RESUMO
Levando em consideração o natural contexto de virtualização das relações de consumo, seu abrupto aumento em virtude da pandemia da Covid-19 e a tendência ao crescimento do mercado no ambiente digital no mundo e em especial no Brasil, o presente trabalho tem o objetivo de demonstrar e refletir sobre a responsabilidade civil e o dever de indenizar no ambiente Marketplace, abordando seu conceito, surgimento e momento atual, além de conceituar a responsabilidade civil, objetiva e subjetiva, entendendo o fundamento do dever indenizatório sob a ótica do Código Civil Brasileiro, bem como, do Direito Do Consumidor.
Palavras-chave: Marketplace; Direito do Consumidor; Responsabilidade Civil; Código Civil;
ABSTRACT
Taking into account the natural context of virtualization of consumer relations, its abrupt increase due to the Covid-19 pandemic and the tendency to market growth in the digital environment in the world and especially in Brazil, the present work aims to demonstrate and reflect the civil liability and the duty to indemnify in the Marketplace environment, addressing its concept, emergence, and current moment, in addition to conceptualizing civil liability, objective and subjective, understanding the foundation of the indemnification duty from the perspective of the Brazilian Civil Code, as well as consumer law.
Keywords: Marketplace; Consumer Law; CIvil Liability; Civil Code;
INTRODUÇÃO
Com o avanço no meio digital, pode-se verificar que houve uma grande procura no mercado digital, em busca de produtos que são vendidos por todo o Brasil e mundo. Nesse sentido, os consumidores passaram a realizar suas compras no chamado Marketplace, o qual refere-se a um mercado virtual que realiza intermediação entre o vendedor e o consumidor.
As referidas virtualizações das relações de consumo sofreram um aumento abrupto demostrado por estudos em virtude da pandemia decorrente do vírus Covid-19, como consequência da restrição de locomoção para evitar a proliferação da doença, como indica matéria da plataforma InfoMoney.
Com esse crescimento do mercado digital, faz-se necessário o entendimento da responsabilidade deste intermediador, quando se encontra na situação de reparar danos causados ao consumidor.
O denominado E-Marketplace, ou apenas Marketplace, corresponde à uma plataforma virtual de vendas, pela qual é efetuado o comércio eletrônico. Dessa forma, a plataforma reúne virtualmente comerciantes que oferecem seus produtos e serviços aos clientes interessados em uma espécie de shopping online.
Nesta esteira, é facultado aos consumidores uma experiência bastante parecida com aquela vivenciada nas compras físicas. Isso porque o consumidor pode realizar consulta aos preços, analisar promoções e condições da venda, e ainda efetuar a compra desejada através do espaço online. Isto posto, em contrapartida, o Marketplace cobra um percentual pelas compras efetuadas através da plataforma.
Ocorre que, assim como nas lojas físicas, o E-Marketplace está sujeito a incidência de vícios e defeitos no que concerne aos produtos ou serviços oferecidos. Sendo assim, surge a dúvida nos consumidores acerca da responsabilidade da plataforma; questão explanada a seguir.
Nota-se que o ordenamento jurídico brasileiro adotou, em sentido amplo, duas espécies de responsabilidade civil, pelas quais haverá reparação do dano causado a outrem como bem reza o artigo 927 do Código Civil, sendo elas: a responsabilidade civil subjetiva e a responsabilidade civil objetiva. Destarte, a primeira corresponde à necessária reparação do dano causado, através da comprovação de quatro elementos, quais sejam: ato ilícito, dano, nexo causal e demonstração de dolo ou culpa por parte do causador do dano. Por sua vez, a segunda, em suma, diz respeito à mesma necessidade de reparação do dano causado por meio de ato ilícito, e a imprescindível ligação entre eles; todavia, sem a necessidade de comprovação da culpa lato sensu.
Isto posto, a legislação brasileira e a jurisprudência atual, com o intuito de garantir a rápida e efetiva reparação do consumidor prejudicado, têm adotado a esses casos, o entendimento pela aplicação da denominada Teoria da Aparência, adotada pelo Código de Defesa do Consumidor. Nesta esteira, a adoção da referida teoria pela legislação consumerista em seu artigo 3°, trouxe a possibilidade de responsabilização solidária por parte do fornecedor aparente, que ficará responsável por assumir a posição do verdadeiro fabricante do produto e/ou serviço perante os consumidores.
