As jovens que zombaram da estudante de 40 anos e o vazamento do vídeo

Leia nesta página:

A Unisagrado divulgou, no Instagram, nota:

"unisagrado_oficial

Para começarmos esta conversa, deixamos claro que não compactuamos com qualquer tipo de discriminação.

Completando... defendemos uma causa: A EDUCAÇÃO. Na verdade, somos a causa.

Acreditamos que todos devem ter acesso à educação de qualidade, desde pequenos até quando cada um quiser, porque educação é isso: autonomia. Isso tudo faz sentido para nós."

Três jovens estudantes de Biomedicina zombaram de outra estudante também de Biomedicina, de 40 anos de idade. Para as jovens, a estudante de 40 anos não deveria estar estudando. Preconceito etário.

Antes de prosseguir, é importante alertar sobre divulgação de conteúdo (vídeo, áudio, print de tela). Em setembro de 2021, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) teve entendimento de que divulgação de conteúdo fechado — conteúdo exclusivo para pessoas específicas e não aberto ao público em geral — viola o direito de sigilo de telecomunicação. Segundo a ministra Nancy Andrighi:

"Ao levar a conhecimento público conversa privada, além da quebra da confidencialidade, estará configurada a violação à legítima expectativa, bem como à privacidade e à intimidade do emissor, sendo possível a responsabilização daquele que procedeu à divulgação se configurado o dano."

Será que divulgar conteúdo privados — conteúdo exclusivo para pessoas específicas e não aberto ao público em geral — viola o direito de sigilo de telecomunicação, o direitos à intimidade e à privacidade? Depende de cada caso concreto. Vejamos:

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III - a dignidade da pessoa humana;

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

(...)

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;

II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; (Regulamento)

XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;

XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;

§ 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Vide ADIN 3392) (Vide Atos decorrentes do disposto no § 3º do art. 5º da Constituição)

LEI Nº 7.716, DE 5 DE JANEIRO DE 1989

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

Pena: reclusão de um a três anos e multa.(Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

§ 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.(Incluído pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

§ 2º Se qualquer dos crimes previstos neste artigo for cometido por intermédio dos meios de comunicação social, de publicação em redes sociais, da rede mundial de computadores ou de publicação de qualquer natureza: (Redação dada pela Lei nº 14.532, de 2023)

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.(Incluído pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

§ 2º-A Se qualquer dos crimes previstos neste artigo for cometido no contexto de atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais destinadas ao público: (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Pena: reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e proibição de frequência, por 3 (três) anos, a locais destinados a práticas esportivas, artísticas ou culturais destinadas ao público, conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

§ 2º-B Sem prejuízo da pena correspondente à violência, incorre nas mesmas penas previstas no caput deste artigo quem obstar, impedir ou empregar violência contra quaisquer manifestações ou práticas religiosas. (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Ordenamento jurídico brasileiro e a internacionalização dos direitos humanos:

DECRETO Nº 678, DE 6 DE NOVEMBRO DE 1992

1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.

2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito a censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei e ser necessárias para assegurar:

a) o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou

b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas.

3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões.

4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2.

5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência.

Três incisos no Art. 5º, da CRFB de 1988:

II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

Há um grupo de aplicativo (Telegram, WhatsApp, Snapchat, TickTock, Helo etc.). Um vídeo. O conteúdo, um brasileiro defendendo o nazismo. Há a suástica nazista, que em nada se compara com a, p. ex., suástica budista, o hino nazista etc. Pelo "interesse público", pelo "Estado Democrático de Direito", pelo "limite da liberdade de expressão", pois a liberdade de expressão não é "direito absoluto", pela "dignidade humana", a espécie humana como "um fim em si mesma", o conteúdo nazista deve ser denunciado.

Qualquer integrante do grupo pode comunicar o aplicativo, pois há a "responsabilidade social" — recomendo ler 'Responsabilidade social global' na Era dos direitos humanos e Covid-19. A responsabilidade social do empreendimento de produtos, de serviços e de publicidades —, para a retirada do vídeo.

