O que podemos esperar da regulamentação da Nova Lei de Licitações?

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Foi publicada em 09/02/2023, na edição 29 do Diário Oficial da União, a Instrução Normativa SEGES/MGI nº 2/2023 que dispõe sobre a licitação pelo critério de julgamento por técnica e preço, na forma eletrônica, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional.

Tal norma infralegal é a 35ª (trigésima quinta) editada para regulamentar a Nova Lei Geral de Licitações e Contratos (NLGLC – Lei nº 14.133/2021) na esfera de atuação do Governo Federal.

A Instrução Normativa SEGES/MGI nº 2/2023 foi precedida pelo(a): 1) Decreto nº 10.764/2021, que dispõe sobre o Comitê Gestor da Rede Nacional de Contratações Públicas, de que trata o § 1º do art. 174 da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021; 2) Decreto nº 10.818/2021, que regulamenta o disposto no art. 20 da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para estabelecer o enquadramento dos bens de consumo adquiridos para suprir as demandas das estruturas da administração pública federal nas categorias de qualidade comum e de luxo; 3) Portaria SEGES/ME nº 8.678/2021, que dispõe sobre a governança das contratações públicas no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 4) Portaria de pessoal nº 9.728/2021, que designa os membros titulares do Comitê Gestor da Rede Nacional de Contratações Públicas; 5) Instrução Normativa SEGES/ME nº 65/2021, que dispõe sobre o procedimento administrativo para a realização de pesquisa de preços para aquisição de bens e contratação de serviços em geral, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional; 6) Instrução Normativa SEGES/ME nº 67/2021, que dispõe sobre a dispensa de licitação, na forma eletrônica, de que trata a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, e institui o Sistema de Dispensa Eletrônica, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 7) Instrução Normativa SEGES/ME nº 72/2021, que estabelece regras para a definição do valor estimado para a contratação de obras e serviços de engenharia nos processos de contratação direta, de que dispõe o § 2º do art. 23 da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 8) Instrução Normativa SEGES /ME nº 75/2021, que estabelece regras para a designação e atuação dos fiscais e gestores de contratos nos processos de contratação direta, de que dispõe a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 9) Instrução Normativa AUTOR/ME nº 62/2021, que altera a Instrução Normativa nº 53, de 8 de julho de 2020, que dispõe sobre as regras e os procedimentos para operação de crédito garantida por cessão fiduciária dos direitos de créditos decorrentes de contratos administrativos, realizadas entre o fornecedor e instituição financeira, por meio do Portal de Crédito digital, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 10) Decreto nº 10.899/2021, que altera o Decreto nº 10.496/2020, que institui o Cadastro Integrado de Projetos de Investimento; 11) Instrução Normativa SEGES/ME nº 116/2021, que estabelece procedimentos para a participação de pessoa física nas contratações públicas de que trata a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 12) Portaria ME nº 15.496/2021, que designa os membros titulares e suplentes para a composição do Comitê Gestor da Rede Nacional de Contratações Públicas; 13) Decreto nº 10.922/2021, que dispõe sobre a atualização dos valores estabelecidos na Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021 - de Licitações e Contratos Administrativos; 14); Decreto Estadual nº 10.929/2022, que estabelece procedimento especial para consultas públicas de decretos destinados a regulamentar dispositivo da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021 - Lei de Licitações e Contratos Administrativos; 15) Portaria ME nº 538/2022, que altera a Portaria ME nº 15.496, de 29 de dezembro de 2021; 16) Decreto nº 10.947/2022, que regulamenta o inciso VII do caput do art. 12 da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para