Sendo o Direito a Mobilidade um valor Constitucional decorrente do princípio maior norteador da nossa magna Carta, o Direito a Vida, um permanente debate se mantém na construção de cidades melhores pra se viver, e logo isso passa pelas prioridades estabelecidas por décadas para a circulação desses automóveis.!
Não se pode falar em isonomia quando alguns acreditam que a sua vida é mais importante do que ao do pedestre na rua. O estacionamento de superfície nos priva de um espaço estratégico para o desenvolvimento de opções alternativas, e além disso, o hábito de procurar vaga de estacionamento na rua contribui muito negativamente para o congestionamento. Nas cidades do futuro, o estacionamento de superfície está condenado a desaparecer completamente.
Não se pode falar em isonomia, quando olhares desatentos resolvem curtir uma foto do Instagram enquanto dirigem seus veículos pela cidade.
Pense apenas na padronização e alargamento das calçadas e ampliação das ciclovias? Pense apenas em um trabalho em que as ruas das suas cidades são modificadas em uma velocidade de 10% delas ao ano? Qual o impacto na empregabilidade e na circulação das pessoas nesse redesenhar dos modais de transporte?
A renúncia e ou redução do carro privado depende de uma série de fatores, afinal se parte dos nossos filhos vão para escola de bikes ou patinetes, certamente nossos veículos acabam andando menos e congestionando menos as vias.
Afinal, qual a razão dos nossos celulares não travarem enquanto dirigimos veículos? Qual a razão para que os mesmos não tenham o módulo “conduzindo veículo”? Por qual razão nossos celulares que nos monitoram em todos os movimentos não estão conectados ao sistema de trânsito avisando que estamos conduzindo um veículo acima da velocidade permitida? Todas essas soluções são simples, já existem e a crise fiscal deve empurrar os entes públicos para esse caminho.
Nossos celulares e seus dados de locomoção vão interagir de forma cada vez mais intensa com o avançar das tecnologias de 5G e Internet das Coisas, estamos apenas no início, e por mais que seja antipático serão medidas que salvarão vidas e melhorarão o trânsito nas ruas e rodovias.
Algumas empresas já são capazes inclusive de detectar os péssimos motoristas, e de travar o veículo em caso de má condução através dos seus softwares.
A medida fundamental para tornar as cidades atraentes para opções de mobilidade pessoal, como bicicletas ou patinetes, é a criação de faixas habilitadas para elas, onde os cidadãos podem se locomover sem arriscar suas vidas. E a única maneira razoável de permitir esses espaços é tirá-los do estacionamento da superfície. Não mais considerando a rua como um espaço para abandonar um carro por horas. A equação é tão simples.
Não é uma proposta de eliminar vagas somente, mas de realocá-las dando as ruas ao trânsito e não para estacionamentos, só para ajudar se os prédios e residenciais e comerciais aumentarem o número de vagas de estacionamento ganham todos. Isso requer uma mentalidade diferente, pois as cidades não podem mais serem construídas tendo o carro como prioridade, a prioridade precisa ser a saúde das pessoas.
Afinal quantas cidades brasileiras obrigam seus prédios novos e antigos a instalarem sistemas de energia solar e ou eólica? Quantos são os prédios que ampliaram o número de vagas para bikes e patinetes, veja o shopping da sua cidade e tire a medida dessa falta de incentivo, onde os carros reinam soberanos sobre os meios de locomoção sustentáveis. A mudança começa em casa.
O transporte e a gestão inteligentes do tráfego estão transformando a forma como as cidades abordam a mobilidade. Com o surgimento da Internet das Coisas (IOT), é possível aplicar várias tecnologias para monitorar, avaliar e gerenciar diferentes sistemas de transporte, reduzindo o tempo de deslocamento e aumentando a segurança, logo espaços e equipamento pouco usados estão com os seus dias contados.
A tecnologia da informação, deve ofertar um conjunto permanente de conteúdo para escolha das melhores rotas e modais.
De acordo com a Política Nacional de Mobilidade Urbana, publicada em 2012, é preciso contribuir para o acesso universal à cidade por meio do uso igualitário do espaço público. A aplicação da Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) no gerenciamento da mobilidade urbana não pode apenas se restringir a coleta e aplicação de dados. É preciso entender as causas da segregação urbana e buscar soluções para diminuir as disparidades sociais nos deslocamentos.
Cada cidade exerce um papel fundamental nesse redesenho, e essa política deve ser construída com Estados e União, principalmente na edificação de sandbox regulatórios para um novo circular, onde o homem e o seu tempo de deslocamento em condições saudáveis esteja no centro desse processo.
No meio dessa discussão, muitas soluções da micromobilidade passam por um necessário regramento, que considere a experiência e a vivência harmoniosa das novas soluções de micromobilidade, do contrário os embates são inevitáveis. Vejamos o que aconteceu no último mês na cidade de Paris, que após consulta popular, resolveu proibir os patinetes elétricos para aluguel na capital francesa, após uma votação na qual apenas 4% dos habitantes da cidade participaram, causando um golpe para os operadores em um de seus maiores mercados.
De acordo com a Câmara Municipal, 89% dos cidadãos que votaram no referendo apoiaram a proibição. O conselho acrescentou que não convocará novas licitações ou renovará as licenças das 15.000 scooters elétricas em uso, operadas pela alemã Tier, pela Lime, apoiada pela Uber, e pelo grupo franco-holandês Dott.
