu um tapa na filha por se referir ao réu desta forma. Informou que certo dia tomou conhecimento que as crianças estavam com uma revista pornográfica quando lhes disse que "se esse fato se repetisse iria ‘cortar o pinto das crianças’". Alegou que dias após a vítima J. G. S. J. lhe comunicou a vontade de se tornar coroinha, mas não tinha túnica, o acusado então disse que iria providenciar, quando o chamou para tirar suas medidas disse que "nesse instante a criança segurou os órgãos genitais do réu e que ninguém presenciou este fato e que nesse momento o interrogado se afastou e com o próprio cordão bateu nas mãos da criança mencionada reprimindo aquela atitude". Informou, ainda, que dias após enquanto celebrava uma missa foi informado que algumas pessoas haviam invadido sua residência e em seguida dirigiu-se até sua casa onde soube que dois rapazes armados o estavam acusando de ter abusado sexualmente das vítimas, Aduziu, por fim que não sabe o motivo de tal acusação e que se trata de uma montagem. Na polícia (fls. 58/60), igualmente o imputado negou a autoria dos delitos.

Analisado a casuística, vejamos o Direito.

Compulsando os autos, entendo que provadas se acham a autoria e a materialidade delitógenas, tendo o Ministério Público, a quem compete o ônus da prova, efetivamente realizado a contento a prova penal.

Senão, vejamos a minha conclusão:

A meu juízo, o imputado praticou três crimes de atentado violento ao pudor, em seqüência ou de forma contínua, figurando como vítimas três crianças, o que justifica, ademais, a presunção de violência, vez que todas elas menores de 14 (catorze) anos à época dos fatos.

A vítima J. G. S. J., à época com 12 anos de idade, em síntese descreveu o tipo penal da seguinte forma:... "que um dia o acusado levou o declarante para uma sala da igreja e trancando a porta disse que iria medir a batina do declarante usando um corda....e que o acusado começou a medir a batina com a corda e que depois acariciou o corpo do declarante ficando inclusive por trás do mesmo sendo que o declarante deu uma cotovelada no acusado e correu para a porta, etc...".

Nesse passo, a versão da criança J. G. S. J. coincide em muito com a versão do réu em Juízo, no tocante ao fato da medição da batina, diferençando apenas pelo fato de o réu ter dito que foi a criança quem segurou seus órgãos genitais, conforme assim narrou em seu interrogatório judicial (fls. 102), a saber:... "Alegou que dias após a vítima J. G. S. J. lhe comunicou a vontade de se tornar coroinha, mas não tinha túnica, o acusado então disse que iria providenciar, quando o chamou para tirar suas medidas disse que "nesse instante a criança segurou os órgãos genitais do réu e que ninguém presenciou este fato e que nesse momento o interrogado se afastou e com o próprio cordão bateu nas mãos da criança mencionada reprimindo aquela atitude". Nesse passo, pois, impõe-se a conclusão que o réu não negou e não nega que houve um encontro entre ele e a vítima J. G. S. J., mas que fora ela quem tinha segurado os seus órgãos genitais..., o que ressoa pouco verossímil diante do relato das demais vítimas.

A vítima E. V. S., à época com 06 de idade, assestou que o réu, a pretexto de convidá-lo para um piquenique, chamou primeiramente seu primo Y. L. S. C. para uma sala da igreja e depois o chamou e que "ao chegar na sala o réu fechou a porta e tirou toda a roupa do declarante deixando-o nu e, em seguida, "começou a alisar o declarante e que passou a mão na pinta do declarante e depois o Padre mandou que o declarante botasse a mão na pinta dele e que o declarante botou a mão e ficou segurando um tempozinho e que não ficou balançando". Informou, ainda, que o acusado ameaçou o declarante afirmando que caso ele contasse a mãe o acontecido "ele iria cortar a pinta do declarante",

