EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 1ª VARA FEDERAL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE FLORIANÓPOLIS - SC
Distribuição por dependência à Execução Fiscal n...
AUTOR, brasileiro, aposentado, casado, portador da Carteira de Identidade n... e inscrito no CPF sob o n..., residente e domiciliado na Rua...., n..., Bairro..., Cidade..., CEP..., vem, por seu advogado, à presença de Vossa Excelência, propor
AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO FEDERAL - MULTA AMBIENTAL
em face do INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS – IBAMA, autarquia federal, devendo ser citada na pessoa de seu representante legal, em endereço de conhecimento deste Juízo, pelos motivos abaixo aduzidos.
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1. Da Gratuidade de Justiça:
Estatui a Constituição Federal em seu art. 5º, incisos XXXV e LXXIV:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.
Nesse tom, a Constituição Federal objetivou dar amplo acesso ao Estado-Juiz, garantindo, inclusive àqueles que não possuem condições financeiras para ver cumpridos os seus direitos, o meio legal à sua realização.
A seu turno, densificando a garantia fundamental ao acesso universal e efetivo à Justiça, o art. 98, caput, do Código Fux disciplinou que "a pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma na lei".
Para o Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, tem direito à concessão do benefício, àqueles que declarem impossibilidade de arcar com as custas na forma da lei e comprovem renda líquida mensal inferior a 10 salários mínimos, conforme colhe-se da jurisprudência:
PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DEFERIMENTO. 1. Consoante os parâmetros no novo Estatuto Processual Civil, faz jus à gratuidade da justiça a pessoa física que se declare pobre, na acepção da lei, desde que não haja nos autos elementos que afastem a presunção de veracidade desta declaração. 2. Um dos elementos considerados pela jurisprudência para afastar a presunção de pobreza decorrente da declaração da pessoa física é a comprovação de renda líquida mensal superior a 10 (dez) salários mínimos, não se constituindo, todavia, em critério único e absoluto, pois deverá ser avaliado em conjunto com os demais elementos constantes dos autos. 3. Hipótese em que a agravante faz jus à gratuidade. (TRF4, AG 5002674-47.2019.4.04.0000, PRIMEIRA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 10/04/2019).
Conforme declaração de hipossuficiência e contracheque acostos, tem-se que a renda líquida mensal do Autor, cabo bombeiro militar, é inferior a 04 salários mínimos, e por isso, não possui todas as condições para arcar com o pagamento das custas e despesas judiciais sem prejuízo do próprio sustento e de sua família, requerendo portanto, com fundamento no art. 5º, inciso LXXIV da Constituição Federal e no art. 98 e seguintes do Código de Processo Civil, a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita.
2. DOS FATOS:
O autor foi abordado por agentes da Polícia Ambiental do Batalhão de Polícia Ambiental. Durante a inspeção, a qual contou com a colaboração do demandante, foram encontrados, segundo o Boletim de Ocorrência nº 123456789/2019, dez pássaros silvestres em cativeiro:
- 4 cardeais;
- 2 trinca-ferros; e
- 4 canários-da-terra.
Em decorrência da apreensão, foi lavrado, em 27 de setembro de 2019, o Auto de Infração nº 123456789 pelo IBAMA, o qual imputa ao autor a conduta de manter em cativeiro 10 (dez) pássaros silvestres sem licença do órgão competente. A conduta foi descrita como infração prevista no art. 70 c/c o art. 29, III, da Lei nº 9.605/98 e art. 11, § 1º, III c/c art. 2º, II, do Decreto nº 6.514/2008.
A instrução processual administrativa culminou com uma decisão que houve por bem condenar o autor ao pagamento de multa no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais).
Tal decisum, embora já transitado em julgado no âmbito administrativo, não merece guarida na esfera judicial.
É importante referir que o autor é pessoa humilde, de parcos conhecimentos e de baixa renda, o qual desconhecia a ilicitude de seu ato. O demandante criava os pássaros como animais de estimação, era apegado afetivamente a eles e jamais os comercializaria.
