O Papel da Defensoria Pública no Processo Penal Brasileiro

02/03/2023 às 16:22
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RESUMO

 

O presente artigo possui como objetivo discorrer sobre a Defensoria Pública e a sua importância ao Processo Penal brasileiro. A Defensoria Pública foi um órgão instituído para auxiliar na efetivação dos direitos fundamentais da população carente, que não possui dinheiro, normalmente, para contratar um advogado particular, portanto a Defensoria Pública age em prol dos interesses desse cliente, chamado de assistido, eis que o acesso à justiça é um direito constitucionalmente garantido a todos os cidadãos. Assim, abordar-se-á o papel da Defensoria Pública de modo geral no Processo Penal brasileiro, suas particularidades, prerrogativas e outras questões que irão demonstrar o porquê deste órgão se diferenciar da advocacia privada. Este artigo foi elaborado seguindo o método indutivo, com abordagem qualitativa, e por meio de pesquisa bibliográfica nas mais diversas fontes, como legislações, doutrinas e jurisprudências.

 

Palavras-chave: Defensoria Pública. Acesso à Justiça. Processo Penal Brasileiro.

 

 

 


 


1.      INTRODUÇÃO

 

O direito de acesso à justiça é um direito constitucionalmente assegurado no artigo 5º, inciso XXXV da Lei Maior, que estabelece que “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

Também é constitucionalmente prevista a dignidade da pessoa humana como um valor fundamental do Estado Democrático de Direito brasileiro, de forma que todas as pessoas devem ser tratadas igualmente, na medida de suas desigualdades. E a dignidade da pessoa humana é um valor intrínseco, inerente a todo ser humano, para que possa ter uma vida digna, ou seja, uma vida na qual todos seus direitos fundamentais são assegurados, e possa viver uma vida condizente à sua situação como ser humano.

Foi nesse contexto que a Defensoria Pública surgiu, eis que, uma coisa é certa, toda pessoa, eventualmente, irá necessitar recorrer ao Poder Judiciário para fazer valer um direito seu.

Antes do surgimento da Defensoria Pública, a jurisdição era mais reservada à pessoas que pudessem arcar com os custos de um advogado. Ocorre que, as lesões ou ameaças de lesões não escolhem classes sociais para acontecerem, elas atingem, eventualmente, todo tipo de pessoa, desde as mais favorecidas com recursos financeiros, até as mais carentes.

Assim, a Defensoria Pública constitui um grande papel no direito processual brasileiro, eis que busca assegurar os direitos da população carente, atuando, dessa forma, como um órgão público, voltado a dirimir as desigualdades sociais.

Dessa forma, este trabalho buscará discorrer, um pouco mais, sobre o papel da Defensoria Pública no ordenamento jurídico brasileiro, trazendo-se o contexto histórico, como surgiu, prerrogativas conferidas ao órgão para uma desburocratização do atendimento à população carente, situações em que a Defensoria Pública é legitimada a agir, e particularidades conferidas ao órgão para tornar o trabalho mais célere.

Este artigo foi elaborado seguindo o método indutivo, com abordagem qualitativa, e vasta pesquisa bibliográfica em doutrinas, legislações e jurisprudências, o intuito de demonstrar a importância do instituto em questão.

Espera-se que ao final seja possível concluir a importância da Defensoria Pública para o ordenamento jurídico brasileiro, mais especificamente, para o direito processual penal, em busca à diminuição das desigualdades sociais que assolam este país.

 

2.      A DEFENSORIA PÚBLICA

 

O Estado é responsável por criar, através de políticas sociais, condições dignas de vida para todas as camadas da sociedade. Sozinho, porém, não é capaz de pôr em prática tal política. Daí a necessidade de, superando conceitos neoliberais e estatistas, promover uma ação conjunta entre Estado, mercado, e sociedade civil, em que representantes dessas três esferas discutirem suas propostas, encaminhando soluções (SOUZA JUNIOR, 2012).

É a Defensoria Pública, assim, incumbida de conferir acesso à justiça para a grande maioria da população brasileira, privada das mínimas condições de vida digna. Como se trata de uma instituição nova– criada pela Carta Constitucional de 1988 – ainda sofre equívocos que a impede de exercer o seu papel de inserção social, imprescindível à efetivação da Justiça (DA ROCHA, 2005, p. 2).

 

Houve a opção brasileira pela Defensoria Pública como forma de possibilitar o acesso à Justiça, diante da preocupação em tornar o acesso à Justiça legitimamente igualitário e eficaz.

É por meio das Defensorias Públicas que o Estado cumpre o seu dever de garantir o acesso à Justiça das pessoas desprovidas de recursos financeiros.

Isto porque, a Assembleia Nacional Constituinte, reunida em 5 de outubro de 1988, inaugurou uma nova ordem jurídica com a promulgação da vigente Constituição Federal, a qual foi denominada Constituição Cidadã pelo saudoso deputado federal Ulisses Guimarães em razão da grande participação popular na elaboração de seu texto, e bem assim, da significativa ruptura com mais de duas décadas de regimes totalitários no Brasil. (SOUZA JÚNIOR, 2012).

 

É a Defensoria Pública, desta forma, a responsável pela descoberta do verdadeiro problema que aflige o brasileiro excluído (na grande maioria dos casos, o diagnóstico inicial, provocador da procurado Defensor, é a ponta de um iceberg). Tal descoberta é viabilizada por um atendimento digno, estruturado, inserido em uma verdadeira rede de cidadania, mediante   estrutura   humana   e   material   na conformidade da determinação constitucional. O simples ato de protocolizar uma petição inicial apenas aumentaria o tamanho da parte submersa que um dia acabará por estourar e, provavelmente, prejudicara vida em sociedade. Não se pode simplesmente diminuir a febre, mas tem-se que curar a infecção (DA ROCHA, 2005, p. 2).

                       

2.1. PERSPECTIVA HISTÓRICA ACERCA DA DEFENSORIA PÚBLICA E DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA NO BRASIL

 

O processo histórico para se chegar ao conceito atual de acesso à Justiça e de cidadania nos remete ao limiar da civilização ocidental. Na Antiguidade Clássica já havia, ainda que restrita, a preocupação com os temas relacionados ao acesso à Justiça (DE ALMEIDA, 2013, p. 12).

A Defensoria Pública surgiu no Brasil como instituição essencial à função jurisdicional do Estado com a promulgação da Constituição de 1988. Em seu art. 134, caput, a Constituição Federal fixou o conceito de Defensoria Pública ao dispor que: “Art. 134 A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5°, LXXIV” (BARRETO, 2007, p. 162).

Ao fim do século XX, com a intensificação dos processos de globalização da economia, crises dos mercados financeiros e a ineficiência do Estado em mudar esse cenário, proporcionaram um maior debate sobre os riscos a que está submetida à população mundial e como estes contribuem para sua fragilização (PESSOA, 2018, p. 188).

O contexto histórico do acesso à justiça no Brasil começou durante o período imperial, com uma iniciativa do jurista Thomaz Nabuco de Araújo, também fundador do Instituto dos Advogados do Brasil – IAB, de 1866 até 1873. Thomaz tentou, por meio do Poder Legislativo, conferir destaque ao acesso à justiça como uma forma de garantir a justiça e estruturar um sistema de assistência jurídica. Desta forma, foi criado o cargo denominado “Advogado dos Pobres”, tendo como objetivo central defender os réus de delitos penais, e em troca de seus serviços prestados, recebiam como pagamento o Tesouro público, e desta forma nasce os primeiros “Defensores Públicos do Brasil”. Entretanto, o movimento foi extinto em 1884 (ROMERO JÚNIOR, 2016 apud RANGEL, 2018, p. 24).

O direito fundamental de acesso à justiça foi devidamente prestigiado com a criação da Defensorias Pública em nosso país, pois com isso se pretendeu garantir que tal direito não ficasse limitado aqueles que reúnem melhores condições financeiras de arcar com os custos de uma lide (DE OLIVEIRA, 2016, p. 22).

 

2.2. A NATUREZA JURÍDICA DA DEFENSORIA PÚBLICA

 

Em relação às formas que a Defensoria Pública intervém no processo, estabelece o CPC/2015 que ela pode se dar por: a) representação processual; b) legitimação ordinária; c) legitimação extraordinária; d) “amicus curiae”; e) curadoria especial. Assim, pode a instituição representar direito alheio, em nome alheio (representação processual); pode, em nome próprio, portar interesse institucional (legitimidade ordinária); pode, em nome próprio, ajuizar demanda coletiva na defesa de direitos transindividuais (legitimidade extraordinária); pode, em nome próprio, a partir do interesse público e da relevância temática, intervir como terceiro sui generis 15 , (“amicus curiae”); ou pode atuar nas hipóteses do artigo 72, como representante processual do incapaz ou como legitimada em favor de ausentes (curadoria especial) (KETTERMANN, 2017 et al, p. 100).

 

Apesar das qualificações um pouco diversas, percebemos que o ponto comum das duas posições consiste no reflexo processual da atribuição, ou seja, a sua natureza jurídica como elemento que interfere na capacidade postulatória dos membros da Defensoria Pública.

É por esta razão que o instituto deve ser encarado como a pedra fundamental da instituição. Toda a essência da Defensoria Pública deve girar em torno de sua atribuição, não bastando apenas que haja um Defensor Público.

Em verdade, para que haja a regular atuação institucional, em respeito ao princípio constitucional da legalidade, o Defensor Público deve ter atribuição para prestar a assistência jurídica ao assistido, seja de natureza genérica, em razão do acúmulo de funções do órgão de atuação, seja em caráter específico, em razão de designação especial.