Os dispositivos causaram inconvenientes aos cidadãos após sua introdução não regulamentada em 2018. Em um ponto, havia 35.000 patinetes elétricos de 12 operadores, muitas vezes espalhando as ruas e bloqueando as entradas.
Posteriormente, as regras foram reforçadas e o licenciamento introduzido, mas alguns parisienses ainda consideravam as scooters elétricas perigosas, apesar do limite de velocidade de 20 km / h.
O referendo foi criticado pelas empresas de patinetes elétricos por ser excessivamente restritivo, com apenas 100.000 pessoas votando. As restrições incluíam o encerramento antecipado das inscrições, a limitação das assembleias de voto e a ausência de votação electrónica ou por correspondência.
Lembro que é em Paris, que foi adotado a experiência da cidade de 15 minutos, com a ideia de que o morador faça tudo que precisa sem gastar mais que um quarto de hora em deslocamentos. O projeto inclui ênfase na locomoção a pé ou de bicicleta, imóveis de uso misto, residencial e comercial, e melhoria constante do transporte público
Tem os dias contados a ideia da cidade espalhada, que privilegiava o carro e separava residencial de comercial, marcou o urbanismo modernista, pois o urbanismo contemporâneo é totalmente diferente. Hoje em dia o modelo de cidade adensada é uma unanimidade.
O aperfeiçoamento regulatório a micromobilidade é fundamental para o planejamento das nossas cidades.
A volta dos patinetes compartilhados às ruas das nossas cidades já foi anunciada diversas vezes desde a quebra da maior das operadoras durante a pandemia. Sucessivos anúncios e adiantamentos espelham exatamente o tamanho do desafio regulatório e comercial de se colocar novamente de pé essa importante alternativa de micromobilidade urbana.
O aperfeiçoamento da micromobilidade por patinetes e bikes, vai ao encontro de devolver as nossas centenas e por vezes milhares, de horas que perdemos dentro dos nossos carros em meio a congestionamentos sem fim e sem horário pra começar ou acabar.
Em Madrid por exemplo a municipalidade abriu para concorrência a exploração do serviço de patinetes elétricos, limitando as autorizações inicialmente em 6.000, o que já estabelece algumas referências regulatórias: 1) O serviço precisa sim ser autorizado pois necessita do controle da municipalidade; 2) O serviço precisa trabalhar com um número mínimo de patinetes (o tamanho da frota), afinal a experiência de cidades como São Paulo, com milhares deles jogados por nossas calçadas, pode dar a dimensão da importância de se estabelecer um número como ponto de partida, e claro que o mesmo pode ser ajustado de acordo com a experiência; 3) É preciso limitar o número de operadoras que precisam oferecer os requisitos mínimos (como seguro para o usuário ou terceiros que podem ser vítimas de acidentes), um limite que não desanime o investidor e que ao mesmo tempo oferte garantias da prestação com qualidade do serviço; 4) O processo licitatório pode e deve estabelecer a necessidade do serviço cobrir determinadas áreas da cidade, evitando assim serviços ofertados de forma discriminatória para determinados bairros em detrimento de outros menos lucrativos; 5) As áreas ao serem divididas devem ser compartilhadas por mais de um operador, para que a concorrência entre elas permita a construção de um referencial de prestação de serviço. Essas são apenas algumas das premissas como ponto de partida para regulação municipal.
A definição de pontos de estacionamento exclusivo para esses patinetes (e bikes também) é fundamental para evitar acidentes, logo a fiscalização desse serviço pode ser facilitada pelo próprio aplicativo que indica o estacionamento mais próximo do destino do usuário, isso vai seguramente ofertar uma nova oportunidade de negócio para condomínios, casas e estabelecimentos comerciais que disponibilizarem o seu espaço para estacionamento e recarga dos mesmos.
Lembro que antigamente, os patinetes eram alvos de depredação e roubo, além de ficarem espalhados por uma área muito grande, o que encarecia demais a operação. Com uma nova tecnologia já disponível, o usuário só pode devolver ou alugar os patinetes em áreas predeterminadas, isso vai acabar com aqueles milhares de patinetes jogadas indevidamente nas calçadas.
O Direito a mobilidade, é antes de mais nada um Direito à saúde, e é óbvio que o trânsito nas médias e grandes cidades, além de piorar as condições do ar contribui para milhares de horas que todos nós ficamos presos dentro de carros nas cidades do mundo. É um tempo jogado fora que nunca recuperamos.
Nossas cidades foram construídas colocando o carro na preferência dos espaços, e logo as obras de infraestrutura quase sempre são pensadas em onde e como colocarmos mais carros, como resultados as cidades a cada dia, sistematicamente envenenam seus habitantes com mais e mais poluição, e com mais e mais perda de qualidade de vida nas milhares de horas que passamos trancados em veículos em um tempo pouco ou quase nada produtivo.
A livre iniciativa sem o mínimo de controle é selvageria, e com controle em demasia é a morte do negócio. É preciso encontrar um meio termo que produza como resultado um desenvolvimento saudável para as pessoas e para o negócio.
Afinal quantos anos da sua vida o trânsito poder furtar?