Diante da total impossibilidade de arcar com o pagamento da multa, requereu, na via administrativa, sua substituição mediante a imposição de serviços de preservação, melhoria e recuperação do meio ambiente. Entretanto, o pedido foi indeferido.
Hoje, o demandante tem 68 anos de idade e está acometido de câncer no fígado e no rim, além de uma hérnia inguinal que lhe causa muita dor. Apesar disso, mantém a vontade de obter a substituição da multa que lhe foi imposta pela prestação de serviços que seja compatível com sua atual condição física.
Informa-se, ainda, que a multa foi inscrita em dívida ativa, sendo objeto da Execução Fiscal nº 123456789.05.2019.1.2.3456. Atualmente, o valor atualizado da dívida importa em R$ 19.478,74 (valor atualizado até 02/12/2018).
3. DO DIREITO:
3.1. Da ausência de prévia advertência:
O artigo 72 da Lei nº 9.605/98 dispõe que a multa deverá ser aplicada somente quando o agente, advertido por irregularidade, deixar de saná-las em prazo determinado.
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º:
§ 3º A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo:
I - advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha;
No entanto, a parte autora não foi previamente advertida pelos agentes da autarquia ambiental. Assim, a aplicação da multa pelos agentes de fiscalização da autarquia ambiental ofendeu o princípio da legalidade, porquanto sua aplicação se encontra condicionada a uma prévia e necessária advertência, o que não foi observado, como se verifica do Processo Administrativo.
Diante do exposto, a anulação da multa pelo Poder Judiciário mostra-se necessária, na medida em que toda e qualquer atividade administrativa deve estar autorizada por lei.
3.2. Da ofensa ao princípio da razoabilidade:
É sabido que a Administração Pública possui a faculdade de, junto à determinada situação do mundo fenomênico, escolher uma dentre as várias soluções juridicamente possíveis e admitidas pelo legislador.
Tal faculdade denomina-se Poder Discricionário, que se caracteriza pela possibilidade de a Administração fazer opções, ou seja, liberdade na valoração dos motivos e na escolha do objeto do ato que deseja expedir.
Sucede que o exercício dessa competência discricionária encontra limites na Constituição da República.
Estamos nos referindo ao princípio da razoabilidade, que veda a atuação desarrazoada dos órgãos do Poder Público. Assim, por se tratar de uma pauta de natureza axiológica decorrente dos ideais de justiça, prudência, justa medida, referido princípio tem sido habitualmente utilizado para aferir a legitimidade das restrições aos direitos dos administrados.
O grande fundamento do princípio da proporcionalidade, segundo José dos Santos Carvalho Filho[1], “é o excesso de poder, e o fim a que se destina é exatamente o de conter atos, decisões e condutas de agentes públicos que ultrapassem os limites adequados, com vistas ao objetivo colimado pela Administração, ou até mesmo pelos Poderes representativos do Estado. Significa que o Poder Público, quando intervém nas atividades sob seu controle, deve atuar porque a situação reclama realmente a intervenção, e este deve processar-se com equilíbrio, sem excessos e proporcionalmente ao fim a ser atingido”.
Segundo os ensinamentos da doutrina alemã, a aplicação deste princípio exige a verificação do ato do Poder Público quanto aos seguintes aspectos:
- adequação, no sentido de o meio empregado ser compatível com o fim colimado;
- necessidade, vinculando os agentes públicos, no exercício de sua atuação, a empregar o meio menos gravoso para alcançar o interesse público, ou seja, a escolha deve ser aquela que cause o menor prejuízo possível aos administrados; e
- proporcionalidade em sentido estrito, que impõe o sobreposição das vantagens em relação às desvantagens da medida adotada.
