Fui ao Cartório e descobri que o terreno que pretendo não existe e não tem dono. Ele pode ser meu através da Usucapião?

15/12/2022 às 09:14
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A USUCAPIÃO é a medida que adotada para buscar a regularização da titularidade de bem imóvel junto ao Cartório do Registro de Imóveis, embasada no preenchimento dos requisitos que a Lei exige - sustentada principalmente na POSSE qualificada exercida pelo TEMPO necessário sobre COISA usucapível. Como sabemos existem diversas modalidades de usucapião (variando o tempo de posse de 2 a 15 anos, além de outros requisitos) e desde 2015 a Usucapião pode ser resolvida tanto pela via judicial (através do tradicional processo judicial) quanto pela via extrajudicial (direto em Cartório, sem necessidade de processo judicial porém com obrigatória assistência de Advogado - que, vale recordar sempre, NÃO PODE SER INDICADO pelo Cartório).

É importante que o Advogado que cuide do caso entenda bem do procedimento não só quanto à matéria principal - direito imobiliário e direitos reais - mas principalmente dos pormenores da seara extrajudicial e principalmente do Direito Notarial e do Direito Registral, não desconhecendo inclusive as normas administrativas locais editadas pela CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA que é o órgão que ficaliza os Cartórios (vide art. 37 da Lei 8.935/94 c/c art. 236 da CRFB/88) e também do CNJ.

No processo da Usucapião é preciso apontar e identificar perfeitamente o IMÓVEL pelo qual se pretende a declaração de propriedade por conta da comprovação dos requisitos da Usucapião, conforme modalidade pretendida. Esse imóvel pode ser uma sala, um terreno, um apartamento, uma casa, uma mansão, um galpão, uma garagem, enfim, bens imóveis sobre os quais esteja o titular conferindo a verdadeira FUNÇÃO SOCIAL indicada no inciso XXIII do art. 5º da CRFB/88 - que é o que o proprietário deveria atender mas, deixando que outrem o faça, permite que a semente da prescrição aquisitiva seja plantada, germinada e frutifique.

Quando se planeja a aquisição pela Usucapião nem todas as pessoas buscam as informações e cautelas que facilitarão o processo. Geralmente essas orientações só são obtidas depois do aconselhamento com um Especialista que conhecendo as peculiaridades de cada caso proporá a adoção de algumas medidas para conferir maior segurança à pretensão principalmente por ser a aquisição por usucapião uma jornada demorada que envolve o preenchimento dos requisitos pelo tempo necessário exigido em Lei.

Uma importante medida é a solicitação ao Cartório do RGI competente da Certidão que contemplará informações sobre o imóvel. Essa certidão hoje em dia pode ser obtida pela INTERNET com facilidade, mas também ainda estão facultados a todos a ida até o Cartório, presencialmente, para solicitar no Balcão da Serventia a CERTIDÃO DA MATRÍCULA DO IMÓVEL. O parágrafo 11 do art. 19 da Lei de Registros Publicos, incluído pela recente Lei 14.382/2022 explica bem sobre a importância dessa certidão:

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"No âmbito do registro de imóveis, a certidão de inteiro teor da matrícula conterá a REPRODUÇÃO DE TODO O SEU CONTEÚDO e será suficiente para fins de comprovação de propriedade, direitos, ônus reais e restrições sobre o imóvel, independentemente de certificação específica pelo oficial".

Trata-se de uma certidão imprescindível para fins de regularização que, todavia, poderá dar lugar a uma CERTIDÃO DE NADA CONSTA se, obviamente, nada for localizado sobre o imóvel pretendido naquela Serventia. Nesse caso é bom que se registre desde já que a Usucapião não restará inviabilizada: não é porque o imóvel não consta registrado no Cartório que não poderá ser regularizado mediante Usucapião, uma vez preenchidos os requisitos exigidos por Lei. A "coisa" se efetivamente existe e é ocupada (e mais, se estão preenchidos os requisitos legais da Usucapião) pode e deve ser regularizada no RGI, seja por sentença judicial, seja pelo procedimento extrajudicial imposto pelo art. 216-A da Lei 6.015/73, regulamentado pelo Provimento CNJ 65/2017. A propósito, o referido regulamento já contempla a possibilidade expressa de mesmo no procedimento extrajudicial ser regularizado imóvel sem matrícula (e origem) registral, senão vejamos:

"Art. 3º O requerimento de reconhecimento extrajudicial da usucapião atenderá, no que couber, aos requisitos da petição inicial, estabelecidos pelo art. 319 do Código de Processo Civil CPC, bem como indicará:

(...)

IV o número da matrícula ou transcrição da área onde se encontra inserido o imóvel usucapiendo ou a informação de que NÃO SE ENCONTRA MATRICULADO ou transcrito";

(...)"

A decisão abaixo exarada pelo ilustríssimo Professor e Desembargador do TJRJ, Dr. CELSO PERES, com todo acerto cassa sentença que extinguia processo de Usucapião justamente por não ter sido apresentada a Certidão (positiva) da Matrícula imobiliária:

" TJRJ. 00944660820168190038. J. em: 06/04/2022. Apelação cível. Ação de usucapião extraordinário. Sentença terminativa, baseada na necessidade da demonstração da regularidade registral do lote, como condição de procedibilidade para o ajuizamento da ação. Somente as terras devolutas são insuscetíveis de usucapião, o que jamais pode ser confundido com a 'res nullius'. Irrelevância da ausência de titulação dominial de terceiro sobre o imóvel. Precedentes do STJ. Extinção que se revela prematura. Apelo provido".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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