ELÉTRICOS, GERAÇÃO DISTRIBUÍDA E O DIREITO AO ABASTECIMENTO

A eletrificação das frotas de veículos deve ser acompanhada por uma melhor regulamentação no Direito de Construir das Cidades.

21/09/2022 às 11:12
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O marco regulatório da geração distribuída, aliado à eletrificação da frota vai revolucionar o abastecimento dos veículos, e dessa forma abrir milhares de oportunidades na micro-distribuição de energia das cidades.

 

A eletrificação dos nossos veículos impõe diversos desafios regulatórios, embarcados nas inúmeras oportunidades do repensar desse modal logístico. Alguns desses desafios são permanantes pois evoluem conforme os modelos regulatórios avançam, a extrafiscalidade que desenha incentivos fiscais, fundamental para novas tecnologias,  pode definir o papel de toda uma cadeia de indústria como protagonista da transformação.

Como toda nova mudança sempre tem um espaço enorme para os céticos e gigante para os ignorantes, que enraivecidos por não encontrar o seu espaço no novo, torcem o nariz e procuram ver nos problemas e obstáculos o maior dos seus aliados.

Com a publicação da Resolução Normativa da ANEEL 482/12, permitindo que o consumidor brasileiro possa gerar sua própria energia elétrica a partir de fontes renováveis ou cogeração qualificada, podendo inclusive fornecer o excedente para a rede de distribuição de sua localidade, criou-se um potencial mercado de micro e pequenos geradores de energia, logo imagine esse segmento com a adoção dos veículos eletrificados, onde milhões de veículos no curto e médio prazo poderão ser abastecidos nas nossas garagens? Tente imaginar empresas com centrais de geração fotovoltaica e ou eólica em seus pátios abastecendo as suas frotas? São inovações que aliam economia financeira, consciência socioambiental e autossustentabilidade. A geração distribuída, além de reduzir o custo de abastecimento para milhões de pessoas, vai criar um redesenho completo em toda cadeia de logistica no mercado de combustível, que deve ficar muito diferente, logo os milhares de caminhões transportando combustível em nossas estradas devem ter seu volume reduzido, os oleodutos que transportam combustível devem ter sua vazão reduzida, e o Direito Urbanístico vai caminhar para regulamentação que torne obrigatória postos de reabastecimento desses veículos elétricos, sejam eles caminhões, motos, ou bicicletas, além é claro das frotas de carga comercial em toda moradia multifamiliar e comercial coletiva.

Outros benefícios são também identificados, como o adiamento de investimentos em expansão dos sistemas de transmissão e distribuição, o baixo impacto ambiental, a redução no carregamento das redes, com a minimização das perdas e a diversificação da matriz energética.

Ao mesmo tempo, com o objetivo de reduzir os custos e tempo para a conexão da microgeração e minigeração, bem como compatibilizar o Sistema de Compensação de Energia Elétrica com as condições gerais de fornecimento de energia, foi publicada a Resolução Normativa nº 1.000/2021 e a Resolução Normativa nº 687/2015, pela ANEEL que revisou a Resolução Normativa nº 482/2012, todas ampliando essa oportunidade que deve vir acompanhada de alterações em leis municipais.

Os céticos, torciam o nariz para os carros elétricos, criticando a sua autonomia, como ponto frágil e seu elevado custo, sabidamente todos são problemas contornáveis no médio prazo, seja pela escala ou por pequenas mudanças de hábito, afinal pergunte para uma pessoa que circula diariamente cerca de 40kms se ela não prefere abastecer seu carro em casa com energia gerada por ela mesma, ao invés de ir para os tradicionais postos de combustíveis? A escala é nesse caso, a senhora das soluções e das oportunidades, pois se as células tem hoje autonomia de mais de 360kms, isso nos carros elétricos de entrada, e podem ser reabastecidas em até 80% com uma breve parada para um lanche na estrada de 30 minutos, todo argumento será apenas com o propósito de atrasar essa transformação, que vai ocorrer mesmo com a oposição de muitos dinossauros da distribuição de combustível. O petróleo certamente continuará sendo usado mas a cada dia menos para combustível e mais para indústria química, bem mais rentável.

Empresas tradicionais que estão vendo na transformação elétrica a oportunidade já começam a colher os frutos do seu investimento, isso sem falar na Tesla a maior montadora em valor do mundo que produz por ano menos de uma semana do que a GM produz, ou isso não é argumento suficiente para entender para o onde vai essa indústria?

A alemã BMW, já está trabalhando em uma nova geração de baterias, a sexta, que chegará em 2025 com 30% mais autonomia e 50% mais barata, ao mesmo que já começou a produzir sistemas de células de combustível para o BMW iX5 Hydrogen, ainda que no momento eles só serão usados para fins de desenvolvimento e demonstração.

A preocupação com o meio ambiente, vai na alteração da matriz energética, e segue também quando a fabricante anuncia o lançamento dos primeiros modelos BMW e Mini com interiores totalmente veganos e sem couro em 2023, além de em 2025 começar a fabricar peças com plástico reciclado a partir de redes de pesca, material que responderá por 30% do total.

Suas novas bateria, que são mais baratas, reduzem as emissões de CO2 na produção celular em até 60%, vão ainda melhorar a velocidade de carregamento em 30%, o que vai permitir uma autonomia de mais de 1.000 quilômetros, embora o peso comprometeria muito as qualidades dinâmicas dos veículos, o que vai obrigar uma posição de equilíbrio entre autonomia e peso.

