RESUMO: O presente artigo elaborado como trabalho de curso de pós-graduação ato sensu de direito processual penal e penal, no UNIFLU, ira discorrer a cerca da suspensão, perda e cassação de direitos políticos. Para tanto foi implementada ampla pesquisa doutrina, legislativa e, notadamente, jurisprudencial visando uma abordagem sistematizada e atual do tema.
Palavras-chave: Repercussão da suspensão e da perda dos direitos políticos.
SUMÁRIO: CAPITULO PRIMEIRO - INTRODUÇÃO: ANALISE CONSTITUCIONAL. CAPITULO SEGUNDO: CONDENÇÃO CRIMINAL E A SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLITICOS. CAPITULO TERCEIRO: DA CONDENÇÃO CRIMINAL E LEI DE FICHA LIMPA E O CASO LULA. CAPITULO QUARTO: CONCLUSAO – SENTENÇA ABSOLUTORIA IMPROPRIA E SEUS EFEITOS PARA COM OS DIREITOS POLITICOS
CAPITULO PRIMEIRO - INTRODUÇÃO: ANALISE CONSTITUCIONAL
Os direitos políticos se referem a um conjunto de regras constitucionalmente fixadas, referentes à participação popular no processo político. Dizem respeito, em outras palavras, à atuação do cidadão na vida pública de determinado país.
No sentido jurídico, cidadania é a condição da pessoa como membro de um estado, de encontrar-se no gozo dos direitos que lhe permitem participar da vida política. Tal condição se resumo o titulo de cidadão. Como podemos concluir que uma pessoa é um cidadão?
A cidadania é o conjunto dos direitos políticos, que lhe permitem intervir na direção dos negócios públicos do Estado, participando de modo direto ou indireto na formação do governo e na sua administração, seja ao votar (capacidade politica ativa), seja ao concorrer a cargo público (capacidade politica passiva). É condição inata da pessoa física, natural de uma nação ou que adquire nacionalidade dela, cumprindo requisitos relacionados principalmente a residência no sentido jurídico, com animus de estabelecimento, raízes com respectivo território.
Trata-se de direito fundamental, vez que se encontra no capitulo de direitos fundamentais do homem, na magna carta brasileira. No entanto, como qualquer direito fundamental (para autores como André Carvalho Ramos, o direito de não ser torturado é absoluto), pode ser relativizado, é a chamada teoria dos limites dos limites, de George Jelinek.
Dessa forma a Constituição Federal, no seu art. 15 elenca casos em que ocorrera a perda ou a suspensão de direitos políticos, no entanto veda a cassação de tais direitos. Vamos ver a dicção legal da magna carta.
É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; II - incapacidade civil absoluta; III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII; V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.”
A cassação de direitos políticos, apesar de vedado peremptoriamente pelo texto constitucional, como visto, já foi pratica comum no Brasil, principalmente, no período do regime militar. Ele consistia basicamente em uma retirada abrupta tanto da capacidade politica ativa, quanto passiva, não possuindo mais, mesmo que cidadão, qualquer direito politico. A marca desta pratica era a retirada unilateral, coercitiva e sem qualquer direito de defesa.
Ora, tal pratica desafiava todos os modernos princípios do estado democrático de direito, como proporcionalidade, razoabilidade, notadamente na sua função substantiva do devido processo legal, segurança jurídica, dentre tantos outros. Lembranças de ruins de nosso recente passado, por tantos já esquecidos. Continuemos no campo jurídico.
Notemos a filigrana, a cassação do mandado não incorrera na cassação de direitos políticos, uma fez que são institutos de naturezas jurídicas distintas, apesar de cognatos. Dessa forma, pode-se afirmar que atualmente não há divergências, seja doutrinaria, seja jurisprudencial quanto à inaplicabilidade desta nefasta pratica.
No entanto, uma indagação deve surgir. Quais seriam as diferenças entre a perda e a suspensão dos direitos políticos? Quais dos incisos, do citado artigo 15, da CF são considerados perda, quais são suspensão de direitos políticos? Para encontramos respostas a tais indagações, basta observamos a natureza de cada instituto.
Enquanto a perda é restrição de prazo indeterminado, de reaquisição não automática (eis que o sujeito deve alistar-se novamente), a suspensão pode ser por prazo determinado, sendo readquiridos os direitos políticos automaticamente.
Quanto à classificação, podemos apontar como hipótese de perda o inciso I, enquanto podemos apontar como hipótese de suspenção os incisos II, III, e V, do citado artigo 15, da CF, intuitivos, vez que, como já dito, sua reaquisição ocorrera automaticamente, assim que findarem seus efeitos.
Apesar da aparente pacificidade desta classificação, temos uma divergência quanto o inciso IV, qual seja, de recusa em cumprir obrigação legal a todos imposta. No caso do art. 15, IV (recusa em cumprir obrigação legal a todos imposta), há divergência entre a doutrina e a legislação. Segundo a quase unanimidade da doutrina, trata-se de um caso se perda de direitos políticos (esta é a posição dos renomados doutrinadores José Afonso da Silva, Alexandre de Moraes, Gilmar Ferreira Mendes e Pedro Lenza).
