PALAVRAS-CHAVE: Artigo científico. Direito Constitucional. Atividade de Advocacia.
1 Introdução
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário nº 1240999, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.074), e da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4636, que os Defensores públicos não estão sujeitos ao Estatuto da Advocacia.
Trata-se de decisão que declarou a regra do artigo 3º, parágrafo 1º, da Lei 8.906/1994, incompatível com a Constituição Federal, ao passo que o Defensor Público submete-se somente ao regime próprio da Defensoria Pública, sendo irregular sua sujeição ao Estatuto da OAB.
2 Da Atividade de Advocacia
A advocacia é considerada uma das profissões mais antigas do mundo, e é consagrada pela Constituição Federal como uma das atividades indispensáveis à administração da justiça.
O exercício da advocacia é regulamentado pela Lei Federal nº 8.906/94 (Estatuto da OAB), pelo Código de Ética e Disciplina e pelos Provimentos do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
Conforme se depreende dos artigos 1º e 4º da Lei 8.906/1994, atividades tais como, postulação, consultoria e assessoria, são privativas da advocacia, e o exercício dessas atividades por pessoa não inscrita na OAB é passível de nulidade, além de sanções civis, penais e administrativas.
3 Da Atividade do Defensor Público
Nos termos da Constituição Federal, "a Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados" (artigo 134, caput).
Após a Emenda Constitucional nº 45/2004, foi conferida autonomia administrativa e funcional (art. 134, §2º, CF), bem como financeira (art. 168, CF), as Defensorias Públicas, de modo que o referido órgão não integra a estrutura do Poder Executivo.
Portanto o Defensor Público atua no atendimento jurídico em sentido amplo, de natureza judicial e extrajudicial, e possui legitimidade para atuar não só individualmente, mas também por meio da tutela coletiva.
4 DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.240.999/SP
Trata-se na origem de mandado de segurança coletivo impetrado pela ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE DEFENSORES PÚBLICOS – APADEP em face da ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SEÇÃO DE SÃO PAULO – OAB/SP, com o objetivo de anular as decisões que indeferiram os pedidos de cancelamento das inscrições na OAB pelos Defensores Públicos, afastando, assim a competência disciplinar da OAB, e o pagamento das contribuições anuais.
Em primeira instância a ação foi julgada improcedente, no entanto, o Tribunal Regional Federal da Terceira Região deu parcial provimento à apelação da ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE DEFENSORES PÚBLICOS – APADEP, fixando as seguintes teses, (i) atuam os Defensores Públicos como autênticos advogados na defesa dos interesses dos necessitados que não possuem condições de custear as despesas com a contratação de um patrono particular. É cediço utilizarem-se os defensores públicos, no exercício do cargo, do número da inscrição na OAB como identificação nas peças processuais que subscrevem, além de concorrerem na classe dos advogados ao quinto constitucional destinado à categoria a compor os Tribunais, na forma do artigo 94 da Constituição Federal; (ii) Como advogados e, nessa qualidade, os defensores públicos devem possuir inscrição dos quadros da OAB, contribuindo para o Conselho na forma prevista na legislação de regência; (iii) O Defensor Público deve submeter-se a ambos os regimes (estatutário e OAB), não sendo possível a ele aplicar os comandos da Lei nº 8.906/94 quando conflitantes com a legislação específica e estatutária, pois, no confronto, devem prevalecer as disposições que regem a carreira, para que não ocorra o bis in idem.
O Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao Recurso Especial interposto pela Associação Paulista dos Defensores Públicos - APADEP, declarando a desnecessidade de inscrição dos Defensores Públicos nos quadros da OAB, para o exercício de suas atribuições.
A OAB/SP e o Conselho Federal da OAB, apresentaram recurso extremo ao STF, sustentando que (i) os Defensores públicos exercem essencialmente a atividade advocatícia, razão pela qual devem estar inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil para que possam postular em juízo; (ii) mostra-se razoável a sujeição dos defensores públicos ao regime ético-disciplinar da OAB concomitantemente com o respectivo regime disciplinar-funcional da Defensoria Pública Estadual; (iii) não há qualquer incompatibilidade entre as Leis que regem a carreira do Defensor Público (Lei Complementar 81/94) e a atividade advocatícia (Estatuto da OAB Lei, 8.096/94); (iv) “Não há que se falar, portanto, que a Constituição Federal não exige a inscrição dos Defensores Públicos na OAB, uma vez que ninguém pode, em princípio, procurar em juízo sem a devida inscrição na Entidade da Advocacia”, (v) os editais de concurso para o cargo de defensor público apresentam como requisito a inscrição na OAB para posse no respectivo cargo, o que não teria sentido se o cancelamento pudesse ser requerido após a posse.
O Supremo Tribunal Federal negou provimento ao Recurso extraordinário, fixando a seguinte tese de Repercussão geral: É inconstitucional a exigência de inscrição do Defensor Público nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil.
Para os Ministros do STF a Defensoria Pública foi alocada na CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988 no rol das funções essenciais à justiça, nos seus arts. 134 e 135, sendo que sua permanência no Estado Democrático de Direito da nossa República Federativa é reputada indispensável.
Assim, na interpretação da Constituição Federal, o STF concluiu que “o artigo 4º, § 6º, da Lei Complementar 80/1994, na redação dada pela Lei Complementar 132/2009, prevê que a capacidade postulatória do defensor decorre exclusivamente de sua nomeação e posse no cargo público, no que torna irrelevante, sob o prisma jurídico processual, a sua inscrição nos quadros da OAB.”
Logo, o Defensor Público submete-se, única e exclusivamente, ao Estatuto da Defensoria Pública, de modo que o art. 3º da Lei 8906/1994, ao estatuir a dupla sujeição ao regime jurídico da OAB e da Defensoria Pública, seja da União, seja estadual, não se harmoniza com a CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
8 Conclusão
Diante do exposto, em que pese o exercício de atividades análogas entre Advogados e Defensores Públicos, a Emenda Constitucional 80/2014, fez separação dessas duas categorias de profissionais, indicando que o Constituinte quis explicitar, ainda mais, a distinção existente entre as carreiras.
Conclui-se assim que, a diferença entre as carreiras de Advogado e Defensor, se consubstancia no fato de o primeiro exercer sua atividade em caráter privado e o segundo exercer atividade de natureza pública, de modo que o Defensor Público submete-se somente ao regime próprio da Defensoria Pública, sendo irregular sua sujeição ao Estatuto da OAB.
9 Referências
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, Senado, 1988.
BRASIL. Lei 8.906/94 – Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, VADE MECUM, Editora Rideel, 10ª edição, 2010, São Paulo.
Recurso Extraordinário nº 1240999 - Disponível em: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em: fev/2023. BRASIL. Supremo Tribunal Federal.