Relações de parentesco

28/09/2022 às 17:14
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Resumo: O presente artigo tem como objeto estudar as relações de parentesco sob a égide do Direito Constitucional, do Código Civil e do Estatuto da Criança e do Adolescente. O tema abrange parentesco e suas definições: filiação, reconhecimento de filho, adoção e poder familiar. Procuramos no desenvolvimento do trabalho conceituar família no ordenamento jurídico e abordar a crescente evolução social e jurídica acerca do tema. Continuamos na análise do conceito tradicional e expandindo para o conceito de novas formas de organização familiar da atualidade, onde convivem o pluralismo, o respeito e em valores que se caracterizam mais no afeto e na identidade pessoal. O tema está intrinsicamente ligado aos direitos da pessoa, à dignidade humana, de ter suas escolhas respeitadas e gera efeitos diretos na composição familiar, na parentalidade e consequências patrimoniais. O estudo implica em uma abordagem doutrinária e jurisprudencial acerca de importantes questões atinentes ao tema que tem sido discutida em sociedade e colocada aos Tribunais para decisões. Neste contexto trataremos do DNA como prova biológica da paternidade e do entendimento paulatino da jurisprudência em reconhecer a importância do vínculo afetivo.


CONCEITO DE PARENTESCO E MODALIDADES

As relações de parentesco encontram-se descritas no subtítulo II do Livro IV do Direito de Família, nos arts. 1.591 a 1.595 do Código Civil1

Segundo Maria Helena Diniz a relação de parentesco pode ser definida como:

O vínculo existente entre pessoas que descendem umas das outras, mesmo tronco comum, mas também entre cônjuge ou companheiro e os parentes do outro e entre adotante e adotado.

Silvio de Salvo Venosa 2define o instituto afirmando que:

O parentesco é o vínculo que une duas ou mais pessoas, em decorrência de uma delas descender da outra ou de ambas procederem de um genitor comum.

Pontes de Miranda3 conceitua parentesco como:

A relação que vincula entre si pessoas que descendem umas das outras, ou de autor comum, que aproxima cada um dos cônjuges dos parentes do outro, ou que se estabelece, por fictio iuris, entre o adotado e o adotante

A Constituição Federal no artigo 227, § 6º atribui aos filhos adotivos, aos havidos fora do casamento e aos de outra origem, os mesmos direitos e deveres da filiação biológica.

1 Art. 1.591. São parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as outras na relação de ascendentes e descendentes.

Art. 1.592. São parentes em linha colateral ou transversal, até o quarto grau, as pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra.

Art. 1.593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem.

Art. 1.594. Contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na colateral, também pelo número delas, subindo de um dos parentes até ao ascendente comum, e descendo até encontrar o outro parente.

Art. 1.595. Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade.

§ 1o O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro.

§ 2o Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável.

2 Direito Civil: direito de família, Atlas, 2011, p. 215

3 Apud Gonçalves, Carlos Roberto. 2011, p. 309

Portanto, três são as modalidades de parentesco:

  1. Parentesco consanguíneo ou natural nas hipóteses em que há vinculo biológico ou de sangue (ancestral comum).
  2. Parentesco por afinidade existente entre o cônjuge ou companheiro e os parentes do outro cônjuge ou companheiro (art. 1.595, CC). Exemplos: sogro e nora, sogra e genro, padrasto e enteada, madrasta e enteado e assim sucessivamente linha reta -, bem como os cunhados linha colateral.

Na linha reta o parentesco permanece nas hipóteses de dissolução do casamento ou da união estável.

  1. Parentesco civil tradicionalmente, decorre da adoção. Contudo, atribui- se no termo outra origem, citado pelo artigo 1593 do Código Civil duas outras formas de parentesco civil: o parentesco decorrente de técnica de reprodução assistida heteróloga (material genético de terceiro) e a parentalidade socioafetiva (Enunciados 103 e 256, CJF/Superior Tribunal de Justiça4).

CONTAGEM DO PARENTESCO CONSANGUÍNEO

Importante consignar que o vínculo de parentesco estabelece-se por linhas e a contagem se faz por graus.

O parentesco pode se dar por linha reta ascendente ou descendentes (artigo 1591 do Código Civil) ou por linha colateral (artigo 1592 do Código Civil).

São parentes em linha reta os ascendentes e descendentes que têm origem no mesmo tronco comum (art. 1.591, CC).

4 Enunciado 103, CJF/STJ: Art. 1.593: o Código Civil reconhece, no art. 1.593, outras espécies de parentesco civil além daquele decorrente da adoção, acolhendo, assim, a noção de que há também parentesco civil no vínculo parental proveniente quer das técnicas de reprodução assistida heteróloga relativamente ao pai (ou mãe) que não contribuiu com seu material fecundante, quer da paternidade socioafetiva, fundada na posse do estado de filho.

Enunciado 256, CJF/STJ: Art. 1.593: A posse do estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalidade de parentesco civil.

Para a contagem dos graus de parentesco, devem ser contados os números de gerações à medida que se sobre ou se desce na escada sucessória (art. 1.594, CC).

