A procuração é o instrumento que materializa o contrato de mandato. Dessa forma, quanto a natureza jurídica, a procuração é negócio jurídico unilateral, sendo que o mantado é um negócio jurídico biliteral, tendo em vista sua natureza contratual.
De forma geral, é por meio do mandato que uma pessoa recebe os poderes de representação de outra pessoa, devendo zelar pelos interesses do outorgante e lhe prestar contas.
Vejamos o teor do art. 653 do Código Civil:
Art. 653. Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato.
Ademais, na procuração ordinária, esses poderes de representação podem cessar para o outorgado nas seguintes hipóteses previstas no art. 682 do Código Civil:
Art. 682. Cessa o mandato:
I - pela revogação ou pela renúncia;
II - pela morte ou interdição de uma das partes;
III - pela mudança de estado que inabilite o mandante a conferir os poderes, ou o mandatário para os exercer;
IV - pelo término do prazo ou pela conclusão do negócio.
Por via de exceção o legislador contemplou a hipótese de mandato “em causa própria”, ficção jurídica que afasta sua extinção pelo evento morte, impede a perda de eficácia em caso de revogação, além de dispensar a prestação de contas e conferir poderes ao outorgado para transferir para si os bens móveis e imóveis que sejam objeto do mandato.
Assim é o art. 685 do Código Civil:
Art. 685. Conferido o mandato com a cláusula "em causa própria", a sua revogação não terá eficácia, nem se extinguirá pela morte de qualquer das partes, ficando o mandatário dispensado de prestar contas, e podendo transferir para si os bens móveis ou imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades legais.
Isto posto, a Quarta Turma do STJ, por unanimidade, no REsp. 1.345.170-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 04/05/2021, entendeu que a procuração “em causa própria” não é título translativo hábil para transferência da propriedade.
Aqui o destaque publicado no Informativo n° 695 STJ:
A procuração em causa própria (in rem suam) não é título translativo de propriedade.
Na prática, quando o art. 1.245 do Código Civil determina a formalidade do registro do “título translativo” para transferência da propriedade de bens imóveis, fica a cargo do legislador estabelecer qual é o título hábil.
É o que faz o art. 108 da mesma codificação ao estabelecer que, salvo disposição legal em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Com isso, a mencionada norma jurídica permite que bens imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País seja exceção à regra, podendo ser utilizado o instrumento particular como título translativo. Além dele, a legislação especial contempla o contrato de financiamento bancário e a promessa de compra e venda de loteamento com prova de quitação como títulos translativo hábeis a transferir a propriedade do bem imóvel.
Ubirajara Guimarães (@ugprofessor)
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