Da análise do Processo Administrativo, conclui-se que a aplicação da multa pecuniária pelo agente público à parte autora – que é pessoa humilde, de parcos conhecimentos e de baixa renda – não respeitou mencionados subprincípios, mostrando-se ilegal e desarrazoada, o que se extrai da subsunção dos fatos aos seguintes preceitos jurídicos:
Lei nº 9.605/98
Art. 6º - Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:
I- a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente;
- os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;
- a situação econômica do infrator, no caso de multa.
[...]
Art. 72 - As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º:
I- advertência;
- multa simples; III - multa diária;
- apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração;
- destruição ou inutilização do produto;
- suspensão de venda e fabricação do produto; VII - embargo de obra ou atividade;
- demolição de obra;
- suspensão parcial ou total de atividades; X – (VETADO)
XI - restritiva de direitos.
§ 1º Se o infrator cometer, simultaneamente, duas ou mais infrações, ser-lhe-ão aplicadas, cumulativamente, as sanções a elas cominadas.
§ 2º A advertência será aplicada pela inobservância das disposições desta Lei e da legislação em vigor, ou de preceitos regulamentares, sem prejuízo das demais sanções previstas neste artigo.
§ 3º A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo:
- advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha;
- opuser embaraço à fiscalização dos órgãos do SISNAMA ou da Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha.
§ 4° A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
§ 5º A multa diária será aplicada sempre que o cometimento da infração se prolongar no tempo.
§ 6º A apreensão e destruição referidas nos incisos IV e V do caput obedecerão ao disposto no art. 25 desta Lei.
§ 7º As sanções indicadas nos incisos VI a IX do caput serão aplicadas quando o produto, a obra, a atividade ou o estabelecimento não estiverem obedecendo às prescrições legais ou regulamentares.
§ 8º As sanções restritivas de direito são:
- suspensão de registro, licença ou autorização;
- cancelamento de registro, licença ou autorização;
- perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais;
- perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito;
- proibição de contratar com a Administração Pública, pelo período de até três anos.
Vê-se, para logo, que a legislação vincula o agente público a observar, quando da imposição e gradação das penalidades administrativas, a gravidade do fato, os antecedentes do infrator e sua condição econômica. No vertente caso, ao revés, o agente administrativo não observou referidos limites jurídicos para a aplicação da multa administrativa.
Vinculando o agente administrativo a observar o princípio da razoabilidade, dispõe o Decreto nº 6.514/2008, art. 24, § 9º, in verbis:
§ 9º - A autoridade julgadora poderá, considerando a natureza dos animais, em razão de seu pequeno porte, aplicar multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais) quando a contagem individual for de difícil execução ou quando, nesta situação, ocorrendo a contagem individual, a multa final restar desproporcional em relação à gravidade da infração e a capacidade econômica do infrator.
Portanto, pode-se concluir que, tanto para a escolha da sanção (modalidade multa) quanto para o valor estipulado, o agente público não observou as três balizas normativas, em especial a terceira, na medida em que a condição de hipossuficiente da parte autora possui o condão de afastar a aplicação da multa ou de reduzir seu valor.
Por outro lado, também se constata a ausência de razoabilidade entre a imposição da multa e a infração ambiental praticada pela parte autora, de forma a violar, em última análise, o princípio da legalidade. Esta é a razão pela qual a doutrina mais moderna faz a seguinte consideração[2]:
Desse modo, quando alguns estudiosos indicam que a razoabilidade vai se atrelar à congruência lógica entre as situações postas e as decisões administrativas, parecer-nos que a falta da referida congruência viola, na verdade, o princípio da legalidade, porque, no caso, ou há vício nas razões impulsionadoras da vontade, ou o vício estará no objeto desta. A falta de razoabilidade, na hipótese, é puro reflexo da inobservância de requisitos exigidos para a validade da conduta.
