Convenção de Roma - 1980

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03/03/2023 às 15:23
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Carlos Roberto Claro1

03/03/2023

SUMÁRIO: Introdução. 1. A globalização econômica. 2. Uniformidade mundial a respeito de lei sobre obrigações contratuais. 3. O contrato internacional. 4. A Convenção de Bruxelas de 1968. 5. A Convenção de Roma de 1980. 5.1. As regras uniformes da convenção. 5.2. A quem não se aplica a convenção. 5.3. O silêncio das partes quanto a escolha da lei. 5.4. Contratos celebrados por consumidores. 5.5. Contrato individual de trabalho. 5.6. As disposições imperativas. 6. A diferença em relação à Convenção de Bruxelas. 7. A tentativa de transformar a Convenção de Roma de 1980 em instrumento comunitário europeu. 8. Conclusões.

Introdução

Tenciona o presente ensaio apresentar algumas considerações, não exaustivas, a respeito de importante Convenção, aberta em 19 de junho de 1980, em Roma, da qual participaram alguns países Comunidade Européia [European Community], e que diz respeito às obrigações contratuais, e que entrou em vigor, efetivamente, em 1º de abril de 1991. Antes, imprescindível analisar a Convenção de Bruxelas de 1968, que trata da competência judiciária e da execução de decisões em material civil e comercial. Não se mostra crível compreender os objetivos almejados pela Convenção de Roma sem antes analisar, mesmo que de forma breve, o conteúdo da Convenção de Bruxelas.

Algumas palavras serão escritas a respeito da globalização econômica, que abriu, definitivamente, as portas das nações para o verdadeiro intercambio de bens e prestação de serviços, e que sem dúvida alguma também foi deveras importante para a assinatura da convenção objeto deste tema. A utopia quanto à tentativa de uniformização de leis mundiais, por assim dizer, também será objeto de análise, bem como apresentar-se-á definição a respeito do contrato internacional, mas sem se debruçar sobremaneira a respeito do relevante tema.

As diferenças básicas entre as duas convenções serão discriminadas, também de forma breve, a fim de se chegar ao tema principal do presente texto. A Convenção de Roma de 1980 tem importantes aspectos, que dizem com o contrato internacional, de modo que necessariamente também serão devidamente abordadas, até mesmo para se examinar o que se denomina de tentativa de transformação da Convenção de Roma de 1980 em instrumento comunitário europeu, de modo que o texto não poderá deixar de também tratar do chamado Livro Verde, apresentado pela Comissão das Comunidades Européias e assinado em Bruxelas, em 14 de janeiro de 2003. No lugar próprio será demonstrado à saciedade que foi elaborado documento tencionando transformar a aludida convenção em instrumento comunitário com a modernização dos aspectos essenciais.

  1. A globalização econômica

A globalização econômica [ou universalização], que vem ocorrendo de forma generalizada e efetiva, especialmente a contar da década de 1980, traz sensíveis reflexos diretos a todas as pessoas, e também espraia nítidos reflexos nos contratos internacionais. Tais reflexos ocorreram de forma indistinta e são, evidentemente, positivos e negativos, nas mais variadas áreas. A globalização econômica nada mais é do que um processo de profunda integração mundial nos campos econômico, social e cultural, entre os países componentes do chamado planeta terra. Niklas Luhmann adverte que a globalização fez com que surgisse uma sociedade mundial e que existe desenvolvimento global desequilibrado2. Ainda, há a acirrada competitividade de empresas transnacionais, e o que importa é a produtividade.

