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Modelo - Ação anulatória de ato administrativo ambiental

Modelo de petição de ação declaratória de nulidade de ato administrativo multa ambiental com pedido liminar concedido no caso concreto. Atualizada.

Agenda 22/12/2020 às 06:29

Modelo Ação Anulatória. Ação que busca a nulidade de auto de infração ambiental. Anulatória de multa administrativa.

 

 

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EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) JUIZ (A) FEDERAL DA 6ª VARA DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SANTA CATARINA

AUTORA, brasileira, casada, inscrita no RG sob o n… e CPF n…, residente e domiciliada na Rua…, Florianópolis/SC, CEP…, vem, à presença de Vossa Excelência, por seu advogado, propor

AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA - MULTA AMBIENTAL DO IBAMA

em face de INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA, com sede na Rua…, Centro, Florianópolis – SC, CEP…, pelas razões de fato e de direito que passa a expor.

 

1. DOS FATOS QUE ENSEJARAM A AÇÃO ANULATÓRIA AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL

No dia 21 de dezembro de 2007, o agente fiscal do Ibama lavrou o Auto de Infração Ambiental e Termo de Embargo, originando o Processo Administrativo Ambiental, por entender que a Autora teria infringido o art. 2º, II e VII e art. 25 do Decreto 3.179/99, art. 38 e art. 70 da Lei 9.605/08 e art. 2º, “a” da Lei 4.771/65, assim descritos:

Decreto 3.179/99 (revogado)

Art. 2º As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções: […]
II – multa simples; […]
VII – embargo de obra ou atividade;
Art. 25. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Multa de R$1.500,00 (mil e quinhentos reais) a R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), por hectare ou fração.

Lei 9.605/08

Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.

Lei 4.771/65 (revogada)

Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de outro qualquer curso d’água, em faixa marginal cuja largura mínima será:
1 – de 5 (cinco) metros para os rios de menos de 10 (dez) metros de largura:
2 – igual à metade da largura dos cursos que meçam de 10 (dez) a 200 (duzentos) metros de distancia entre as margens;
3 – de 100 (cem) metros para todos os cursos cuja largura seja superior a 200 (duzentos) metros.
4 – de 30 (trinta) metros para os rios de menos de 10 (dez) metros de largura;
5 – de 50 (cinqüenta) metros para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinqüenta) metros de largura;
6 – de 100 (cem) metros para os cursos d’água que meçam entre 50 (cinqüenta) e 100 (cem) metros de largura;
7 – de 150 (cento e cinqüenta) metros para os cursos d’água que possuam entre 100 (cem) e 200 (duzentos) metros de largura; igual à distância entre as margens para os cursos d’água com largura superior a 200 (duzentos) metros;

1.1. Lavratura do auto de infração

Segundo o agente fiscal, a Autora estaria construindo uma casa residencial em área circundante a APA/Anhatomirim, danificando florestas considerada de preservação permanente (próximo à curso d’água e nascente) na Praia de Palmas, Município de Governador Celso Ramos/SC.

Ocorre que, antes mesmo de iniciar a construção, a Autora realizou a consulta de viabilidade e posteriormente teve seu projeto aprovado pela municipalidade, emitindo-se o competente alvará para construção de residência unifamiliar.

Ademais, o imóvel de propriedade da Autora objeto da autuação, está localizado em loteamento devidamente aprovado pela municipalidade, cadastrado na Prefeitura Municipal de Gov. Celso Ramos e registrado no Cartório de Imóveis da Comarca.

No entanto, o fiscal do IBAMA alegou que se tratava de área de preservação próxima a APA do Anhatomirim, autuou e embargou a obra da Autora erroneamente.

Contudo, sequer consta no auto de infração qual seria a vegetação danificada ou distância do aludido curso d’água ou nascente.

1.2. Defesa prévia

A defesa prévia apresentada tempestivamente, foi instruída com documentos suficientes a comprovar a legalidade da obra, dentre os quais destacam-se:

  1. Consulta de viabilidade de 13.03.2007;
  2. Aprovação do projeto arquitetônico de 18.04.2007;
  3. Alvará de licença para construção de 22.04.2007;
  4. O parecer da municipalidade emitido em 13.07.2007 atestando a inexistência de danos ambientais da obra.