São parentes colaterais aqueles que não estão na relação de ascendência e descendência (art. 1.592, CC).

Para contagem do grau de parentesco colateral, deve-se subir na cadeia sucessória até o ascendente comum e depois descer até encontrar o parente (art. 1.594, CC). O Código Civil admite como parente o parentesco colateral até quarto grau.

O parentesco gera inúmeros efeitos jurídicos em várias áreas do direito, como por exemplo, no direito processual civil, que prevê o impedimento do cônjuge, ascendentes, descendente e colateral até terceiro grau para depor como testemunha.

No direito penal, o efeito jurídico do parentesco decorre do agravamento das penas, quando o crime é praticado contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge.

No direito administrativo a relação de parentesco também produz efeitos ao restringir a ocupação de determinados cargos por parentes.

No Direito Civil, o professor Carlos Roberto Gonçalves5 descreve algumas consequências jurídicas do parentesco em linha reta:

De assistir, criar e educar os filhos menores, imposto aos pais pelo art. 229 da Constituição Federal, que também atribui aos filhos maiores o encargo de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade; o direito deferido aos parentes, no art.1624 do código civil, de pedirem uns aos outros os alimentos de que necessitam para viver de modo compatível com a sua condição social; a indicação dos descendentes e ascendentes, no art. 1845; a inclusão da aludida relação no rol dos impedimentos absolutos à realização do casamento, em consequência do vínculo de consanguinidade etc.

No que tange ao parentesco colateral, outras são as consequências jurídicas, citadas pelo professor Carlos Roberto Gonçalves:

O parentesco colateral acarreta, até o terceiro grau inclusive, impedimento para o casamento (artigo 1521, inciso IV do Código Civil); a obrigação de pagar alimentos aos parentes necessitados extensiva aos irmãos, que são colaterais de segundo grau (artigo 1697); o chamamento para suceder somente dos colaterais até o quarto, no âmbito do direito das sucessões (art. 1839), bem como a adoção do princípio de que os mais próximos excluem os mais remotos (art. 1840).

5 Gonçalves, Carlos Roberto, 2011, p.313

FILIAÇÃO

É o vínculo jurídico existente entre pais e filhos, regido esse vínculo pela isonomia, pois todos os filhos são iguais (art. 227, §6º, CF6, e art. 1.596, CC7).

O art. 1.5978, do Código Civil, traz as antigas presunções de paternidade ao lado de presunções que decorrem de técnicas de reprodução assistida.

6 Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

(...)

§ 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

7 Art. 1596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

8 Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

  1. - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;
  2. - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;
  3. - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;
  4. - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga;
  5. - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.

O Código Civil presume a filiação legítima com base na probabilidade (incisos I e II do artigo 1597 9do CC) e em dados científicos ( inciso II, IV e V do artigo 1597 do CC)

Nos termos do art. 1.597, do Código Civil, presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

  • nascidos 180 dias pelo menos depois de estabelecida a convivência conjugal.
    • Filhos nascidos nos 300 dias subsequentes á dissolução da sociedade conjugal por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento.
    • Os filhos havidos por fecundação artificial homóloga (com material genético dos cônjuges), mesmo que falecido o marido.

Essa presunção é relativa ou iuris tantum, pois contempla exceções (artigo 1598 e 1599 do Código Civil). O exame de DNA é prova cabal de paternidade.

  • Filhos havidos a qualquer tempo em se tratando de embriões excedentários decorrentes de concepção artificial homóloga. Esses embriões são aqueles que não foram utilizados na técnica de reprodução assistida e que estão congelados na clínica correspondente.

O art. 5º, da Lei de Biossegurança prevê que após três anos do congelamento é possível utilizar suas células embrionárias para fins científicos ou terapêuticos, desde que haja autorização dos genitores.

  • Filhos havidos por inseminação artificial heteróloga (com material genético de terceiro) desde que tenha prévia autorização do marido. Sem a manifestação do marido a presunção resta afastada.

O art. 1.52910 prevê que a impotência generandi (para gerar filhos) afasta a presunção relativa de paternidade.

9 Art. 1.598. Salvo prova em contrário, se, antes de decorrido o prazo previsto no inciso II do art. 1.523, a mulher contrair novas núpcias e lhe nascer algum filho, este se presume do primeiro marido, se nascido dentro dos trezentos dias a contar da data do falecimento deste e, do segundo, se o nascimento ocorrer após esse período e já decorrido o prazo a que se refere o inciso I do art. 1597.

10 Art. 1.529. Tanto os impedimentos quanto as causas suspensivas serão opostos em declaração escrita e assinada, instruída com as provas do fato alegado, ou com a indicação do lugar onde possam ser obtidas.

Maria Helena Diniz11 afirma que a impotência pode ser tanto a coeundi (inaptidão para a prática do ato sexual) como a generandi (esterilidade).

Segundo entendimento majoritário da doutrina, o artigo 1529 não se aplica a impotência coeundi ou instrumental.

Porém, a infidelidade da mulher ou a sua confissão não afasta a presunção de paternidade (arts. 1.60012 e 1.60213).

