É cediço que a competência é a limitação do exercício legítimo da jurisdição. Desta feita, o juiz incompetente estará, portanto, exercendo de forma ilegítima sua jurisdição, podendo qualquer sujeito processual apontar tal ofensa.
Em relação a legitimidade para apontar tal ofensa, a melhor doutrina explana que “todos os sujeitos processuais são legitimados a apontar a ofensa a uma regra dessa natureza, até mesmo porque o respeito à ordem pública é questão incompatível com a limitação de legitimados que pretendam sua concretização”. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil, Ed. 10, p. 224).
No caso em tela, se por um lado o artigo 76 da Lei de Falência e Recuperação Judicial determina a reunião de todas as ações de bens e interesses do falido no Juízo da Falência, por outro o artigo 47 da lei Processual Civil dispõe que as ações fundadas em direito real sobre bens imóveis devem tramitar no Juízo do foro da situação da coisa.
Desta feita, o autor entende que o JUÍZO competente para o julgamento da AÇÃO da USUCAPIÃO é o do foro da situação da coisa, vez que a dicção do artigo 47 do Código de Processo Civil criou uma regra de “competência absoluta", determinando o foro do local do imóvel como o absolutamente competente para conhecer ações reais imobiliárias e ações possessórias imobiliárias.
No mesmo ínterim, os doutrinadores Dinamarco, Instituições, p. 509; Pizzol, A competência, p. 172; Arruda Alvim, Manual, p. 323 Nery-Nery, Código, p. 494, explanam que a razão de ser absolutamente competente o foro do local do imóvel decorre:
a) da conveniência de decidir no local as demandas referentes a imóveis;
(b) facilidade de produção probatória;
(c) repercussão na vida econômica e social da localidade em que se situa o imóvel.
Por fim, Nelson Nery Jr. e Rosa Maria De Andrade Nery dispuseram que “a ação de usucapião especial proposta contra a massa falida deve ser processada e julgada na comarca da situação do imóvel, não prevalecendo o foro do juízo da falência (Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, Ed. Revista dos Tribunais, 11ª edição, 2010, p. 368).
Acerca do tema, o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo vem decidindo que:
Conflito negativo de competência. Ação de usucapião especial urbano ajuizada contra falida, distribuída no juízo da situação do imóvel.Declinação da competência e remessa ao juízo universal da falência. Impossibilidade. Competência do foro da situação do imóvel. Inteligência do art. 47 do código de processo civil. Competência do juiz suscitado da 1ª vara do foro regional de vila mimosa – campinas. (TJSP; Conflito de competência 0005930-72.2018.8.26.0000; Relator (a): Campos Mello (Pres. da Seção de Direito Privado); Órgão Julgador: Câmara Especial; Foro de Campinas - 6ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 11/06/2018; Data de Registro: 21/06/2018)
“Conflito de competência. Ação de usucapião. Declínio da competência ao MM. Juízo onde decretada a falência da ré. Impossibilidade. Juízo universal falimentar que comporta ressalvas. Artigo 76 da lei nº 11.101/05. Princípio forum rei sitae. Competência absoluta, estabelecida no foro da situação da coisa. Prevalência da regra insculpida pelo artigo 47, § 2º, do CPC. Competência do MM. Juízo da 1ª Vara Cível de Catanduva, ora suscitado. Conflito procedente. (Conflito de Competência nº 0041015-56.2017.8.26.0000, Câmara Especial, Rel. Des. LÍDIA CONCEIÇÃO, j. 19/02/2018) (g/n).
“Conflito Negativo de Competência Juízos de Comarcas distintas - Ação de Usucapião redistribuída ao Juízo onde tramita pedido de Falência da requerida Inadmissibilidade - Conflito entre as regras do artigo 76 da Lei 11.101/76 e do artigo 95 do CPC - "Vis Attractiva" do Juízo Falimentar que comporta exceções Usucapião que detém regra de competência absoluta (“forum rei sitae”) e, assim, prepondera sobre a universalidade do Juízo da Falência Conflito julgado procedente, para declarar a competência do MM. Juízo do lugar da situação do imóvel, suscitado.” (Conflito de Competência nº 0162261-58.2013.8.26.0000, Câmara Especial, Rel. Des. CLAUDIA GRIECO TABOSA PESSOA, j. 24/02/2014) (g/n)
Portanto, a força atrativa do Juízo da Falência não é absoluta, compreendendo algumas exceções. E, no caso da usucapião, tem-se que a regra de competência é de natureza absoluta, porquanto funcional, estabelecendo-se no foro da situação da coisa (“forum rei sitae”). Daí porque prepondera sobre a universalidade do Juízo da Falência.