Vê-se que, o auto de infração foi lavrado em data posterior a concessão de licenças e vistorias do Poder Público. Não era caso de autuação.

Em 15.04.2010 a autoridade julgadora homologou o auto de infração ambiental ambiental aplicando multa ambiental no valor de R$ 50.000,00, julgando improcedente a defesa prévia.

1.3. Recurso administrativo

Disso, foi interposto recurso administrativo, reiterando que a obra foi erigida à luz das normas ambientais e municipais, com aprovação de projeto e expedição do competente alvará de construção.

Entretanto, o recurso administrativo foi improvido, que assim como a decisão de primeira instância, sequer analisou as provas acostas pela Autora, e a condenou ao pagamento de multa administrativa e à demolição da edificação e recuperação da área supostamente degradada.

Intimada da decisão administrativa, a Requerente peticionou nos autos do processo administrativo requerendo o parcelamento da multa em 60 parcelas de R$ 1.215,00 com início em 08.05.2014, o que foi deferido pela autoridade ambiental conforme termo de compromisso firmado naqueles autos.

O acordo foi cumprido integralmente com o pagamento da 60ª parcela em 08.04.2019.

Contudo, em novembro de 2020 a Requerente foi intimada pelo IBAMA para reparar integralmente os supostos danos ambientais objeto do auto de infração ambiental, sob pena de infringir o art. 81 do Decreto 6.514/08[1], que prevê multa de R$ 1.000,00 a R$ 100.000,00 em caso de descumprimento.

Portanto, busca-se procedência da ação anulatória de auto de infração, porque o auto de infração ambiental lavrado em face da Autora é eivado de vício, conforme passa a demonstrar.

2. NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL

Ao lavrar o auto de infração ambiental, o agente fiscal indicou como norma infringida, o art. 25 do Decreto 3.179/99 que assim dispõe:

Art. 25. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Multa de R$1.500,00 (mil e quinhentos reais) a R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), por hectare ou fração.

O auto de infração foi homologado pela autoridade quando do julgamento e, por consequência, indeferida a defesa prévia. De igual modo, o recurso administrativo da Autora foi improvido e o auto mantido.

Ocorre que, nenhuma vegetação foi destruída para construção da residência. Há, no mínimo, um erro na tipificação da infração, até porque, consta que a edificação estaria em área circundante de unidade de conservação, quando não está!

À propósito, como mencionado ut retro, antes de iniciar a construção de sua residência, a Autora realizou consulta de viabilidade, e posteriormente, teve seu projeto arquitetônico aprovado, expedindo-se o competente alvará de licença para construção, e assim, cumpridas todas as etapas à luz das normas vigentes, foi concedido o “Habite-se”.

Não obstante, antes mesmo da lavratura do auto de infração, a municipalidade emitiu parecer atestando que a execução do projeto apresentado pela Autora não incidia em nenhum dano ao meio ambiente, e que se verificou uma área de preservação permanente à aproximadamente 40 metros distantes da área frontal do lote, o que não inviabilizaria a construção.

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Desconsiderando este e todos os outros documentos, o agente fiscal do Ibama lavrou genericamente o auto de infração por entender que a residência estaria sendo erigida em área circundante a APA/Anhatomirim, danificando floresta considerada de preservação permanente (próxima a curso d’água e nascente). Ocorre que a APA/Anhatomirim dista mais de 5 quilômetros do local objeto da infração.

2.1. Ausência de dano

Ora. Não basta a simples menção de construção em área próxima a APA, de modo que, a ocorrência do resultado naturalístico, ou seja, dano ambiental efetivo, deve ficar comprovada, ao passo que, se não houver a comprovação de dano, não há que se falar em infração administrativa.

Evidente que não houve a destruição de vegetação para construção do imóvel, mesmo porque, trata-se de loteamento aprovado pela municipalidade em que foram concedidas todas as aprovações e autorizações de acordo com a legislação vigente à época.