Maria Helena Diniz citando Barros Monteiro14, admite o adultério como prova complementar para ilidir a presunção paterno filial.

Caio Mário da Silva Pereira sustenta15:

Não tem sentido manter-se a presunção da paternidade quando se comprove o adultério, se não foi aliado a outras provas que demonstram o efetivo desrespeito ao cônjuge.

Nem mesmo a confissão materna basta para excluir para excluir a paternidade

Sempre deve prevalecer a declaração feita no registro, sem prejuízo da possibilidade de se ingressar com a ação reivindicatória de paternidade fundada no art. 1.604, do Código Civil16.

1 Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito de Família, 2002, p. 389

12 Art. 1.600. Não basta o adultério da mulher, ainda que confessado, para ilidir a presunção legal da paternidade.

13 Art. 1.602. Não basta a confissão materna para excluir a paternidade.

14 Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito de Família, 2011, p. 389

15 Instituições de Direito Civil. Direito de Família, Forense, 2004, p. 329

16 Art. 1.604. Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando- se erro ou falsidade do registro.

A prova da filiação é feita pela Certidão de Nascimento (art. 1.603, CC17), devendo-se levar em conta a parentalidade socioafetiva (Enunciado 108, CJF/STJ18).

O art. 1.601, do Código Civil19, estabelece a possibilidade do marido contestar os filhos havidos de sua mulher, sendo tal ação imprescritível.

Segundo e Enunciado 258 do CJF/STJ, não cabe a ação prevista no artigo 1601 do Código Civil se a filiação tiver origem em procriação assistida heteróloga, autorizada pelo marido nos termos do inc. V do art. 1.597, cuja paternidade configura presunção absoluta.

Os Tribunais tem se posicionado de duas maneiras na investigação de paternidade. A primeira e mais ultrapassada posiciona o resultado do exame de DNA como rainha das provas em detrimento as previsões legais, de forma que a verdade biológica prevalece sobre a verdade fictícia.

A respeito citamos o julgamento proferido no Superior Tribunal de Justiça, acerca do

tema:

Direito civil. Família. Recurso especial. Ação negatória de paternidade. Exame de DNA. - Tem-se como perfeitamente demonstrado o vício de consentimento a que foi levado a incorrer o suposto pai, quando induzido a erro ao proceder ao registro da criança, acreditando se tratar de filho biológico. - A realização do exame pelo método DNA a comprovar cientificamente a inexistência do vínculo genético, confere ao marido a possibilidade de obter, por meio de ação negatória de paternidade, a anulação do registro ocorrido com vício de consentimento. - A regra expressa no art. 1.601 do CC/02, estabelece a imprescritibilidade da ação do marido de contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher, para afastar a presunção da paternidade. - Não pode prevalecer a verdade fictícia quando maculada pela verdade real e incontestável, calcada em prova de robusta

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17 Art. 1.603. A filiação prova-se pela certidão do termo de nascimento registrada no Registro Civil.

18 Enunciado 108, CJF/STJ: Art. 1.603: no fato jurídico do nascimento, mencionado no art. 1.603, compreende- se, à luz do disposto no art. 1.593, a filiação consangüínea e também a socioafetiva.

19 Art. 1.601. Cabe ao marido o direito de contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher, sendo tal ação imprescritível.

Parágrafo único. Contestada a filiação, os herdeiros do impugnante têm direito de prosseguir na ação.

certeza, como o é o exame genético pelo método DNA. - E mesmo considerando a prevalência dos interesses da criança que deve nortear a condução do processo em que se discute de um lado o direito do pai de negar a paternidade em razão do estabelecimento da verdade biológica e, de outro, o direito da criança de ter preservado seu estado de filiação, verifica-se que não há prejuízo para esta, porquanto à menor socorre o direito de perseguir a verdade real em ação investigatória de paternidade, para valer-se, aí sim, do direito indisponível de reconhecimento do estado de filiação e das conseqüências, inclusive materiais, daí advindas. Recurso especial conhecido e provido. (STJ - REsp: 878954 RS 2006/0182349-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 07/05/2007, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 28.05.2007 p. 339)

Contudo, uma nova corrente tem ganhado força, não admitindo a negatória de paternidade quando há vínculos de afetividade entre o pai duvidoso e o filho, prevalecendo o vínculo afetiva sobre o vínculo biológico.

A respeito:

NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. IMPROCEDÊNCIA. PATERNIDADE

SOCIOAFETIVA. Ainda que o autor, pai registral, não seja o pai biológico da ré, mantém-se a improcedência da ação negatória se estabelecida a paternidade socioafetiva entre eles. Em se tratando de relação de filiação não se pode compreender que seja descartável, ao menos em casos como o presente onde efetivamente se estabeleceu a afetividade, e a ré nasceu e formou sua personalidade tendo como pai o autor. Apelação desprovida. (Apelação Cível Nº 70018465104, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 04/10/2007).

RECONHECIMENTO DE FILHO

Antes da Constituição Federal de 1988, os filhos havidos fora do casamento eram tidos como ilegítimos e podiam ser naturais ou espúrios. Com a equiparação constitucional entre os filhos, essa classificação perdeu o sentido. A filiação fora do casamento exige o reconhecimento, voluntário ou judicial, porque nestes casos não há a presunção de paternidade.