Como dito, a globalização econômica correu de forma avassaladora no final do século XX, com grande revolução tecnológica, notadamente nas áreas das comunicações e eletrônica. Sinala François Chesnais que o

adjetivo global surgiu no começo dos anos 80, nas grandes escolas americanas de administração de empresas, as célebres ‘business management scholls’ de Havard, Columbia, Stanford etc. Foi popularizado nas obras e artigos dos mais hábeis consultores de estratégia e marketing3

Nota-se, então, a chamada cultura de massa faz parte do fenômeno capitalista, resultado direto do pós-guerra [2ª guerra mundial], ou mesmo resulta da revolução no campo tecnológico. Trata-se, pois, de um fenômeno pós-moderno. A globalização comercial certamente permitiu a abertura das fronteiras das nações e hoje o mundo certamente é bem menor. Esclarece Milton Santos que a globalização é o estágio supremo da internacionalização4 e Paulo Bonavides demonstra, em poucas palavras, sua preocupação quanto ao mundo globalizado, asseverando o seguinte: a globalização é ainda um jogo sem regras; uma partida disputada sem arbitragem, onde só os gigantes, os grandes quadros da economia mundial, auferem as maiores vantagens e padecem os menores sacrifícios5, sendo que assevera Fábio Konder Comparato que a partir da segunda metade do século passado houve a multiplicação de entidades multinacionais [ou transnacionais], formadas por sociedade controladora e controladas, ensejando também o surgimento de organização reticular de empresas no mercado internacional6.

Diz ainda que a globalização econômica foi precedida, desde a época dos grandes descobrimentos lusitanos e espanhóis, por várias experiências daquilo que o grande historiador francês, Fernand Braudel, denominou ‘economias-mundo’7. Com efeito, a globalização nada mais é do que um processo de profunda integração mundial especificamente no campo econômico, mas que acaba espraiando reflexos nos mais variados setores, mas não é de hoje que nela se fala, tal como adverte Fábio Comparato. A globalização econômica se traduz na verdadeira interdependência econômica das nações mundiais, de modo que são raros os países que não se encontram em conexão comercial com os demais, considerando pois que o mundo após a globalização econômica tornou-se sistêmico para a grande maioria das nações, principalmente ocidentais.

  1. Uniformidade mundial a respeito de lei a respeito de obrigações contratuais

Certamente que [também] diante da globalização econômica há certa preocupação em uniformizar as leis a respeito, por exemplo, das obrigações contratuais internacionais. Com efeito, consoante consta do chamado Livro Verde8, nota-se que

uma das conseqüências do aumento das trocas e das deslocações no interior da União Européia e no mundo em geral é a possibilidade cada vez maior de um cidadão europeu ou uma empresa estabelecida num Estado-Membro ser envolvido num litígio cujos elementos não estão, na sua totalidade, limitadas ao Estado onde se situa a sua residência habitual9

Não obstante a globalização econômica, observa-se que é realmente utópica a ideia de criação de uma lei mundial a respeito de determinado tema, como os contratos internacionais, por exemplo. Nesse passo, assevera Haroldo Valladão que

a supressão da diversidade legislativa existente no mundo, a adoção de um código ou de uma lei civil, comercial, penal, processual etc., únicos para todas as nações, Estados, províncias etc... extingüiria, outrossim, o problema do DIP, pois sendo o direito um só, o intercâmbio espacial de homens e coisas se faria sem gerar dúvidas sobre qual a lei aplicável às relações interespaciais10

E prossegue, afirmando que a uniformidade mundial de leis positivas é uma utopia11, sendo que da mesma opinião comunga Irineu Strenger ao afirmar categoricamente

a uniformidade de legislações como forma de aperfeiçoamento da civilização, sonho de alguns autores, é desejo aparentemente irrealizável. Pode-se somente esperar que as bases sobre as quais repousam diversas ordens jurídicas se amoldem cada vez mais aos princípios comuns da Justiça12

Diante da impossibilidade de uniformização a respeito de leis para o aperfeiçoamento das relações entre pessoas, as relações de cunho contratual etc., há necessidade de serem assinadas as Convenções e Tratados Internacionais. Estas, assinadas em âmbito multilateral, consoante adverte Hee Moon Jo13, ocorrem justamente para que o comércio internacional, por exemplo, seja afastado das amarras estatais, e possa ser efetivado de forma mais célere, sem vínculos com esquemas legais geograficamente circunscritos, consoante adverte Irineu Strenger14, e com a mínima estabilidade. Tal fato ocorre também considerando a globalização econômica.