Também não é verdade que a casa estava sendo erigida próxima a curso d’água, porque a própria municipalidade emitiu o já mencionado Parecer, consignando que havia uma área de preservação permanente à aproximadamente 40 metros distantes da área frontal do lote, o que não inviabilizaria a construção. Tal área, possui declividade acentuada.

Importante destacar que o agente fiscal do Ibama apontou que a construção era irregular por estar em área circundante a APA/Anhatomirim, danificando florestas considerada de preservação permanente (próximo à curso d’água e nascente), mas não identificou a distância da edificação e o curso d’água e nascente.

Evidentemente, insuficiente dizer “próximo à curso d’água e nascente”, o que por si só, em razão da inexistência de precisa indicação acerca da metragem entre a construção e o curso d’água, cai por terra o ímpeto autuador.

E que nem se cogite que a autuação foi homologada pela autoridade ambiental em primeira instância e mantida em segunda, porque não houve o mínimo de análise da defesa prévia, do próprio recurso administrativo e muito menos das provas juntadas pela Autora, de modo que se torna imperativa a procedência da ação anulatória de auto de infração.

3. VALIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS – REGULAR CONCESSÃO DE ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO

Ao lavrar o auto de infração, o fiscal do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA desconsiderou totalmente os atos administrativos expedidos pela Prefeitura de Gov. Celso Ramos.

Dentre os quais, o alvará de construção e o próprio Parecer atestando que a execução do projeto apresentado pela Autora não incidia em nenhum dano ao meio ambiente.

Por outro lado, não há nos autos do processo administrativo, qualquer prova de ilegalidade na concessão de licenças e autorizações, corolário disso, é presumir-se legítimos e imperativos os atos administrativos. Nessa tessitura, valiosos são os ensinamentos de Marçal Justen Filho[2], que vaticina:

A presunção de legitimidade ao ato administrativo é um instrumento necessário à satisfação dos deveres inerentes à função administrativa. Como há encargos impostos ao Estado e fins que deve realizar, tem ele de dispor de instrumental jurídico compatível. 
Não seria possível ao Estado cumprir suas funções administrativas se lhe fosse reservada situação jurídica idêntica àquela dos particulares.
Se não houvesse a presunção de legitimidade do ato administrativo, o Estado teria de recorrer ao Poder Judiciário para obter provimento jurisdicional comprovando a legitimidade dos seus atos, e somente assim poderia vincular os terceiros.

3.1. Doutrina

Vale trazer à baila o conceito de ato administrativo, que segundo o professor Hely Lopes Meirelles[3], traduz-se em:

[…] toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria.

Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello[4], é a:

Declaração do Estado (ou de quem lhe faça às vezes – como, por exemplo, um concessionário de serviço público) no exercício de prerrogativas públicas, manifestada mediante providências jurídicas complementares da lei, a título de lhe dar cumprimento, e sujeitos a controle de legitimidade por órgão jurisdicional.

E, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro[5]:

Ato administrativo é “a declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário.

Por óbvio que tais conceitos abrangem os atos gerais e abstratos, como os regulamentos e instruções, e atos convencionais, como os contratos administrativos, licenças e autorizações.

3.2. Ato administrativo

O ato administrativo deve se pautar sempre no sistema jurídico vigente, sob pena de poder ser caracterizado como ilegal acaso descumprido o ordenamento. Entretanto, o regramento normativo pode ou não deixar margem de liberdade de decisão quanto ao aspecto da atuação do Poder Público, razão pela qual os tais atos podem ser classificados em: vinculativos e discricionários.

Em breve síntese, atos vinculativos são aqueles nos quais o regramento atinge os vários aspectos de uma atividade determinada, como o próprio nome já diz, ou seja, a expedição destes atos não comporta espaço para discussões de conveniência se deve ou não ser expedido, basta que os requisitos sejam preenchidos para que haja sua expedição/emissão.

Por outro lado, nos atos classificados como discricionários, o regramento não atinge todos os aspectos da atuação da administração, ou seja, são aqueles que terão sua expedição/emissão condicionada a uma análise e um estudo aprofundado, facultando-se ao Poder Público sua expedição/emissão ou não.