Em igual sintonia, a vítima Y. L. S. C., à época com 06 anos de idade, em juízo asseverou que certa tarde, o réu e padre, também a pretexto de fazer um piquenique, o chamou para uma salinha da igreja, tendo em seguida fechado a porta e depois "em seguida o Padre tirou a roupa do declarante e que o declarante ficou nu e o Padre começou a alisar o corpo do declarante e que passou a mão na pinta do declarante e que não passou a mão na bunda do declarante e que o Padre mandou o declarante botar a mão na pinta dele e que o Padre estava de short; que o Padre segurou a mão do declarante botou por dentro do short dele e que o declarante pegou na pinta do Padre e que o Padre ficou segurando a mão do declarante na pinta dele e que ficou balançando a pinta e que o declarante tentou tirar a mão e ele ficava segurando a força". Informou, ainda, que ao final o acusado disse "que era para o declarante não contar o ocorrido a mãe e que se contasse iria torar a pinta do declarante" e que no outro dia contou a sua mãe o ocorrido.

Por seu turno, a genitora de duas vítimas e tia da terceira, M. I. S. [mãe], em juízo, narrou o que ouviu das três vítimas, de forma detalhada, bem como aventou da suspeita de que o réu não era padre e que convivia com uma garota de 15 anos de idade.

A avó das vítimas, M. I. S. [avó], em juízo, narrou que certa feita seu neto J. G. S. J. chegou em casa assustado e narrou-lhe o seguinte crime praticado pelo réu:.. "que mais ou menos um mês após ter concordado em J. G. S. J. virar ‘coroinha’ deu-se o fato envolvendo J. G. S. J., ou seja, seu neto J. G. S. J. chegou em casa assustado e reclamando que o Padre tinha chamado ele para uma sala fim de medir uma batina e que o réu fechou a porta da sala e ai o acusado começou a acariciar J. G. S. J. nas costas ai J. G. S. J. empurrou o réu e nesse momento alguém bateu na porta e o réu abriu a porta e ai a vitima J. G. S. J. saiu; Que a declarante ouviu seu neto J. G. S. J. e pediu para o mesmo não contar o fato a ninguém, inclusive aos parentes, pois caso soubesse do fato algo ruim iria acontecer e que J. G. S. J. não contou isso a ninguém; Que depois disso a declarante se afastou da igreja do réu, assim como J. G. S. J., sendo que os outros dois netos menores continuaram a freqüentando a igreja juntamente com os demais meninos da região e que posteriormente deu-se o fato envolvendo os dois netos menores, Y. L. S. C. e E. V. S.; Que o fato envolvendo seus netos Y. L. S. C. e E. V. S. se deu mais ou menos 15 dias após o fato envolvendo a vítima J. G. S. J. e que seus dois netos menores chegaram em casa dizendo que o Padre chamou eles para um pic nic e que tirou a roupa deles e botou a mão dos meninos, no pênis do Padre; Que em razão disso a declarante não deu mais chance ao Padre, pois agora o fato se repetiu com os dois netos menores e então o caso foi levado a mãe dos meninos".

A testemunha Carlos Jorge ouviu dizer o seguinte:..."que ouviu quando o menino S. lhe disse que o Padre costumava tirar a roupa dos meninos, pra olhar a pinta dos meninos".

Já o filho do réu, Paulo Sérgio, na condição de declarante, confirmou que seu pai chamou os três meninos para a sala e foi fazer a túnica deles e que foi um menino de cada vez....e que não presenciou as medições.

A atual companheira do réu, Lidiane Guedes, confirmou que ouviu dizer que o acusado pegou na pinta dos meninos e que acariciou e beijou" e disse ainda que fugiu com o réu quando tinha 14 (quatorze anos) e esse fato gerou problemas no município de Gravatá, Pernambuco.

A testemunha Joseni Luiz, na condição de empregada doméstica do réu, não presenciou a conversa com as vítimas e o réu-padre, mas confirmou que as crianças entraram na sala do padre, cada qual de sua vez.

Nesse diapasão, é curial dizer que a versão do réu, além de genérica e inconsistente, se lastreou na versão da companheira, do filho e da empregada da igreja, sendo que tais depoimentos foram tomados como declarações, e que, portanto, de menor valor probatório, além do que efetivamente tais pessoas não presenciaram ou viram os fatos – todos ocorridos às ocultas, na salinha da igreja.