A atribuição, por tal razão, tem natureza intra e extraprocessual, pois é cediço que a assistência jurídica prestada pela Defensoria Pública não se resume apenas à atuação perante os órgãos do Poder Judiciário, de modo que o instituto é dotado de ampla concepção. Não é demais lembrar que o art. 4º da Lei Complementar nº 80/1994 e as legislações estaduais estabelecem inúmeras funções institucionais da Defensoria Pública, muitas delas não relacionadas a órgãos do Poder Judiciário. (ESTEVES, 2015).

 

Agora, os assistidos, a par do acesso ao judiciário, podem reclamar todo tipo de assistência pertinente aos atos jurídicos. De sorte que, incluem-se neste plexo: a instauração e movimentação de processos administrativos perante quaisquer órgãos públicos; os atos notariais e quaisquer outros de natureza jurídica praticados extrajudicialmente; a prestação de serviços de consultoria, ou seja, de informação e aconselhamento em assuntos jurídicos (SILVA, 2011). Dessa forma, nota-se que a Defensoria Pública possui, também, o papel de aconselhadora jurídica, auxiliando os assistidos.

A partir de tal interpretação literal, as funções típicas da Defensoria Pública seriam apenas aquelas relacionadas à tutela dos direitos dos hipossuficientes econômicos, sem levar em conta as vulnerabilidades de natureza jurídica ou organizacional (MELOTTO, 2014, p. 28).

Dentro desta classificação tradicional, as funções atípicas da Defensoria Pública seriam aquelas que não se relacionam com a condição econômica dos destinatários, sendo realizadas pela instituição independente da verificação de hipossuficiência dos destinatários (MELOTTO, 2014, p. 28).

 

2.3. A AUTONOMIA DA DEFENSORIA PÚBLICA

 

A autonomia conferida às Defensorias Públicas é assegurada pela lei maior, em seu artigo 134, §2º, que estabelece que:

 

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal.

§ 2º Às Defensorias Públicas Estaduais são asseguradas autonomia funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias e subordinação ao disposto no art. 99, § 2º. (BRASIL, 1988).

 

Certamente, a defesa social e jurídica de categorias estigmatizadas e marginalizadas encontra seu preço e custo político. Nesse sentido, é notória a dificuldade de estruturação que a Defensoria Pública brasileira encontra desde a nacionalização e ordem de interiorização do modelo em 1988. A dificuldade foi tamanha que forma engendrados esforços para concessão da autonomia e retirá-la do jugo do Estado-Executivo, este que é muitas vezes o grande violador dos direitos dos mais necessitados – daí uma das razões da concessão autonomia do Estado Defensor, iniciada pelas Defensorias Estaduais em 2004 (Emenda Constitucional –EC. 45/2004) (MAIA, 2017 apud SILVA; SARQUIS JÚNIOR; SOUZA; LIMA, 2022, p. 19259).

A despeito das diferenças entre as Defensorias, todas elas sofreram, em maior ou menor medida, as consequências da ausência de autonomia e da subordinação ao Executivo. Esse status constrangia a possibilidade de executar projetos próprios, condizentes com as prioridades estabelecidas pela própria instituição. Não controlando os recursos para o exercício de gerenciamento interno, eram limitadas as condições para o exercício de autogestão e de definição e implementação de políticas adequadas e de qualidade (BARROS; MACHADO, 2018, p. 232).

Dos dados são notáveis as variações de arranjo organizacional e operacional entre as unidades da Federação. E o Diagnóstico pôs em evidência a precariedade do acesso à Justiça até então no país. Por este motivo, o governo federal estabeleceu como ponto prioritário na reforma constitucional do Judiciário a concessão de autonomia funcional, administrativa e iniciativa de proposta orçamentária à Defensoria, meio de se reverter o processo de apatia e indiferença com assistência jurídica gratuita que marcou a década de 90 (BARROS; MACHADO, 2018, p. 232).

 

 

2.4. PRINCÍPIOS INSTITUCIONAIS DA DEFENSORIA PÚBLICA

 

A partir dos anos 1970, os princípios e conceitos dos direitos humanos - tanto civis e políticos quanto econômicos e sociais - emergiram como elementos da agenda política, ganhando maior visibilidade com o término do regime militar. Já no início dos anos 1980, os movimentos sociais progressivamente dedicavam-se à promoção dos direitos sociais e econômicos dos setores pobres da população, além de demandarem novos direitos que ampliassem o processo de inclusão social. Assim, iniciou-se a defesa dos direitos dos grupos chamados "minoritários", como negros, mulheres, homossexuais, crianças e portadores de deficiência, além da promoção do direito de moradia, educação, saúde e a defesa do meio ambiente. Essa luta da sociedade civil pelo restabelecimento do estado de direito teve como ponto de apoio os movimentos sociais (PINHEIRO, 2001 apud MOTTA, RUEDIGER e RICCIO, 2006).

O grande salto da Defensoria ocorreu a partir da Constituição da República de 1988. Os princípios assegurados pela Carta Magna no seu art.5º, que estruturam as garantias fundamentais dos cidadãos, abordam a Defensoria Pública e o papel do defensor público no processo de constituição do acesso à Justiça (MOTTA, RUEDIGER e RICCIO, 2006).

Nesse aspecto, a Constituição do Rio de Janeiro de 5-10-1989 tomou a dianteira em relação às outras unidades federativas. Nessa Carta constitucional, o campo de atuação da Defensoria Pública ultrapassa as normas estabelecidas pela CF/88. Em primeiro lugar, o Procurador-Geral da Defensoria Pública tem legitimidade para propor ação direta de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais e municipais em face da Constituição Estadual (CERJ/89, art.162). Em segundo lugar, estabelece uma novidade no campo de ação dessa instituição: além dos direitos individuais - tradicionalmente representados pelos defensores públicos -, também inclui os direitos coletivos e difusos (MOTTA, RUEDIGER e RICCIO, 2006).

O artigo 3º da Lei Complementar nº 80/1994, estabelece que são princípios institucionais da Defensoria Pública a unidade, indivisibilidade e independência funcional.

 

2.4.1. PRINCÍPIOS DA UNIDADE, INDIVISIBILIDADE E DA INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL

 

O princípio da unidade aponta que a Defensoria Pública é uma instituição única, razão pela qual seus membros compõem um corpo único. Contém três elementos, a unidade hierárquico-administrativa no contexto institucional, assim como a unidade funcional e normativa (PIRES, 2022).

Quando se fala em princípio da unidade, o próprio nome já traz a ideia do seu significado, correspondendo a “um todo orgânico, sob uma mesma direção, mesmos fundamentos e mesmas finalidades” (MORAES, 1997, p. 46 apud BARROSO e LIMA, 2007, p. 395).

Outro ponto importante vinculado ao princípio da unidade institucional, diz respeito à inamovibilidade do Defensor Público, o que lhe garante poder desenvolver suas funções de forma independente, sem temer uma remoção, como forma de punição pela sua atuação na defesa dos direitos dos hipossuficientes, em confronto com poderosos influentes (BARROSO e LIMA, 2007, p. 395).

Paiva (2017) explica que o princípio da unidade é basicamente a ocorrência de integrarem um todo sob somente uma administração, devido à independência existente entre os membros.

Importante observar que, sob o prisma orgânico, a unidade somente existe no âmbito de cada Defensoria Pública, já que compõem estruturas organizacionais distintas e encontram-se sob chefia institucional diversa. A Defensoria Pública Estadual tem uma unidade orgânica, já a Defensoria Pública da União tem outra unidade orgânica (CARVALHO, 2016, p. 58).

Outra peculiaridade é a indivisibilidade, os membros da Defensoria Pública podem se substituir, a fim de alcançar seu objetivo que é dar continuidade na execução de suas tarefas, indispensável o uso do substabelecimento, uma vez que nesse meio não há procuração, todo esse procedimento deve ser regulado pelas 4 normas internas, devidamente fundamentadas, previsto em lei complementar nº 80 de 12 de janeiro de 1994 (GONÇALVES, 2018).

Segundo Junkes (2005 apud CARVALHO, 2016), o princípio da indivisibilidade decorre do princípio da unidade, sendo muito semelhante, sendo que a Defensoria Pública é um todo orgânico, não se admitindo rupturas e fracionamentos, o que poderia implicar a possibilidade de seus membros substituírem-se uns aos outros sem qualquer prejuízo para a atuação da instituição ou para a validade processual.

A indivisibilidade completa um ciclo de proteção institucional da Defensoria Pública, impedindo tanto a ruptura externa quanto interna (PAIVA, 2016, p. 33 apud PIRES, 2022, p. 14).

Já em relação ao último princípio de que é dotada a Defensora Púbica, qual seja: o princípio da independência funcional, o mesmo reflete a autonomia que a Defensoria Pública possui perante os outros órgãos, não podendo sofrer, dessa maneira, qualquer interferência política visando a prejudicar a sua atuação (BARROSO e LIMA, 2007).