Diante dessas breves considerações, aclarada a questão conceitual, faz-se importante relembrar que o ato administrativo, quanto ao seu conteúdo, pode ser classificado em autorizações, licenças, admissões, permissões, aprovações, homologações, pareceres e vistos.

Pois bem. As licenças e autorizações administrativas ─ aqui, com enfoque naquelas concedidas à Autora autorizando a construção da edificação ─, possuem natureza jurídica de ato administrativo vinculado, como se pode verificar de alguns conceitos trazidos por renomados juristas de nosso ordenamento.

3.3. Conceitos da doutrina

Hely Lopes Meirelles[6]:

Licença administrativa é “o ato administrativo vinculado e definitivo pelo qual o Poder Público, verificando que o interessado atendeu a todas as exigências legais, faculta-lhe o desempenho de atividades ou a realização de fatos materiais antes vedados ao particular, como, por exemplo, o exercício de uma profissão, a construção de um edifício em terreno próprio”.

Celso Antônio Bandeira de Mello[7]:

Licença é o ato vinculado, unilateral, pelo qual a Administração faculta a alguém o exercício de uma atividade, uma vez demonstrado pelo interessado o preenchimento dos requisitos legais exigidos.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro[8]:

Licença administrativa é “o ato administrativo unilateral e vinculado pelo qual a Administração faculta àquele que preencha os requisitos legais o exercício de uma atividade”. 
Com isso, diz-se que a licença administrativa é um ato administrativo vinculado, ou seja, sua concessão dependerá do preenchimento de determinados requisitos previstos em lei, de maneira que não se admite a análise por parte da Autoridade Pública da conveniência ou não daquele ato.

E, no caso de licenças ou autorizações nada se difere. Possui ela natureza jurídica de ato administrativo vinculativo, portanto, sua concessão pressupõe validade, ao passo que não há espaço para discussões.

É dizer que, se a Autora possuía as competentes licenças para construir, não poderia um servidor do IBAMA lavrar auto de infração ambiental, quando a própria municipalidade reconheceu, por ato vinculativo, o preenchimento dos requisitos autorizadores para construir, daí que possível a procedência da presente ação anulatória de auto de infração.

Nessa linha, temos que todo ato administrativo deve ser considerado, a princípio, como realizado de acordo com a Lei e de acordo com a realidade.

Tanto o é, que o Superior Tribunal de Justiça[9] entende que “ato administrativo goza de presunção de legalidade que, para ser afastada, requer a produção de prova inequívoca […]”.

In casu, o agente do IBAMA que lavrou o auto de infração ambiental, sequer indicou qual era a suposta vegetação destruída ou a distância entre a edificação e o tal curso d’água ou nascente.

3.4. Legalidade do ato administrativo

Sendo assim, irrefutável a ilegalidade do auto de infração quando a edificação foi precedida de todas as licenças e autorizações. Nas palavras de Cassage, citado por Di Pietro[10]:

A presunção de legitimidade constitui um princípio do ato administrativo que encontra seu fundamento na presunção de validade que acompanha todos os atos estatais, princípio em que se baseia, por sua vez, o dever do administrado de cumprir o ato administrativo.

Não se pode lavrar auto de infração ambiental e termo de embargo desconsiderando os atos administrativos exarados pela municipalidade, mesmo porque, trata-se de auto de infração que sequer menciona a distância do imóvel objeto da infração da suposta área de preservação permanente, o que por si só, viola o direito ao contraditório e da ampla defesa.

E, como se verá mais adiante, as decisões da autoridade julgadora de primeira e segunda instância administrativa se basearam em pareceres e documentos totalmente omissos às provas apresentadas pela Autora.

Por fim, ressalte-se que as ações da administração pública na esfera municipal, estão dentro dos lindes da legalidade, não merecendo que o auto de infração lavrado seja considerado legal, de modo que, devem ser reconhecidas as licenças e autorizações concedidas para julgar procedente a ação anulatória de auto de infração e declarar nulo o auto de infração com a consequente extinção das obrigações impostas à Autora.

4. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO FLORESTAL À ZONA URBANAS

Não se desconhece que o Superior Tribunal de Justiça – STJ determinou o sobrestamento de todos os processos que tratam sobre a extensão da área não edificável a partir das margens do curso d’água natural em trechos de área urbana consolidada, que rendeu azo ao Tema n. 1010, assim delimitado:

Extensão da faixa não edificável a partir das margens de cursos d’água naturais em trechos caracterizados como área urbana consolidada: se corresponde à área de preservação permanente prevista no art. 4°, I, da Lei n. 12.651/2012 (equivalente ao art. 2°, alínea ‘a’, da revogada Lei n. 4.771/1965), cuja largura varia de 30 (trinta) a 500 (quinhentos) metros, ou ao recuo de 15 (quinze) metros determinado no art. 4°, caput, III, da Lei n. 6.766/1979.

No entanto, a discussão debatida no presente feito é a inaplicabilidade do art. 2°, alínea ‘a’, da revogada Lei n. 4.771/1965, vigente à época em que lavrado o auto de infração ambiental, porque a área objeto de autuação se trata de loteamento urbano e aprovado pela municipalidade. Além disso, inexistem cursos d’água, tão pouco naturais.

Já no tema afetado, discute-se se nas zonas de ocupação urbana consolidada se deve aplicar o artigo 4º, inciso I, do Código Florestal ou o artigo 4º, inciso III, da Lei de Uso e Parcelamento do Solo Urbano.

Assim, poderia até se cogitar “distinguishing” que autoriza o julgamento da causa independentemente da decisão do Superior Tribunal de Justiça acerca do Tema 1010. Mas de fato, a matéria destes autos é diferente porque não há nenhum curso d’água no local objeto da aludida infração.

4.1. O que diz o CPC

Além do mais, conforme disposição expressa do artigo 1.037, § 9º, do Código de Processo Civil:

“demonstrando distinção entre a questão a ser decidida no processo e aquela a ser julgada no recurso especial ou extraordinário afetado, a parte poderá requerer o prosseguimento do seu processo”.

Portanto, em razão da evidente distinção entre o caso aqui analisado e o tema afetado para julgamento de Recursos Especiais repetitivos pelo Superior Tribunal de Justiça (Tema 1010), não há porque falar em suspensão da demanda.

Pois bem. O parágrafo único do art. 2º da Lei 4.771/1965 que embasou o auto de infração dizia:

Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
Parágrafo único. No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal, e nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, obervar-se-á o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo.

Não se pode aplicar o atual Código Florestal pelo fato ocorrido no ano de 2006 em área consolidada, e mesmo que fosse possível, o seu artigo 4º, inciso I, alínea a, considera como área de preservação permanente, em zonas rurais ou urbanas, as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular.

4.2. Inaplicabilidade do Código Florestal

Vê-se que, a própria norma sugere a inaplicabilidade do regime de proteção previsto no Código Florestal aos cursos de água que correm por meios não naturais, porquanto não se enquadram no conceito da norma.

É que, a partir do momento em que um curso d’água deixa de correr pela calha natural, não há que se falar em borda que marca o início da zona ‘non aedificandi’. Além disso, deixam de existir “faixas marginais”, objeto da proteção.

Sendo assim, ainda que se considere a existência de margens de canais construídos pela ação do homem em loteamento devidamente aprovado e consolidado, sem afloramento natural, não se caracterizam como área de preservação permanente (APP).

Isso porque, para que as faixas marginais estejam sujeitas às normas de proteção, os cursos d’água precisam ser naturais.

Atento a essas peculiaridades, o legislador catarinense definiu que não são consideradas APPs, as áreas cobertas ou não com vegetação nas faixas marginais de cursos d`água não naturais, devido à realização de atividades de canalização, tubulação ou incorporação de cursos d`água a sistemas produtivos ou de drenagem urbana ou rural (artigo 119-C, IV, do Código Estadual do Meio Ambiente[11], Lei Estadual n. 16.342/14).