Afinal, mesmo que a pessoa cumpra a obrigação não adimplida, será necessário alistar-se novamente como eleitor (a reaquisição dos direito políticos não é automática). Diante dos argumentos aqui citados, assim nos posicionamos favorável a presente corrente, julgando mais acertada.
Noutro giro, outros autores, em minoria, fundados em uma interpretação legalista, com fulcro dicção legal das leis que tratam do serviço militar obrigatório e da participação no tribunal do Júri, afirma tratar-se de suspensão, pelo simples fato de constar na redação legal, a palavra suspensão dos direitos políticos.
Até aqui expomos uma breve digressão de pontos e conceitos importantes relativos ao tema, no entanto, cremos caber uma abordagem mais contundente do inciso que trata da suspensão dos direitos políticos, por condenação criminal transitada em julgado, enquanto duraram seus efeitos, uma vez que o tema é ínsito a este curso de penal.
CAPITULO SEGUNDO: DA CONDENÇÃO CRIMINAL E SUSPENÇÃO DOS DIREITOS POLITICOS
Uma primeira afirmação se faz necessária. Depreende-se do texto importante conclusão, qual seja, a de que o preso provisório, ou seja, aquele contra o qual há uma sentença condenatória de 1º grau, ainda não confirmada por um Tribunal, não tem os direitos políticos suspensos, uma vez que o texto constitucional exige para tal o transito em julgado. Logo não é todo preso que esta com seus direitos políticos suspensos.
Em uma abordagem sistemática, avançamos ao artigo 92 do Código Penal, que prevê que a pessoa condenada criminalmente perderá o cargo, função pública ou mandato eletivo que ocupe nos seguintes casos:
“Art. 92. São também efeitos da condenação: I – a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública; b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos.”
Se não vejamos, em caso de condenação criminal transitada em julgado, haverá a perda imediata do mandato eletivo. Tal conclusão advém do fato de que para a pessoa exercer um mandato eletivo, ela tem de estar no pleno gozo de seus direitos políticos e como vimos, quando uma pessoa é condenada criminalmente fica com seus direitos políticos suspensos enquanto durarem os efeitos da condenação. Esta conclusão advém da combinação dos art. 15, III c/c art. 14, § 3º, II da CF/88:
“Art. 15 É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: III – condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;
Art. 14 (...)§ 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei: II – o pleno exercício dos direitos políticos;”
Aparentemente tais conclusões são irrefutáveis, no entanto a jurisprudência interna, do próprio Supremo Tribunal Federal, é divergente no tocante ao tema.
Não há divergência no entendimento até aqui exposto, quando o caso versa sobre perda de mandado por condenação criminal de governadores, presidentes, prefeitos ou vereadores. A divergência reside no caso mandatos de Senadores e Deputados federais.
Isso porque para a perda de mandatos de tais parlamentares, a CF tem previsão especifica, qual seja:
“Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador: VI – que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.(...)§ 2º Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda será decidida pela Câmara de Deputados ou pelo Senado Federal, por maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.”
Um primeiro entendimento, com interpretação literal do texto constitucional, afirma que a decisão sobre a perda do mandato é da Câmara dos Deputados ou o Senado Federal, no caso de condenação criminal, com base no artigo 55, da CF, acima citado. Está é a posição adotada pela 2ª Turma do STF: AP 996, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 29/05/2018.
Um segundo entendimento, com uma técnica de interpretação sistemática, prega que com a condenação criminal, imporá a perda do mandado, sem necessidade de decisão politica da câmara nos casos em que a condenação ultrapassar 120 dias.
Porque foi estipulado este prazo? Tal prazo equivale ao tempo em que a CF estipula para que a perda de mandato ocorra por falta do parlamentar a sessões do parlamento, sem necessidade de deliberação da respectiva casa, a mesma ira apenas declarar a perda do mandado. Ora se o parlamentar ficar preso por mais de 120 dias, não poderá ir ao parlamento, perdendo seu mandato automaticamente, sem necessidade decisão, tudo conforme a dicção constitucional.
Noutro giro, ficou assentado também por este segundo entendimento que se o parlamentar for condenado a regime diverso do fechado, não perderá, automaticamente, seu mandado, vez que poderá obter autorização de saída para frequentar seu trabalho.
É a posição adotada pela 1ª Turma. Nesse sentido: STF. 1ª Turma. AP 694/MT, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 2/5/2017 (Info 863). STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 23/5/2017 (Info 866).
CAPITULO TERCEIRO: DA SENTENÇA CONDENATORIA, A LEI DE FICHA LIMPA E O CASO LULA
Insta salientar sumariamente que a intitulada lei de ficha limpa, LC 135 foi editada emendando a lei das inexigibilidades, LC 64. A LC 135 foi produto de iniciativa popular, capitaneada pelo Juiz Marlon Reis, cumprindo determinação procedimental da CF, que determina lei complementar em material eleitoral.