Enfim, eis a síntese dos autos.

Em verdade, convencido estou da materialidade dos três crimes, de forma continuada, tendo o réu demonstrado astúcia e dolo, mormente em face de as vítimas serem crianças.

A meu juízo, o réu agiu com dolo e com dolo intenso...pois que, de forma ardilosa, convidou J. G. S. J. para ser coroinha e este aceitou, com a anuência da avó, e então, em certo dia e de forma premeditada o réu chamou vítima J. G. S. J., a criança mais velha – à época com 14 anos de idade – e pretenso "coroinha", para medir uma batina a ser confeccionada e para tanto o réu-padre levou a criança até uma salinha da suposta igreja e lá, de posse de uma corda, começou e medir a batina de J. G. S. J., quando então passou a acariciar o corpo deste e depois ficou por trás de J. G. S. J., quanto este reagiu dando uma cotovelada no réu e correu para a porta. Ato contínuo, após livrar-se da investida libidinosa do réu-padre, a criança J. G. S. J. correu para a casa de sua avó, Dona M. I. S. [avó], onde lá – ainda assustada – contou para sua avó o que se passara na salinha da igreja.

Malgrado tamanha conduta criminosa, mormente em se tratando de um religioso, o réu-padre, mais ou menos quinze (15) após o fato envolvendo J. G. S. J., também investiu contra as duas outras criança menores, Y. L. S. C. e E. V. S., à época com 06 anos de idade, da seguinte forma que passo a discorrer, ou seja:

Em certa tarde, quando elas (Y. L. S. C. e E. V. S.) brincavam com outras crianças na suposta igreja, o réu-padre, com astúcia, e a pretexto de fazer um piquenique com as criança -- inicialmente chamou a criança Y. L. S. C. para uma salinha da igreja e fechou a porta e após tirou a roupa de Y. L. S. C., deixando-o nu, e em seguida alisou o corpo da criança e depois passou a mão no pênis da criança e depois botou a mão da criança em seu pênis (dele, padre), tendo em seguida o padre botado a mão de Y. L. S. C. por dentro do seu short (dele, padre) e que o réu ficou segurando a mão da criança no pênis dele (padre) e que a criança tentou tirar a mão, mas o réu a segurava à força. Por fim, o réu ameaçou a criança, quando disse para ela nada falar sobre o ocorrido com a mãe, pois se isso acontecesse ele padre iria "cortar a sua pinta".

Nessa mesma tarde, e de igual forma – isto é, valendo-se de idêntico modus operandi -- o indigitado padre investiu contra a criança E. V. S., primo de Y. L. S. C., e a pretexto de fazer um piquenique -- chamou E. V. S. para uma salinha da igreja e fechou a porta e após tirou a roupa de E. V. S., deixando-o nu, e em seguida alisou o corpo da criança e depois passou a mão no pênis da criança e depois botou a mão da criança em seu pênis (dele, padre). Por fim, o réu ameaçou a criança, quando disse para ela nada falar sobre o ocorrido com a mãe, pois se isso acontecesse ele padre iria "cortar a sua pinta".

De sorte que, bem amiudada a prova dos autos, entendo induvidosa a materialidades dos três crimes, sendo igualmente segura a autoria na pessoa do réu-padre.

E nesse diapasão, declaro que a prova é robusta, sólida e séria, vez que a palavra das três crianças vítimas foram uniformes e uníssonas, até porque, em sede de crimes contra os costumes – como é o caso do delito de atentado violento ao pudor – a palavra da vítima merece atenção especial, consoante exara a jurisprudência pertinente, que acolho e adoto, ‘verbis’:

"Em tema de crimes contra os costumes, que geralmente ocorrem às escondidas, as declarações da vítima constituem prova de grande importância, bastando, por si só, para alicerçar o decreto condenatório, mormente se tais declarações mostram-se plausíveis, coerentes e equilibradas, e com o apoio em indícios e circunstâncias recolhidas no processo" (JCAT 76/639).