Duas são as modalidades de reconhecimento de filho.

  1. Reconhecimento Voluntário ou Perfilhação (arts. 1.607 a 1.617, CC20)

É possível o reconhecimento voluntário nas hipóteses do art. 1.609 do Código Civil, quais sejam: no registro do nascimento, por instrumento público ou escrito particular, por

20 Art. 1.607. O filho havido fora do casamento pode ser reconhecido pelos pais, conjunta ou separadamente.

Art. 1.608. Quando a maternidade constar do termo do nascimento do filho, a mãe só poderá contestá-la, provando a falsidade do termo, ou das declarações nele contidas.

Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito: I - no registro do nascimento;

II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório; III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;

IV - por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.

Art. 1.610. O reconhecimento não pode ser revogado, nem mesmo quando feito em testamento.

Art. 1.611. O filho havido fora do casamento, reconhecido por um dos cônjuges, não poderá residir no lar conjugal sem o consentimento do outro.

Art. 1.612. O filho reconhecido, enquanto menor, ficará sob a guarda do genitor que o reconheceu, e, se ambos o reconheceram e não houver acordo, sob a de quem melhor atender aos interesses do menor.

Art. 1.613. São ineficazes a condição e o termo apostos ao ato de reconhecimento do filho.

Art. 1.614. O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação.

Art. 1.615. Qualquer pessoa, que justo interesse tenha, pode contestar a ação de investigação de paternidade, ou maternidade.

Art. 1.616. A sentença que julgar procedente a ação de investigação produzirá os mesmos efeitos do reconhecimento; mas poderá ordenar que o filho se crie e eduque fora da companhia dos pais ou daquele que lhe contestou essa qualidade.

Art. 1.617. A filiação materna ou paterna pode resultar de casamento declarado nulo, ainda mesmo sem as condições do putativo.

testamento, legado ou codicilo, por manifestação direta a qualquer juiz (investido no cargo) ainda que esse não seja o objeto da demanda.

O reconhecimento de filhos gera efeitos de ordem moral e patrimonial.

O reconhecimento de filho é sempre irrevogável ainda que a manifestação seja feita em testamento (art. 1.610, CC).

É ainda possível reconhecer como filho, o nascituro (teoria concepcionista) ou filho já falecido, desde que ele tenha deixado descendentes (reconhecimento post mortem).

Segundo o autor Marcos Bernardes de Mello, o reconhecimento de filho é ato jurídico stricto sensu, pois seus efeitos decorrem de lei.

Trata-se de um ato jurídico unilateral com efeitos retroativos.

Cumpre destacar que o reconhecimento de filho maior, necessita de seu expresso reconhecimento (art. 1.614, CC).

Já o filho menor tem um prazo decadencial de 4 (quatro) anos a contar da maioridade ou da emancipação para impugnar a paternidade, artigo 1614 do Código Civil.

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que esse prazo decadencial não se aplica, pois a ação de impugnação envolvendo ações de estado é imprescritível.

A respeito:

FAMÍLIA. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. NEGATÓRIA DE FILIAÇÃO. PETIÇÃO DE HERANÇA. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. PRESCRIÇÃO. DECADÊNCIA. ECA. - O filho nascido na

constância do casamento, tem legitimidade para propor ação para identificar seu verdadeiro ancestral. A restrição contida no Art. 340 do Código Beviláqua foi mitigada pelo advento dos modernos exames de D.N.A. - A ação negatória de paternidade atribuída privativamente ao marido, não exclui a ação de investigação de paternidade proposta pelo filho contra o suposto pai ou seus sucessores. - A ação de investigação de paternidade independe do prévio ajuizamento da ação anulatória de filiação, cujo pedido é apenas conseqüência lógica da procedência da demanda investigatória. - A regra que impõe ao perfilhado o prazo de quatro anos para impugnar o reconhecimento, só é aplicável ao filho natural que visa afastar a paternidade por mero ato de

vontade, a fim de desconstituir o reconhecimento da filiação, sem buscar constituir nova relação. - É imprescritível a ação de filho, mesmo maior, ajuizar negatória de paternidade. Não se aplica o prazo do Art. 178, § 9º, VI, do Código Beviláqua.(STJ - REsp: 765479 RJ 2005/0053265-5, Relator: Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Data de Julgamento: 07/03/2006, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação:-- DTPB:

20060424/br. DJ 24/04/2006 p. 397)

O reconhecimento de filho não pode ser sujeito a condição ou a termo, sendo estes ineficazes (art. 1.613, CC). Vale o reconhecimento.

  1. Reconhecimento Judicial

O reconhecimento judicial é possível por meio da ação investigatória de paternidade ou maternidade.

A ação investigatória de paternidade ou maternidade é imprescritível (art. 27, ECA21, e Súmula 149, STF22). A prova é baseada essencialmente no exame de DNA, em que há busca da verdade biológica, tida pelo Superior Tribunal de Justiça como um direito fundamental (REsp 883.712/RS).