Ora, diante da clareza solar do Código Estadual do Meio Ambiente e da manifesta inaplicabilidade do Código Florestal Nacional, resta clara a inexistência de área de preservação ambiental e a consequente ilegalidade do auto de infração ambiental para julgar procedente a presente ação anulatória de auto de infração.

5. TUTELA DE URGÊNCIA PARA SUSPENDER A DECISÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO AMBIENTAL

O que se pretende com o pedido de tutela de urgência é tão somente suspender os efeitos do despacho que determinou a recuperação imediata da área, inclusive com a remoção da edificação erigida no ano de 2007, até o julgamento definitivo da ação anulatória de auto de infração.

O art. 300 do Código de Processo Civil assim dispõe sobre a tutela de urgência:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

Constata-se que o diploma processual estabelece que, para concessão da tutela de urgência, será necessário preencher cumulativamente os requisitos da probabilidade do direito e perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Sobre os requisitos, Luiz Guilherme Marinoni[12] anota:

A probabilidade que autoriza o emprego da técnica antecipatória para a tutela dos direitos é a probabilidade lógica – que é aquela que surge da confrontação das alegações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, sendo provável a hipótese que encontra maior grau de confirmação e menor grau de refutação nesses elementos. O juiz tem que se convencer de que o direito é provável para conceder a tutela.

In casu, os requisitos autorizados para concessão da tutela de urgência restam preenchidos.

5.1. Requisitos para concessão da tutela antecipada

A probabilidade do direito resta consubstanciada nos documentos acostos ao processo administrativo, que de forma cristalina evidenciam que a edificação foi erigida fora de unidade conservação ou zona de amortecimento; não está inserida em área de preservação permanente conforme Parecer Municipal;

Ainda, não houve destruição de vegetação conforme imagens colacionadas nesta peça; à época da construção, possuía todas as autorizações e licenças do Poder Público, que, inclusive, resultou na concessão do Habite-se, por atender todas às exigências legais.

Já o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo subsiste no fato de que o descumprimento das obrigações estabelecidas Ofício enviado a Autora poderá acarretar a aplicação de multa R$ 1.000,00 a R$ 1.000.000,00 por infringência do art. 80 do Decreto 6.514/2008, além da deflagração de ação civil pública para cobrança de indenização e imposição de reparar integralmente o suposto dano ambiental.

Ainda, o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo se faz presente diante da possibilidade iminente de o Réu demolir a residência da Autora, causando danos irreparáveis.

Além disso, a demolição é medida extrema que somente pode ser adotada em casos excepcionais, e se eventualmente ao final do processo se reconheça a legalidade da autuação, ainda assim, haverá a possibilidade de regularização, nos termos da Lei 13.465, de 2017.

Portanto, presentes os requisitos, requer a concessão de tutela de urgência para suspender, até o julgamento definitivo da ação anulatória de auto de infração…

continua...

 

 


 

[1] Art. 81. Deixar de apresentar relatórios ou informações ambientais nos prazos exigidos pela legislação ou, quando aplicável, naquele determinado pela autoridade ambiental: Multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais).

[2] Curso de direito administrativo. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 280.

[3] Direito administrativo brasileiro. 24 ed. São Paulo: Malheiros, 1999.

[4] Curso de direito administrativo. 21 ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

[5] Direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Atlas, 2012.

[6] Direito administrativo brasileiro. 24 ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 170.

[7] Curso de direito administrativo. 21 ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 418.

[8] Direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 236.

[9] AgRg no Resp n. 1137177/SP.

[10] Direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 206.

[11] http://leis.alesc.sc.gov.br/html/2009/14675_2009_lei.html

[12] MARINONI, Luiz Guilherme: Novo Código de Processo Civil comentado. 2ª ed. rev. atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. p 382.

Sobre o autor
Cláudio Farenzena

Escritório de Advocacia especializado e com atuação exclusiva em Direito Ambiental, nas esferas administrativa, cível e penal. Telefone e Whatsapp Business +55 (48) 3211-8488. E-mail: contato@advambiental.com.br.

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