[…]
Com esses elementos, desejamos frisar que o princípio da razoabilidade tem que ser observado pela Administração à medida que sua conduta se apresente dentro dos padrões normais de aceitabilidade. Se atuar fora desses padrões, algum vício estará, sem dúvida, contaminando o comportamento estatal. Significa dizer, por fim, que não pode existir violação ao referido princípio quando a conduta administrativa é inteiramente revestida de licitude.
Acertada, pois, a noção de que o princípio da razoabilidade se fundamenta nos princípios da legalidade e da finalidade, como realça Celso Antônio Bandeira de Mello (...). (Grifo nosso).
Salienta-se que, em se considerando que se trata de caso de guarda doméstica de espécimes silvestres não consideradas ameaçadas de extinção, a autoridade competente poderia ter deixado de aplicar a multa, em analogia ao disposto no § 2º do artigo 29 da Lei nº 9.605/98, consoante preceitua o § 4º do artigo 24 do Decreto nº 6.514/2008, o qual reproduz a disposição do § 2º do artigo 11 do revogado Decreto nº 6.514/2008.
À luz do gizado, resta patente que a multa administrativa imposta pelo agente administrativo ofendeu o princípio da razoabilidade e, em última instância,
o próprio princípio da legalidade, pela não observância dos preceitos normativos radicados nos artigos 6º e 72 da Lei nº 9.605/98 e no §§ 4º e 9º do artigo 24 do Decreto nº 6.514/2008, ao efeito de legitimar a sua anulação pelo Poder Judiciário.
Subsidiariamente, caso não acatado o pedido de cancelamento, pugna-se pela diminuição da multa a valores mais acessíveis ao demandante, pois ele, visivelmente, não tem condições de arcar integralmente com o valor imposto.
Salienta-se que se trata de um aposentado, com 68 (sessenta e oito) anos de idade, cuja família sobrevive com dois salários mínimos, sendo um decorrente de aposentadoria por invalidez percebida pelo autor e outro referente à aposentadoria por idade de titularidade da esposa do demandante. Assim, a multa de R$ 8.000,00 (oito mil reais) afigura-se desproporcional, assumindo caráter verdadeiramente confiscatório, lembrando que, atualmente, o valor atualizado da dívida importa em R$ 19.478,74 (valor atualizado até 02/12/2015).
Observa-se que nossos Tribunais vêm afastando a imposição de multas desproporcionais aplicadas pelo IBAMA:
ADMINISTRATIVO. AUTO DE INFRAÇÃO. MANTER EM CATIVEIRO ESPÉCIES DA FAUNA SILVESTRE BRASILEIRA SEM A DEVIDA AUTORIZAÇÃO DO IBAMA. ADVERTÊNCIA NÃO APLICADA. MULTA. VALOR EXCESSIVO EM RELAÇÃO À SITUAÇÃO DA EXECUTADA. DISPENSA DA MULTA. 1. Não foi aplicada a pena de advertência, uma vez que os fiscais do IBAMA, ao observarem que as duas iguanas que a autora portava não obtinham licença do órgão ambiental, aplicaram multa, sem, contudo, abrir oportunidade para a mesma sanar a irregularidade. 2. A multa no valor de R$ 1.000,00 (quinhentos reais) imposta a quem é professora estadual e tem renda mensal de R$ 727,00 (setecentos e vinte e sete reais), aparenta manifesta desproporção, infligindo sanção que destoa da realidade do apenado. 3. A multa deve ser dispensada, tanto mais quando a própria Lei nº 9.605/98 prevê a aplicação de penas alternativas mais adequadas ao caso, a teor do contido no § 4º do art. 72, ou ainda, se considerarmos a previsão contida no § 2º do art. 11 do Decreto 3.179/99, que dispõe que em caso de guarda doméstica de espécime silvestre não considerada ameaçada de extinção - na hipótese dos autos, tal fato não restou comprovado - a multa pode ser dispensada. 4.Apelação do IBAMA improvida. (AC 200938000294486, DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA, TRF1 - QUINTA TURMA, e-DJF1 DATA: 03/06/2011 PAGINA:200.)