RECURSO ESPECIAL Nº 833.712 - RS (2006/0070609-4)

DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE E MATERNIDADE. VÍNCULO BIOLÓGICO. VÍNCULO SÓCIO-AFETIVO. PECULIARIDADES.

  • A adoção à brasileira, inserida no contexto de filiação sócio-afetiva, caracteriza-se pelo reconhecimento voluntário da maternidade/paternidade, na qual, fugindo das exigências legais pertinentes ao procedimento de adoção, o casal (ou apenas um dos cônjuges/companheiros) simplesmente registra a criança como sua filha, sem as cautelas judiciais impostas pelo Estado, necessárias à proteção especial que deve recair sobre os interesses do menor.
  • O reconhecimento do estado de filiação constitui direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, que pode ser exercitado sem qualquer restrição, em face dos pais ou seus herdeiros.
  • O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, estabelecido no art. 1º, inc. III, da CF/88, como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, traz em seu bojo o direito à identidade biológica e pessoal.

21 Art. 27. O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de Justiça.

22 Súmula 149, STF: É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança.

  • Caracteriza violação ao princípio da dignidade da pessoa humana cercear o direito de conhecimento da origem genética, respeitando-se, por conseguinte, a necessidade psicológica de se conhecer a verdade biológica.
  • A investigante não pode ser penalizada pela conduta irrefletida dos pais biológicos, tampouco pela omissão dos pais registrais, apenas sanada, na hipótese, quando aquela já contava com 50 anos de idade. Não se pode, portanto, corroborar a ilicitude perpetrada, tanto pelos pais que registraram a investigante, como pelos pais que a conceberam e não quiseram ou não puderam dar-lhe o alento e o amparo decorrentes dos laços de sangue conjugados aos de afeto.
  • Dessa forma, conquanto tenha a investigante sido acolhida em lar adotivo e usufruído de uma relação sócio-afetiva, nada lhe retira o direito, em havendo sua insurgência ao tomar conhecimento de sua real história, de ter acesso à sua verdade biológica que lhe foi usurpada, desde o nascimento até a idade madura.

Presente o dissenso, portanto, prevalecerá o direito ao reconhecimento do vínculo biológico.

  • Nas questões em que presente a dissociação entre os vínculos familiares biológico e sócio-afetivo, nas quais seja o Poder Judiciário chamado a se posicionar, deve o julgador, ao decidir, atentar de forma acurada para as peculiaridades do processo, cujos desdobramentos devem pautar as decisões.

Recurso especial provido.

Segundo a jurisprudência, não cabe condução coercitiva para a realização do exame de DNA, pois o direito à intimidade biológica prevalece sobre a verdade biológica (STF, HC 71.373/RS).

HABEAS CORPUS Nº 71373-4 RIO GRANDE DO SUL PACIENTE: JOSÉ ANTONIO GOMES PINHEIRO MACHADO IMPETRANTE: JOSÉ ANTONIO GOMES PINHEIRO MACHADO

COATOR: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE EXAME DNA CONDUÇÃO DO

RÉUDEBAIXO DE VARA. Discrepa, a mais não poder, de garantias constitucionais implícitas e explícitas intangibilidade do corpo humano, do império da lei e da inexecução específica e direta da obrigação de fazer provimento judicial que, em ação civil de investigação de paternidade, implique determinação no sentido de o réu ser conduzido ao laboratório, debaixo de vara, para coleta do material indispensável à feitura do exame DNA. A recusa resolve-se no plano jurídico-instrumental, consideradas a dogmática, a doutrina e a jurisprudência, no que voltadas ao deslinde das questões ligadas à prova dos fatos.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em deferir o pedido de habeas-corpus.

Brasília, 10 de novembro de 1994.

Contudo, a negativa ao exame gera presunção relativa de paternidade (arts. 231 e 232, CC23, Súmula 301, STJ24 e Lei nº 12.004/09).

Segundo o art. 1.615, CC, qualquer pessoa que tenha justo interesse pode contestar a ação investigatória.

Julgada procedente a investigação de paternidade, os alimentos são devidos a partir da citação. Trata-se de aplicação do princípio da igualdade entre filhos e do art. 1.616, CC.

ADOÇÃO

Segundo Carlos Roberto Gonçalves25:

A adoção é o ato jurídico pelo qual alguém recebe em sua família, na qualidade de filho, pessoa a ela estranha.

Os doutrinadores, de modo geral, reconhecem a adoção como forma de filiação jurídica, que gera efeitos de ordem pessoal e patrimonial. Os efeitos de ordem pessoal referem- se ao parentesco, ao poder familiar e ao nome. Já os efeitos de ordem patrimonial referem-se aos alimentos e ao direito sucessório.

A adoção é irrevogável e gera entre o adotante e o adotado um parentesco equiparado ao parentesco consanguíneo, em razão do princípio constitucional de igualdade entre os filhos.

A adoção tem caráter complexo, depende de decisão judicial e segue as disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como o artigo 1619 do Código Civil.

23 Art. 231. Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário não poderá aproveitar-se de sua recusa. Art. 232. A recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame.

24 Súmula 301, STJ: Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz

presunção juris tantum de paternidade.