Dessarte, no caso vertente, registre-se a riqueza de detalhes nas declarações das vítimas, de forma uniforme e coincidente, quer seja na polícia, quer seja em juízo, valendo-se frisar que a versão do réu de que fora a criança J. G. S. J. quem teria segurado seus órgãos genitais (dele, réu) ressoa por demais frágil e inconsistente, inclusive pelo fato de J. G. S. J. de imediato e ainda assustado ter ido contar o ocorrido à sua avó.

De igual forma, a prova se robustece à vista do relato linear e detalhado das demais crianças (Y. L. S. C. e E. V. S.), não tendo o réu rebatido ou rechaçado, com consistência, a imputação dessas duas crianças, salvo referência feita de maneira genérica e vaga de que tudo se tratava de uma "montagem",sendo a versão do réu amparada em declarações de familiares (companheira e filho) e de uma empregada – que não presenciaram a cena dos crimes – materializada às escondidas, às ocultas, numa salinha da suposta igreja ou galpão.

Outrossim, é curial ressaltar, para fins comprovação da imputação, a existência de um importante documento – um Laudo Técnico -- qual seja, o Parecer da Psicologia Clínica Policial, às fls. 62, não só atestando a veracidade da narrativa dos menores vítimas, bem como informando sobre o fato de o réu Padre conviver com uma menor de 13 anos de idade, o que se caracteriza em Pedofilia Preferencial

Acerca da pertinência da palavra da vítima, em sede de crimes contra os costumes, bem como em se tratando de testemunho infantil, assim verbera a jurisprudência que acolho e adoto, in vebis:

"Irrelevante o fato de se tratar de declarações de menor de pouca idade uma vez coerentes os relatos, harmônicos com o restante das provas e confortados por depoimentos de testemunhas adultas" (TJSP – AC – Rel. Jarbas Mazzoni – RT 652/276).

"Não se pode pôr em dúvida a palavra da criança, vítima de atentado violento ao pudor, quando se encontra em harmonia com os demais elementos coligidos nos autos, como também comprovada, sob o aspecto material, com o laudo técnico e não é contrariada por qualquer elemento objetivo e idôneo" (TJSP – AC – Rel. Lopes da Silva – RT 727/462).

Atentado Violento Ao Pudor – Depoimento De Menor, Acolhido E Considerado Expressão Da Verdade

"Em tema de crime sexual, a palavra do menor é da maior valia e se sobrepõe à negativa do réu. É que se tratando de crime que em geral é praticado às escondidas, sem prova testemunhal, o valor do depoimento do menor assume credibilidade inafastável até prova em contrário, havendo que se considerar os pareceres de especialistas porque atinentes ao comportamento infantil, em tese e pareceres de especialistas porque atinentes ao comportamento infantil, em tese e não ao aspecto concreção que reveste cada acontecimento factual e jurídico" (TJSP – AC – Rel. Fontes Barbosa – RJTSP 131/479).

Já no tocante ao objeto material do crime de atentado violento ao pudor – no sentido da necessidade do contato físico e corporal entre o réu-padre e as vítimas – convencido estou que houve o contato físico entre o réu e as três vítimas, em momentos distintos, e para tanto trago à baila a seguinte jurisprudência perfeitamente aplicável ao caso in examine, verbis:

"Para a caracterização do crime de atentado violento ao pudor é imprescindível que o agente, na realização do ato libidinoso, mantenha contato corpóreo com a vítima, pois sem a sua participação física ativa ou passiva, o delito não se configura". (STJ – Resp. 63.509-8 – Rel. Vicente Leal – Bol. IBCCrim 531/190).