dispor sobre o plano de contratações anual e instituir o Sistema de Planejamento e Gerenciamento de Contratações no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional; 17) Portaria SEGES/ME nº 938/2022, que institui o catálogo eletrônico de padronização de compras, serviços e obras, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, em atendimento ao disposto no inciso II do art. 19 da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021; 18) Instrução Normativa SEGES/ME nº 26/2022, que dispõe sobre a dispensa, o parcelamento, a compensação e a suspensão de cobrança de débito resultante de multa administrativa e/ou indenizações, previstas na Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, não inscritas em dívida ativa; 19) Instrução Normativa SEGES nº 58/2022, que dispõe sobre a elaboração dos Estudos Técnicos Preliminares - ETP, para a aquisição de bens e a contratação de serviços e obras, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, e sobre o Sistema ETP digital; 20) Portaria ME nº 7.828/2022, que estabelece normas complementares para o cumprimento do Decreto nº 10.193/2019, que estabelece limites e instâncias de governança para a contratação de bens e serviços e para a realização de gastos com diárias e passagens no âmbito do Poder Executivo federal; 21) Instrução Normativa SEGES nº 73/2022, que dispõe sobre a licitação pelo critério de julgamento por menor preço ou maior desconto, na forma eletrônica, para a contratação de bens, serviços e obras, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 22) Decreto nº 11.246/2022, que regulamenta o disposto no § 3º do art. 8º da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para dispor sobre as regras para a atuação do agente de contratação e da equipe de apoio, o funcionamento da comissão de contratação e a atuação dos gestores e fiscais de contratos, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional; 23) Instrução Normativa SEGES/ME nº 77/2022, que dispõe sobre a observância da ordem cronológica de pagamento das obrigações relativas ao fornecimento de bens, locações, prestação de serviços e realização de obras, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 24) Portaria ME nº 12.663/2022, que altera a Portaria ME nº 15.496/2021; 25) Instrução Normativa SEGES/ME nº 81/2022, que dispõe sobre a elaboração do Termo de Referência - TR, para a aquisição de bens e a contratação de serviços, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, e sobre o Sistema TR digital; 26) Instrução Normativa SEGES/ME nº 91/2022, que estabelece regras para a definição do valor estimado para a contratação de obras e serviços de engenharia nos processos de licitação e de contratação direta, de que dispõe o § 2º do art. 23 da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 27) Instrução Normativa SEGES/ME nº 96/2022, que dispõe sobre a licitação pelo critério de julgamento por maior retorno econômico, na forma eletrônica, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 28) Instrução Normativa SEGES/ME nº 98/2022, que estabelece regras e diretrizes para o procedimento de contratação de serviços sob o regime de execução indireta de que dispõe a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 29) Portaria de pessoal SE/ME nº 14.542/2022, que altera a Portaria ME nº 15.496, de 29 de dezembro de 2021; 30) Decreto nº 11.317/2022, que atualiza os valores estabelecidos na Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021; 31) Orientação e Procedimento nº 37 - sobre o relatório de gestão de riscos do Plano de Contratações Anual – PCA; 32) Instrução Normativa SEGES/ME nº 103/2022, que dispõe sobre os procedimentos de seleção de imóveis para locação no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional; 33) Portaria de pessoal/MGI nº 592/2023, que altera a Portaria ME nº 15.496, de 29 de dezembro de 2021 e 34) Instrução Normativa SEGES/MGI nº 4/2023, que estabelece regras complementares para aplicação do Decreto nº 10.818/2021.

