Liberdade para o agressor do presidente?

08/03/2023 às 16:05
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Quando lecionava direito penal na faculdade de direito e na Escola Superior da Magistratura observava os olhos arregalados dos estudantes quando afirmava que “quanto mais hediondo é o crime, mais inocente é o réu”.

Por mais paradoxal que seja ao leigo, o barbarismo do crime, entre outros elementos, indica ao julgador que o agente pode não ser responsável por seus atos, e absolvê-lo.

Estabelece o art. 26, do Código Penal, que é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. É a chamada absolvição imprópria, ou seja, o juiz reconhece a existência do crime e sua autoria, mas ABSOLVE o réu face à sua inimputabilidade.

Pode ocorrer que o réu seja apenas parcialmente incapaz, caso em que o Juiz deverá reduzir a pena de um a dois terços, como prevê o Parágrafo Único.

Causou certa perplexidade a absolvição do agente que atentou contra vida do então candidato a Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, fato inédito na política brasileira. Foi enquadrado como crime contra a segurança nacional face à sua motivação política e religiosa.

Na ocasião, após analisar as provas materiais e testemunhais, decidiu o Juiz instaurar um incidente de insanidade mental, suspendendo o andamento do processo. Pelos exames periciais concluiu que o réu era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Por essas razões, nomeou um curador para assisti-lo e absolveu o acusado, isentando-o da pena prevista para a prática do crime.

Por imposição obrigatória do art. 97, do Código Penal, face à gravidade do crime e inimputabilidade do réu, determinou sua internação pelo prazo mínimo de três anos como Medida de Segurança. A internação ocorreu na Penitenciária de Segurança Máxima de Campo Grande, MS. Essa internação será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade.

Isso não significa, no entanto, que será eterna. Decorrido o prazo mínimo de três anos, fixado na sentença, deve o réu ser obrigatoriamente submetido a perícia médica, como está ocorrendo. Se constatada a cessação da periculosidade, o réu receberá desinternação, ou liberação condicional, que será revogada caso, antes de um ano, pratique fato indicativo de persistência de sua periculosidade.

Verificado, pelos exames a que está sendo submetido, que persiste sua periculosidade, deverá ser mantida sua internação e repetido o exame anualmente, ou a qualquer tempo, se assim determinar o Juiz das Execuções Criminais.

Sem entrar no mérito das decisões ou crítica da sistemática jurídica que envolve a questão da Medida de Segurança, procurei resumir, em linguagem acessível ao grande público, a regulamentação legal da matéria face ao caso concreto.

Assim, em conclusão, o agressor do Presidente foi absolvido da prática do crime, pois se concluiu que não poderia ser responsabilizado por seus atos, face à doença mental. Em razão de sua periculosidade, foi internado pelo prazo mínimo de três anos, estabelecido em lei, sendo reavaliado após o decurso desse prazo, e anualmente, pelo menos, após esse prazo.

Enquanto persistir a periculosidade, e assim for constatado nos exames periciais a que deve ser submetido, deverá o réu permanecer internado, sem prazo limite.

A possibilidade de desinternação na véspera de nova campanha presidencial, portanto, era uma mera coincidência.

Sobre o autor
Moacir Leopoldo Haeser

Advogado e Desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ex-professor da Faculdade de Direito de Santa Cruz do Sul (UNISC) e da Escola Superior da Magistratura – AJURIS.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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