Importante observar, no entanto, que a independência funcional do Defensor Público não é absoluta, pois se mostra inadmissível a existência de poderes absolutos no atual Estado Democrático de Direito. Ao contrário do indivíduo, que tem permissão para fazer tudo aquilo que a ordem jurídica não tenha proibido, aquele que exerce funções públicas apenas se encontra autorizado a fazer o que a ordem jurídica permite. Com isso, a atuação do Defensor Público, assim como a de todo e qualquer agente político, deve estar obrigatoriamente baseada em autorização conferida por norma válida. Nesse ponto, a legalidade deve atuar como15 autêntica lanterna, iluminando o caminho a ser percorrido pelo Defensor Público no exercício de suas funções; tudo aquilo que permanecer nas sombras deverá ser repelido na atuação do membro da Defensoria Pública, por ser contrário à lei ou à Constituição (ESTEVES e SILVA, 2018, p. 746-747 apud PIRES, 2022, p. 15).

Por dependência funcional, deve-se entender que a Instituição é dotada de autonomia perante os demais órgãos estatais, estando imune de qualquer interferência política que afete a sua atuação, o que é demonstrado pela nomeação do Defensor Público-Geral dentre os componentes da carreira, a existência de um regime jurídico próprio dos Defensores Púbicos, garantis e prerrogativas. Vale ressaltar que, em face do princípio institucional da independência funcional, os Defensores Públicos, de acordo com a classificação adotada por Hely Lopes Meirelles, são agente políticos do Estado, ou seja, agentes públicos que executam atribuições determinadas na Constituição Federal, dependendo, para tal, de independência funcional e outras prerrogativas (MORAES, 1997, p. 47 apud CARVALHO, 2016, p. 61).

 

2.5. PRERROGATIVAS DOS DEFENSORES PÚBLICOS

 

As prerrogativas atribuídas ao advogado criminal ou ao defensor público pela respectiva legislação, sobretudo no processo penal, são instrumentos eficazes e indispensáveis a efetivação dos direitos e garantias fundamentais do cidadão defendido e da vítima, com vistas a salvaguardar o princípio maior, que é da dignidade humana (DA SILVA, 2011, p. 57).

O Defensor Público [...] postula e defende seus assistidos (e não clientes!) por prerrogativa constitucional, sem necessidade alguma de apresentação de mandato, pois este, na realidade, lhe é conferido pelo próprio Estado, no ato de sua nomeação e posse. Além disso, o Defensor Público patrocina interesses de determinada classe social que se acha alijada do mercado privativo da advocacia, justamente para permitir o acesso de todos à Justiça, sem distinção de qualquer natureza. Trata-se do princípio da igualdade de todos perante a lei, baluarte da democracia e do progresso social. [...] (GALLIEZ, 1999, p. 43-45 apud DA MOTTA, 2011, p. 89).

O prejuízo ao cidadão defendido, em razão da violação de prerrogativas do defensor é ainda um tema pouco explorado pela doutrina. Destarte, de início, cumpre assinalar que todos aqueles que exercem relevante função pública, com previsão constitucional (parlamentares, presidente, governadores, prefeitos, membros do Poder Judiciário e do Ministério Público, advogados, defensores públicos, ministros, oficiais das militares), gozam de prerrogativas para o livre exercício de suas valorosas funções, em decorrência da finalidade última que é assegurar direitos e garantias fundamentais (DA SILVA, 2011, p. 109).

O artigo 44 da Lei Complementar nº 40/1994, estabelece como prerrogativas da Defensoria Pública da União, as seguintes (as quais também se comunicam às Defensorias Públicas estaduais):

 

Art. 44. São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública da União:

I - receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância administrativa, contando-se lhes em dobro todos os prazos;

II - não ser preso, senão por ordem judicial escrita, salvo em flagrante, caso em que a autoridade fará imediata comunicação ao Defensor Público-Geral;

III - ser recolhido a prisão especial ou a sala especial de Estado­ Maior, com direito a privacidade e, após sentença condenatória transitada em julgado, ser recolhido em dependência separada, no estabelecimento em que tiver de ser cumprida a pena;

IV - usar vestes talares e as insígnias privativas da Defensoria Pública;

VI - ter vista pessoal dos processos fora dos cartórios e secretarias, ressalvadas as vedações legais;

VII - comunicar-se, pessoal e reservadamente, com seus assistidos, ainda quando esses se acharem presos ou detidos, mesmo incomunicáveis, tendo livre ingresso em estabelecimentos policiais, prisionais e de internação coletiva, independentemente de prévio agendamento;

VIII - examinar, em qualquer repartição pública, autos de flagrantes, inquéritos e processos, assegurada a obtenção de cópias e podendo tomar apontamentos;

IX - manifestar-­se em autos administrativos ou judiciais por meio de cota;

X - requisitar de autoridade pública e de seus agentes exames, certidões, perícias, vistorias, diligências, processos, documentos, informações, esclarecimentos e providências necessárias ao exercício de suas atribuições;

XI - representar a parte, em feito administrativo ou judicial, independentemente de mandato, ressalvados os casos para os quais a lei exija poderes especiais;

XII - deixar de patrocinar ação, quando ela for manifestamente incabível ou inconveniente aos interesses da parte sob seu patrocínio, comunicando o fato ao Defensor Público-Geral, com as razões de seu proceder;

XIII - ter o mesmo tratamento reservado aos magistrados e demais titulares dos cargos das funções essenciais à justiça;

XIV - ser ouvido como testemunha, em qualquer processo ou procedimento, em dia, hora e local previamente ajustados com a autoridade competente;

Parágrafo único. Quando, no curso de investigação policial, houver indício de prática de infração penal por membro da Defensoria Pública da União, a autoridade policial, civil ou militar, comunicará, imediatamente, o fato ao Defensor Público-Geral, que designará membro da Defensoria Pública para acompanhar a apuração. (BRASIL, 1994).

 

Conforme artigo 44, inciso I da Lei Complementar nº 80/1994, uma das prerrogativas concedidas à Defensoria Pública é a contagem do prazo em dobro; assim, cabe explicar um pouco mais, no tópico seguinte, sobre essa prerrogativa.

 

2.5.1. DO PRAZO PROCESSUAL EM DOBRO

 

Os Defensores Públicos possuem a prerrogativa dos prazos processuais em dobro, conferida pela Lei Complementar 80/94, a fim de viabilizar o cumprimento dos prazos do grande número de processos que, semanalmente, recebem de carga processuais (DA ROSA, 2016, p. 24).

A concessão de prazos processuais em dobro para a Defensoria Pública, constitui, de certa forma, uma prerrogativa concedida à este órgão. Antes de privilégios pessoais, as prerrogativas expressam “direitos exclusivos” constituídos com a finalidade de que a função pública realizada pelos agentes possa ser cumprida da melhor maneira. Elas não existem para servir ao ocupante do cargo, mas, sim, para que ele esteja munido de um aparato ideal para desempenhar as funções que lhe foram cometidas (LIMA, 2012, p. 297 apud DOS SANTOS, 2020, p. 84).

 

Os Defensores Públicos, como sujeitos do processo, estão submetidos aos regramentos legalmente previstos para a sua atuação, eis que o andamento procedimental, apesar de ter suas bases na Constituição, tem limitações impostas para garantir o bom andar dos feitos sujeitos ao Poder Judiciário. Contudo, conforme dito alhures, a Defensoria Pública é o órgão legitimamente investido na incumbência da defesa dos necessitados. Assim, o leque de assistidos pela Defensoria é enorme, eis que não pode escolher em que casos atuar.

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Desta forma, para que seja realizado um serviço de qualidade, garantindo-se a eficiência do serviço público prestado, necessária a concessão de algumas prerrogativas à instituição quando de sua atuação. É com base nesse raciocínio que à Defensoria Pública é dado prazo em dobro em todas as suas manifestações, é necessária a intimação pessoal com vista dos autos para os seus membros, assim como é possível a intimação pessoal dos assistidos para providenciarem medidas necessárias ao andamento do processo e de testemunhas para comparecimento em audiência. (DOS REIS, 2015, p. 565).

 

O prazo em dobro concedido à Defensoria Pública, encontra-se descrito no artigo 186 do Código de Processo Civil (2015):

 

Art. 186. A Defensoria Pública gozará de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais.

§ 1º O prazo tem início com a intimação pessoal do defensor público, nos termos do art. 183, § 1º.

§ 2º A requerimento da Defensoria Pública, o juiz determinará a intimação pessoal da parte patrocinada quando o ato processual depender de providência ou informação que somente por ela possa ser realizada ou prestada.

§ 3º O disposto no caput aplica-se aos escritórios de prática jurídica das faculdades de Direito reconhecidas na forma da lei e às entidades que prestam assistência jurídica gratuita em razão de convênios firmados com a Defensoria Pública.

§ 4º Não se aplica o benefício da contagem em dobro quando a lei estabelecer, de forma expressa, prazo próprio para a Defensoria Pública. (BRASIL, 2015).

 

Depreende-se, então, que a prerrogativa do prazo processual em dobro, visa a igualar os desiguais, no sentido de que, frente ao grande volume de demanda e atendimento da Defensoria Pública, esta fica em condição desigual diante da advocacia privada que, presumidamente, possui um número menor de atendimentos, se comparado ao serviço público, sendo, portanto, imprescindível a observância de tal prerrogativa (DA ROSA, 2016, p. 24).

 

2.5.2. DA DISPENSA DA OUTORGA DA PROCURAÇÃO

 

A dispensa da outorga da procuração, pela Defensoria Pública, encontra-se disposta no artigo 287, parágrafo único, inciso II, do Código de Processo Civil. Vejamos:

 

Art. 287. A petição inicial deve vir acompanhada de procuração, que conterá os endereços do advogado, eletrônico e não eletrônico.

