De Pitágoras a Platão – A jurimetria na atual era digital

27/09/2022 às 14:26
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Como a utilização de métodos matemáticos e a estatística podem auxiliar na resolução de demandas em recursos repetitivos e a sobrecarga do judiciário.

Exatas e Humanas sempre foram matérias distintas por essência e significação, o principal método de distinção na escolha universitária era e ainda é a natural inclinação humana a uma das ciências. A Matemática, anciã das anciãs, data desde o Antigo Egito e Império Babilônico (3500 a.C); enquanto as ciências Humanas e suas subdivisões (Língua Portuguesa, Língua Estrangeira, História, Geografia, Filosofia, Sociologia e Direito) nascente frente a necessidade de interação humana, delimitação de limites e formas governamentais; sendo a primeira tradição legal originada na Mesopotâmia (séc XVIII a.C) o Código de Hamurábi. Mas qual seria a possibilidade de união fortuna destas duas ciências? Para a era digital, em linguagem binária, isto é possível.

O termo hodierno, mas já conhecido como campo de estudo desde 1960, a Jurimetria, agrega conhecimentos algébricos e estatísticos aplicados a ciência jurídica. A frente de seu tempo, o jurista americano Lee Loevinger, militando no Direito da Concorrência, trouxe o termo pela primeira vez em seu artigo Jurimetrics: the methodology of legal in inquiry; a posteriori, o professor americano da universidade de Cornell Law School, agregou um método próprio a Jurimetria, baseando-se no método empírico de verificação de veracidade.

Por definição, entende-se pela etimologia da palavra Jurimetria (juri direito, metria medida) medir o direito, constatar as probabilidades de ocorrência de certa demanda por intermédio do método quantitativo (repetição, volume). É fato notório a sobrecarga judiciária e a conhecida expressão massificada na área jurídica; a atuação das Exatas seria um difusor de águas desta problemática, por intermédio da Estatística (descritiva e inferencial) esse estudo seria materializado em um programa de computador, capaz de organizar os processos por área de concentração, partes, matéria e qualquer outra definição desejada pelo usuário (campo de pesquisa).

Por intermédio dos estudos do jurista Marcelo Guedes Nunes, sendo matéria de sua tese de doutorado, orientado pelo professor Fabio Ulhoa Coelho; o termo Jurimetria se fez conhecido em âmbito nacional; a pesquisa se expandiu com a criação da Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ) entidade sem fins lucrativos fundada em 2011, união de pesquisadores da área de direito, matemática e estatística afim de fomentar os estudos e sua aplicabilidade prática na melhora da prestação jurisdicional brasileira. O projeto Senado em Números (elaborado pela FGV Direito Rio) é um exemplo da aplicabilidade prática destes estudos, gerindo a análise de perfil de atuação do STF em matéria tributária de 1988 até 2018; foi possível uma análise quantitativa referente a incidência temática: ICMS, crédito tributário e contribuição social; e quanto a parte ativa da demanda: União como autora do maior número de demandas em decorrência da maior carga tributária.

Em matéria penal, o Conselho Nacional de Justiça disponibilizou o Relatório Analítico Propositivo Justiça e Pesquisa: Justiça Criminal, Impunidade e Prescrição, pesquisa realizada em conjunto com a Associação Brasileira de Jurimetria e o núcleo de estudos de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo; entre os principais objetivos deste estudo, destaca-se a visibilidade do panorama da persecução penal à corrupção no Brasil com base nas decisões dos principais tribunais estaduais (TJRJ, TJSP, TRF, TRF2 e TRF3). A maior incidência de decisões com base em extinção da punibilidade, verifica-se no TJSP; absolvições pelo TJRJ e condenações pelos TRF3, TRF1 e TJRJ; no que se refere a instauração de inquéritos policiais, verificou-se a solução de 95% dos procedimentos, um contraste relevante frente a opinião pública da sensação de ineficácia jurídica em matéria penal.

Apesar dos resultados positivos da utilização da Jurimetria frente a otimização da administração de tribunais, elaboração de carteiras processuais, controle legislativo e pesquisas acadêmicas; a matéria é ainda considerada tão somente como um ramo de estudo do Direito, e não como uma via efetiva de solução de sobrecarga jurisdicional; a antiga dialética: humanas vs exatas (jurista vs jurimetrista) se faz presente. Seria possível a substituição de magistrados, promotores, defensores, advogados e demais auxiliares da justiça frente a moderna e desenvolta era digital? Evidente que não!

O receio inicial de uma utilização desproporcional desta tecnologia, de modo a automatizar decisões judiciais não seria uma realidade plausível, frente a principal característica necessária a todo operador do Direito: o olhar humano. A automação refere-se tão somente a fase inicial processual, equivalente a fase saneadora do processo, na verificação dos requisitos obrigatórios e essenciais a propositura da ação; no que se refere a fase decisória e atos do juiz, a essência da matéria de humanas seria mantida.

Desde a antiguidade, filósofos e pensadores reservavam parte de sua existência a elucidar as tribulações humanas; entre eles, Pitágoras de Samos em sua máxima tudo é número já vislumbrando uma visão do futuro em linguagem binária; a matemática e suas elementares, nos ajudariam na resolução de parte da problemática de otimização processual, maior organização e projeção de demandas, certificação digital, audiências digitais; sobretudo no período pandêmico. É natural do ser humano a desconfiança e descréditos iniciais a novas idéias e projetos, mas destituir a credibilidade dos avanços tecnológicos em decorrência de possíveis erros humanos é colocar entraves a evolução.

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O que diria Platão daqueles que ainda tem receio em sair da caverna?

Sobre a autora
Camila Falkowski

Advogada. Graduada em Direito pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (2017). Pós Graduada em Direito Digital e Proteção de Dados pela Escola Brasileira de Direito - EBRADI (2023). Pós Graduada em Perícia Cível e Criminal pela Instituição Verbo Jurídico (2020). Pós Graduada em Direito e Processo Penal pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (2020). Membro Efetivo Regional da Comissão da Mulher Advogada - OAB/SP. Autora de artigos jurídicos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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