1 Introdução
Diante do aumento significativo das demandas judiciais em âmbito nacional, o Código de Processo Civil trouxe diversas inovações, dentre elas o estímulo de mecanismos para a solução de conflitos de forma consensual, como uma das medidas para diminuir o número de demandas judiciais.
Assim, considerando que a Administração Pública, nos seus variados níveis e esferas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) é considerada a maior litigante na esfera cível do sistema jurídico brasileiro, é indispensável que os movimentos de conciliação integrem de maneira efetiva as demandas que envolvam os entes federados.
2 Conciliação no Novo Código de Processo Civil
A conciliação é considerada a melhor forma de resolução de conflitos, ao passo que os envolvidos, com suporte de um facilitador, definem os critérios para a solução do problema comum.
Conforme se denota do Código de Processo Civil, diversos artigos incentivam a conciliação.
Art. 277. O juiz designará a audiência de conciliação a ser realizada no prazo de trinta dias, citando-se o réu com a antecedência mínima de dez dias e sob advertência prevista no § 2º deste artigo, determinando o comparecimento das partes. Sendo ré a Fazenda Pública, os prazos contar-se-ão em dobro.
§ 1º A conciliação será reduzida a termo e homologada por sentença, podendo o juiz ser auxiliado por conciliador.
Art. 331. Se não ocorrer qualquer das hipóteses previstas nas seções precedentes, e versar a causa sobre direitos que admitam transação, o juiz designará audiência preliminar, a realizar-se no prazo de 30 (trinta) dias, para a qual serão as partes intimadas a comparecer, podendo fazer-se representar por procurador ou preposto, com poderes para transigir.
§ 1o Obtida a conciliação, será reduzida a termo e homologada por sentença.
Art. 447. Quando o litígio versar sobre direitos patrimoniais de caráter privado, o juiz, de ofício, determinará o comparecimento das partes ao início da audiência de instrução e julgamento.
Parágrafo único. Em causas relativas à família, terá lugar igualmente a conciliação, nos casos e para os fins em que a lei consente a transação.
Art. 448. Antes de iniciar a instrução, o juiz tentará conciliar as partes. Chegando a acordo, o juiz mandará tomá-lo por termo.
Art. 449. O termo de conciliação, assinado pelas partes e homologado pelo juiz, terá valor de sentença.
Art. 125. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe:
I - assegurar às partes igualdade de tratamento;
II - velar pela rápida solução do litígio;
III - prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da Justiça;
IV - tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes
Segundo ensinamentos do Prof. Moreira Neto: “a consensualidade tornou-se decisiva para as democracias contemporâneas, pois contribuem para aprimorar a governabilidade (eficiência); propiciam mais freios contra o abuso (legalidade); garantem a atenção a todos os interesses (justiça); proporcionam decisão mais sábia e prudente (legitimidade); desenvolvem a responsabilidade das pessoas (civismo); e tornam os comandos estatais mais aceitáveis e facilmente obedecidos (ordem).”
Assim, os novos mecanismos de solução alternativa de conflitos representam o avanço do processo civilizatório da humanidade, que, de maneira consciente, busca mecanismos de pacificação social eficientes.
3 Da Indisponibilidade do Interesse Público e a consensualidade no direito administrativo
Segundo o princípio da indisponibilidade do interesse público, a Administração deve realizar suas condutas sempre zelando pelos interesses da sociedade, mas sem a faculdade de dispor deles, pois o titular desses bens/direitos é o povo.
Logo, o princípio da indisponibilidade do interesse público acaba sendo uma barreira à realização de atos consensuais por parte da Administração Pública, uma vez que para a efetivação de uma transação, o Administrador precisaria dispor do interesse da coletividade em favor de particulares.
Para o Professor Silvio Luís Ferreira da Rocha, “em regra, a ideia de indisponibilidade afasta a possibilidade de qualquer transação, perdão, renúncia ou inércia do poder público em relação ao objeto jurídico caracterizador do interesse público”.
No mesmo sentido é o entendimento de Eduardo Cambi e Fernando Machado de Souza, “falta ao gestor público capacidade para transigir, posto que a titularidade dos interesses públicos é do povo, o que torna os bens públicos indisponíveis, pois, como corolário do direito de propriedade, somente o proprietário poderia dispor desse direito”.
É inegável que a viabilidade transacional, quando a situação envolve o poder público, depende de prévia autorização normativa capaz de viabilizar que o representante da Fazenda Pública possa transigir em juízo.
Portanto, em que pese o movimento de harmonização do princípio da indisponibilidade do interesse público com o fenômeno da consensualização do Direito Administrativo, fato é que eventual autocomposição pelos entes públicos precisa respeitar o princípio da legalidade (artigo 37, CF), assim, apenas a edição de normas é capaz de validar a consensualidade no direito administrativo.
4 Conclusão
Diante do exposto, a consensualidade é essencial para a evolução do sistema jurídico brasileiro, no entanto, nos conflitos que envolvem a Fazenda Pública, eventual composição depende de prévia autorização legislativa e deverá harmonizar o princípio da indisponibilidade do interesse público com o fenômeno da consensualização do Direito Administrativo.
5 Referências
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. Apud SALOMÃO;
Luis Felipe. DRUMOND, Mônica. Métodos online de resolução de litígios. Disponível em: https://www.editorajc.com.br/metodos-online-de-resolucao-de-litigios/;
ROCHA, Silvio Luís Ferreira da. A administração pública e a mediação. In: PONTES
FILHO, Valmir; MOTTA, Fabrício; GABARDO, Emerson (Coords.). Administração
Pública: novos desafios para a transparência, probidade e desenvolvimento. Belo Horizonte: Fórum, 2017;
CAMBI, Eduardo; SOUZA, Fernando Machado de. A disponibilidade do interesse público no Novo Código de Processo Civil e o princípio da eficiência na Administração. Revista da AJURIS, Porto Alegre.