Parágrafo único. Dispensa-se a juntada da procuração:

I - no caso previsto no art. 104;

II - se a parte estiver representada pela Defensoria Pública;

III - se a representação decorrer diretamente de norma prevista na Constituição Federal ou em lei. (BRASIL, 2015).

 

Nesse sentido, vejamos acórdão do Superior Tribunal de Justiça (2011 apud SILVA e ESTEVES, 2015):

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL. DISPENSA DE JUNTADA DE PROCURAÇÃO COM PODERES ESPECIAIS PELA DEFENSORIA PÚBLICA. Quando a Defensoria Pública atuar como representante do assistente de acusação, é dispensável a juntada de procuração com poderes especiais. Isso porque o defensor público deve juntar procuração judicial somente nas hipóteses em que a lei exigir poderes especiais (arts. 44, XI, 89, XI, e 128, XI, da LC 80/1994). Ressalte-se que a Defensoria Pública tem por função institucional patrocinar tanto a ação penal privada quanto a subsidiária da pública, não havendo incompatibilidade com a função acusatória. Assim, nada impede que a referida instituição possa prestar assistência jurídica, atuando como assistente de acusação, nos termos dos arts. 268 e seguintes do CPP (HC 24.079-PB, Quinta Turma, DJ 29/9/2003). HC 293.979- MG, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 5/2/2015, DJe 12/2/2015. 17 DEFENSOR PÚBLICO. INTIMAÇÃO. LEI N. 11.232/2005. MULTA. ART. 475-J DO CPC. Discute-se no REsp se a intimação referida no art. 475-J do CPC pode ser feita na pessoa do defensor público e se há incidência da multa lá prevista, nas hipóteses em que o trânsito em julgado da sentença ocorreu antes da entrada em vigor da Lei n. 11.232/2005. Nos termos da nova sistemática processual, para que se inicie a fase executiva, basta a intimação do devedor para pagamento. Essa intimação, não obstante a ausência de previsão legal expressa, deverá ocorrer na pessoa do advogado da parte, conforme jurisprudência pacífica deste Superior Tribunal. Na hipótese dos autos, o recorrente foi intimado na pessoa de seu advogado para o cumprimento da sentença. O fato de esse advogado ser um defensor público não impõe a necessidade de que a intimação para pagamento seja feita à pessoa do devedor, como se de citação se tratasse. O defensor público tem poderes para o foro em geral, entre os quais está o recebimento de intimações. A única especificidade é a exigência de que essa intimação seja pessoal nos termos do art. 5º, § 5º, da Lei n. 1.060/1950, diferentemente do que ocorre com o advogado constituído pela parte, que é intimado pela Imprensa Oficial. Assim, exigir a intimação pessoal do devedor na hipótese do art. 475-J do CPC, mesmo que apenas nas hipóteses em que ele estiver representado por defensor público, é propiciar um retrocesso, impedindo que sejam atingidos os escopos de celeridade e efetividade pretendidos com a Lei n. 11.232/2005. O ato jurídico que desencadeará a fluência do prazo de 15 dias, segundo o atual entendimento do STJ, não é o trânsito em julgado da sentença, mas a intimação do devedor para pagamento que, na hipótese, ocorreu na vigência da Lei n. 11.232/2005. Assim, se a intimação para pagamento ocorreu na vigência da lei nova, é ela que deve ser aplicada, com a consequente incidência da multa do art. 475-J, sem que isso represente prejuízo ao executado ou qualquer ofensa ao ato jurídico perfeito, no caso, à sentença transitada em julgado. (BRASIL, 2011 apud SILVA e ESTEVES, 2015, grifo nosso).

 

Quanto à desnecessidade de mandato outorgado ao Defensor Público, tal prerrogativa deriva do fato de que a natureza jurídica da representação do assistido em juízo decorre da lei e da investidura do agente no cargo, e não da outorga de mandato. É um liame de natureza pública estatutária. É obvio que esse vínculo não envolve questões que exigem poderes especiais e, nesse caso, a parte assistida deverá assinar a inicial juntamente com o Defensor (ALVES e PIMENTA, 2004, p. 118 apud DA SILVA, 2011, p. 59).

Nesse sentido, discorre Da Rosa (2016, p. 25):

 

A dispensa da procuração para que a Defensoria Pública possa representar seus assistidos em juízo é mais uma importante prerrogativa conferida aos Defensores Públicos, com previsão legal no artigo 44, inciso XI, da Lei Complementar 80/94.

Referida prerrogativa é de suma importância para o desenvolvimento das atividades dos Defensores Públicos, uma vez que desburocratiza uma exigência formal da representação em juízo, dando maior agilidade as suas atividades.

Além do mais, tendo em vista o fato de que os Defensores Públicos são agente políticos, dotados de fé pública, desnecessário seria um documento que comprovasse a pretensão do assistido em ser representado pela Defensoria Pública. (DA ROSA, 2016, p. 25).

 

Dessa forma, é possível perceber que a não exigência de apresentar procuração nos autos, pelos Defensores Públicos, está ligado ao fato de serem agentes públicos, incumbidos ao papel de representar os assistidos, pessoas hipossuficientes e que não possuem recursos para contratar um advogado particular. Ademais, esta prerrogativa contribui em reduzir a burocracia, tornando o trabalho da Defensoria Pública mais produtivo.

 

2.6. A VULNERABILIDADE SOCIAL DOS ASSISTIDOS

 

Recordamos que a autonomia dos indivíduos é a principal bandeira do Estado liberal e que as teorias que tratam da vulnerabilidade tentam contra argumentar o discurso liberal de que todos os indivíduos são autônomos, independentes e autossuficientes, e que, em razão disso, caberia ao Estado apenas deixar que se desenvolvessem livremente, intervindo apenas quando houvesse ofensa ao próprio Estado ou à liberdade dos outros indivíduos (PESSOA, 2018, p. 183).

Os teóricos clássicos do Estado liberal sempre trataram os indivíduos como detentores de plena capacidade, já que eram todos iguais, o que levava a defesa de um estado mínimo. O Estado Liberal deveria limita-se a uma organização política capaz de permitir ao indivíduo o livre desenvolvimento de sua personalidade. A esse estado mínimo não caberia intervir na esfera privada do indivíduo, tão pouco realizar julgamentos éticos ou morais, devendo apenas garantir os direitos ditos negativos (PESSOA, 2018, p. 183).

Contudo, verifica-se que apesar da igualdade com que todos os indivíduos devem ser tratados, em alguns casos, os indivíduos não são de fato iguais, pois cada indivíduo é singular, portanto, devem ser sim tratado como iguais, mas na medida de suas desigualdades, eis que conforme explica Pessoa (2018), as vulnerabilidades podem decorrer dos mais inúmeros motivos, como enfermidade, pobreza, incapacidade, gênero, entre outros, o que pode influenciar em maior ou menor grau a autonomia individual e em consequência, impedir o livre desenvolvimento de suas personalidades.

Como um órgão público que presta assistência jurídica integral e gratuita a pessoas de baixa renda que, por uma questão econômica, não podem pagar pelos serviços de advocacia, a Defensoria Pública também atende casos de pessoas em que se verifica hipossuficiência de defesa jurídica e promove a defesa de grupos em contextos/situações de vulnerabilidades sociais, destinatários de políticas públicas que propagam os Direitos Humanos e a Cidadania (NASCIMENTO, REIS, CARDOSO, DE OLIVEIRA E DE SOUZA, 2020, p. 57).

[...] Como bem sabemos, nossa sociedade é desigual e o Estado, que deveria promover acesso a bens e serviços sociais, incontáveis vezes viola direitos e marginaliza cidadãos em situação de vulnerabilidade social (OLIVEIRA e BRITO, 2019, p. 5); é nesse contexto que se vislumbra a importância da Defensoria Pública, pois ao atender os assistidos, indivíduos vulneráveis, age diretamente contra as desigualdades sociais que assolam o país.

Na Defensoria Pública, essas situações de vulnerabilidades e singularidades atravessam as principais demandas encaminhadas, que são: disputa de guarda e regulação de visitas, alienação parental, violência contra mulher (vítimas e agressores), práticas violentas contra crianças (abuso sexual infantil), produtores ou vítimas de infrações penais, conflitos familiares, uso abusivo de álcool e outras drogas, violências contra a população LGBTI, entre outros (NASCIMENTO, REIS, CARDOSO, DE OLIVEIRA E DE SOUZA, 2020, p. 62).

3.      O PROCESSO PENAL BRASILEIRO

 

Como forma geral o surgimento da sociedade, independente da corrente que se utilize para justifica-la, foi um momento que historicamente homens e mulheres passaram tempos em busca da melhor forma de conviver, assim, foi demonstrado alguns métodos na finalidade de ordem social, como por exemplo, a lei de talião, código Hamurabi, punição divina e assim por diante, até se chegar à conclusão que a melhor forma de convivência, seria atribuir ao Estado o poder, dever de punir.

Desse modo, se faz necessário lembrar dos limites da qual cabe o poder de punir estatal, que só deve ser invocado quando existir relevante justificativa para a intervenção do Estado na liberdade do indivíduo, ou seja, quando ocorro um ataque aos bens ou interesses tutelados pelo Estado, por exemplo, o direito à vida, à honra, à integridade física, nasce o jus puniendi, ou seja, o direito do Estado de punir o transgressor (BRITO, FABRETTI E LIMA, 2019, p.01).