Desconsiderando as normas infralegais que (a) são de competência conjunta com outros órgãos regulamentadores; (b) são de competência exclusiva de outros órgãos regulamentadores; que dependem de alteração legislativa e (c) não são essenciais para a eficácia da Lei nº 14.133/2021, serão ao todo 53 (cinquenta e três) regulamentos para garantir a fiel execução e detalhar a Nova Lei Geral de Licitações na seara federal, faltando ainda ser editados, por exemplo, normas regulamentando: (i) o credenciamento; (ii) a gestão de bens móveis e (iii) o Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI).

Mas esse, como já dito, é apenas o cenário da regulamentação da NLGLC no âmbito do Poder Executivo Federal, cabendo o esclarecimento de que é possível, está acontecendo, uma regulamentação: I) no âmbito do Poder Executivo Estadual e Municipal; II) no âmbito dos Poderes Judiciário e Legislativo da União, DF, Estados e Municípios; III) no âmbito dos órgãos do Ministério Público e IV) no âmbito dos Tribunais de Contas.

Em exemplo de tal regulamentação “multifederativa” pode ser extraído do art. 20 da NLGLC que estabelece que “os itens de consumo adquiridos para suprir as demandas das estruturas da Administração Pública deverão ser de qualidade comum, não superior à necessária para cumprir as finalidades às quais se destinam, vedada a aquisição de artigos de luxo”, ao passo que o § 1º do mencionado artigo estabelece que “os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário definirão em regulamento os limites para o enquadramento dos bens de consumo nas categorias comum e luxo”.

Pois bem, como já exposto, tal matéria foi regulamentada no âmbito federal pelo Decreto nº 10.818/2021, mas também veio a ser regulamentada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) por meio da Resolução nº 341, de 31 de agosto de 2022, pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE/PE) via Portaria Normativa TC nº 194, de 13 de outubro de 2022 e pelo Governo do Amapá quando da edição do Decreto Estadual nº 463, de 26 de janeiro de 2022.

E os exemplos de regulamentação da NLGLC fora do âmbito da Administração Pública Federal são diversos conforme se pode verificar da seguinte lista evidentemente não exaustiva: 1º) Decreto Municipal nº 1.602.001 de16 de fevereiro de 2023 que regulamenta a Lei Federal nº 14.133, de 01 de abril de 2021, no âmbito dos órgãos e entidades da Administração Pública direta, autárquica e fundacional vinculados ao Poder Executivo Municipal do Crato/CE; 2º) Decreto Municipal nº 028/2021 que regulamenta a Lei nº 14.133, de 01 de abril de 2021, que dispõe sobre licitações e contratos administrativos no município de São Valério/TO; 3º) Decreto Municipal nº 29/2021 que regulamenta a Lei no 14.133, de 1º de abril de 2021, que dispõe sobre Licitações e Contratos Administrativos, no Município de São Raimundo das Mangabeiras-MA; 4º) Decreto n° 025/2021 que regulamenta a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, que dispõe sobre licitações e contratos administrativos, no município de Sambaiba-MA; 5º) Decreto Municipal nº 034/2021 de 39 de abril de 2021 que regulamenta a Lei nº 14.133, de 1° de abril de 2021, que dispõe sobre Licitações e Contratos Administrativos, no Município de Caracol/PI; 6º) Decreto Municipal nº 059, de 27 de abril de 2021 que regulamenta a Lei no 14.133, de 1º de abril de 2021, que dispõe sobre Licitações e Contratos Administrativos, no Município de Serra do Mel/RN e dá outras providências; 7º) Decreto Municipal nº 0020, de 14 de maio de 2021 que institui o regulamento de licitações e contratos administrativos em âmbito municipal, conforme dispõe a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, no município de Baraúna/PB; 8º) Decreto Estadual nº 034/2021 que regulamenta, no âmbito da Administração Pública estadual, direta, autárquica e fundacional do Estado do Paraná, a Lei nº 14.133, de 01 de abril de 2021, que “Estabelece normas gerais de licitação e contratação para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”, a aquisição e incorporação de bens ao patrimônio público estadual, os procedimentos para intervenção estatal na propriedade privada e dá outras providências; 9º) Decreto Judiciário nº 269/2022 – GP que regulamenta, no âmbito deste Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, a Lei de Licitações e Contratos Administrativos nº 14.133, de 1º de abril de 2021, adota parcialmente o Decreto Estadual nº 10.086, de 17 de janeiro de 2022 e dá outras providências; 10º) Decreto Municipal nº 032, de 11 de maio de 2021 que regulamenta a Lei no 14.133, de 1º de abril de 2021, que dispõe sobre Licitações e Contratos Administrativos, no Município de Olho d’Água das Cunhãs/MA, e dá outras providências; 11º) Decreto Municipal nº 030/2021, de 30 de abril de 2021, que regulamenta a Lei no 14.133, de 1º de abril de 2021, que dispõe sobre Licitações e Contratos Administrativos, no Município de Nova Colinas/MA; 12º) Decreto Municipal nº 055/2021 que regulamenta a Lei no 14.133, de 1º de abril de 2021, que dispõe sobre Licitações e Contratos Administrativos, no Município de Machados/PE; 13º) Decreto Municipal nº 183/2021 que regulamenta a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, que dispõe sobre Licitações e Contratos Administrativos, no Município de Lençóis, Estado da Bahia; 14º) Decreto Municipal nº 50797 de 13 de maio de 2022, que dispõe sobre a Contratação Direta de que trata a Lei Federal nº 14.133, de 1º de abril de 2021, e regulamenta a sua realização no Sistema Compras.gov.br, aprova as minutas-padrão que menciona, no âmbito da Administração Pública direta, autárquica e fundacional do Município do Rio de Janeiro e dá outras providências; 15º) Decreto Municipal nº 967, de 14 de março de 2022 que regulamenta o Sistema de Registro de Preços de que trata a Lei federal nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para aquisição e locação de bens ou contratação de obras ou serviços, inclusive de engenharia, pelos órgãos e entidades da administração pública direta e indireta do Município de Goiânia; 16º) Decreto Municipal nº 804 de 06/06/2022, que regulamenta as normas e procedimentos de contratações diretas fundamentadas nos incisos I e II do artigo 75 da Lei Federal nº 14.133, de 1º de abril de 2021, no âmbito dos órgãos e entidades da Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional do Município de Curitiba e dá outras providências e 17º) Decreto Estadual/MT n° 1.126, de 29 de setembro de 2021, que regulamenta as hipóteses de contratação direta disciplinadas pela Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, que dispõe sobre a Lei de Licitações e Contratos Administrativos.

