Os relacionamentos interpessoais geralmente passam por fases de turbulências e, por mais que no início os conflitos pareçam ser improváveis de acontecer, a realidade nos mostra que eles são uma certeza.
Nas sociedades empresárias não poderia ser diferente, isso porque nem sempre os interesses, anseios, expectativas e ambições dos sócios serão harmônicos e compatíveis. Nesta eira, tais divergências somadas à rotina do negócio e a imprevisibilidade do mercado podem resultar em conflitos fervorosos entre os sócios de uma empresa.
Assim sendo, a briga de sócios é uma das principais razões que ocasionam as dissoluções total e parcial das sociedades empresárias. Destarte, torna-se importante sintetizar o conceito de tais institutos do mundo jurídico, quais sejam:
- DISSOLUÇÃO TOTAL DE SOCIEDADE: A dissolução total de uma sociedade consiste na extinção da pessoa jurídica, ou seja, é o fechamento da empresa;
- DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE: A dissolução parcial da sociedade é a extinção do vínculo entre um sócio e a empresa, a qual continua existindo e exercendo o seu objeto por intermédio dos sócios remanescentes.
Além disso, ao lado da briga de sócios, a falta de planejamento financeiro e a escassez de capital também constituem outros dois motivos que comumente levam à extinção da sociedade empresária.
A briga de sócios, quando recorrente, pode ocasionar o desgaste das relações no exercício da atividade empresarial e prejudicar os resultados do negócio, motivando o fechamento da empresa e consequente extinção da sua personalidade jurídica em decorrência da quebra da affectio societatis.
Mas afina, o que é a affectio societatis
A affectio societatis é o elemento subjetivo fundamental para a constituição e para a manutenção saudável de uma sociedade empresária, caracterizando-se como a intenção do sócio em constituir e permanecer em uma sociedade.
Em outras palavras, é a vontade da pessoa, seja esta jurídica ou física, de participar da sociedade, mediante a aceitação das suas normas, funcionamento e objetivos.
Neste sentido, estudiosos da área entendem que a fidelidade, a confiança, a colaboração consciente e ativa, a colaboração dos sócios em igualdade e a busca final pelo lucro a partilhar constituem elementos essenciais para a formação da affectio societatis.
Portanto, a ausência ulterior de qualquer desses componentes também pode vir a ser causa de briga de sócios e dar fim na intenção do sócio de permanecer naquela sociedade empresária.
Quais as demais causas para o conflito ente sócios
Além dos motivos inicialmente mencionados, as brigas de sócios e as divergências de opiniões também são comumente causadas por:
- Divergências quanto ao modo de integralização do capital social;
- Descumprimento de obrigações estabelecidas em sede de contrato social, bem como a falta de clareza na descrição das obrigações de cada sócio;
- Quebra de confiança;
- Disputas nas decisões;
- Crises no mercado;
- Confusão patrimonial;
- Questões sucessórias;
- Execução fiscal.
Como prevenir a briga de sócios?
Por todo o exposto, é de extrema importância que os sócios de uma sociedade empresária, ou aqueles que visem constituir uma sociedade, tenham em mente quais são os assuntos mais sensíveis e passíveis de originar conflitos em um futuro da sociedade.
Isto, pois antecipar tais situações pode evitar a briga de sócios, desentendimentos e constrangimentos, além de resguardar a existência da empresa e a continuidade da atividade empresarial em momentos de crise interna e no mercado. Assim sendo, o primeiro passo para entender os pontos sensíveis e se antecipar diante da possibilidade de briga de sócios, é o diálogo entre estes.
Destarte, manter a clareza na comunicação com a transparência de ideias, intenções, ambições, interesses e objetivos é fundamental para que cada indivíduo tenha consciência e certeza de que há convergência na motivação que os une. Nesse sentido, existem dois documentos contratuais de suma importância voltados à prevenção e mitigação de briga de sócios.
Memorando de Entendimento
O primeiro documento a ser aqui abordado é o denominado Memorando de Entendimento, também conhecido como Memorandum of Understanding (MoU), o qual possui caráter preliminar à constituição da sociedade empresária e por meio do qual é reduzido a termo o acordo entre futuros sócios.
Assim, o MoU é utilizado para estabelecer diretrizes relacionadas à formação e funcionamento da sociedade, bem como regulamentar sobre a relação entre sócios e investidores. Destarte, no momento da elaboração do MoU são levantadas questões de extrema relevância para o futuro da empresa.
São exemplos de cláusulas comuns deste documento:
- Delimitação de competências;
- Atribuições;
- Direitos e deveres dos sócios;
- Aspectos relativos a tomada de decisões;
- Detalhamento de ações em caso de dissolução parcial da sociedade;
- Foro para resolução de divergências entre sócios.
Ainda, ressalta-se que todas as cláusulas devem ser expressas de forma clara e mediante concordância dos sócios.
Outrossim, é importante salientar que apesar de ser elaborado antes da regularização de uma empresa, o Memorando de Entendimento possui validade jurídica e obriga as partes signatárias a seguirem o que foi acordado. Portanto, é evidente a sua função de evitar a existência de futura briga de sócios.
Acordo de Sócios
O segundo documento que visa prevenir e evitar a briga de sócios é o acordo de sócios, o qual é elaborado após a formalização de um contrato social. Ressalta-se que a principal diferença entre o Memorando de Entendimento e o acordo de sócios é o momento em que cada documento é elaborado.
