Imóvel sem Escritura e RGI, mas apenas objeto de Promessa de Compra e Venda pode ser arrolado em Inventário Extrajudicial?

20/03/2023 às 10:07
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OS DIREITOS AQUISITIVOS têm importância e apreciação econômica e como tal, são plenamente passíveis de transmissão, podendo integrar tanto o rol de bens objeto de partilha entre herdeiros em sede JUDICIAL quanto EXTRAJUDICIAL.

Como sempre falamos aqui, não são raros os casos em que as transações imobiliárias não se concretizam motivos alheios à vontade do promitente comprador mesmo havendo, em grande parte deles, um contrato preliminar ditando as regras. É o que podemos exemplificar com a PROMESSA DE COMPRA E VENDA ou o também usual COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA que não finalizam e aperfeiçoam a transação com a desdejada ESCRITURA DEFINITIVA. Para esses casos a Lei aponta a ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA como solução e o art. 463 do Código Reale explica com clareza:

"Art. 463. Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive" .

Ainda que o parágrafo único do referido artigo 463 informe que o Contrato Preliminar deverá ser levado a registro é importante não esquecer que há muito (julgamento em 28/06/2000) o STJ já sumulou o entendimento que "O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis" (Súmula 239).

Em acréscimo é preciso também recordar que a recente Lei Federal 14.382/2022, dentre outras novidades, trouxe a possibilidade (já vigente) da realização da ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA EXTRAJUDICIAL, com assistência de Advogado, direto nas Serventias Extrajudiciais (Tabelionato de Notas e Registro de Imóveis) sem a necessidade de um longo e custoso Processo Judicial - como já acontece com a Usucapião e o Inventário. Ainda que sem regulamentação pelo CNJ até esse momento, muitos Estados como São Paulo e Rio de Janeiro já possuem as regras locais e por isso, pelo menos nesses Estados, sua realização já é plenamente possível.

A grande questão que pode se apresentar diz respeito à hipótese em que o PROMITENTE COMPRADOR - que não obteve a sua Escritura Definitiva - venha a falecer. Nesse caso, o imóvel objeto do contrato preliminar mas sem ESCRITURA e muito menos REGISTRO poderia integrar o rol de bens deixados pelo falecido e ser partilhado entre seus herdeiros - ainda que esse contrato preliminar não esteja registrado no RGI?

Antes de tudo é preciso compreender que nesse caso o que se partilha são os DIREITOS AQUISITIVOS egressos do referido contrato preliminar e não diretamente o IMÓVEL. Sim, efetivamente a propriedade imobiliária intervivos só se transmite pelo REGISTRO do título no Cartório do REGISTRO DE IMÓVEIS, como deixa claro o art. 1.245 do mesmo CCB, que merece ser repetido:

"Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1 o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel".

Como se disse, com ou sem registro os DIREITOS AQUISITIVOS oriundos do contrato preliminar têm importância e apreciação econômica e por isso poderão ser arrolados em sede de Inventário Judicial ou Extrajudicial, todavia, no Inventário não entra o IMÓVEL - já que, por óbvio, esse, naquelas condições, nem mesmo ao morto pertencia ainda. Enquanto não aperfeiçoada a transmissão ele ainda permanecerá no Registro Público em nome dos proprietários originários. Com a sua inclusão em sede de inventário os direitos aquisitivos poderão ser partilhados entre os herdeiros que, aí sim, titulares dos referidos direitos poderão promover a sua regularização pela via própria - inclusive a EXTRAJUDICIAL.

A jurisprudência do STJ há muito reconhece com tranquilidade a possibilidade do Inventário e da Partilha de tais direitos:

"STJ. REsp 1185383/MG. J. em: 08/04/2014. RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. DIREITO REAL QUANDO REGISTRADO. ART. 1.225 DO CÓDIGO CIVIL. ARROLAMENTO DE DIREITOS. INVENTÁRIO. ART. 993, INCISO IV, ALÍNEA G, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. (...). 2. A promessa de compra e venda identificada como direito real ocorre quando o instrumento público ou particular é registrado no cartório de registro de imóveis, o que NÃO SIGNIFICA que a ausência do registro retire a validade do contrato. 3. A gradação do instituto da promessa de compra e venda fica explícita no art. 25 da Lei n. 6.766/1979, que prevê serem irretratáveis os compromissos de compra e venda, cessões e promessas de cessão, os que atribuem direito a adjudicação compulsória e, estando registrados, conferem direito real oponível a terceiros. 4. Portanto, no caso concreto, parece lógico admitir a INCLUSÃO DOS DIREITOS oriundos do contrato de promessa de compra e venda de lote em inventário, ainda que sem registro imobiliário. Na verdade, é facultado ao promitente comprador adjudicar compulsoriamente imóvel objeto de contrato de promessa de compra e venda não registrado, e a Lei n. 6.766/1979 admite a transmissão de propriedade de lote tão somente em decorrência de averbação da quitação do contrato preliminar, independentemente de celebração de contrato definitivo, por isso que deve ser inventariado o direito daí decorrente. 5. O compromisso de compra e venda de imóvel é SUSCETÍVEL DE APRECIAÇÃO ECONÔMICA e transmissível a título inter vivos ou CAUSA MORTIS, independentemente de REGISTRO, porquanto o escopo deste é primordialmente resguardar o contratante em face de terceiros que almejem sobre o imóvel em questão direito incompatível com a sua pretensão aquisitiva, o que não é o caso dos autos. 6. Recurso especial provido".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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