Em relação à causa de aumento especial de pena prevista na Parte Geral do Código Penal (art. 71), isto é, o crime continuado, entendo que se acha devidamente provada, haja vista que o réu, através de mais de uma conduta, cometeu dois ou mais delitos – precisamente três crimes – da mesma espécie e da mesma natureza (atentado violento ao pudor), sendo o instituto do crime continuado uma ficção jurídica que visa a impedir o apenamento exarcebado do agente delitivo. E nesse sentido, trago à baila jurisprudência que acolho e adoto, in verbis:

"Para os crimes de atentado violento ao pudor, praticados em sequência, sendo duas ou mais vítimas, justificável o reconhecimento da continuidade delitiva" (TJSP – AC – Rel. Oliveira Ribeiro – RT 724/631)

No que se refere à presunção de violência cotejada no artigo 9º da Lei de Crimes Hediondos – não obstante não observada pelas partes (Acusação e Defesa) – e que prevê que essa causa especial de aumento de pena seja acrescida de metade (artigo 9º da Lei 8.072/90) às penas ditadas pelo artigo 6º, a meu juízo acompanho o posicionamento jurisprudencial mais liberal e menor rigoroso, que estabelece que a regra do artigo 9º não se aplica ao disposto pelo artigo 224 alínea ‘a’ do Código Penal, por se configurar – se assim o fosse possível – em um verdadeiro ‘bis in idem’, consoante assim prevê o seguinte entendimento jurisprudencial que acolho e adoto, verbis:

"No atentado violento ao pudor cometido contra menor de 14 anos a violência (real ou ficta) já foi considerada como elemento constitutivo do tipo básico, à vista do que dispõe o art. 224, a, do Código. Desta forma, o que é elementar no tipo – a violência – não pode figurar causa de aumento" (STF, HC, Rel. Francisco Rezek, RT, 734:616).

Dessarte, nesse diapasão, inclusive imbuído pelo Princípio de Motivação das Decisões Judiciais (art. 93 inciso IX da Constituição Federal), em sede do critério trifásico adotado por Nelson Hungria, nos moldes do artigo 68 do Estatuto Penal – devo registrar, para fins de motivação das circunstâncias judiciais, que houve um fato público e notório envolvendo o réu há alguns anos, na Cidade de Gravatá, Estado de Pernambuco, em razão de o mesmo ter se envolvido com uma criança de apenas 14 anos de idade (Lidiane Guedes da Silva), sua atual companheira, e que o caso teve repercussão na imprensa nacional, inclusive, e que esse fato público restou também consignado no Laudo Técnico feito pelo Núcleo de Psicologia da Secretária de Segurança Pública (fls. 62), subscrito pelo Psicólogo Clínico Dr. José Aloysio Couto de Rezende, nos seguintes termos, verbis:.... "Lembramos outrossim, o fato do acusado, Padre José Maria, conviver com uma menor de 13 anos de idade, o que se define pelo OMS (Organização Mundial de Saúde) como PEDOFILIA. Creio, sem sombra de dúvida, estarmos diante de um caso de PEDOFILIA PREFERENCIAL. Atenciosamente, José Aloysio Couto de Rezende. Psicólogo Clínico. CRP – 03/0082."

À luz do conceito dicionarizado, a expressão Pedofilia significa a qualidade ou sentimento de pedófilo, isto é, que ou aquele que gosta de crianças. Nesse sentido, e em reforço ao contido no Laudo Técnico Psicológico já referido (fls. 62), observo ser sintomático, ainda que sob a forma de prova indiciária, o fato de o réu ter acostado aos autos inúmeras fotografias (em torno de trinta fotos), nas quais se acha fotografado somente ao lado de crianças, em outros Estados onde residiu...

Alfim e por fim, convencido estou que o acriminado praticou o crime de atentado violento ao pudor (artigo 214 do CP) – crime considerado hediondo, ex vi art. 1º inciso VI da Lei 8.072/90 -- em face das três vítimas crianças, e em caráter contínuo (art. 71 do CP), sendo certo que a circunstância agravante do artigo 61 inciso II alínea ‘h’ (delito praticado contra criança) não se aplica ao caso concreto, vez que a menoridade da vítima já é elementar do crime e o integra, em razão da presunção da violência.

Eis o meu veredicto, à luz dos autos -- o único cárcere do Juiz!


