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Contrarrazões de Agravo de Instrumento - desapropriação para reforma agrária em faixa de fronteira - indenização devida

Agenda 18/05/2019 às 00:50

Trata-se de peça suscinta de Contrarrazões ao Agravo de Instrumento sustentando diversas teses contrárias à pretensão da União de ver-se isenta de indenizar particular que teve o imóvel desapropriado para reforma agrária em faixa de fronteira.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL XXX.

Agravo de Instrumento n° XXX

A firma XXX., sob liquidação judicial, já qualificada nos autos de execução de sentença contra a fazenda pública nº XXX, vem, por meio de seu procurador XXX, com o devido respeito e acatamento à Vossa Ex.a, em face do despacho retro, apresentar suas

CONTRA-RAZÕES

ao Agravo de Instrumento interposto pela Procuradoria Federal do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), pelos seguintes fundamentos.

i. sobre a titulação dominial da União em suposta “faixa de fronteira”, impugna a tese pois, nos autos em exame, a sentença condenatória restou acobertada pela coisa julgada, com trânsito em XXX (certidão de fls.XXX), inclusive superado o prazo deação rescisória[1]; a matéria preclusa, esgotado o prazo junto à inicial de embargos à execução (fls.XXX)[2];

ii. ilegalidade e inconstitucionalidade no entendimento do INCRA, porque a Lei Complementar n° 76/93 veda o debate da titularidade da res no bojo da desapropriação, remetendo o interessado, em caso de dúvida, à propositura de “ações próprias” (art.6°,§1°). Permiti-lo feriria a igualdade processual entre os litigantes (art. 5°, caput, CF), já que a contestação ofertada só pôde versar o montante da indenização[3], e a retificação dominial exigiria perícia judicial;

iii. ademais, o reconhecimento de eventual vício no título de propriedade redundaria nulidade do próprio decreto expropriatório que legitimou a imissão de posse, convertendo-a em esbulho possessório[4] que, tanto quanto, seria passível de indenização.

iv. convém lembrar que as Constituições anteriores à de 1988 (p.ex., a de 67), permitiam a Usucapião[5] de imóveis reputados “públicos”, desde que débeis quanto à regularidade cadastral imobiliária da pessoa jurídica de direito público, consumando-se a prescrição aquisitiva[6] em favor de posseiros de res nullius, terras devolutas ou enfiteuses.[7] Que dirá de imóveis com sucessivas transcrições regulares desde o ano de 1855 (fl.14/15).

Não é outro o entendimento desta Corte, que já enfrentou a matéria:

ADMINISTRATIVO. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. BEM PÚBLICO. PRESCRIÇÃO AQUISITIVA. 1. A ação de usucapião somente declara uma situação jurídica já previamente constituída mediante a convergência dos elementos formadores desse direito, na hipótese, cabível o usucapião mesmo sobre bem público. 2. Comprovou-se que a posse sobre a área usucapienda seria superior a 30 anos, antes mesmo da instituição do Decreto nº 22.785/33 e 9.760/46. 3. A jurisprudência firmou o entendimento no sentido de que se a prescrição aquisitiva operou-se antes da vigência do Código Civil, impõe-se o reconhecimento do usucapião, mesmo que sobre bens dominiais.(TRF4 - APELAÇÃO CIVEL: AC 7297 SC 95.04.07297-6 / Relator(a): VÂNIA HACK DE ALMEIDA / Julgamento: 24/06/1999 Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA Publicação: DJ 08/09/1999 PÁGINA: 692).

Trata-se, por tudo exposto, de nova tentativa de procrastinar o pagamento no feito, constatada pelo juízo singular desde fls. XXX, merecendo arbitramento de indenização por litigância de má-fé[8] e majoração da multa fixada, em valores suficientes para impedir nova interposição de recurso protelatório.

Pelo exposto, pelo improvimento do recurso e acatamento das contra-razões, nos seus termos.

Local e data.

p.p. XXX

OAB/PR n° XXX

______________

[1] Art. 495. O direito de propor ação rescisória se extingue em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão.

[2] Art. 245. A nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão.

[3] Art. 9º A contestação deve ser oferecida no prazo de quinze dias e versar matéria de interesse da defesa, excluída a apreciação quanto ao interesse social declarado.

[4] O esbulho estaria caracterizado pela perda da posse direta (justa e de boa-fé), por força de ato administrativo e judicial viciados. Outros fundamentos de indenização na espécie seriam o enriquecimento ilícito do Estado, já que o título de propriedade supostamente nulo foi adquirido onerosamente de terceiros, e o factum principis, fruto de contradição orgânica da administração pública, a gerar prejuízo ao particular.

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[5] Caio Mário da Silva Pereira define Usucapião como “a aquisição da propriedade ou noutro Direito Real pelo decurso de tempo estabelecido e com a observância dos requisitos instituídos em Lei”. (in Instituições de Direito Civil. 6ª edição, vl. 1, 1982, p. 118).

[6] Código Civil de 1916, Art. 551. Adquire também o domínio do imóvel aquele que, por 10 (dez) anos entre presentes [...] o possuir como seu, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé.

[7] É unânime o entendimento jurisprudencial de que antes do Decreto n° 22.785/33, havia possibilidade da usucapião de bens públicos indistintamente (RF 96/51, 106/473, 121/123, RT130/113, 142/144, 144/637, 199/261, 215/476, 225/395, 230/321, 241/473, 333/605; Arquivo Judiciário 115/422). Após, a dos imóveis supostamente públicos mas com debilidade cadastral ou desafetados/dominicais, por força do art. 65 do Código Civil de 1916: “São Públicos os bens do domínio nacional pertencentes à União, aos Estados, ou aos Municípios. Todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.” Sobre usucapião em enfiteuse v. RExt 87050/CE; usucapião em ilhas marítimas v.Rext 285615/SC.

[8] Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.

Sobre o autor
Alexandre Rocha Pintal

Advogado da Fundação Estatal de Saúde de Curitiba, inscrito na OAB/PR sob o n.º 42.250, pós-graduado em Direito Público, do Trabalho e Previdenciário, autor de Direito Imigratório (Juruá 4ª ed., 2014), articulista de revistas e sites especializados.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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