  1. O contrato internacional

Diante do fato que a Convenção de Roma de 1980 trata justamente das obrigações assumidas em contratos internacionais, faz-se importante, neste passo, conceituar o que vem a ser contrato internacional.

Consoante pensamento do já citado Hee Moon Jo, o contrato internacional é o contrato cujos elementos constitutivos da relação contratual, tais como nacionalidade, domicílio, local de celebração, situação do objeto do contrato, local de execução, etc., transpassam duas ou mais jurisdições internacionais15, asseverando ainda que o contrato internacional é o eixo central mantenedor das transações internacionais, e o comércio internacional é o foco central dessas transações16.

Irineu Strenger esclarece que o contrato internacional é justamente a conseqüência do intercâmbio entre Estados e pessoas, no sentido amplo, cujas características são diversificadoras dos mecanismos conhecidos...17, sendo que mais adiante, no seu texto, assevera que o contrato tem feição internacional quando seja conectado a normas jurídicas emanadas de vários Estados, em razão, notadamente, de seu lugar de conclusão ou execução, da localização de seu objeto, da nacionalidade ou do domicílio das partes etc.18, sendo que prepondera a idéia de as partes pertenceram a mais de um Estado.

Apresentadas as premissas necessárias, o próximo ponto analisará a Convenção de Bruxelas de 1968, que se revela como importante para poder [tentar] entender o conteúdo da Convenção de Roma de 1980.

  1. A Convenção de Bruxelas de 1968

A Convenção de Bruxelas de 196819 trata da competência judiciária e da execução de decisões em matéria civil e comercial, assinada em Bruxelas, no dia 27/09/1968. Consoante esclarece Henry Lesguillons se tentou unificar as regas de conflitos de leis, para suprimir os inconvenientes resultantes da diversidade das regras de conflito, especialmente no domínio dos contratos20, sendo que o mesmo autor, ao se referir ao conteúdo da convenção, esclarece que permitiu às partes celebrar convenções de prorrogação de competência e escolher dentre vários tribunais que poderiam decidir, que a preferência fosse dada ao tribunal de um Estado cujo direito fosse mais favorável21. A convenção de Bruxelas se aplica em matéria civil e comercial, independentemente da jurisdição, não abrangendo as matérias fiscais, aduaneiras e administrativas. A convenção foi assinada para reforçar na Comunidade Européia a proteção jurídica das pessoas estabelecidas no seu território. Com efeito, são excluídos da convenção a segurança social, a arbitragem, as falências, as concordatas e outros processos análogos, bem como o estado e a capacidade das pessoas singulares, os regimes matrimoniais, os testamentos e as sucessões.

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No âmbito contratual, o requerido com domicílio no território de um Estado contratante pode ser demandado num outro Estado, sendo que a demanda ocorrerá perante o Tribunal onde a obrigação que serve de fundamento ao pedido foi ou deva ser cumprida, consoante artigo 5º da convenção. Interessante notar, no tocante ao reconhecimento e execução, que, para fins exclusivos da convenção, considera-se decisão qualquer decisão proferida por um tribunal de um Estado Contratante independentemente da designação que lhe foi dada, tal como acórdão, sentença, despacho judicial, dentre outros [artigo 25º].

Ainda, e para rematar, as decisões proferidas num Estado Contratante serão reconhecidas nos outros Estados também contratantes, sem necessidade de recurso a qualquer processo. Já no tocante especificamente à execução, estabelece a convenção que as decisões proferidas num Estado contratante e que nesse Estado tenham força executiva podem ser executadas em outro Estado depois de nele tem sido declaradas executórias, a requerimento de qualquer interessado.

Especificamente para determinar se uma parte tem domicílio no território do Estado contratante a cujo tribunal é submetida a questão, o juiz aplica a sua lei interna.

