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Habeas corpus com pedido de liminar

Agenda 31/07/2019 às 12:45

Trata-se de habeas corpus impetrado em acusação de delito de porte ilegal de arma, no caso, a defesa entendeu que a fundamentação apresentada pela autoridade coatora foi insuficiente

AO EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

José Roberto Telo Faria, brasileiro, divorciado, advogado, inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Secção São Paulo, sob o nº 207.840, com escritório profissional descrito no rodapé desta, vem respeitosamente à presença de Vossa excelência, com fundamento no artigo 5º, XXXV e LXVIII da Constituição Federal, e artigos 647 e 648, inciso II, do Código de Processo Penal, impetrar:

HABEAS CORPUS COM MEDIDA LIMINAR, em favor de:

FULANO DE TAL, brasileiro, solteiro, comerciante, portador da Cédula de Identidade com o RG de nº 00000.00 SSP/SP, inscrito no CPF/MF sob o nº 0000000.0000, residente e domiciliado nesta capital na rua..................., nº ..........., Jardim................, atualmente preso e recolhido à disposição da Justiça Pública nas dependências do Centro de Detenção Provisória de Pinheiros 3, nesta Capital..

Em virtude de prisão preventiva, manifestamente ilegal, decretada pelo Mm. Juiz de Direito do Plantão Judiciário da Comarca da Capital, ora Autoridade Coatora, nos autos do Inquérito Policial de nº000000000.

Apresenta em separado as razões de seu pedido, aguardando o deferimento da MEDIDA LIMINAR, justificada na presente impetração, e, posteriormente, a concessão definitiva do HABEAS CORPUS.

Termos em que,

Pede deferimento.

São Paulo, 15 de janeiro de 2019.

José Roberto Telo Faria

OAB/SP 207.840


EGRÈGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Ínclitos Julgadores,

Douto Procurador.

O paciente encontra-se preso e recolhido à disposição da Justiça Pública, desde a data de 14/01/2019, ocasião em que foi preso e autuado em flagrante pela suposta prática do delito contemplado no artigo 16 da Lei nº 10.826/03.

Em audiência de custódia, o Douto Juízo do plantão judiciário homologou o auto de prisão em flagrante, convertendo a prisão em flagrante em preventiva.

Ainda por ocasião da audiência de custódia, a defesa requereu que fossem aplicadas as medidas cautelares em substituição a prisão, tendo em vista a primariedade do indiciado, além de estarem presentes os requisitos dos artigos 44 e 59 do código Penal, levando-se ainda, em conta, que mesmo no caso de eventual denúncia e posterior condenação, faria o indiciado, em tese, jus a benefícios legais.

Entretanto, a ora autoridade coatora, indeferiu o pleito, sem adentrar ao mérito por não ser o momento oportuno, apenas á título de argumentação, salvo entendimento diverso, mesmo no caso de uma eventual denúncia e posterior condenação, desde já, fazendo-se uma projeção de uma futura reprimenda, o paciente faria jus ao regime aberto, ou ainda teria sua pena restritiva de liberdade substituída pela restritiva de direitos, logo sua prisão cautelar atualmente seria desnecessária, já que ficaria preso enquanto presumidamente inocente e seria colocado em liberdade no caso de uma eventual condenação, o que, SMJ, se traduz em uma injusta e incoerente decisão.

Excelência, em que pese o entendimento da Douta Autoridade Coatora que negou o pleito liberatório, alegando em síntese a gravidade abstrata do delito, ressaltando ainda a necessidade da custódia em razão da “ausência de prova de atividade laboral” do indiciado num país onde existem onze milhões de desempregados, alegando, em síntese que sua presumível que sua liberdade geraria presumível retorno às vias delitivas, por não ter fonte de renda, é no mínimo incoerente.