Nesse sentido, o jus puniendi possui duas características, quais sejam: a exclusividade da titularidade, ou seja, não há possibilidade que outra instituição ou personalidade que não o Estado exerça o poder de punir, um exemplo, entre vários, que reafirma a importância dessa característica é a na inserção do artigo 345, do Código Penal, que impõem pena à quem exercer arbitrariamente justiça pelas próprias razões, a saber:  

 

 Art. 345 - Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite:

 Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência. (BRASIL, 1940)

 

Como segunda característica do jus puniendi, que modernamente se pode reconhecer, é a impossibilidade que o Estado utilize indiscriminadamente essa atribuição, assim, nasce sob forma de princípios constitucionais, a limitação imposta pelo próprio Estado e aplicada por ele.

Para Brito, Fabretti e Lima (2019, p. 01-07) principalmente o da reserva legal e o do devido processo legal – inseridos no texto constitucional faz o controle de seu poder punitivo. Ainda corroboram ao dizer:

 

O princípio da reserva legal consubstancia-se no brocardo nullum crimen nulla poena sine praevia lege, que em nosso ordenamento jurídico encontra-se expresso na Constituição Federal, art. 5º, XXXIX, e no art. 1º do Código Penal, da seguinte forma: “Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”, não permitindo, assim, que nenhum cidadão seja condenado por fato que não esteja previsto em lei anterior, como crime. Já o princípio do devido processo legal, entendido em sua mais simples forma como um mandamento de que não haverá pena sem um processo – nulla poena sine juditio –, encontra-se no ordenamento pátrio na Constituição Federal, art. 5º, inciso LIV, que declara que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. (BRITO, FABRETTI e LIMA, 2019, p. 01-07).

 

Em síntese, podemos dizer, que o Direito Processual Penal, corrobora com a operacionalização procedimental, técnico e processual, com a finalidade de que a paz social e a proteção do indivíduo não se desvirtue, atingindo ao máximo a plena efetividade dos direitos constitucionais, fazendo valer os princípios que são assegurados pela Constituição Federal, bem como a lei vigente no nosso sistema.

Assim, corrobora Nucci (2021, p. 23) ao eleger dois princípios regentes, reguladores de todo o sistema: dignidade da pessoa humana e devido processo legal, pois estes retratam a finalidade do Estado Democrático de Direito, o primeiro, proporciona respeito à pessoa humana, sem distinção a posição social, moral, étnica ou qualquer diferença religiosa, a cor, credo ou classe social, o segundo por sua vez, tem propósito ao cumprimento de todos as normas e princípios penais e processuais penais.

 

3.1. A ESSENCIALIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA À FUNÇÃO JURISDICIONAL DO ESTADO

 

Inicialmente, se faz necessário dar significado ao nome atribuído à instituição, “Defensoria Pública”, a qual assegura ao indivíduo o exercício do direito de defesa em face da persecução penal promovida pelo Estado, conforme o §1º da  Lei Complementar nº 80/1994, que Organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados, além de outras providências:

 

 

Art. 1º  A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal. (BRASIL, 1994, grifo nosso) 

 

 

No mesmo vértice é o artigo 134, da Constituição Federal:

 

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal . (BRASIL, 1988).

 

 

Sobre o direito de defesa em face da persecução penal, corrobora Fensterseifer (2017, p. 91-91) ao dizer:

 

Não há dúvida que a imposição constitucional de se assegurar ao indivíduo o exercício do seu direito de defesa em face de persecução penal promovida pelo Estado está na gênese e impulsionou a criação da Defensoria Pública. E, nesse alinhamento, até em razão da desproporção de forças que caracterizam a relação jurídica “vertical” entre cidadão e Estado, expressivamente potencializada no espectro da persecução penal e infracional – no qual o indivíduo exerce o seu direito de defesa tanto em face da autoridade policial quanto do Ministério Público –, nada mais adequado que outra instituição pública, especialmente para os indivíduos vulneráveis e desprovidos de recursos econômicos para custear advogado particular, cumpra o papel da defesa criminal e traga equilíbrio e isonomia para a relação processual-penal (e mesmo pré-processual, como ocorre no âmbito do inquérito policial e das prisões em flagrante). (FENSTERSEIFER, 2017, p. 90-91).

 

Em respeito a previsão legislativa de assistência judiciária, nota-se que esta,  já vinha tendo previsão na Constituição de 1934,  momento em que era trazida pela primeira vez no ordenamento jurídico brasileiro, mas é importante elencar que somente em 1988, a Constitucional Federal, além de preocupar-se com a assistência judiciária, no artigo 5º, LXXIV, com a previsão que: “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”, passou a uma efetiva designação desse serviço essencial a Defensoria Pública (FENSTERSEIFER, 2017, p. 61).

A consagração dos direitos essenciais do ser humano, foram, ao longo dos tempos classificados como direitos de primeira a quinta dimensão (a depender da corrente a ser seguida, estende-se), em que o direito a assistência jurídica gratuita compõe o campo da segunda geração dos direitos fundamentais, e visam corrigir a possibilidade de desigualdade material no caso concreto e fático, que é o resultado de carência de recursos. Assim, todo o cidadão será usufruto da mesma benesse jurídica que àquele mais abastado financeiramente. (LIMA, 2015, p. 71).

No contexto brasileiro, a função da Defensoria Pública claramente é contribuir com a transformação social brasileira, ao fazer os direitos da parte fragilizada que não teria possibilidade de arcar com os gastos que uma defesa (não publica) tem, conforme Junqueira et al (2021, p. 93) utiliza a expressão “fazer invisíveis e desprezados tornarem-se visíveis e respeitados seus direitos” acrescenta-se, num cenário pleno democrático.

Prosseguindo os ensinamentos, Junqueira et al, conclui que:

 

(...) Defensoria Pública é expressão do regime democrático porque só numa democracia faz sentido existir essa instituição, instituição essa que, na sua labuta diária, contribui para a democracia ao promover direitos humanos à população necessitada. Pode-se dizer que a Defensoria Pública é uma prova da democracia porque a põe à prova. O poético jogo de palavras talvez se explique pela novidade que é ainda hoje a Defensoria Pública no Brasil e a expectativa que a sociedade brasileira nela deposita. (JUNQUEIRA et al, 2021, p. 93)

 

Assim, conforme demonstrado, a Defensoria Pública tem viés constitucional, e é uma instituição essencial parte do Estado Democrático de Direito, a qual atua com a finalidade de defesa dos direitos humanos em geral, para que seja verdadeiramente posto em prática os preceitos da dignidade humana, devido processo legal e outros direitos, além de proporcionar maior paridade aos desiguais, assegurado pela Constituição Federal e pelas legislações infraconstitucionais.

Ainda, pode ser considerado que a Defensoria Pública é uma instituição que promove cidadania, atributo dado pela sua defesa e promoção dos direitos das pessoas em condições de carência socioeconômica. Essa condição de vulnerabilidade e carência, de forma sintética, é devido a falta de acesso desses indivíduos ao mínimo bem-estar, ou, mínimo existencial, o que significa a falta de acesso aos seus direitos sociais mais básicos, como saúde, educação, moradia, água e saneamento básico, alimentação, previdência, assistência social, transporte público, acesso à justiça, entre outros. (FENSTERSEIFER, 2017, p. 97).

 

3.2. DA PERSECUÇÃO PENAL

 

Antes de adentrarmos ao tema em questão se faz importante trazer o significado de Direito Processual Penal e Processo Penal Democrático uma vez que ambos têm ligação com a persecução penal.

O direito processual penal, conforme o conceito dado por Nucci (2021, p. 34-35) é o corpo de normas jurídicas cuja finalidade é regular a persecução penal do Estado, através de seus órgãos constituídos, para que se possa aplicar a norma penal, realizando-se a pretensão punitiva no caso concreto.

Por sua vez o Processo Penal democrático: compreende o processo penal a partir dos pressupostos estabelecidos na Constituição Federal, assim, é de relevância observação os direitos e garantias humanas fundamentais, adaptando o Código de Processo Penal a essa realidade, ainda que, se preciso for, deixe-se de aplicar legislação infraconstitucional defasada e, por vezes, nitidamente inconstitucional, conforme relação casuística de determinado fato criminoso. (NUCCI, 2021, p. 34-35)

Dito isso, conforme já elencado em tópico específico, o Estado detentor do direito de punir, a qual nasce como melhor forma de controle social, além de satisfazer os direitos e deveres gerais da sociedade de maneira igualitária conforme previsão constitucional, isso se dá através da Ação Penal, ou seja, na medida em que o Estado  assumiu o monopólio da Justiça, é seu dever colocar ao alcance do cidadão instrumentos capazes de fazer valer os direitos inerentes ao exercício da cidadania. (RANGEL, 2022, p. 228).

Assim, a persecução penal, inicia com a instauração do inquérito policial, pela polícia judiciária, na fase de investigação (fase inquisitiva) e cabendo de forma fundamentada o prosseguimento dos procedimentos, passa a se estender em juízo, o qual ocorre a observação a aplicação da ampla defesa e contraditório, que dá o nome de fase acusatória. Pode ocorrer o arquivamento, porém, cabe ao delegado, autoridade presidente do inquérito policial dar fundamento e posteriormente ao ministério público arquivar ou dar prosseguimento com o oferecimento da denúncia ou queixa-crime.

Conforme Renato Marcão (2021, p. 59) observou:

 

(...) se a investigação coletar provas que indiquem a prática de fato típico, sua autoria e materialidade (se a hipótese for de delito material), o ajuizamento da ação penal será inevitável,1 instaurando-se, então, a persecução penal em juízo, salvo quando ocorrer causa de extinção da punibilidade (CP, art. 107) ou de evidente exclusão da antijuridicidade (CP, art. 23). É manifesta, portanto, a importância da investigação, na medida em que seu êxito é que irá proporcionar conteúdo probatório capaz de legitimar, ou não, a instauração de processo. (MARCÃO, 2021, p. 59).

