NÃO SE DESCONHECE que inventários são medidas demoradas, onerosas e complexas destinadas a resolver e partilhar bens daqueles que já se foram. Até então, sempre feito através de AÇÃO JUDICIAL onde, observadas as regras relativas à ordem de vocação hereditária (atualmente no art. 1.829 do CC/2022 - outrora, art. 1.623 do CC/1916) os bens deixados pelo "de cujus" são divididos entre herdeiros e o imposto causa mortis (ITD ou ITCMD) recolhido ao Estado. Desde 2007 por ocasião da Lei 11.441 um novo cenário se descortinou com a possibilidade da resolução mais rápida de Inventários e Partilhas direto no Cartório, com a presença obrigatória de ADVOGADO mas sem qualquer necessidade de um PROCESSO JUDICIAL.
A muito bem-vinda novidade tinha algumas restrições originalmente: não era possível fazer inventário em Cartório quando houvesse DISSENSO entre os interessados, TESTAMENTO ou herdeiros INCAPAZES. Coube à Resolução 35/2007 do CNJ apresentar a regulamentação para que na prática a novidade fosse executada pelos Cartórios e - de lá para cá - mais de 15 (quinze) anos já se passaram e hoje podemos afirmar categoricamente que o tempo fez muito bem ao INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL: hoje já é perfeitamente possível realizar Inventários Extrajudiciais em Cartório mesmo tendo o falecido deixado TESTAMENTO ou mesmo havendo HERDEIROS INCAPAZES (*sendo muito importante analisar essa classificação de"incapacidade"à luz do novo panorama instaurado pela Lei 13.146/2015).
Aqui no Rio de Janeiro por exemplo as regras para a realização do Inventário Extrajudicial com testamento e também com interessados incapazes estão, respectivamente nos artigos 446 e 447 do Código de Normas Extrajudiciais, em vigor a partir de Janeiro de 2023. De toda forma, é importante deixar claro que a via JUDICIAL não está vetada mesmo nas hipóteses onde todos os requisitos para a realização pela via administrativa estejam presentes. A bem da verdade, houve quem defendesse que a via judicial só poderia ser utilizada caso restasse osbtaculizada a via extrajudicial, de modo que obrigatória seria, então, a utilização da via cartorária - posição da qual jamais comungamos.
A via extrajudicial não pode jamais ser obrigatória. O traço comum aqui será sempre a facultatividade.
Uma questão recorrente para nós que lidamos diariamente com casos envolvendo INVENTÁRIOS, partilhas, testamentos, heranças e questões afins diz respeito àqueles inventários judiciais que há anos, senão décadas, se encontram paralisados na justiça causando verdadeiro PREJUÍZO a todos os envolvidos. Podem ser trazidos para a solução na via extrajudicial, mesmo passado tanto tempo?
Antes de mais nada é preciso recordar que na atualidade o Inventário Judicial pode ser resolvido através de três formas, como disciplina o CPC/2015 (e já falamos aqui em detalhes): rito tradicional e solene (arts. 610 a 658), arrolamento sumário (arts. 659 a 663) e arrolamento comum (art. 664).
Nem sempre trazer o inventário que já tramita há alguns anos na via judicial pode ser vantajoso como se pode imaginar, já que, por exemplo, a regra na via judicial será o recolhimento de custas ANTES da solução prolatada por sentença - diferentemente da via extrajudicial onde a "solução" se dá com a lavratura da Escritura, momento então onde os emolumentos são pagos/recolhidos. Analisando por esse aspecto é possível verificar que, se então, na via judicial as custas já foram pagas para iniciar o processo de inventário judicial, novas custas terão de ser pagas ao Cartório Extrajudicial caso uma Escritura seja a solução e não mais uma Sentença, por força da conversão procedida (art. 2º da Resolução 35/2007 do CNJ).
Nesse sentido é muito importante que o Advogado Especialista seja consultado e analise todo o panorama da situação, inclusive faça um estudo sobre a real VIABILIDADE da conversão do procedimento judicial em extrajudicial já que, como sabemos, nem sempre a via extrajudicial - que mesmo com todos os avanços poderá se mostrar LIMITADA diante de determinadas situações concretas - poderá ser vantajosa para todos os casos. Considerar a questão do aventado "duplo" recolhimento de custas/emolumentos é um ponto crucial que deve ser ponderado com outro recurso tão importante nos dias de hoje: o TEMPO que as partes podem já não dispor para usufruir dos bens livres, desembaraçados e regularizados em seus nomes.
POR FIM, a lúcida jurisprudência do TJMG que serve de alerta para esse necessário exame de viabilidade da conversão:
"TJMG. 10324150029878001. J. em: 23/06/0020. AGRAVO DE INSTRUMENTO - DIREITO PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE INVENTÁRIO. (...). SUJEIÇÃO AO PAGAMENTO DAS CUSTAS - PEDIDO DE DESISTÊNCIA PARA PROMOVER A PARTILHA NA VIA EXTRAJUDICIAL - IRRELEVÂNCIA - INEXISTÊNCIA DE ISENÇÃO LEGAL - NATUREZA TRIBUTÁRIA DO DÉBITO - FEITO QUE TRAMITOU DURANTE CINCO ANOS - COBRANÇA DEVIDA (...) 3. A Resolução n. 35/2007 do CNJ, ao permitir a opção pela via extrajudicial, a qualquer tempo, não exime os herdeiros do pagamento das custas judiciais e da taxa judiciária. 4. A desistência do inventário judicial para migrar para a via extrajudicial não confere ao espólio isenção do pagamento das custas processuais, que são devidas pela simples movimentação da máquina judiciária. Feito que, ademais, tramitou durante cinco (5) anos e contou com a prática de atos pelo distribuidor, pela secretaria, pelo juízo e também pela contadoria, já devidamente contabilizados nos cálculos das custas processuais. 5. A jurisprudência do c. STF já firmou orientação de que as custas processuais possuem natureza tributária, qualificando-se como taxas remuneratórias de serviço público. Ausente previsão legal quanto à sua isenção na hipótese em comento, não pode o Judiciário simplesmente conferira-la a seu bel prazer, lesando inadvertidamente os já combalidos cofres públicos estaduais. 6. Recurso não provido".