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MARKETPLACE E O MERCADO BRASILEIRO
- Conceito
Marketplace é a palavra designada comumente para tratar do ambiente de comercio eletrônico, ou um tipo de shopping virtual sendo este, o ambiente online no qual o mercado está adentrando ou se transferindo de certa forma. Segundo Fabio Ulhôa comércio eletrônico é a venda de produtos, virtuais ou físicos, ou a prestação de serviços realizada em ambiente virtual, sendo assim, podemos dizer que Marketplace ou E-Marketplace é o ambiente virtual, no qual, há a atividade de mercado, reunindo diversos vendedores e produtos em uma mesma plataforma.
As atividades de comercio dentro do Marketplace podem ser classificadas em:
- Marketplace B2B ou business to business: focado em empresas, ou seja, é o comercio de bens ou produtos de uma empresa para outra;
- Marketplace B2C ou business to consumer: tem como foco, já a pessoa física, ou seja, o consumidor final;
- Marketplace Marketplace C2C ou consumer to consumer: Tanto o vendedor como o consumidor são pessoas ficas que tanto consomem quanto vendem;
- Marcketplace de nicho: no qual, as vendas são realizadas para um nicho específico de consumidores ou produtos.
- Surgimento E Desenvolvimento No Mercado De Consumo Brasileiro
O Marketplace como local seguro e confiável de se fazer negócios se popularizou no mundo e principalmente nos Estados Unidos com o crescimento dos sites americanos AMAZON e EBAY, nos anos 2000, e no Brasil, grandes lojistas como Magazine Luiza, Casas Bahia e Saraiva, expandiram seus negócios através da virtualização de sua atuação gerindo seus próprios Marketplace. Outro grande destaque que expandiu a adesão do Brasil tendo sua população consumidora em ambientes virtuais foi a criação do MERCADO LIVRE no ano de 1999, sendo uma empresa que nasceu na Argentina, contudo, teve forte adesão e crescimento na sua versão brasileira tendo como diretor Stelleo Tolda. (JORNAL DE NEGÓCIOS SEBRAE, 2016).
Devido ao aumento do acesso a novas tecnologias, a internet e redes sociais, por consequência, o mercado Marketplace no Brasil vem tendo grandes faturamentos e crescimento contínuo, acompanhando o mercado internacional. A fonte Webshoppers Ebit|Nielsen demonstra que o arrecadamento em plataformas Marketplace, já representa cerca de 78% das vendas online no país.
O evento recente que incentivou fortemente a adesão ao mercado online, foi o advento da pandemia do vírus COVID-19, que resultou em políticas de distanciamento social, isolamento e incentivo a população para permanecer em casa e evitar sair em ambientes mais frequentados a não ser em caso de extrema necessidade, sendo assim, foi natural a adesão aos Marketplace e comercio online como um todo, a plataforma jornalística InfoMoney, informa que o número de empresas que aderiram ou mudaram para ambientes de Marketplace cresceu 208% de 2019 para 2020.
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ABORDAGEM DO MARKETPLACE NA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA
- CDC e o Direito do Consumidor
O artigo 3° do Código de Defesa do Consumidor traz o conceito legal de fornecedor, sendo este, toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. O MarketPlace, por seu turno, uma vez que realiza a intermediação e negociação de vendas, se enquadra na categoria de fornecedor por meio da Teoria da Aparência, adotada pela referido Código brasileiro em seu artigo 3°, bem como pelo artigo 309 do Código Civil.
Assim, integrando a cadeia de consumo, as plataformas de MarketPlace, nos moldes dos artigos 7º parágrafo único c/c art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, respondem objetiva e solidariamente juntamente com o ofertante. Isso pois, a Teoria da Aparência, amparada pela legislação consumerista, instrui que, apesar de o MarketPlace não ser o efetivo vendedor, é fornecedor do negócio realizado com o consumidor, participando, dessa forma, da relação consumerista celebrada, visto que o contato estabelecido entre contratante e contratado somente é instaurada porque ambos utilizaram a intermediação realizada pelo MarkePlace.
Ademais, válido salientar que a atividade realizada pelas plataformas de MarketPlace, uma vez que integra a cadeia de fornecedores, como já mencionado outrora, conforme bem elucida os artigos 18 e 19 do Código de Defesa do Consumidor, respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, bem como respondem solidariamente pelos vícios de quantidade do produto sempre que, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza.
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RESPONSABILIDADE CIVIL NO MARKETPLACE
- Conceito: Responsabilidade Objetiva
Inicialmente cabe esclarecer a respeito da responsabilidade civil objetiva e o seu fundamento. Entende-se como responsabilidade objetiva aquela que independe de culpa, ou seja, para que o agente causador do dano seja responsabilizado, não haverá necessidade de existência de culpa ou dolo. A responsabilidade objetiva também pode ser denominada de Teoria do Risco, em que o simples exercício da atividade realizada poderá criar riscos, e uma vez tendo sido causado o dano, deverá ser reparado mesmo com a ausência de culpa. (GONÇALVES, 2021, p. 20)
O artigo 927, parágrafo único do Código Civil apresenta que a obrigação de reparar danos ocorrerá independentemente de culpa, conforme disposto abaixo.