 

3.3. DA FASE INQUISITIVA

 

De atribuição da Polícia Judiciária, a fase inquisitiva é precedida pela Policia Civil ou Federal (quando se trata de crimes contra a União), que cuida da realização da investigação preliminar peça de fundamental para o processo penal, cujo a finalidade é a busca de indícios de autoria e materialidade do crime, tudo isso se dá através do Inquérito Policial.

Sendo assim, se faz importante sintetizar o que é o Inquérito Policial, é o principal instrumentos do qual compreende-se por uma série de diligência realizadas pela autoridade policial, de natureza administrativa, sem contraditório e ampla defesa no seu curso uma vez que se trata de estar sendo realizado na fase inquisitorial, destinado à busca de informações para elucidação do crime em questão.

O inquérito policial, permite ao Ministério Público em caso de crimes de ação penal pública e ao ofendido nos crimes de ação penal privada o oferecimento da denúncia e da queixa-crime.

Conforme Avena (2022, p. 135), lembra:

Tratando-se de um procedimento inquisitorial, destinado a angariar informações necessárias à elucidação de crimes, não há ampla defesa no seu curso. E, como veremos mais à frente (item 4.3), não afeta essa natureza inquisitiva a modificação determinada pela Lei 13.245/2016 ao Estatuto da OAB (Lei 8.906/1994), que passou a estabelecer, no seu art. 7.º, inciso XXI, como direito do Advogado “assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente [...]”. Afinal, referida alteração legislativa não modificou o Código de Processo Penal de modo a estabelecer a obrigatoriedade da assistência de advogado ao investigado durante o inquérito. Não foi isto, enfim, o que fez o legislador. O que fez, isto sim, foi assegurar o direito do advogado em assisti-lo, não podendo esse direito, quando requerido o seu exercício, ser obstado sob pena, agora sim, de nulidade do interrogatório, do depoimento e de todos os atos que daí decorrerem. Mas atenção: na atualidade, a despeito da função primordial do inquérito policial no sentido de obter elementos para que a parte legitimada possa intentar a competente ação penal – a denominada função preparatória –, alguns doutrinadores têm nele vislumbrado, também, outra ordem de função – a função preservadora, relacionada ao intuito de evitar imputações infundadas ou levianas. Tal linha de pensamento, que afasta a clássica função unidirecional da investigação criminal, voltada exclusivamente para a acusação, é, porém, minoritária. (AVENA, 2022, p. 135, grifo nosso).

 

 

Corrobora Marcão (2021, p. 62) ao afirmar:

 

A regra não diz mais que o óbvio. O sistema vigente não foi alterado para o fim de determinar que todo e qualquer indivíduo seja sempre assistido por advogado em sede de inquérito policial, sob pena de nulidade. Note-se que a alteração não foi introduzida no Código de Processo Penal, mas no “Estatuto dos Advogados”, e tem por escopo ressaltar as elevadas atividades da nobre categoria. Não por acaso, a regra em questão foi inserida no rol dos “direitos dos advogados”. (MARCÃO, 2021, p. 62).

 

Neste vértice, mesmo se tratando de um procedimento inquisitorial, a presença do advogado de assistir seus clientes durante a apuração das infrações, sob pena de nulidade, refere-se ao direito do advogado e não do investigado, suposto autor do crime de se ter respeitado o direito à ampla defesa e do contraditório, pois estes, só se fazem presentes em procedimentos posterior. Ainda, há de salientar que a presença de advogado não é obrigatória, mas, caso o investigado o tenha, a exclusão deste profissional ao acesso ou conhecimento de todo o material que se tenha até o momento contra o seu cliente é passivo de nulidade.

 

3.4. DA FASE ACUSATÓRIA

 

A fase acusatória, é própria de regimes democráticos, e é principalmente diferenciada pela distinção que se entre o as funções da acusação, defesa e julgamento, que são feitos por pessoas distintas. Tem como característica o nome “acusatório” pois ninguém poderá ser chamado a juízo sem uma acusação, devidamente fundamentada, narrado todas as circunstâncias para que isso possa ocorrer (AVENA, 2022, p. 07).

Se faz atual os ensinamentos de Nereu José Giacomolli, ao dizer:

 

(...)verifica-se que o sistema processual desenhado pelo constituinte é o acusatório, entendido como o de separação entre as funções de acusar e julgar, envolto por um manto de princípios e garantias, as quais afastam as características do sistema inquisitório (ainda encontrado na legislação ordinária, na doutrina, na jurisprudência e nas práticas judiciárias). Isso porque o constituinte, expressamente, determinou a observância do devido processo legal, com todos os seus derivativos explícitos tais como: o contraditório, a ampla e plena defesa, a publicidade, o estado de inocência, o silêncio não autoincriminatório, o juízo predeterminado legalmente, a prisão como extrema ratio, a exclusividade da ação penal pública ao Ministério Público. (GIACOMOLLI, 2016, p. 90, grifo nosso).

 

Assim, nessa fase, é assegurado ao acusado, de forma primordial, o contraditório e a ampla defesa, e, em decorrência destes, presume-se a inocência do réu. Destarte, como regra de rigorosa observância, deverá ele responder ao processo em liberdade, salvo se ocorrem motivos que justifiquem a decretação de sua prisão preventiva, como por exemplo para assegurar a aplicação da lei penal, quando se encontre em risco fundamentado. (AVENA, 2022, p. 9).

Ressalta-se além do contraditório e ampla defesa, conforme citamos acima, na fase acusatória há outras características essenciais como o da publicidade dos atos, que assegura que em regra, todos os atos processuais serão públicos, o que evita abusos e limita atitudes negativas que possam ocorrer. Nesse cerne, o artigo 96, inciso IX, da Constituição Federal prevê:

 

IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação. (BRASIL, 1988, grifo nosso).

 

 A exceção a essa regra de publicidade, está prevista no artigo 5º, inciso LX, da Constituição Federal: “a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”.

Entre outros princípios e direitos assegurados, tem-se o duplo grau de jurisdição também se faz presente, podendo a parte recorrer a outra instância, buscando o reexame da causa por outro órgão jurisdicional superior. Dessa maneira é evidente a importância da fase acusatória e suas principais características, o que torna o Estado, o maior garantidor de deveres e direitos de forma imparcial à sociedade.

 

3.5. A RELAÇÃO ACUSADO E DEFENSOR

 

Primeiro, há de fazer uma diferenciação necessária para o entendimento da relação de acusado e defensor, que é a nomenclatura “acusado”, o qual figura o sujeito passivo da relação processual, que se dá após o recebimento da denúncia, diferente de quando o mesmo sujeito está sendo apontado como suspeito pelo Estado, através da autoridade policial, do qual se deve dar nome de indiciado. Em sequência, de denunciado, no momento do oferecimento da denúncia e por fim, réu ou acusado, após o seu recebimento, como já dito. (NUCCI, 2022, p. 359).

O acusado pode ser pessoa física, desde que maior de 18 anos ou pessoa jurídica, permitindo que o figure como autora de crimes contra o meio ambiente, conforme previsão legal no artigo 3º da lei 9.605/1998, autorizado ainda, pela Constituição Federal em seu artigo 225, §3º. 

Para o acusado há diversos direitos, conforme sintetizamos ao longo do presente estudo, o que cabe ao defensor agir em prol de maior seguridade aos direitos e interesses deste sujeito, buscando sempre uma decisão favorável à sua defesa, visando sempre respeitar os princípios morais e éticos. Para atingir essa finalidade, vejamos o artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal, que dispõe que: “O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”, assim, se pode visualizar o defensor público e o dativo, profissionais patrocinados pelo Estado para a defesa do acusado hipossuficiente.

Conforme Nucci (2022, p. 361):

 

O defensor não deve agir com a mesma imparcialidade exigida do representante do Ministério Público, pois está vinculado ao interesse do acusado, que não é órgão público e tem legítimo interesse em manter o seu direito indisponível à liberdade. Deve pleitear, invariavelmente, em seu benefício, embora possa até pedir a condenação, quando alternativa viável e técnica não lhe restar (em caso de réu confesso, por exemplo), mas visando à atenuação de sua pena ou algum benefício legal para o cumprimento da sanção penal (como penas alternativas ou sursis). Isso não significa que deva requerer ou agir contra a lei, burlando normas e agindo sem ética, durante o processo penal. Seus desvios, na atuação defensiva, podem tornar-se infrações penais ou funcionais. (NUCCI, 2022, p. 361).

 

Ainda, de acordo com a Constituição Federal, sobre a necessidade que ao acusado seja assessorado por um defensor no decorrer da ação penal, para se tornar efetivo o exercício dos seus direitos, sob pena de nulidade, versa o artigo 113 que: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.” , corrobora ainda, o Código de Processo Penal, artigo 261, caput, ao dizer: “Nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor.”.

 

3.6. A REFORMA PROCESSUAL PENAL OCORRIDA NO ANO DE 2008 E A DEFENSORIA PÚBLICA

 

Com a reforma processual penal ocorrida em 2008, obtida através do advento das leis nº 11.689; que altera alguns dispositivos relativos ao Tribunal do Júri, e dá outras providências, assim como a lei nº 11.690; que modifica dispositivos relativos à prova, e dá outras providências e a lei nº11.719 que modifica alguns artigos relativos à suspensão do processo, emendatio libelli, mutatio libelli e aos procedimentos, todos alterando o Código de Processo Penal.

