O Crime de Stalking: dissertando sobre a série YOU (você) da Netflix

25/10/2022 às 16:30
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O crime de perseguição obsessiva, intrusiva e indesejada há tempos deixou de ser considerado como uma exclusiva consequência de pessoas famosas e celebridades. Conforme a literalidade do art. 147-A do Código Penal brasileiro, o stalking admite sua prática por qualquer meio o uso de dispositivos informáticos é um deles. Dessa forma, caracterizando o cyberstalking; a perseguição por meio de dispositivos informáticos, telemáticos e/ou pelo uso da rede mundial de computadores de modo que possam auxiliar sua prática delituosa. Em voga, trata-se de um crime doloso, onde não se admite modalidade culposa, ou seja, requer o elemento cognitivo e volitivo para a sua caracterização; consciência e vontade. O agente quer e pretende o resultado.

O comportamento habitual que viole a privacidade ou a esfera de liberdade da vítima, utilizando táticas de stalking em diversos meios com o emprego do uso da tecnologia: ligação, envio de mensagens, whatsapp, texto, e-mail, publicação de fatos ou boatos em sites da Internet é que caracteriza o cyberstalking. Para tal caracterizar o tipo penal de perseguição, o sujeito ativo age com a intenção de causar danos à integridade mental e emocional de sua vítima, de modo a restringir sua liberdade de movimento ou prejudicar sua reputação é que tipificam a conduta de stalking. Dentre os motivos do assédio por intrusão, são os mais variados possíveis, mas podemos destacar uns: erotomania, violência doméstica, inveja, vingança, ódio ou simples brincadeira.

O espectro de vítimas e sujeito ativo nesta determinada empreitada criminosa pode ser qualquer um do povo, o tipo penal não exige agente próprio, mas, quando praticado contra criança, adolescente, idoso ou mulher em razão da condição do sexo feminino possuirá agravantes, ou seja, qualifica, majora e aumenta a pena do crime, que legalmente é prevista a reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. O bem jurídico tutelado no crime de perseguição é a liberdade individual, no que diz respeito à privacidade, ao direito de locomoção, à integridade psíquica e à autodeterminação da vítima (sujeito passivo).

O fato é que, o resultado crescente desses atos reiterados provocara de forma paulatina a criminalização da perseguição ao redor do mundo, deixando tão somente de ser um crime praticado em face de pessoas famosas, celebridades, cantores, jogares de futebol, artistas de televisão, cinema, internet e dos demais meios de comunicação social saltando para o catálogo legal de crimes de vários ordenamentos jurídicos ao redor do globo terrestre. O Brasil, ainda que tardiamente, tipificou o crime de stalking somente no ano de 2021.

Na plataforma de streaming estadunidense, Netflix, temos uma série intitulada "YOU" (Você, em tradução livre), derivada do livro da escritora americana Caroline Kepnes (2018), que tem como foco narrativo principal a vida e perseguições do stalker Joe Goldberg (interpretado por Penn Badgley) que ao decorrer das 3 temporadas da série pratica diversos crimes e ilícitos penais, além da perseguição reiterada, bem como: homicídio, ocultação de cadáver, invasão de dispositivo informático, violação de domicílio, cárcere privado, falsidade ideológica, documentação falsa, sequestro, cyberstalking, calúnia, difamação, injúria e outros tipos penais.

Na produção televisa, o stalker erotomaníaco, possui distúrbios psicológicos, distorção da realidade e além do personagem ter conflitos interiores causados por traumas de infância, bem como abandono e outros. Joe era visto pela sociedade como uma pessoa aparentemente normal, pessoa não tendente à prática criminosa, aqui podemos traçar um paralelo à Teoria do Etiquetamento Social (Teoria do Labelling Approach), onde a habitualidade criminosa erroneamente é associada às classes mais baixas e os menos afortunados . Nesta Teoria, muda-se o foco de pesquisa do crime ou do criminoso e, passa a analisar o problema da estigmatização social, de modo a deslocar o problema criminológico do plano da ação transpondo ao plano da reação. Assim sendo, tal teoria erige as audiências sociais em variáveis críticas do estudo da deviance (desvio, teoria do desvio).