25 p. 376

A adoção atribui ao adotado a condição de filho, desligando-o de todos os vínculos com a família biológica, exceto no que toca aos impedimentos matrimoniais e à adoção do filho do cônjuge ou do convivente.

Também se questiona a desvinculação no que toca à família biológica e às relações de afetividade, a exemplo de recente decisão do TJMG acerca do direito de visita da avó biológica.

MENOR - PAI DA CRIANÇA FALECIDO -ADOÇÃO PELO PADRASTO - DIREITO DE VISITAS DA AVÓ BIOLÓGICA PATERNA - LEGITIMIDADE

ATIVA - SENTENÇA CASSADA. - A adoção efetivada pelo cônjuge da mãe (padrasto), em virtude do falecimento do pai biológico, não tem o efeito de romper definitivamente o vínculo estabelecido pela filiação natural da criança com a família paterna, conforme prescreve o art. 1626 do Código Civil. - A realidade material dos fatos não é anulada pela ficção do ato legal da adoção, devendo ser preservados os vínculos afetivos e familiares do menor, cuja individualidade não é atingida por presunções artificiais da realidade que a lei, com outras razões, estabelece. (TJ-MG 100510702050110011 MG 1.0051.07.020501-1/001(1), Relator: WANDER

MAROTTA, Data de Julgamento: 08/04/2008, Data de Publicação: 23/04/2008)

A adoção bem como as demais formas de colocação em família substituta se subordina a critérios gerais que devem se harmonizar entre si para que se busque a melhor colocação possível, tudo à luz dos arts. 28 e 29, ECA26. São eles:

26 Art. 28. A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desta Lei.

§ 1o Sempre que possível, a criança ou o adolescente será previamente ouvido por equipe interprofissional, respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau de compreensão sobre as implicações da medida, e terá sua opinião devidamente considerada.

§ 2o Tratando-se de maior de 12 (doze) anos de idade, será necessário seu consentimento, colhido em audiência.

§ 3o Na apreciação do pedido levar-se-á em conta o grau de parentesco e a relação de afinidade ou de afetividade, a fim de evitar ou minorar as consequências decorrentes da medida.

§ 4o Os grupos de irmãos serão colocados sob adoção, tutela ou guarda da mesma família substituta, ressalvada a comprovada existência de risco de abuso ou outra situação que justifique plenamente a excepcionalidade de solução diversa, procurando-se, em qualquer caso, evitar o rompimento definitivo dos vínculos fraternais.

  1. respeitar os vínculos prévios de afinidade e afetividade do adotando como forma de minimizar os danos oriundos da ruptura do vínculo com a família biológica. Tratando-se de guardião legal, há inclusive a possibilidade de dispensa do cadastro (art. 50, §13, ECA27),
  2. dar preferência à colocação junto à família extensa ou ampliada (ex: tio, avô). Os parentes têm preferência na adoção e em relação a eles há também dispensa do cadastro (art. 50, §13, ECA),
  3. respeitar a vontade do adotando, que deve ser ouvido e ter sua opinião considerada. Tratando-se de adolescente, ele deve consentir com a adoção. A opinião do adotando deve ser colhida com cuidado, em vista da sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento,
  4. a família acolhedora deve estar apta à adoção no aspecto psicológico e socioeconômico, bem como o pedido deve fundar-se em motivos legítimos e apresentar reais vantagens para o adotando (arts. 2928 e 4329, ECA),
  5. buscar a colocação conjunta de grupo de irmãos, desde que possível e razoável, na colocação de indivíduos oriundos de quilombos ou grupos indígenas, procurar famílias de sua

§ 5o A colocação da criança ou adolescente em família substituta será precedida de sua preparação gradativa e acompanhamento posterior, realizados pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com o apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar.

§ 6o Em se tratando de criança ou adolescente indígena ou proveniente de comunidade remanescente de quilombo, é ainda obrigatório:

  1. - que sejam consideradas e respeitadas sua identidade social e cultural, os seus costumes e tradições, bem como suas instituições, desde que não sejam incompatíveis com os direitos fundamentais reconhecidos por esta Lei e pela Constituição Federal;
  2. - que a colocação familiar ocorra prioritariamente no seio de sua comunidade ou junto a membros da mesma etnia;
  3. - a intervenção e oitiva de representantes do órgão federal responsável pela política indigenista, no caso de crianças e adolescentes indígenas, e de antropólogos, perante a equipe interprofissional ou multidisciplinar que irá acompanhar o caso.

Art. 29. Não se deferirá colocação em família substituta a pessoa que revele, por qualquer modo, incompatibilidade com a natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar adequado.

27 § 13. A habilitação de postulante estrangeiro ou domiciliado fora do Brasil terá validade máxima de 1 (um) ano, podendo ser renovada. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) .

28 Art. 29. Não se deferirá colocação em família substituta a pessoa que revele, por qualquer modo, incompatibilidade com a natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar adequado.

29 Art. 43. A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos.

etnia, no tocante aos indígenas, propiciar a intervenção no processo de autoridade administrativa federal para que fiscalize o respeito a sua cultura, valores, etc.