Com isso, a Defensoria Pública, foi objeto de citação em alguns artigos de grande relevância, sendo que a partir de então, o direito resguardado ao réu possibilitou maior abrangência em relação à sua defesa, a título exemplificativo, o artigo 396-A, do Código de Processo Penal:

 

Art. 396-A.  Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário.

§ 1º A exceção será processada em apartado, nos termos dos arts. 95 a 112 deste Código.

§ 2º Não apresentada a resposta no prazo legal, ou se o acusado, citado, não constituir defensor, o juiz nomeará defensor para oferecê-la, concedendo-lhe vista dos autos por 10 (dez) dias. (BRASIL, 1940, grifo nosso).

 

Assim, como se pode observar, através da alteração feita pela Lei 11.719 de 2008, é indisponível que se tenha a dispensa do defensor público em casos que o acusado não constitua defensor, nas palavras de Avena (2022, p. 111): “Extermina-se, com isso, o impasse existente sob a égide da legislação anterior, quando se discutia acerca da obrigatoriedade ou não da defesa prévia no processo criminal.”.

Pode se extrair do artigo 396-A do CPP, com a alteração dada em 2008, que o juiz ao receber a denúncia ou queixa, não mais citará o acusado para o interrogatório, mas sim, vai o intimar para apresentar a defesa preliminar por escrito, o que evidencia o direito à ampla defesa, uma vez que o processo pode ser compreendido atualmente, como um instrumento de garantia constitucional, logo, a garantia de defesa importa em garantia ao próprio processo, bem como na regularidade deste, de seus atos e de seus prazos processuais. (CARVALHO, 2014, p. 74).

 

3.7. O INTERROGATÓRIO DO ACUSADO

 

            Como forma de defesa, o interrogatório do acusado é a oportunidade que lhe é cabível, para ser ouvido a sua versão quanto aos fatos que lhe são imputados, esse interrogatório é feito no final da fase de instrução com o advento das leis 11.689 e 11.719, ambas de 2008, que alterou o Código de Processo Penal. Assim, em uma audiência única se colhem todas as provas e interroga-se o réu, conforme se extrai do artigo 400, do Código de Processo Penal:

 

Art. 400.  Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado. (BRASIL, 1941)

 

 

Salienta-se, que no interrogatório, em qualquer que seja a sua modalidade, a autoridade judiciária garantirá ao réu ao direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor e se realizado por videoconferência (forma utilizada como meio excepcional),  além de ficar também garantido o acesso a canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e o advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre este e o preso, tudo isso conforme o artigo 185, §5º do Código de Processo Penal.

Além disso, é de direito do acusado permanecer em silêncio, visto que não é obrigado a produzir provas contra sí, coibindo, a autoincriminação, sendo que se optar pelo silêncio, este não é forma de confissão, nesse sentido o artigo 186, do Código de Processo Penal aduz:

 

Art. 186. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas.  

Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa. (BRASIL, 1941, redação dada pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)

 

Nessa esteira,  quanto a instrução criminal, em procedimento comum, o interrogatório do acusado somente se realizará após a apresentação escrita da defesa conforme orienta o artigo 396, do CPP, e, na audiência una de instrução, como se pode observar no artigo 400, do CPP, já citado no presente estudo, sendo esta realizada após a inquirição do ofendido, das testemunhas (de defesa e de acusação) e até dos esclarecimentos dos peritos, acareações e demais diligências probatórias que devam ali ser realizadas. (PACELLI, 2021, p. 309).

4.      RITOS PROCESSUAIS PENAIS ESPECIAIS

 

Os procedimentos processuais penais se subdividem em uma forma padronizada procedimental, a qual denominam-se de comum e especial (que fogem à regra do procedimento comum).

Ao que refere-se ao procedimento comum, se subdivide em ordinário: quando o crime relacionado ao fato tem sanção máxima cominada igual ou superior a quatro anos de pena privativa de liberdade, o sumário, é utilizado quando a sanção máxima cominada é inferior a quatro ano de pena privativa de liberdade e, por último ao que refere-se ao procedimento comum sumaríssimo, que é destinado às infrações de menor potencial ofensivo, tudo sob aspecto do artigo 394, § 1º, inciso I, II e III do Código de Processo Penal.

Já o procedimento especial, refere-se a todo aquele previsto no âmbito do Código de Processo Penal ou de Leis Especiais para as hipóteses legais específicas, incorporando regras próprias de tramitação processual visando à apuração dos crimes que constituem o objeto de sua disciplina. (AVENA, 2022, p. 703).

Ainda, conforme Avena, são exemplos que se utilizam do procedimento especial:

 

Procedimento dos crimes de responsabilidade dos funcionários públicos (arts. 513 a 518); Procedimento dos crimes contra a honra (arts. 519 a 523); Procedimento relativo aos processos de competência do tribunal do júri (arts. 406 a 497); Lei de Drogas (Lei 11.343/2006); Procedimento dos crimes de competência originária dos tribunais (Lei 8.038/1990) etc. (AVENA, 2022, p. 703).

 

Importante salientar que em regra o procedimento comum é o padrão, aplicado de forma residual, conforme o artigo 394, § 2º, do Código de Processo Penal que dispõe: “ aplica-se a todos os processos o procedimento comum, salvo disposições em contrário deste Código ou de lei especial”, ou seja, há algumas exceções previstas em leis especiais e também no próprio Código de Processo Penal.

 

4.1. O RITO PROCESSUAL ESPECIAL DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS

 

Sob um rito processual especial, regulado pela Lei de Drogas, nº 11.343 de 2006, conforme disciplina sua seção II do capitulo III, alguns procedimentos o diferencial do rito comum, como se verá.

Inicialmente, o artigo 54, da lei em questão, no que diz respeito a instrução criminal:

Art. 54. Recebidos em juízo os autos do inquérito policial, de Comissão Parlamentar de Inquérito ou peças de informação, dar-se-á vista ao Ministério Público para, no prazo de 10 (dez) dias, adotar uma das seguintes providências:

I - requerer o arquivamento;

II - requisitar as diligências que entender necessárias;

III - oferecer denúncia, arrolar até 5 (cinco) testemunhas e requerer as demais provas que entender pertinentes. (BRASIL, 2006)

 

Assim, ofertada a denúncia, com a notificação do acusado para oferecer defesa preliminar, conforme menciona Masson, “inaugura-se um verdadeiro contraditório prévio ao recebimento da peça acusatória”, por escrito, no prazo de dez dias. Nessa resposta, consistente em defesa preliminar e exceções o acusado poderá arguir preliminares e invocar todas as razões de defesa, como por exemplo a falta de laudo de constatação e outros, oferecer documentos e justificações, especificar as provas que pretende produzir e, arrolar até 5 testemunhas. (MASSON, 2021, p. 287).

 

Art. 55. Oferecida a denúncia, o juiz ordenará a notificação do acusado para oferecer defesa prévia, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.

§ 1º Na resposta, consistente em defesa preliminar e exceções, o acusado poderá argüir preliminares e invocar todas as razões de defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas que pretende produzir e, até o número de 5 (cinco), arrolar testemunhas.

§ 2º As exceções serão processadas em apartado, nos termos dos arts. 95 a 113 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal.

§ 3º Se a resposta não for apresentada no prazo, o juiz nomeará defensor para oferecê-la em 10 (dez) dias, concedendo-lhe vista dos autos no ato de nomeação.

§ 4º Apresentada a defesa, o juiz decidirá em 5 (cinco) dias.

§ 5º Se entender imprescindível, o juiz, no prazo máximo de 10 (dez) dias, determinará a apresentação do preso, realização de diligências, exames e perícias. (BRASIL, 2006).

 

Assim, conforme dispõe o §3º do artigo supracitado, se a resposta não for apresentada no prazo legal, o juiz nomeará defensor para oferece-la em 10 (dez) dias, concedendo-lhe vista dos autos.

O entendimento jurisprudencial, é no sentido em considerar que a inobservância procedimental do previsto no artigo 55, da Lei de Drogas, acima exposto, da qual prevê a apresentação de defesa preliminar antes do recebimento da denúncia, gera nulidade relativa, desde que demonstrados, concretamente, eventuais prejuízos suportados pela defesa. Assim expôs o Superior Tribunal de Justiça: RHC 113.880/SP, rel. Min. Joel Ilan Paciornik, 5ª Turma, j. 26.05.2020. 

Como se pode observar, com a reforma de 2008, em matéria processual penal, no seu código próprio, traz algumas divergências no que diz respeito ao rito especial o qual refere-se a lei de Drogas de 2006, não encontrando, portanto, conformidade com o objeto disciplinado.

Outro ponto que cabe destaque relacionado à Defensoria Pública, é o artigo 23-A, §7º, da Lei nº 11.343/06, o qual dispõe que “Todas as internações e altas de que trata esta Lei deverão ser informadas, em, no máximo, de 72 (setenta e duas) horas, ao Ministério Público, à Defensoria Pública e a outros órgãos de fiscalização, por meio de sistema informatizado único, na forma do regulamento desta Lei.” (BRASIL, 2006).

 

4.2. O RITO PROCESSUAL ESPECIAL DO TRIBUNAL DO JÚRI

 

O significado do Tribunal do Júri perante o direito contemporâneo, deve ser compreendido como uma garantia do devido processo legal e por consequência, do direito a liberdade, não do contrário, pois seria dizer que este seria uma proteção ao criminoso que atenta contra a vida humana. (NUCCI, 2021, p. 494).