Veja, considerando o que dispõem o art. 22, XXVII e art. 30, II da CF/88 aliado ao entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca da competência normativa suplementar dos Estados e Municípios no tocante à disciplina sobre licitações e contratos administrativos (MC na ADI nº 927/RS e ADI nº 3.059/RS), não seria impossível imaginar por baixo mais de 5.000 normas infralegais se cada município brasileiro regulamentar a NLGLC (e isso considerando que cada faça uma regulamentação geral e não de trechos pontuais da Lei nº 14.133/2021).

E em tal cenário não podemos esquecer, como já foi mencionado aqui, a possibilidade de a NLGLC ser regulamentada por parte do DF, dos Estados, dos Poderes Legislativo e Judiciário, dos órgãos do Ministério Público e dos Tribunais de Contas, algo que, também como já mencionado, está sim ocorrendo.

Diante da possibilidade de tantas normas infralegais regulamentando a Lei nº 14.133/2021, surgem algumas dúvidas que desafiam a atenção dos que atuam em licitações e contratos, como por exemplo: para que serve a regulamentação da NLGLC? Quais os efeitos da inércia em regulamentar a NLGLC? O que acontecerá a partir de 1º de abril de 2023 com as normas infralegais que regulamentavam a Lei nº 8.666/1993 e a Lei nº 10.520/2002? Quais os riscos de uma multirregulamentação da NLGLC?

Bom, em primeiro lugar a regulamentação da Lei nº 14.133/2021 é um limitador da discricionariedade do Administrador, facilitando o controle dos atos administrativos, pois a uniformização de interpretação por ela proporcionada garante que os licitantes, a população e os órgãos de controle saibam com antecedência como a NLGLC será aplicada. A regulamentação da NLGLC serve ainda de garantia e segurança para os agentes públicos, vez que sendo ela a veiculação de interpretações e especificações contidas por meio de atos públicos de caráter geral, ela é claramente uma orientação geral que há de ser invocada quando da revisão do ato administrativo.

Já sobre uma eventual inércia em regulamentar a NLGLC, é preciso ter em mente dois cenários: no primeiro, ela é suprida voluntariamente pelo órgão ou entidade desprovido da norma regulamentar específica e, no segundo, há pressões externas para que se preencha a lacuna.