  1. A Convenção de Roma de 1980

A Convenção de Roma22, assinada em 19 de junho de 1980, trata a respeito da lei aplicável às obrigações contratuais nas situações que impliquem um conflito de lei. Desde logo, destaque-se que a convenção se refere a contratos bem como a atos jurídicos unilaterais. Estes são os relativos a um contrato concluído. Note-se, pois importante, que a Convenção de Roma é o único instrumento de direito internacional privado que tem a forma de tratado internacional. Ainda, especificamente no tocante à ordem pública, a aplicação de uma disposição da lei designada para a convenção só pode ser afastada se tal aplicação for incompatível com a ordem pública do foro, tal como consta do artigo 16.

A Convenção foi assinada pelos seguintes países: Alemanha, Bélgica, França, Irlanda, Luxemburgo, e pelos Países Baixos, no mesmo dia, e em 10 de março de 1981, foi assinada pela Dinamarca, e em 07 de dezembro de 1981 foi subscrita pelo Reino Unido. Em 10 de abril de 1984 foi também assinada pela República Helênica, consoante esclarece Henry Lesguillons23. A Convenção entrou em vigor apenas no dia 1º de abril de 1991. Depois de os nove Estados antes referidos terem aderido, efetivamente, outros, também pertencentes à Comunidade Européia assinaram a referida convenção. A seguir serão analisados os principais aspectos da referida convenção.

  1. As regras uniformes da convenção

Inicialmente, cabe entender o âmbito das obrigações referidas pela Convenção, sendo que esclarece o Livro Verde, redigido pela Comissão das Comunidades Européias, que,

nas situações em que nem todos os elementos estão ligados ao sistema jurídico de um único Estado, por exemplo porque as partes no contrato são de diferentes nacionalidades, são residentes em Estados Diferentes ou ainda porque o contrato foi concluído ou executado em diferentes países ou num país diferente do tribunal interpelado24

A Convenção possui um caráter universal, pois, a lei nela designada será aplicável, mesmo que tal lei seja de um Estado não contratante. O mesmo documento ainda se refere à liberdade de escolha, ou seja, à autonomia da vontade dos contratantes, no tocante à totalidade ou apenas a uma parte do instrumento. A vontade deverá ser expressa ou resultar de modo inequívoco das disposições contratuais ou das circunstâncias da causa. No que se refere às circunstancias da causa, adverte Henry Lesguillons que proíbe o juiz de supor uma escolha de lei aplicável pelas partes se elas não tiveram a intenção de o fazer25.

São elas, as partes, livres para a escolha da lei aplicável no contrato, sendo não menos certo que referida liberdade tem certos limites, bem definidos também no artigo 3º. Com efeito, não obstante a autonomia da vontade, o limite vem expresso justamente no artigo 7º, contém o que se designa de Lei de polícia, na medida em que o contido na referida convenção não pode prejudicar a aplicação das regras do país do for que regulem imperativamente o caso concreto, independentemente da lei aplicável ao contrato. E quanto às chamadas leis de polícia, consta do Livro Verde que são elas

diferentes e apenas intervém num contexto internacional: trata-se de normas a que um Estado consagra tal importância que exige a sua aplicação desde que a situação jurídica apresente uma certa conexão com o seu território, independentemente da lei que, de outro modo, é aplicável ao contato. As leis de polícia têm a particularidade de o tribunal nem sequer aplicar as suas normas de conflitos de leis para determinar qual a lei aplicável e para avaliar se o seu conteúdo seria eventualmente incompatível com os valores do foro, mas aplica automaticamente a sua própria regra de direito26

Podem as partes estabelecer uma lei diferente da que antes o regulava, mesmo que tenha ocorrido escolha anterior. A posterior deliberação neste sentido não afetará a validade formal do contrato, e tampouco prejudica o interesse de terceiros. Esclarece o mesmo Lesguillons que a convenção admite a possibilidade de o juiz poder, considerando o conjunto das circunstancias da causa, constatar que as partes efetuaram uma verdadeira escolha da lei, ainda que não esteja expressamente declarado no contrato27. A seguir serão abordadas as questões relativas à quem se aplica, efetivamente, a convenção em exame.