Ora Excelências, o indiciado, ora paciente, exerce atividade lícita remunerada, além disso, mora com seus pais no mesmo local desde que nasceu, nunca se viu envolvido em qualquer delito, de qualquer natureza, então presumir que ele irá delinquir no futuro, caso seja colocado em liberdade, é negar ao ora paciente, seu direito fundamental de ir e vir, ou seja, a injusta prisão cautelar foi decretada em desacordo com os direitos e garantias constitucionais, em especial o da presunção de inocência, sendo certo que o paciente em nenhum momento comprometeu ou comprometerá a garantia da ordem pública, a normalidade da instrução criminal ou a aplicação da lei penal.

Como se sabe, a prisão preventiva é medida excepcional e deve ser decretada apenas quando devidamente amparada pelos requisitos legais, em observância ao princípio constitucional de inocência, sob pena de antecipar os severos efeitos de eventual decisão condenatória.

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Resta claro que a decisão ora atacada não apresenta qualquer fundamentação idônea para a manutenção da custódia, eis que se baseia apenas em fatos genéricos, limitando-se a afirmar a abstrata e suposta periculosidade do paciente.

Esta afirmação se baseia na experiência do cotidiano forense, que de forma majoritária professa pela presunção de culpa exagerada à pessoa do imputado, antecipando um julgamento e criando indiscutível clima de prévia condenação.

Conforme Vossa Excelência bem sabe, com a edição da Lei nº 12.403/2011, é possível substituir-se a prisão cautelar por quaisquer das modalidades de medidas cautelares ali previstas.

A prisão para cautelar, cuja densidade depende da cabeça de cada Juiz, é utilizada para prender alguém e usada com um mantra qualquer: instabilidade social, confiança das instituições, gravidade, qualquer julgado ou fatia doutrinária bem bonita e moralista, enfim, uma fraude retórica.

Neste sentido, este flutuar do significante -“requisitos para prisão preenchidos” - pode ser preenchido por cadeias discursivas opostas, daí seu efeito mágico, aparentemente bem fundamentado, mas que serve de mecanismo retórico, para manter preso um inocente.

Enfim, sempre com o devido respeito, tudo isso para dizer que, não obstante tenhamos lutado para libertar Rogers na audiência de custódia, toda construção discursiva do direito é suscetível a manipulações convenientes, a depender do contexto e das circunstâncias que permeiam caso a caso.

É por isso que com o presente Remédio Constitucional busca-se, liminarmente, o relaxamento da prisão, fazendo-se cessar o evidente constrangimento ilegal.

DAS INCONVENCIONALIDADES – PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA

O Congresso Nacional, através do Decreto Legislativo n. 27, de 26 de maio de 1992, aprovou o texto da convenção americana sobre direitos humanos (Pacto de São José da Costa Rica). E o governo brasileiro, em 25 de setembro de 1992, depositou a carta de adesão a essa convenção, determinando-se seu integral cumprimento pelo decreto n.º 678, de 06 de novembro de 1992, publicado no diário oficial de 09/11/92, pág. 15.562.

Ao tratar das garantias processuais a referida convenção assegura expressamente que:

“Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa”. (Art. 08, 1 primeira parte).

E referida disposição tem valor de preceito constitucional, pois a carta de 1988 é expressa o respeito, no seu art. 5º, 2º. “Os direitos e garantias expressas nesta constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por elas adotadas, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil, seja parte”.

Assim, parte da referida publicação, a presunção de inocência, constitui princípios informados de nosso processo penal assegurada por duas fontes legislativas, o art. 5º, inciso LVII da Constituição, em que:

“Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória”,

E art. 08, 1º, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que também tem força de regra constitucional. Segundo DIRCEU ÁGUIA CINTRA JÚNIOR (IN PRISÕES CAUTELARES - O USO E ABUSO, Revista da PGE, junho de 1994, p. 132):

“(...) Seja o réu primário, ou reincidente, tenha bons, ou maus antecedentes, ainda que pronunciado ou condenado em primeiro grau, enquanto não transitar em julgado a condenação, continuará inocente, com todos as aplicações constitucionais de tal estado”.

