Subteto do Procurador de Estado e carreiras essenciais à Justiça

26/02/2023 às 19:59
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Não há como confundir o Procurador de Estado, operador de direito, com outros servidores burocráticos do Executivo.

No Brasil pós-Constituição Cidadã, não é possível imaginar uma Administração Pública séria, dinâmica, eficiente e legalista sem a valorização da carreira de Procurador de Estado. Este, além de fiscal da legislação administrativa e da moralidade no serviço público, é o representante judicial e extrajudicial dos Estados-membros, abrangendo os três Poderes.

Antes de ser um ato de justiça, a aprovação do subteto dos Procuradores constituiu uma adequação piramidal de categorias afins, com fundamento consagrado na Constituição Federal.

Com efeito, o Procurador de Estado pertence à única categoria funcional do Executivo cujos poderes e deveres são impostos pela Carta Magna, com exigências inafastáveis, como a realização de concurso público para ingresso na carreira, seguindo as mesmas diretrizes aplicáveis à Magistratura, ao Ministério Público e à Defensoria Pública.

Ademais, é notório que o Procurador de Estado atua como porta-voz, representante e defensor judicial e extrajudicial dos Estados-membros, os quais englobam os Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário, bem como o Ministério Público e o Tribunal de Contas, conforme disposto no artigo 132 da Constituição Federal.

Ao lado dos integrantes do Poder Judiciário, dos membros do Ministério Público e da Defensoria Pública, os Procuradores de Estado formam, constitucionalmente, as carreiras jurídicas essenciais à Justiça, motivo pelo qual o Constituinte de 1988 assegurou-lhes tratamento jurídico simétrico.

Os Tribunais Superiores, especialmente o STF, têm reconhecido ao Procurador de Estado a condição de agente político, sendo definido como "presentante" do Estado e defensor dos princípios constitucionais da legalidade e moralidade administrativa.

Os Procuradores de Estado estão dispensados de apresentar procuração para representar o Estado em juízo, uma vez que são considerados a própria presença do Estado, conforme entendimento do ministro Marco Aurélio (STF), que os definiu como “presentantes” do Estado.

O Procurador de Estado não é um funcionário comum. Ele integra, ao lado da Magistratura, do Ministério Público e da Defensoria Pública, as poucas carreiras de Estado que exercem funções essenciais à Justiça (Capítulo IV, Seção II, art. 132 da CF). Seu ingresso se dá mediante concurso público, e sua estabilidade está prevista em dispositivos próprios da Lei Suprema, incluindo a fixação de remuneração com ressalvas e destaques no texto original da Constituição (art. 135).

O subteto salarial dos Procuradores de Estado, tendo como referência o subsídio de Ministro do STF e a similitude com as demais carreiras jurídicas, como a Magistratura, o Ministério Público e a Defensoria Pública, representa o equilíbrio necessário entre as funções essenciais à Justiça e a observância da Constituição Federal quanto ao tratamento igualitário que deve ser dispensado às referidas instituições.

Excluir os Procuradores de Estado do subteto seria contradizer uma emenda aprovada por unanimidade pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal e promulgada pelo Presidente da República.

Caso tal exclusão ocorresse, instaurar-se-ia o caos legislativo, minando a confiança nas instituições e gerando insegurança jurídica, cujas bases permanecem, até hoje, protegidas pela Constituição Federal.

O título IV da Constituição Federal, dedicado à “Organização dos Poderes”, divide-se em quatro capítulos. Os três primeiros tratam dos Poderes clássicos – Legislativo, Executivo e Judiciário –, enquanto o quarto capítulo aborda as “Funções Essenciais à Justiça”, notadamente o Ministério Público, a Defensoria Pública e a Advocacia Pública (incluindo os Procuradores de Estado).

Isso demonstra que o constituinte originário reconheceu a dependência do Poder Judiciário, para o exercício de suas funções, dessas instituições indispensáveis. Por serem tão complementares, essas instituições funcionam como os braços, as pernas, os olhos e os ouvidos da boa administração da Justiça.

Antes mesmo do advento da atual Constituição, Alcino Salazar, em sua obra clássica “Poder Judiciário – Bases para Reorganização” (Forense, 1975, p. 263), já previa que: “Claro está que o advogado é também órgão da Justiça. Entra na composição do organismo judiciário como um dos seus elementos indispensáveis.” O autor conclui: “Sua essencialidade e indispensabilidade foram, em 5 de outubro de 1988, com a Constituição Cidadã, alçadas ao âmbito constitucional.”

Em razão disso, todas as instituições essenciais à Justiça, como o Ministério Público, os Defensores Públicos e os Procuradores de Estado, obtiveram, após debates exaustivos na Câmara e no Senado, tratamento equânime no que se refere ao subteto salarial, correspondente a 90,25% (noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento) do subsídio do Ministro do STF, que é o teto nacional.

Não havia, nem há, razão plausível para tratamento distinto.

O Procurador de Estado é órgão eminentemente do Estado, com ele se confundindo, sendo considerado uma instituição constitucional (art. 132 da CF).

A especificidade de suas funções essenciais à Justiça levou ao reconhecimento de que se trata de atividade exclusiva de Estado (art. 247 da CF, com fundamento no art. 32 da EC n.º 19/98).

Não se deve confundir o Procurador de Estado, operador do Direito, com outros servidores administrativos do Executivo.

O Procurador de Estado é uma matriz jurídica fundamental, agente político (no sentido original da “polis” grega), que atua com impessoalidade (escolha por sorteio ou distribuição processual) e independência funcional (livre pensar e agir em nome do interesse público e da ordem jurídica).

O renomado constitucionalista José Afonso da Silva, um dos elaboradores da Constituição de 1988, destacou que:

“Seus membros deixaram de ser meros servidores públicos burocráticos, limitados à defesa formal dos interesses patrimoniais da Fazenda Pública, para se tornarem peças essenciais na configuração plena de um Estado Democrático de Direito” (RDA 230/289).

A professora Carmen Lúcia Antunes Rocha, em sua obra Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos (Saraiva, 1999, pp. 181-182), complementa:

“O Advogado Público possui vínculo jurídico específico e compromisso peculiar com o interesse público, que há de ser concretizado pelo governante e pelo administrador. Tal interesse não sucumbe nem se altera a cada quatro anos, conforme os humores de grupos transitórios no poder. Por isso, o advogado público não pode se submeter a interesses subjetivos ou passageiros, devendo prestar contas diretamente aos cidadãos.”

Diante dessas assertivas, fundamentadas na Constituição vigente, na doutrina e em jurisprudência consolidada, bem como na simetria funcional que norteia as carreiras essenciais à Justiça, não se justifica qualquer alteração no texto original da PEC 41, amplamente debatida e aprovada por unanimidade quanto ao subteto salarial.

Sobre o autor
Adalberto Targino

Procurador do Estado,Professor,ex-Promotor de Justiça e membro das Academias de Letras Jurídicas do RN e PB e do Instituto dos Advogados Brasileiros.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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