Isto posto, o Memorando de Entendimento precede a existência regular da empresa, enquanto o acordo de sócios é vinculado ao contrato ou estatuto social. Por assim ser, pressupõe-se que a sociedade empresária já foi constituída e regularizada no estabelecimento do acordo.
À vista do exposto, após a formalização do contrato social, os sócios podem optar pela elaboração do acordo de sócios. Assim, são estabelecidas regras internas referentes ao funcionamento e estruturação da empresa com o intuito de prevenir eventual briga de sócios em decorrência de divergências de entendimentos no exercício da atividade empresarial.
Ademais, antecede-se à sua elaboração uma reunião entre os sócios com o intuito de decidirem juntos como serão abordadas determinadas matérias e situações no âmbito interno da empresa. Destarte, as deliberações oriundas dessa reunião são formalizadas por escrito em documento assinado, que deverá ser arquivado na sede da empresa e vincula todos os signatários, atribuindo-lhes deveres e obrigações além das já previstas no contrato social.
São exemplos de assuntos abordados em acordo de sócios:
- As definições das atribuições de cada sócio no exercício da atividade empresarial;
- Quais sócios poderão prestar serviços à sociedade empresária
- A fixação de quorum para deliberações;
- Direito de preferência;
- Direito de não concorrência;
- Cláusulas de confidencialidade;
- Discriminações a respeito de sucessões e liquidação de quotas.
Sabe-se que, para além dos assuntos que podem ser abordados nos documentos acima delineados, existem situações concretas impossíveis de serem previstas. Para esses casos, recomenda-se o diálogo transparente entre os sócios com decisões sempre documentadas, assinadas entre as partes e arquivadas na sede da empresa. Desse modo, será mais fácil identificar e responsabilizar o descumpridor da obrigação ajustada.
Como a implementação do sistema de compliance pode auxiliar na prevenção da briga entre sócios
O compliance é um substantivo da língua inglesa que se originou do verbo to comply with, que significa, em livre tradução, estar em conformidade, de acordo. Nesse sentido, o compliance é aplicado na empresa para que os seus funcionários, em todos os níveis de hierarquia organizacional, tenham conhecimento amplo e cumpram leis, regulamentos internos e externos, regras, normas e códigos da empresa.
O compliance objetiva a atuação em sintonia e com transparência no exercício da atividade empresária, o que unifica e consolida a rotina de trabalho, favorecendo a avaliação e prevenção de riscos. Ademais, os processos de compliance desenvolvem a cultura da ética e integridade entre os colaboradores, mitigando a possibilidade de ocorrência de briga de sócios.
Como posso, de fato, resolver a briga de sócios?
O mecanismo primário por meio do qual se recomenda buscar resolver a briga de sócios é o diálogo. O diálogo é importante tanto para a prevenção, quanto para a resolução dos conflitos, pois uma simples conversa pode garantir soluções rápidas e eficientes para as divergências existentes.
Destarte, evitando que os sócios passem a dedicar mais do seu tempo e esforços em saírem vitoriosos de brigas e foquem em continuar desenvolvendo a atividade empresária com dedicação.
Contudo, caso o diálogo não seja resolutivo e as partes não consigam entrar em um acordo, a melhor solução que se segue é a nomeação de um mediador ou de um árbitro que detenha a confiança de ambas as partes para ajudar nas decisões, amenizar os ânimos e resolver o objeto que motivou a briga de sócios.
Como um mediador ou árbitro poderá auxiliar na resolução de conflitos entre sócios
O mediador ou árbitro é um terceiro que atua de forma independente e possui expertise na questão demandada, ajudando as partes a chegarem em um consenso de forma profissional, confidencial e imparcial.
A função precípua do mediador é trabalhar na aproximação entre as partes para que, se possível, elas mesmas proponham soluções. Assim sendo, estudos apontam que quando as partes se envolvem na solução do conflito dialogando por meio da troca de ideias, elas comumente saem mais satisfeitas, pois se sentem ouvidas.
Além disso, as partes envolvidas na briga de sócios tendem a cumprir mais as decisões acordadas devido a existência do sentimento de satisfação por terem feito parte da construção da solução.
Caso nenhuma tentativa de solução do conflito entre sócios tenha gerado resultados, o que fazer?
Por fim, caso nenhum dos mecanismos anteriormente citados sejam capazes de solucionar o problema causador da briga de sócios, as partes podem acionar a justiça, momento em que o conflito tem o seu desfecho decidido por um juiz.
Recomenda-se que essa seja a última opção de escolha entre os sócios em embate, tendo em vista que o desgaste resultante da morosidade e gastos no curso de uma ação podem refletir de forma negativa no exercício da atividade empresarial.
Diante do cenário apresentado, torna-se evidente a importância da existência de um assessoramento jurídico empresarial dedicado, especializado e personalizado para cada sociedade empresária de acordo com os objetivos, interesses e expectativas dos sócios que a compõem, de modo a prevenir, mitigar e resolver a briga de sócios.
Destarte, é nítido que situações relacionadas ao conflito de sócios são complexas na busca por uma solução, especialmente quando necessário o envolvimento do judiciário. Assim sendo, contar com advogados especialistas na área é um aspecto fundamental para um deslinde descomplicado de uma demanda de tamanha sensibilidade.