O Princípio Constitucional da não culpabilidade, em nosso sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o poder público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado, ou ao réu, como se esses já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do poder jurídico.

Parece evidente que uma execução antecipada em matéria penal, configuraria grave atentado contra a própria ideia de dignidade humana.

Se entender, como enfaticamente destacam a doutrina e a jurisprudência, que o princípio da dignidade humana não permite que o ser humano se convole em objeto da ação estatal, não há compatibilizar semelhante ideia com a execução penal antecipada.

Como preleciona o eminente Magistrado LUÌS FLÀVIO GOMES (revista jurídica, 189, [jul. 1994], síntese, Porto Alegre-RS):

“O eixo, a base, o fundamento de todas as prisões cautelares no Brasil residem naqueles requisitos da prisão preventiva. Quando presentes pode o juiz fundamentadamente decretar qualquer prisão cautelar, quando ausentes ainda que se trate de reincidente, ou de que não tem bons antecedentes, ou de crime hediondo, ou de tráfico, não pode ser decretada a prisão antes do trânsito em julgado da decisão”.

Com efeito, as condições pessoais do paciente são favoráveis, preenchendo, portanto, os requisitos da concessão da liberdade provisória. O STJ, em recentes decisões, manifesta-se pela exigência de fundamentação idônea para a manutenção da prisão cautelar:

“PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTOS. GRAVIDADE GENÉRICA DO DELITO. PERICULOSIDADE ABSTRATA DO SUJEITO. CREDIBILIDADE DA JUSTIÇA PELA PRISÃO DO AGENTE. INIDONEIDADE.1. A decisão que indefere a liberdade provisória ao acusado portador de circunstâncias pessoais favoráveis, deve ser idoneamente fundamentada nos requisitos do art. 312, do CPP. 2. A gravidade do delito, bem como as considerações de periculosidade abstrata do agente, não configuram causas capazes de determinar a segregação cautelar. Precedentes. 3. Ordem concedida”

(HC n° 192.240/SP, STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Adilson Vieira Macabu, D.J. 07.06.2011). (grifos nossos)

Nesse mesmo sentido é o entendimento do STF:

“Habeas Corpus. Prisão cautelar. Decreto fundado exclusivamente na gravidade abstrata do delito e na suposta periculosidade do agente. Fundamentação inidônea. Precedentes. A invocação da gravidade abstrata do delito supostamente praticado e da hipotética periculosidade do agente não autorizam, per se, a custódia preventiva. Orientação jurisprudencial sedimentada. Ordem concedida”

(HC 95460/SP, STF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, D.J. 31.08.2010) .(grifos nossos)

Note-se que em sua decisão, a Autoridade Coatora não demonstrou qualquer fato concreto que aponte para a periculosidade da Paciente ou para a possibilidade de reiteração criminosa.

Ora, a conclusão da Autoridade Coatora no sentido de que a liberdade provisória do paciente representaria risco à ordem pública penal é vaga e abstrata. Trata-se de mera suposição a respeito do que o paciente poderia vir a fazer se fosse solto. Esta capacidade intuitiva, segundo o STF, não é suficiente para alicerçar a manutenção da prisão cautelar (STF HC 83.943/MG).

Por tais razões, desesperançado e aflito, o paciente bate às portas desta Corte de Justiça, impetrando a presente Ordem de Habeas Corpus, uma vez que se encontra caracterizado o constrangimento ilegal pelo qual vem passando.

DA MEDIDA LIMINAR

A concessão de MEDIDA LIMINAR é indispensável, diante da procedência jurídica do pedido, retratada pela existência do fumus boni iuris, e ante o irreparável dano que se vem causando à liberdade do paciente (periculum in mora), pela denegação injustificável das legítimas garantias pleiteadas (revogação da prisão preventiva).