Pode um blogueiro divulgar o vídeo como matéria jornalística? Sim! Em 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF), no RECURSO EXTRAORDINARIO 511.961 SAO PAULO, considerou que a exigência de diploma de jornalista para o exercício de jornalista é inconstitucional. Caso estarrecedor ocorreu com Sergio Moro sobre o "desconhecimento" do ordenamento jurídico pátrio — Sergio Moro e Eduardo Guimarães. Por que a liberdade de expressão é violada no Brasil? Juiz não pode dizer que "desconhece".

O vídeo deve ser de apologia ao nazismo, e não conteúdo irônico ao nazismo.

Há o vídeo vazado das estudantes ironizando a estudante de 40 anos de idade. Pode ser divulgado: sim. É importante frisar, a divulgação e qualquer comentário deve ser associado com o conteúdo e não pode ultrapassar o limite da liberdade de expressão. Por exemplo:

  • Afirmar que as mães das jovens são (qualquer termo degradante) — não há "bola de cristal" para saber sobre o tipo de educação dos pais aos filhos. Por exemplo: "As mães das jovens devem ser religiosas extremistas apoiadoras de Bolsonaro".

  • Ir além do objeto. O objeto foi o preconceito (etário) contra um ser humano de 40 anos. Falar que as jovens são "nazistas", "fascistas", "mal-amadas", não há correspondências com o objeto, o objeto é o preconceito etário;

  • Chamá-las de "bolsonaristas fascistas" ou de "lulistas ladroas" também não há correspondência, o objeto é o preconceito etário.

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Quem divulga os vídeo vazado com os exemplos acima comete "crime contra a honra".

Os exemplos, infelizmente, são resultados de minhas pesquisas nas redes sociais. Não importam se os vídeos são sobre política, encarceramento, gênero etc. Os direitos humanos não existem.

Ainda que as jovens, posteriormente, justificassem com "Pela idade, ela deveria estar aposentada", ou qualquer justificativa, a verdade é que estudar independe de localidade, de instituição, de faixa etária, de condições físicas (pessoa com necessidade especial ou não, de etnia etc. Faz parte da espécie humana conhecer, ampliar-se em conhecimentos, realizar objetivos inertes por algum motivo.

Na caixa de comentário da universidade comentei:

Educação intelectual e educação em direitos humanos são, deveras, diferentes. Na "intelectual", apenas o intelecto. Nos direitos humanos, o valor do ser humano como "um fim em si mesmo". A Unisagrado poderia ter disciplina de direitos humanos para todos os cursos. Fica a minha dica. Um resumo do porquê dos direitos humanos. Punição de expulsão, não resolve nada.

Exatamente. A educação pelos direitos humanos é a única forma de extinguir qualquer forma de preconceito seja ele milenar ou construído contemporaneamente. A educação pelos direitos humanos deve ser iniciada dentro dos lares brasileiros. Como o Estado não pode, e não deve, montar guarda nas portas das residências para saber se os direitos humanos são ensinados, o Estado pode, através do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, mudar o inconsciente coletivo brasileiro, para melhor: os direitos humanos.

Quanto às jovens. A vivência é pouca para cada uma. Com o tempo compreenderão sobre o valor da idade e das experiências de vida. A estudante de 40 anos vivenciou mudanças comportamentais na sociedade brasileira, nas tecnologias etc. Por mais que qualquer jovem tenha conhecimentos, pelo uso da "Biblioteca Mundial", a internet, o saber intelectual sem a participação não garante uma compreensão plena. Eu posso imaginar a dor dos escravos negros no Brasil. Posso me solidarizar com os afrodescendentes brasileiros. Posso também imaginar suas angústias diante dos racismo. Não posso sentir, plenamente, como é ser negro e ser humilhado por racista. Posso colocar peruca "Peruca Black Power" ; posso pintar o meu corpo para ficar com a epiderme de coloração de etnia negra. Posso vivenciar momentos. Quando eu quiser ser "branco", a vida prossegue. Já a etnia negra, não tem como mudar. E se mudar, para uma aparência "eurocentrista", a mudança é o renegar da cultura negra para "viver bem".

Aprofundo-me. Mulher cisgênero pode andar nas vias públicas com roupas decotadas, mas são assediadas pelo simples fato de vestirem roupas "muito decotadas". Para se "adaptarem" ao meio, os decotes menores.

Educação pelos direitos humanos hoje e sempre!

Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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