As novas células que são cilíndricas, têm um diâmetro de 46 mm e podem ser de duas alturas diferentes (95 ou 120 mm), dependendo do modelo ou versão do carro. A química das células é do tipo NCM (níquel, cobalto, manganês) e o cátodo tem uma porcentagem maior de níquel e menos quantidade de cobalto, enquanto o ânodo é rico em silício. Além disso, para melhorar o uso do espaço, as embalagens carecem de módulos, uma revolução que acompanha toda a indústria, não é a toa que a Vale, a maior mineradora do mundo, pretende segregar os seus ativos de mineração destinados à indústria automobilística elétrica, em uma empresa distinta e abrir seu capital separadamente.

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A eletrificação depende sim de políticas de Estado, que apontam direções, e devem ser realizadas conjuntamente por todos os entes federativos.

Muitos países no mundo já estão avançados como no caso da Noruega, Holanda, Reino Unido e Áustria, segundo um levantamento da Leaseplan, que criou o Índice de Prontidão para Veículos Elétricos (EV Readiness Index). De acordo com o levantamento, publicado pelo Jornal Estadão, o ranking considera avanços em veículos elétricos, estrutura para recarga e custo total.

O Brasil não aparece entre os 20 países do ranking, de acordo com o levantamento. Em quinto lugar surge a Suécia, seguida da Bélgica, Finlândia, Alemanha, Luxemburgo e Irlanda.

O ranking avalia, também, a quantidade de pontos de recarga em relação à população. Além disso, verifica os locais em comparação ao número de veículos e à disponibilidade de carregadores rápidos (DCS) e ao tamanho das rodovias do país. Em custos, são considerados incentivos governamentais, preço da energia, impostos e valor do aluguel mensal de veículos elétricos.

Uma outra referência sobre a importância desse mercado pode ser vista na fabricante de veículos elétricos Zhejiang Leapmotor Technology que deve cerca US$ 1 bilhão no que seria o maior IPO de Hong Kong este ano, a empresa utiliza a tecnologia CTC (Cell to Chassis), considerada uma das chaves do futuro dos carros elétricos, com o propósito de tornar os carros elétricos mais leves, baixando o seu peso consideravelmente, o que representa maior autonomia.

Toyota e Tesla são dois dos fabricantes que estão trabalhando nesta tecnologia, mas foram os chineses que avançaram, um feito da Leapmotor no seu modelo C01, o primeiro modelo que pode ostentar a avançada tecnologia CTC. Esta técnica permite integrar as células das baterias diretamente no piso da plataforma, o que assegura uma importante redução de peso, já que se elimina a caixa da bateria. Além disso, permite alojar mais células chegando inclusive até os eixos, além de aumentar a segurança da mesma ao encontrar-se protegida pela própria estrutura.

Como se isso não bastasse, o C01 aspira ser comercializado no ocidente no segundo semestre de 2022, estreando também o primeiro motor elétrico refrigerado a óleo por demanda. Uma unidade que desenvolve uma potência máxima de 200 kW, equivalentes a 272 cv, embora a marca ofereça uma versão topo de linha com duas unidades e 400 kW, nada menos que 544 cv. As duas estarão equipadas com uma bateria com capacidade de 90 kWh, o que significa que sua autonomia máxima se eleva até os 717 quilômetros, segundo o ciclo NEDC.

A Leapmotor planeja levantar até 8,1 bilhões de dólares de Hong Kong (US$ 1 bilhão) vendendo cerca de 131 milhões de ações em Hong Kong, com preços entre HK$ 48 milhões e HK$ 62 cada. O IPO seria o maior este ano em Hong Kong, onde houve apenas dois IPOs que ultrapassaram US$ 1 bilhão. No entanto, ambas foram vendas secundárias de ações por empresas já listadas nas bolsas de valores chinesas. O fornecedor de componentes de baterias Tianqi Lithium, que levantou US$ 1,7 bilhão em julho, e o China Tourism Duty Free, que arrecadou US$ 2,1 bilhões no mês passado.

A Leapmotor recebeu apoio significativo de grandes investidores. Fundos de investimento estatais, como o Jinhua Industrial Fund e o Zhejiang Industrial Fund, juntamente com outros três investidores de referência, prometeram comprar ações no valor de cerca de US$ 308 milhões, o que corrobora com a lógica de que novas tecnologias dependem da boa vontade estatal.

Carros elétricos aliado a geração distribuída devem provocar uma revolução no abastecimento e no compartilhamento de dados, afinal esses carros podem ser abastecidos no quintal da casa de qualquer pessoa ou empresa, logo imagine se os dados são compartilhados, e você indo da sua casa para o centro da cidade recebe por aplicativo, que sabe o seu destino uma oferta do melhor estacionamento com a melhor condição de abastecimento? Pense no potencial dessas informações compartilhadas e claro dos requisitos mínimos previstos em lei para segurança desses dados compartilhados.

Sobre o autor
Charles M. Machado

Charles M. Machado é advogado formado pela UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, consultor jurídico no Brasil e no Exterior, nas áreas de Direito Tributário e Mercado de Capitais. Foi professor nos Cursos de Pós Graduação e Extensão no IBET, nas disciplinas de Tributação Internacional e Imposto de Renda. Pós Graduado em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Salamanca na Espanha. Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários, onde também é palestrante. Autor de Diversas Obras de Direito.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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