A referida LC 135 traz uma série de causas de inexigibilidades, com abuso de poder econômico, condenação eleitoral, reprovação de contas e condenação criminal, disciplinando prazos específicos para um rol de crimes.
Uma primeira indagação pode surgir, tais previsões não feririam rol taxativo constitucional de previsão de casos de suspensão de direitos políticos? A resposta é negativa, porque a suspensão de direitos políticos é um todo, enquanto a ilegibilidade é uma parte. Como visto no primeiro capitulo, a capacidade politica é ativa e passiva. Neste caso, da lei de ficha limpa, temos apenas a restrição da capacidade passiva, de ser eleito para mandatos políticos.
Art. 1º, inciso I, ALÍNEA, E: os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena, pelos crimes: 1. contra a economia popular, a fé pública, a administração pública e o patrimônio público2. Contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência; 3. Contra o meio ambiente e a saúde pública; 4. Eleitorais, para os quais a lei comine pena privativa de liberdade;5. De abuso de autoridade, nos casos em que houver condenação à perda do cargo ou à inabilitação para o exercício de função pública; 6. De lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; 7. De tráfico de entorpecentes e drogas afins, racismo, tortura, terrorismo e hediondos8. de redução à condição análoga à de escravo; 9. Contra a vida e a dignidade sexual; e 10. Praticados por organização criminosa, quadrilha ou bando;
Outros dois grandes entendimentos são extraídos do texto legal acima destacado. Por essa alínea, é possível que o cidadão se torne inelegível antes mesmo da suspensão de seus direitos políticos. Isto porque essa suspensão só ocorre a partir do trânsito em julgado da decisão condenatória. Já a inelegibilidade inicia-se com a condenação prolatada por órgão colegiado.
Outro é a resposta da seguinte indagação, todo e qualquer condenação dos crimes acima expostos conduzirão a uma inelegibilidade? Resposta novamente negativa, pois a inelegibilidade prevista na alínea “e”: não se aplica aos crimes culposos, crimes de menor potencial ofensivo, nem aos crimes de ação penal privada
Para concluirmos, citamos a discussão que ainda encontra-se pendente no TSE, recursos interpostos pela defesa do Ex-Presidente Lula, condenado por crime contra a administração. Tais recursos foram interpostos contra previsões expressas da inelegibilidade, dessa forma, acreditamos que dentro dos próximos dias o STF se pronunciara pela ilegalidade de chapa Lula, para as eleições presidencias de 2018.
CAPITULO QUARTO: CONCLUSAO- SENTENÇA ABSOLUTORIA IMPROPRIA E SEUS EFEITOS PARA COM OS DIREITOS POLITICOS
Por derradeiro, vamos expor uma intrigante duvida existente entre doutrinadores do tema, qual seja, a capacidade de uma sentença absolutória impropria levar a suspensão dos direitos políticos.
A divergência advém da natureza jurídica da sentença absolutória impropria, eis que hibrida, não sendo propriamente uma sentença condenatória, vez que não impõe pena. Aliado a este fato, há também a não previsão expressa no rol taxativo da CF, no já citado artigo 15.
Profunda divergência instaura-se no tema, no entanto trago aqui conclusão doutrinaria no sentido positivo para o caso. Vislumbra-se a possibilidade de sentença absolutória impropria que aplica medida de segurança suspender direito politico.
Através de forma de interpretação constitucional denominada “pensamento jurídico do possível”, conclui-se pela possibilidade de suspensão dos direitos políticos do incapaz, que tiver contra si uma sentença, mesma que absolutória imprópria, que lhe aplique uma medida de segurança. Tal forma interpretativa busca uma adaptação do texto vigente ao contexto social contemporâneo, sem a necessária positivação anterior ao caso concreto, com vistas a tornar possíveis exigências do mundo contemporâneo. Trata-se de uma forma interpretativa, no contexto da interpretação conforme.
Ela funda-se na capacidade do magistrado valorar o contexto em que a lei foi concebida abstratamente e poder definir, nas novas circunstâncias em que o fato se concretizou, o melhor significado e alcance da norma. No entanto não será possível ao magistrado, subverter simplesmente a vontade abstrata do legislador, para impor integralmente a sua, não se trata disso.
A partir de todo este raciocínio, conclui-se que o incapaz não deve possuir a capacidade politica, vez que não se encontra com seu discernimento pleno, tanto que lhe é imposta medida e segurança por fato por ele praticado.
Dessa forma, mesmo que não escrito na CF a suspensão dos direitos políticos, por sentença, absolutória impropria, há uma maior importância fática e jurídica em sua aplicação, mesmo que ausente da própria dicção do texto formal da constituição.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
RANGEL, Paulo. Direito processual penal, Rio de Janeiro; Impetus 2015.
ALVES, Leonardo Barreto Moreira. Direito processual penal, Salvador; Juspodivm 2017.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. O Juiz e a revelação do direito in concreto. Prática Jurídica. Ano I, n° 6, 2002
COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos Direitos Humanos Editora Saraiva, 3. ed. rev. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 154.