Ainda, em consonância com o § 4º do art. 72 da Lei nº 9.605/98, a multa simples imposta ao cidadão, como no caso em tela, pode ser convertida em serviços de preservação do meio ambiente, in verbis:
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º. (...)
§ 4º A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
Portanto, subsidiariamente, requer-se a substituição da multa mediante a imposição de serviços de preservação, melhoria e recuperação do meio ambiente.
3.3. Da ocorrência de erro e da boa-fé:
Com efeito, trata-se de pessoa humilde, a qual não tinha conhecimento de que os pássaros que criava em sua residência eram animais silvestres. O demandante criava os pássaros como animais de estimação, era apegado afetivamente a eles e jamais os comercializaria.
Importante ressaltar que em momento algum o autor agiu de má-fé, muito antes pelo contrário.
Verificando-se que o demandante é pessoa idosa, de baixa renda e de pouco estudo, certo é que não possuía conhecimentos acerca das inúmeras leis existentes em nosso País, tampouco poderia imaginar existir um dispositivo legal que lhe imputaria sanções por um ato que praticava como se permitido fosse.
Diante do exposto, claramente se percebe que a conduta do demandante se trata de erro de proibição, motivo pelo qual, em conformidade com a melhor doutrina, impõe-se necessário o reconhecimento da excludente da infração ou sanção. Vejamos o que refere Celso Antônio Bandeira de Mello, na doutrina “Curso de Direito Administrativo”, 20ª edição, pg. 800:
“É corrente o uso da expressão 'excludentes' para referir hipóteses em que se considerará inexistente a infração, ou não sancionável a conduta, conforme o caso. São encontráveis menções ao (1) fato da natureza (força maior);
(2) caso fortuito; (3) estado de necessidade; (4) legítima defesa; (5) doença mental; (6) fato de terceiro; (7) coação irresistível; (8) erro; (9)obediência hierárquica; (10) estrito cumprimento do dever legal; (11) exercício regular de direito. Em nosso entender, as oito primeiras hipóteses dizem com a falta de voluntariedade – logo, elidem o próprio cometimento da infração, uma vez que a voluntariedade é o mínimo elemento subjetivo que se exige para imputação de uma infração a alguém. Já as três últimas correspondem a uma exclusão da sanção propriamente dita.” (grifo nosso).
Levando-se em consideração a colaboração do demandante no momento da fiscalização e o desconhecimento da existência de norma proibitiva, verifica-se, indubitavelmente, a boa-fé do autor, devendo, assim, ser reconhecida a excludente de erro.
No caso em apreço, salvo melhor juízo, deve sobrepor-se a garantia individual de não ser submetido a uma decisão administrativa calcada em procedimento viciado. Veja-se, o autor já foi equivocadamente submetido ao dissabor de responder a um processo administrativo por fato a que, em medida alguma, tinha conhecimento de sua amplitude. Impor-lhe a sanção de pagar multa, no montante fixado, após o encerramento de processo é, por demais, arbitrário.
Ademais, em que pese o dever da Administração Pública de bem zelar pelo patrimônio público, função na qual se insere a preservação de um meio ambiente sadio, temos que isso não justifica o uso do arbítrio pelo Estado. Isso porque, o que se pode verificar no presente caso é a tentativa apressada da Administração em ver cumprida sua função, de modo bastante questionável, a respeito da análise de todos os fatos.
Por conseguinte, é temerário imputar a um cidadão a autoria de uma conduta penalmente tipificada, sem a existência de culpa ou dolo do mesmo, haja vista que o autor incorreu em erro, quando não obtinha conhecimento que se tratava de ato ilícito. Vale dizer: em se tratando do exercício do jus puniendi estatal, com a imposição de sanção sobre o particular, não há falar em presunção de autoria ou algo semelhante, mas sim na certeza absoluta acerca da identidade daquele a quem será imputada a sanção.
[continua]
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