O stalker da série possuía emprego formal e fixo, era um bibliotecário educado, possuidor de grande apreço por livros e literatura, se importava com crianças e pessoas mais idosas. No entanto, a sua personalidade stalker era obsessivamente ligado aos seus personagens amorosos (amores platônicos). Joe perseguia e fazia de tudo para conquistar (sorrateiramente) suas vítimas: vigiava, checava gostos, aspirações, preferências e ambições de suas vítimas, criava perfis em redes sociais, vasculhava o ciclo social da vítima, frequentava seus lugares de passada, mantinha presença constante no local de trabalho da vítima com o dolo de observá-la e buscar ao máximo enquadrar-se dentro das aspirações que a vítima gostava ou tinha apreço, tudo isso com o propósito de relacionar-se amorosamente com ela.

Destarte, trata-se da criminalização da conduta de perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. A nova norma penal incriminadora estabelece que tal perseguição trata-se de uma perseguição com conduta reiterada, ou seja, contumaz. Para que tal conduta seja enquadrada no novel tipo penal, o agente deve restringir a capacidade de locomoção da vítima, de modo a invadir, perturbar sua esfera de liberdade ou privacidade por mais de uma vez com condutas frequentes.

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Fato é que, a série (VOCÊ), supramencionada, caiu no gosto popular. Alcançando o primeiro lugar em diversos países, dentre eles o Brasil. O stalker Joe Golberg tornou-se amado pelos seus telespectadores, de modo com que a narrativa (em primeira pessoa, porque a série é contada na visão dele) torcia para que o perseguidor não fosse apanhado pelas autoridades policiais, assim como outros personagens de novela, filmes e seriados no qual gostamos.

Olá, você, com data de estreia para o primeiro semestre de 2023, a quarta temporada de YOU se passará em Paris, Um recomeço com classe, o personagem central de Joe, em cada temporada possui um nome e uma nova narrativa construída, na próxima temporada, que se passará em Paris, o stalker mudou sua aparência e adentrou a elite acadêmica e social parisiense, passou por um refinamento ao cruzar o Atlântico, foi para Londres e atualmente está em Paris lecionando e vivendo o professor Jonathan Moore. Dividida em duas partes, a primeira estreará em 10 de fevereiro e a segunda em 10 de março.

Dessa vez, estou me concentrando no mundo acadêmico e instrução, enquanto mantenho minhas atividades extracurriculares estritamente profissionais. É preciso ter tempo para trocar ideias com colegas que pensam da mesma forma. Mas, com amigos importantes, geralmente vêm outros tentando subir na pirâmide social. Alguns podem acabar caindo, ou sendo empurrados, até a morte social. A pergunta é... por quem?, disse o stalker do famoso seriado.

A série de suspense psicológico contribuiu e muito para a divulgação, identificação, veiculação e propagação do crime de perseguição e relacionamentos abusivos. Mostrou na prática como funciona o delito de stalking e seus meios de prática. Quando o seriado fora lançado no Brasil, no ano de 2018, a prática de stalking não era considera crime para o ordenamento jurídico pátrio. Tão somente sendo punida como crime de perturbação (moléstia), tipificado na Lei de Contravenções Penais (LCP, Decreto-Lei Nº 3.688/1941), por meio do artigo 65. No entanto, fora revogado expressamente pela Lei 14.132/2021, que trouxe ao Código Penal brasileiro através do artigo 147-A a previsão legal do Crime de Perseguição, conhecida mundialmente com stalking.

Sobre o autor
Wagner Muniz

Mestrando em Direito Público e Evolução Social (PPGD/UNESA/RJ), Intercambista na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos (USA). Espec. em Ciências Criminais e Direito Internacional (UniAmérica/PR), Graduando em Gestão Pública (FGV), Bacharel em Direito (Estácio, campus Cabo Frio/RJ), Voluntário no UNICEF BRASIL, atuou como Estagiário da Justiça Federal (TRF-2, SJRJ), Palestrante, Ativista Social pela Educação, Informação e Participação Sociopolítica Juvenil, Influenciador Digital e Mobilizador Social. Wagner é morador de São Pedro da Aldeia - RJ e atua em prol da Defesa dos Direitos Humanos de Crianças, Adolescentes e Jovens. Possui experiência ampla na área de Direito Público, com ênfase em Direito Penal, Processo Penal, Execução Penal, Direitos Humanos, Constitucional e Internacional. Também possui experiência com atuações em Direito Eleitoral, Jornalismo, Comunicação, Marketing, Planejamento de Campanha, Criação de Imagem e Discurso Político, Gestão Pública e Ciência Política. Esteve como Monitor em Direito Penal e Processo Penal e Direito Público, também, como Padrinho Veterano do Curso de Direito (2020-2022) da Universidade Estácio de Sá, campus Cabo Frio-RJ.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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