III - CONCLUSÃO

e, por conseguinte, CONDENO o imputado JOSÉ MARIA RIBEIRO, alhures qualificado, nas reprimendas do art. 214 c/c art. 224 alínea ‘a’ e art. 71 do Estatuto Repressivo Pátrio, passando-lhe a dosar a pena na forma prevista no art.68 do referido diploma legal: evidenciada culpabilidade, tendo agido com dolo específico e manifesto, a pretexto de fazer um piquenique com as vítimas; não possui antecedentes criminais, à luz dos autos, não tendo o Cartório diligenciado a tempo acerca do fato público ocorrido em Gravatá, Pernambuco; não há notícia de possuir má conduta social; a sua personalidade ou perfil psicológico de fato não condiz com sua religiosidade, pois há fortes indícios de ser portador de uma personalidade pedófila; os motivos do crime foram injustificáveis, não tendo havido razão plausível para o seu cometimento; as circunstâncias do fato não lhe são favoráveis, pois ludibriou a confiança das vítimas crianças e que as conseqüências dos fatos foram nocivas para as mesmas, tendo inclusive uma delas, ao depor em Juízo, apresentado-se bastante nervosa e inclusive chorado ao relatar o fato; os crimes são classificados como hediondos e merecem o repúdio do Estado-Juiz, a fim de evitar a impunidade.

Assim, CONDENO-O:

Fixando-lhe a pena-base em 06 (seis) anos de reclusão, não havendo circunstâncias atenuante e agravante a reconhecer e que, em não havendo causas especiais de diminuição de pena, mas havendo a causa especial de aumento de pena (art. 71 do CP), à vista do caráter contínuo dos crimes, precisamente três delitos, aumento a pena supra de metade (1/2), TORNANDO A PENA DEFINITIVA EM NOVE (09) DE RECLUSÃO EM REGIME FECHADO, por força do art.33 §2º alínea "a" e §3º do Estatuto Penal.

A pena ora decretada será cumprida em regime inicialmente fechado, sendo permitida a progressão do regime, pois entendo inconstitucional o disposto no artigo 2º § 1º da Lei 8.072/90, segundo correntes doutrinária e jurisprudencial que acompanho e adoto, haja vista que o regime de progressão da pena é um direito constitucional de todo e qualquer réu.

À vista da natureza hedionda dos delitos, entendo necessária a sua prisão provisória, razão pela qual o condenado permanecerá preso, ainda que apele da sentença, para fins do artigo 2º § 2º da dita Lei 8.072/90.

Outrossim, determino que seja computada na pena privativa de liberdade ora fixada todo tempo em que o réu permaneceu preso em razão deste processo, devendo a detração ser observada pela Vara das Execuções Criminais, "oportune tempore", ficando observado que o ora condenado foi preso preventivamente em 20 de outubro de 2004 (fls. 155/161 e 179), devendo continuar recolhido no Quartel da Polícia Militar até o trânsito em julgado da sentença (art. 295 caput do CPP), vez que tem direito à prisão especial, por ser ministro religioso, a teor do artigo 295 inciso VIII do Código de Processo Penal.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se o réu, pessoalmente, a Defesa, o Ministério Público, e as vítimas, por sua genitora (fls. 170).

Transitada em julgado, lance-lhe o nome no rol dos culpados, expeça-se Guia de Recolhimento e mandado de prisão definitiva, recolhendo-se o condenado a um estabelecimento penal comum, encaminhando-se os autos à Vara das Execuções Criminais desta Comarca, com as cautelas de lei, consoante reza o artigo 105 da Lei de Execução Penal.

Oficie-se ao Desipe e ao Comando da Polícia Militar, encaminhando cópia desta sentença, para ciência e providências pertinentes.

Cumpra-se.

Aracaju, 10 de novembro de 2005.

JOÃO HORA NETO

JUZ DE DIREITO

Sobre o autor
João Hora Neto

juiz de Direito no Estado de Sergipe, professor de Direito Civil da Universidade Federal de Sergipe (UFS), mestre em Direito Público pela Universidade Federal do Ceará (UFC), especialista em Novo Direito Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HORA NETO, João. Religioso é condenado por pedofilia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 900, 20 dez. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/jurisprudencia/16663. Acesso em: 23 dez. 2024.

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