Neste interim, Nucci acrescenta:

 

(...) temos a instituição do júri, no Brasil, para constituir o meio adequado de, em sendo o caso, retirar a liberdade do homicida. Nada impede a existência de garantia da garantia, o que é perfeitamente admissível, bastando ver, a título de exemplo, que o contraditório é também garantia do devido processo legal. Insista-se: não é garantia direta da liberdade do indivíduo acusado de crime doloso contra a vida, mas sim do devido processo legal. Logo, se o júri condenar ou absolver está cumprindo, igualmente, sua função. E mesmo assim, cuida-se de garantia formal, mas não material. (NUCCI, 2021, p. 494).

 

Assim, ao tratarmos do procedimento de apuração dos crimes dolosos contra a vida, há de se dizer que foi alterado com a lei 11.689 de 2008, que antes desta, o procedimento era idêntico ao ordinário até a fase de encerramento da instrução, passou a ser incorporado de forma autônoma em relação aos demais procedimentos, surgindo o rito processual especial do tribunal do júri, sendo orientado pelo Código de Processo Penal, por capítulo próprio (cap. II), o qual trata sobre o procedimento relativo aos processos da competência do tribunal do júri.

O Tribunal do júri tem previsão Constitucional, expresso no seu artigo 5º, inciso XXXVIII, que dispõe que:

 

Art. 5º, XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

 

Além de previsto como um direito e garantia individual, incluem-se na competência do Tribunal do Júri, os seguintes delitos: homicídio simples (art. 121, caput); privilegiado (art. 121, § 1.º), qualificado (art. 121, § 2.º), induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação (art. 122), infanticídio (art. 123) e as várias formas de aborto (artigos 124, 125, 126 e 127) todos do Código Penal. E as formas tentadas. Além deles, naturalmente, vinculam-se os delitos conexos, aqueles que, por força da atração exercida pelo júri (arts. 76, 77 e 78, I, CPP), devem ser julgados, também, pelo Tribunal Popular. (NUCCI, 2021, p. 495).

Ademais, a composição de um tribunal do júri será composto por 1 (um) juiz togado, que será seu presidente e por 25 (vinte e cinco) jurados que serão sorteados dentre os alistados, 7 (sete) dos quais constituirão o Conselho de Sentença em cada sessão de julgamento - este conselho poderá conhecer de mais de um processo no mesmo dia, se as partes o aceitarem, hipótese em que seus integrantes deverão prestar novo compromisso-, conforme os artigos 447 e 452 do Código de Processo Penal.

No que tange à atuação da Defensoria Pública no Tribunal do Júri, cabe destaque o artigo 432, que estabelece que:

 

Art. 432.  Em seguida à organização da pauta, o juiz presidente determinará a intimação do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil e da Defensoria Pública para acompanharem, em dia e hora designados, o sorteio dos jurados que atuarão na reunião periódica. (BRASIL, 2008 in BRASIL, 1941).

 

Uma particularidade que se faz mister elencar aqui, é que o não oferecimento de alegações finais na fase acusatória não acarreta nulidade do processo, devendo os autos ser encaminhados a um novo advogado, caso o acusado tenha constituído, caso contrário, será encaminhado à Defensoria Pública.

Nesse sentido, vejamos decisão do Superior Tribunal de Justiça em Agravo Regimental no Habeas Corpus:

 

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO. TRIBUNAL DO JÚRI. AUSÊNCIA DE ALEGAÇÕES FINAIS. FALTA DE INTIMAÇÃO DO ACUSADO PARA A CONSTITIÇÃO DE NOVO DEFENSOR. REMESSA DOS AUGOS À DEFENSORIA PÚBLICA. CONS-TATAÇÃO DE PREJUIZO. NULIDADE.

1.                     "Consoante reiterado entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, nos processos da competência do Júri Popular, o não oferecimento de alegações finais na fase acusatória (iudicium accusationis) não é causa de nulidade do processo, pois o juízo de pronúncia é provisório, não havendo antecipação do mérito da ação penal, mas mero juízo de admissibilidade positivo ou negativo da acusação formulada, para que o Réu seja submetido, ou não, a julgamento perante o Tribunal do Júri, juízo natural da causa." (RHC 103.562/PE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 08/11/2018, DJe 23/11/2018.) 2. Na hipótese, todavia, em atenção ao princípio da plenitude de defesa, ainda que o causídico, então constituído, tenha sido intimado e não tenha apresentado a peça processual, incumbiria ao magistrado mandar intimar pessoalmente o acusado para constituir novo advogado ou, não tendo eficácia essa providência, encaminhar os autos à Defensoria Pública, de modo que passasse a patrocinar a causa, inclusive apresentando as derradeiras alegações antes da sentença de pronúncia ou despronúncia.
3. Essa providência ainda mais se impunha pelo fato de o acusado ter comparecido a Juízo para dizer que não disponha de condições financeiras para continuar com o patrocínio do defensor constituído, conforme certidão inserida nos autos. Nesse cenário, a falta de alegações finais, como um juízo crítico da prova produzida na primeira fase do procedimento do Júri, configura prejuízo ao acusado e, portanto, implica nulidade.

4. Provimento do agravo regimental. Anulação da sentença de pronúncia. Devolução dos autos à primeira instância para a restituição do prazo para a defesa apresentar alegações finais. (BRASIL, 2022, grifo nosso).

 

No caso em comento, verifica-se a importância da Defensoria Pública, pois o acusado, que era representado por advogado constituído, deixou de apresentar alegações finais porque não possuía recursos financeiros para pagar os honorários do advogado, para que assim ele realizasse e protocolasse as alegações finais, o que acarreta uma situação de nulidade, tendo sido intimada a Defensoria Pública para que atuasse no feito.

Por fim, sobre o Tribunal do Júri, cabe elencar que a recusa injustificada ao serviço do júri acarreta multa em valores variáveis, contudo, são isentos do serviço do júri a Defensoria Pública, por exemplo.

 

5.      CONCLUSÃO

 

Esse artigo buscou discorrer sobre a importância do papel da Defensoria Pública no processo penal brasileiro, dada a atuação social que há por trás do desempenho desta função pública, por seus Defensores e também servidores.

Primeiramente, fez-se um apanhado histórico sobre a Defensoria Pública e a assistência judiciária no Brasil, trazendo-se também a natureza jurídica da Defensoria Pública, autonomia que possui, princípios institucionais que norteia o órgão, prerrogativas conferidas aos Defensores Públicos, como o prazo em dobro e a dispensa da outorga da procuração.

Em seguida, abordou-se a vulnerabilidade social dos assistidos, eis que a maioria das pessoas atendidas, que procuram a Defensoria Pública, são pessoas muito carentes de recursos.

Após, discorreu-se sobre o processo penal brasileiro, relacionado à atuação da Defensoria Pública, analisando-se questões como persecução penal, fase inquisitiva, fase acusatória, relação acusado e defensor, reforma processual penal ocorrida em 2008 e sua relação com a Defensoria Pública, e interrogatório do acusado.

Por fim, abordou-se, brevemente, os ritos processuais penais especiais diferenciados, como o rito processual especial do crime de tráfico de drogas, e o rito processual especial do Tribunal do Júri, buscando-se trazer, brevemente, a relação da atuação da Defensoria Pública nestes ritos.

Diante de todo o apresentado, foi possível concluir que a Defensoria Pública é um órgão público que atua em busca dos interesses dos menos favorecidos financeiramente.

É certo que todas as pessoas possuem acesso à justiça, contudo, este acesso se dá, normalmente, por meio de um advogado, profissional que cobra seus honorários normalmente, seguindo uma tabela determinada pela Ordem dos Advogados Brasileiros, tabela esta que varia em cada estado.

Ocorre que, muitas pessoas não dispõem de recursos financeiros para custear os honorários do advogado particular, sendo que, caso inexistisse a Defensoria Pública, não conseguiriam ter acesso à justiça, e fazer valer os seus direitos.

Dessa forma, denota-se a importância da Defensoria Pública como forma de dirimir as desigualdades sociais, pois é devido a ela que, finalmente, foi possível que todos os indivíduos tivessem acesso à justiça, podendo, assim, ir atrás de seus devidos direitos.

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ABSTRACT 

The present work aims to discuss the Public Defender's Office and its importance to the Brazilian Criminal Procedure. The Public Defender's Office was a body set up to help implement the fundamental rights of the needy population, who normally do not have the money to hire a private lawyer, so the Public Defender's Office acts in favor of the interests of that client, called assisted, behold, the access to justice is a right constitutionally guaranteed to all citizens. Thus, the role of the Public Defender's Office will be addressed in general in the Brazilian Criminal Procedure, its particularities, prerogatives and other issues that will demonstrate why this body is different from private law. This work was prepared following the inductive method, with a qualitative approach, and through bibliographical research in the most diverse sources, such as legislation, doctrines and jurisprudence. 

Keywords: Public Defender. Access to justice. Brazilian Criminal Procedure.

Sobre a autora
Thalita

Advogada. Pós-graduada em nível de Especialização lato sensu, em Direito Civil e Processo Civil, Direito Penal e Processo Penal, Direito do Trabalho e Processual do Trabalho, Direito Médico e da Saúde, Direito Público e Advocacia na Fazenda Pública. Mestranda em Direito na Universidad Europea del Atlántico.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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