Art. 927. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Desta forma, cabe ressaltar que a responsabilidade objetiva possui um rol taxativo disposto no Código Civil, sendo um exemplo a ser citado, a responsabilidade dos pais sobre os filhos menores quando estes estiverem na sua companhia. Entretanto, é importante esclarecer que além dos casos específicos, a lei determina que em todos os casos em que a atividade trouxer riscos por sua natureza, será necessário a reparação dos danos.
- Conceito: Responsabilidade Subjetiva
No que diz respeito a responsabilidade subjetiva, pode-se afirmar que se trata de um instituto contrário a responsabilidade objetiva. Enquanto a responsabilidade objetiva independe de culpa, a responsabilidade subjetiva tem a culpa como elemento essencial para que seja necessária a reparação de danos pelo agente causador. Nesse sentido, a responsabilidade subjetiva também é conhecida como teoria da culpa, uma vez que só haverá a responsabilidade de reparar danos, quando for identificado a existência de culpa ou dolo. (GONÇALVES, 2021, p. 20)
Na legislação, a responsabilidade subjetiva pode ser identificada no artigo 186 do Código Civil, quando há a afirmação de que, a negligência ou imprudência são elementos fundamentais para a definição de ato ilícito. Desta forma, a partir desse conceito entende-se que a responsabilidade subjetiva possui a culpa como fundamento para estabelecer e atribuir a responsabilidade ao agente.
- Responsabilidade Civil adequada ao MarketPlace
Em relação à responsabilidade das plataformas de MarketPlace, vislumbra-se que, em caso de existência de vícios ou defeitos na prestação de serviços ou produtos vendidos por meio de sua intermediação, a legislação consumerista dispõe, com fundamento na Teoria da Aparência, cuja manifestação pode ser exemplificada pelo disposto no artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor, que, apesar de referidas plataformas não atuarem diretamente na venda e prestação de serviços e produtos, estas possuem responsabilidade objetiva, uma vez que atuam como verdadeiras intermediadoras. Sendo assim, o fornecedor se torna responsável pelos prejuízos sofridos pelo consumidor, independentemente da comprovação de dolo ou culpa.
Isso porque, sendo sabido que o consumidor se encontra em desvantagem em relação aos fornecedores, uma vez que este se encontra em situação de hipossuficiência em relação àquele, a legislação brasileira teve como intuito a proteção e eficiente reparação do consumidor lesado, afastando discussões infindáveis sobre quem seria o verdadeiro responsável. Ademais, ressalta-se que, como já mencionado outrora no referido artigo, que as plataformas de MarketPlace respondem ainda de forma solidária com o verdadeiro vendedor, nos moldes do artigo 7º, parágrafo único c/c art. 14, do Código de Defesa do Consumidor, visto que responsável pela intermediação do negócio celebrado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A luz do exposto, pode-se afirmar que o crescimento do mercado digital resultou na necessidade de aprofundamento em matéria de responsabilidade civil, uma vez que, é imprescindível a compreensão de qual é o papel dos setores empresariais, e em especial do Marketplace, para a tutela dos direitos do consumidor. Nesse aspecto, a partir dos pontos levantados pode-se verificar que no Marketplace será aplicável a responsabilidade civil objetiva, ou seja, aquela que ocorrerá independentemente de culpa ou dolo.
Desta forma, entende-se que atribuir a responsabilidade objetiva ao Marketplace, trata-se de uma forma de proteger os direitos dos consumidores, pois a necessidade de reparar os danos ocorrerá de acordo com a teoria do risco, ou seja, o exercício da atividade que traz a possibilidade de riscos, já estabelece a responsabilidade ao agente.
Isto posto, o Código de Defesa do Consumidor dispõe que, o Marketplace sendo responsável pela intermediação do vendedor e consumidor, terá responsabilidade solidária com o vendedor do produto em questão. Sendo assim, visando o cuidado e proteção ao consumidor, a legislação buscou a tutela dos direitos tanto por parte do vendedor, quanto do intermediador.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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TARTUCE, Flávio. Responsabilidade Civil. Grupo GEN, 2021. 9786559640959. Disponível em: https://app.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559640959/. Acesso em: 20 mar. 2022.
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