No primeiro cenário, basta lembrar que, por exemplo, diversos municípios adotam a Instrução Normativa nº 5/2017 (que dispõe sobre as regras e diretrizes do procedimento de contratação de serviços sob o regime de execução indireta no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional) para promoverem a repactuação de preços.

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No segundo cenário, cumpre fazer remissão à Súmula nº 633/STJ que preconiza que “a Lei n. 9.784/1999, especialmente no que diz respeito ao prazo decadencial para a revisão de atos administrativos no âmbito da Administração Pública federal, pode ser aplicada, de forma subsidiária, aos estados e municípios, se inexistente norma local e específica que regule a matéria”. Desta forma, não é difícil imaginar um Tribunal de Contas aplicando uma norma estadual ou mesmo federal em caso de inércia regulamentar por parte de algum município.

Voltando aos questionamentos, diga-se que não há outra conclusão de que as normas infralegais que regulamentavam a Lei nº 8.666/1993 e a Lei nº 10.520/2002, a partir de 1º de abril de 2023, por força do art. 193, II da NLGLC estão revogadas, vez que é inconcebível que normas meramente regulamentadoras subsistam como regulamentos autônomos sem o supedâneo das leis regulamentadas.

A única forma de as normas infralegais que regulamentavam a Lei nº 8.666/1993 e a Lei nº 10.520/2002 seguirem aplicáveis a partir de 1º de abril de 2023 será na hipótese em que sua aplicação for fundamental para dar cumprimento aos contratos firmados com base no parágrafo único do art. 191 da Lei nº 14.133/2021, vez que como tais contratos seguem as diretrizes do regime anterior ao da NLGLC, é racional que eles sigam também sendo tutelados pelas normas regulamentares aplicáveis àquele regime.

Por fim, a multirregulamentação da NLGLC pode trazer dois efeitos de ordem prática: uma cacofonia de interpretações e/ou um desprezo de interpretações.

Na cacofonia de interpretações, podemos ver licitantes tendo que se adaptar a diversos procedimentos para participar de licitações, o que pode, em última análise, comprometer a competitividade (pois licitantes/fornecedores podem abrir mão de disputar certames regulamentados por normas que trazem interpretações muito díspares da maioria dos seus clientes) e a escolha da proposta mais vantajosa.

No desprezo de interpretações, a regulamentação do Município “X” pode ser simplesmente ignorada e cair em desuso simplesmente pelo fato de que: A - sistemas de “e-licitações” não contemplem seus procedimentos, tornando a interpretação contida em sua norma local, na prática, inexequível; B – doutrinadores de referência em licitações e contratos (que notadamente só analisam a regulamentação federal) influenciarem agentes públicos, órgãos de controle e outros atores envolvidos a simplesmente abandonarem a interpretação contida na norma local naquilo que ela discrepar da legislação federal e C – a jurisprudência do TCU (que só se debruça sobre normas federais) tutelar, mesmo que indevidamente, os procedimentos regulamentados pela norma legal de forma tal que conferem ar de equívoco ou de ilegalidade à norma local.

Como se vê, a regulamentação da Lei nº 14.133/2021 traz diversos questionamentos de ordem prática que certamente precisam ser objeto de um melhor debate e consequente enfrentamento por parte de quem atua nas licitações e contratações do Poder Público.

Por Aldem Johnston Barbosa Araújo, advogado de Mello Pimentel Advocacia.

E-mail: [email protected].

Sobre o autor
Aldem Johnston Barbosa Araújo

Advogado em Mello Pimentel Advocacia. Membro da Comissão de Direito à Infraestrutura da OAB/PE; Autor do livro "Processo Administrativo e o Novo CPC - Impactos da Aplicação Supletiva e Subsidiária" publicado pela Editora Juruá; Articulista em sites, revistas jurídicas e periódicos nacionais; Especialista em Direito Público.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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