A adoção depende do consentimento dos pais ou responsáveis.

E, assim, efetivada a medida, a sentença de adoção gera a extinção do poder familiar.

Ressalta-se que o consentimento não é renúncia ao poder familiar. Esse é irrenunciável.

O consentimento deve sempre ser prestado em juízo e perante o Ministério Público, com assistência psicológica e pode ser dispensado quando os pais foram destituídos do poder familiar.

A sentença constitutiva de adoção produz seus efeitos a partir do trânsito em julgado, salvo no caso da adoção póstuma, que produz seus efeitos a partir do óbito.

O nome dos adotantes integrará o nome do adotado e o prenome também poderá ser alterado a pedido do adotante ou do adotado.

O registro de nascimento será cancelado para confecção de um novo e esta operação é cercada por sigilo legal que só pode ser quebrado em prol do interesse do adotado ou por questões de ordem pública a critério judicial, como, por exemplo, para os impedimentos matrimoniais.

A adoção gera relação sucessória recíproca entre adotante e seus parentes e o adotado e seus descendentes.

O adotado foi desligado dos vínculos com a família biológica e agora se liga com a família do adotante na condição de filho deste.

DO PODER FAMILIAR

Segundo Carlos Roberto Gonçalves30:

30p.380

Poder familiar é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, no tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores.

O Poder Familiar está inserido no direito pessoal, sendo irrenunciável, intransacionável, indelegável e imprescritível, somente podendo perde-lo na forma e nos casos expressos em lei.

Sílvio Rodrigues conceitua o poder da família como:

O conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, em relação à pessoa e aos bens dos filhos não emancipados, tendo em vista a proteção destes.

O poder familiar extingue-se com a maioridade (18 anos) ou antes, se ocorrer a emancipação, em razão das causas indicadas no artigo 5º, parágrafo único do Código Civil.

O poder familiar é exercido pelos pais em relação de igualdade, nos termos do artigo 226, §5º 31do Texto Constitucional e o artigo 1631 do Código Civil.32

Assim, durante a constância do casamento e da união estável, os pais exercem em igualdade de condições o poder familiar sobre os filhos. Na falta de um dos pais, o outro exercerá o poder familiar com exclusividade.

No caso de separação do casal ou dissolução da união estável, surge o sistema de guarda e o direito de visitas. Atualmente a guarda compartilhada veio solucionar esta questão da titularidade do poder familiar, mantendo-se inalterada a relação entre pais e filhos, em que pese a separação do casal.

31 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§5º. Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher

32 Art. 1631. Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade.

Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo.

Vale registrar que com o Estatuto da criança e do Adolescente e de acordo com o artigo 22733 do Texto Constitucional, a criança passou a ser sujeito de direitos e o entendimento vigente é de total proteção na criança e ao adolescente.

Consigna-se que o artigo 163334 do Código Civil dispõe sobre o filho não reconhecido pelo pai, enquanto não houver o reconhecimento o poder familiar é exercido pela mãe exclusivamente e se a mãe for incapaz de exercer o poder familiar, dar-se-á tutor.

O poder familiar abrange os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos menores e seus bens.

O artigo 1634 do Código Civil35 trata dos deveres dos pais em relação à pessoa dos filhos menores e o artigo 168936 do mesmo diploma legal dispõe sobre os direitos e deveres dos pais em relação aos bens do filho. Já o artigo 1693 estabelece as hipóteses de exclusão dos pais na administração dos bens dos filhos.

33 Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

34 Art. 1633. O filho, não reconhecido pelo pai, fica sob o poder familiar exclusivo da mãe; se a mãe não for conhecida ou capaz de exercê-lo, dar-se-á tutor ao menor.

35 Art.1634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

  1. dirigir-lhes a criação e educação;
  2. tê-los em sua companhia e guarda;
  3. conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;
  4. nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
  5. representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;
  6. exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.

36 Art. 1689. O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar: I são usufrutuários dos bens dos filhos,

II tem a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade.

O poder familiar se extingue por fatos naturais (morte dos pais, morte do filho, maioridade), de pleno direito (emancipação) ou por decisão judicial (adoção, decisão judicial na forma do artigo 163837).

A doutrina diferencia perda da extinção, conceituando a perda como uma sanção imposta por sentença judicial, enquanto a extinção decorre da morte, emancipação.

A perda do poder familiar decorre de faltas graves praticadas pelos pais que podem pôr em risco a criança e o adolescente. A perda do pátrio poder ainda que permanente, não é definitiva, visto que os pais podem recuperar o poder familiar demonstrando em juízo que a acusa que ensejou a perda não existe mais.

O castigo ao filho abrange tanto a violência física quanto a violência moral, tais como ofensas verbais e ameaças e traz consequências negativas na formação da personalidade do filho, razão pela qual pode ensejar a perda do poder familiar.

O abandono, citado no inciso II do artigo 1638 abrange o abandono material (deixar de prestar assistência econômica) e intelectual (deixar de demonstrar afetividade, atenção, carinho).

O inciso III do mesmo artigo trata dos valores morais, de criação, de educação de honestidade que os pais devem passar a seus filhos.