O texto claro do artigo 5°, - LXVIII da Constituição da República preceitua que é cabível o habeas corpus contra coação originada de ilegalidade ou de abuso de poder.

Demonstrada, anteriormente, a coação por ilegalidade, é necessário, provar agora, sucintamente, que ela ocorre por abuso de poder.

O professor Heleno Cláudio Fragoso, em petição de habeas corpus apresentada ao Supremo Tribunal Federal, em favor de Jorge Wallace Símonsen, e que tomou o n. 42.697, teve a oportunidade de sustentar:

“A norma Constitucional determina Concessão de habeas corpus não só em casos de ilegalidade, como também em casos de abuso de poder, sendo, pois, mais ampla do que a definição da Lei processual para coação ilegal”.

Dispõe o art. 647 do CPP:

Dar-se-à habeas corpus, sempre que alguém sofrer ou se achar na eminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar.

Registre-se sem a menor sombra de dúvida de que é perfeitamente possível a concessão de liminar em sede de Habeas Corpus não dispensando tal temário maiores controvérsias.

É dizer: desde que presentes os requisitos ensejadores, a concessão da liminar é a medida mais justa e pertinente a ser adotada. No presente caso os requisitos são cumpridos com louvor.

Quanto ao fumus boni iurisin casu é a previsão constitucional da presunção de inocência (art.5º, LVII, CF), a orientação segundo a qual a segregação cautelar somente pode ser efetivada se presentes os requisitos legais, a ausência de adequação fundamentação da decisão emanada do juízo coator, o visível constrangimento ao qual o paciente vem sendo submetido, sendo desrespeitado o teor do pacto de São José da Costa Rica, a Constituição da República Federativa do Brasil e o Código de Processo Penal Pátrio.

Quanto ao periculum in mora- consiste no fato de eventual tardar na resposta do poder dos juízes, contristando a liberdade sem a devida formação de culpa e posicionamento definitivo, muito menos sem restar cabalmente demonstrada sua necessidade de impingir ao paciente o desnecessário prolongamento no seu suplício consistente em permanecer segregado durante a instrução do feito apesar de como já alhures mencionado, fazer jus a responder o processo em liberdade, discutindo no foro civilizado dos homens de bem, meritum causae,exercendo a ampla defesa e, ao final provando sua inocência.

Ademais, merece ficar registrado também, o fato de que a concessão de liminar em absolutamente nada prejudica o curso da possível ação penal além de não se avistarem presentes os motivos legitimadores de um decreto prisional cautelar como o que fora prolatado no feito sub examine, comprometendo-se, o paciente a comparecer a todos os atos processuais a serem designados pelo juiz processante.

DOS REQUERIMENTOS

Diante do exposto, presentes os requisitos legais para a concessão da ordem, liminarmente, haja vista a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora que apontam com evidência, a possibilidade de ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação, requer-se A CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR, por manifesto o constrangimento ilegal e estando presentes os pressupostos de admissibilidade para efeito de ser revogada a prisão preventiva do paciente, até que seja transitada e julgada a sentença penal condenatória não subsistindo mais os motivos do artigo 312 do CPP.

Compromete-se o paciente a comparecer em juízo sempre que for necessário, espera a revogação da medida, com a expedição do ALVARÁ DE SOLTURA

E no mérito requer que seja mantida a decisão liminar, garantindo-se ao paciente o direito de responder ao processo em liberdade, até o trânsito em julgado.

É o pleito da defesa!

São Paulo, 15 de janeiro de 2019.

José Roberto Telo Faria

Advogado – OAB/SP 207.840

Sobre o autor
José Roberto Telo Faria

Advogado Criminalista, Bacharel em Direito pela Universidade de Guarulhos (2002); Pós Graduado em Direito Penal e Direito Processual Penal pela FMU (2015); Secretário Adjunto da Comissão do Tribunal do Júri da OAB/SP - Sub Seção de Santo Amaro (2011).

Informações sobre o texto

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