  1. A quem não se aplica a convenção

A Convenção de Roma de 1980 não se aplica, dentre outros, ao Estado e à capacidade das pessoas singulares, salvo as exceções previstas no artigo 11; às convenções de arbitragem e de eleição de foro; às obrigações contratuais relativas a testamentos e sucessões por morte, regime de bens no matrimônio, direitos e deveres decorrentes de relações de família, de parentesco, de casamento ou de afinidade, incluindo as obrigações alimentares relativas aos filhos nascidos fora do casamento.

  1. O silêncio das partes quanto a escolha da lei

Em caso de silêncio das partes contratantes, a convenção utiliza o princípio da proximidade, uma vez que o contato é regulado, nesse caso, pela lei do país com o qual apresenta uma conexão mais estreita, consoante estabelece o artigo 4º. Consoante esclarece o Livro Verde, presume-se que o contrato apresenta uma conexão mais estreita com o país onde a parte que está obrigada a fornecer a ‘prestação característica’do contrato tem a sua residência habitual no momento da celebração do contrato28.O n. 2 do referido artigo 4º, por exemplo, esclarece o que se pode estabelecer como laço mais estreito, pois, presume-se que o instrumento apresenta essa conexão mais estreita com o país onde a parte que está obrigada a fornecer a prestação característica do contrato tem, no exato momento da celebração da avença, a sua residência habitual, ou, se se trata de uma sociedade, a administração central [onde são de fato praticados os atos de gestão].

  1. Contratos celebrados por consumidores

No tocante aos contratos celebrados por consumidores, instrumentos esses bastante diversificados, com efeito,, considerando a globalização econômica. De fato, desde os anos 70 que se tem vindo a desenvolver significativamente um novo direito especial, o direito de consumo, destinado a tomar em consideração o desequilíbrio entre consumidores e profissionais, consoante adverte o multicitado Livro Verde29.

Diante de tal situação, a Convenção de Roma de 1980 apresenta peculiaridades em relação ao contrato celebrado por consumidor.

O artigo 5º leva em consideração o desequilíbrio contratual que existe entre o consumidor e o fornecedor de bens móveis corpóreos ou mesmo de serviços a uma pessoa, denominada de consumidor. Não obstante a possibilidade de livre escolha das partes quanto a lei aplicável ao caso concreto, verifica-se que não pode o consumidor ser privado de proteção que lhe garantem as disposições imperativas do país no qual tenha a sua residência habitual.

O n. 3 do artigo 5º diz que, não obstante a falta de escolha de lei pelos contratantes, os instrumentos serão regulados pela lei do país em que o consumidor tiver a sua residência habitual, se se verificarem as circunstancias referidas no n. 2, quais sejam, se a celebração do contrato tiver sido precedida, no país do consumidor, de uma proposta que lhe foi especialmente dirigida ou de anúncio publicitário e se o consumidor tiver executado nesse mesmo país todos os atos necessários à celebração. Em caso de recebimento do pedido no país do consumidor, ou se o contrato tiver como base a venda de mercadorias e se o consumidor se tiver deslocado desse país a um outro país e aí tiver feito o pedido, desde que a viagem tenha sido organizada pelo vendedor com o objetivo de incitar o consumidor a adquirir o produto.

As regras relativas aos contratos assinados por consumidor não se aplicam quando se tratar de contrato de transporte; contrato de prestação de serviços quando estes, devidos ao consumidor, devem ser prestados exclusivamente num país diferente daquele em que este tem a residência habitual.