Já a suspensão ao poder familiar é temporária e pode ser total ou parcial, dependendo dos poderes inerentes ao poder familiar que os pais estarão temporariamente impedidos de exercer e pode referir-se a apenas um filho, não abrangendo toda a prole como ocorre no caso de extinção do pátrio poder.

37 Art. 1638.Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I - castigar imoderadamente o filho;

  1. deixar o filho em abandono;
  2. praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
  3. incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

As hipóteses de suspensão do pátrio poder estão elencadas no artigo 1637 do Código Civil38 e no artigo 2439 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Cabe nas hipóteses de descumprimento dos deveres inerentes ao pátrio poder quanto à pessoa do filho e a administração de seus bens.

Ressalta-se que a prática reiterada de faltas que acarretam a suspensão do pátrio poder pode gerar a perda do pátrio poder, nos termos do artigo 1638, inciso IV do Código Civil.

38 Art. 1637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.

39 Artigo 24. A perda e a suspensão do pátrio poder serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o artigo 22.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As relações de parentesco tem sofrido, ao longo dos anos, importantes e grandes alterações, isto se deve a expansão do conceito de família que ultrapassa a família tradicional oriunda do casamento e alcança outras formas.

A sociedade tem sido palco de intrínsecas reformulações conceituais, sociais e tecnológicas, o que tem permitido o amadurecimento de novas formas de família baseadas no afeto.

Estas novas relações geram efeitos diretos na seara jurídica, nas relações de parentesco, na filiação, no reconhecimento dos filhos.

A Constituição Federal ampliou o conceito de família.

Antigamente, o conceito de família estava intimamente atrelado ao conceito de casamento.

Atualmente, no artigos 226 da Constituição Federal encontramos a união estável e a monoparentalidade como entidades familiares e, ao longo do Texto Constitucional, encontramos princípios importantes de respeito aos direitos fundamentais e à dignidade da pessoa humana que tem conduzido a jurisprudência na aceitação de outras formas de organização familiar.

O parentesco gera inúmeros efeitos jurídicos e patrimoniais, em diversas áreas do direito, tais como direito processual civil, direito penal, direito administrativo.

E dentro deste tema relações de parentesco, temos a filiação, que também sofreu importantes mudanças para se adaptar as inovações científicas de reprodução assistida.

Assim, temos a presunção dos filhos havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que o marido seja falecido, os filhos havidos a qualquer tempo de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga e os filhos havidos da inseminação artificial heteróloga, desde que com prévia autorização do marido.

Nesse aspecto e na interpretação do artigo 1597, o direito se socorre dos conceitos e avanços desenvolvidos pela medicina.

Os avanços científicos da medicina, especialmente na área da reprodução humana, que gera desdobramentos na filiação e nas relações de parentesco, possibilitaram uma mudança nos contornos da sociedade atual.

Os casais podem ter filhos após a idade fértil utilizando-se das técnicas de reprodução assistida e esse desenvolvimento tecnológico muda a sociedade e conceitos e presunções jurídicas até então estabelecidas.

Por outro lado, diante das novas formas de organização familiar, também encontramos famílias formadas por pessoas de mesmo sexo, que a jurisprudência tem entendido como entidade familiar autorizando a união e filhos havidos de reprodução assistida, bem como organizações familiares monoparentais com filhos havidos através das técnicas de reprodução humana.

Ainda nesta reflexão, discutimos o parentesco e a importância do laço biológico e do laço afetivo, bem como apresentamos no panorama jurídico como a questão se apresenta.

Interessante que em um primeiro momento os exames de DNA acerca da paternidade se apresentam como a rainha das provas, a verdade real, incontestável, pois o parentesco é cabalmente provado pelo laço biológico, cujo exame genético traz a robusta certeza de filiação.

Contudo a evolução social e humana nos tem mostrado a importância do afeto sobre o aspecto biológico no que tange a filiação.

Conceitos tradicionais do direito tem sido questionado nos Tribunais e hoje as relações familiares tem como principal característica o afeto e os interesses das crianças envolvidas nos processos.

Essas mudanças nos paradigmas correspondem a forte alteração social e nas relações pessoais que acontecem nos tempos atuais e tendo como base primordial de qualquer família o afeto, tanto ao conceituarmos a organização familiar como na configuração das relações de parentesco, filiação, reconhecimento de filhos e poder familiar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

A Constituição da República Federativa do Brasil, Coleção Saraiva de Legislação.

DIAS, Berenice. Manual de Direito das Famílias de acordo com o novo CPC. 11ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Volume 05 Direito de Família. 2011.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Volume 06 Direito das Sucessões. 2011.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Sinopses Juridicas. Direito de Família. Editora Saraiva. OLIVEIRA, Euclides. Direito de herança A nova Ordem de Sucessão. Editora Saraiva.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Direito de Família. Forense. 2004.

RODRIGUES, Sílvio. Direito de Família. Editora Saraiva, 28ª edição, 2016.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil. Direito de Família. Editora Forense, 11ª edição, 2016. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Famíl volume VI. Editora Atlas, 16ª edição, 20.

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