  1. Contrato individual de trabalho

Especificamente no que diz com o contrato individual de trabalho, existe a preocupação quanto ao trabalhador, pois busca-se conferir-lhe certa proteção, que justamente se encontra no artigo 6º. Com efeito, não obstante a escolha da lei aplicável ao contrato de trabalho, não pode privar o trabalhador de proteção que lhe garante as disposições imperativas constantes da lei que seria de fato aplicável. Poderá o contrato de trabalho ser regulado pela lei do país em que o trabalhador, cumprimento da obrigação, presta de forma habitual o seu trabalho, mesmo que tenha sido destacado de forma temporária para outro país, ou se o trabalhador não prestar habitualmente o seu trabalho no mesmo país, pela lei do país em que esteja situado o estabelecimento que contratou o trabalhador, a não ser que resulte do conjunto das circunstancias que a avença apresenta conexão mais estreita com um outro país, sendo em que em tal situação, aplicar-se-á a lei desse outro país.

  1. As disposições imperativas

As chamadas disposições imperativas estão justamente previstas no artigo 7º da convenção em referência. Tratam-se, pois, das chamadas leis de polícia, que são justamente aquelas já referenciadas no decorrer da presente exposição. Basicamente, as leis de polícia apenas dizem com um contexto internacional. Pode ser dada prevalência às disposições imperativas da lei de outro país com qual há mais conexão do caso concreto, contanto que, de acordo com o sistema jurídico de tal país, tais disposições forem aplicáveis, qualquer que seja a lei que regula o contrato. Para fins de decisão, cabe sopesar a respeito da natureza e do objeto do contato, assim como as conseqüência que resultariam da sua aplicação [ou não], consoante estabelece o n. 1 do art. 7º. A convenção não poderá prejudicar a aplicação das regras do país do foro que regulem imperativamente o caso em exame, independentemente da lei aplicável ao instrumento contratual.

  1. A diferença em relação à Convenção de Bruxelas

Basicamente, a diferença entre as Convenções de Bruxelas [1968] e de Roma [1980] é a seguinte: a de Bruxelas abrange as obrigações nitidamente contratuais como àquelas em decorrência de delitos. A Convenção de Roma de 1980 incide tão somente sobre as obrigações de cunho contratual.

  1. A tentativa de transformar a Convenção de Roma de 1980 em instrumento comunitário europeu

No ano de 2003, em Bruxelas, foi elaborado o já denominado Livro Verde [COM(20020)654 final], cujo escopo era transformar a Convenção de Roma de 1980 em instrumento comunitário, até para que houvesse a necessária modernização das disposições legais. Para tanto, foi lançada uma consulta [em forma de questionário] a respeito de questões eminentemente jurídicas à transformação pretendia, questionário esse levado a efeito pela Comissão das Comunidades Européias. Segundo se infere da leitura acurada do extenso texto, buscava-se a uniformização do direito internacional privado nos chamados Estados-Membros, sendo que atribuir-se-ia ao Tribunal de Justiça a competência para interpretar os dispositivos legais. A tentativa em exame se deu [também] em virtude da ausência de uniformidade quanto à aplicação da convenção, pelos tribunais nacionais.

Buscou-se, pois, a coerência de interpretação do texto a nível comunitário, o que significa dizer que a comissão pretendida que houvesse uma uniformidade de tal interpretação. A modernização também assentava raiz na questão envolvendo a proteção do consumidor nas relações contratuais. Com isso, tencionava-se incluir, num novo texto, cláusula garantidora da aplicação da norma mínima comunitária quando todos os elementos, ou determinados elementos particularmente significativos do contrato, estão localizados na Comunidade, conforme consta do Livro Verde30, já mencionado.

Sobre o autor
Carlos Roberto Claro

Advogado em Direito Empresarial desde 1987; Ex-Membro Relator da Comissão de Estudos sobre Recuperação Judicial e Falência da OAB Paraná; Mestre em Direito; Pós-Graduado em Direito Empresarial; Professor em Pós-Graduação; Parecerista; Pesquisador; Autor de onze obras jurídicas sobre insolvência empresarial.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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