Delegação do Poder de Polícia

Posicionamento dos Tribunais Superiores quanto à delegação do Poder de Polícia

19/04/2023 às 19:51

Resumo:


  • A jurisprudência atualizada discute a delegação do poder de polícia para entidades da administração pública indireta.

  • As fases delegáveis do ciclo do poder de polícia são legislação, consentimento, fiscalização e sanção.

  • O STF limita a delegação do poder de polícia para entidades públicas e privadas de capital majoritariamente público que prestem serviços públicos próprios do Estado e em regime não concorrencial.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Apresenta-se a atualização jurisprudencial quanto à possibilidade de delegação do poder de polícia para determinadas entidades da administração pública indireta, e quais fases do ciclo do poder de polícia seriam delegáveis.

Resumo: Apresenta-se a atualização jurisprudencial quanto à possibilidade de delegação do poder de polícia para determinadas entidades da administração pública indireta, e quais fases do ciclo do poder de polícia seriam delegáveis.

Abstract: It is brought the jurisprudential update regarding the possibility of delegating police power to certain indirect public administration entities, and which phases of the cycle of police power would be delegable.

Siglas:

STJ - Superior Tribunal de Justiça

STF - Supremo Tribunal Federal

Introdução

Poder de polícia (para a Teoria do Estado) é como se chama a prerrogativa de índole "poder-dever" do Estado sobre a iniciativa privada (e, com isso, também sobre os indivíduos), visto que é seu dever fazer respeitar a lei, porém o faz com certa discricionaridade, como interditar um estabelecimento aberto ao público por razões sanitárias.

(Para o Direito Administrativo) Em sentido amplo é prerrogativa que permite condicionar e restringir o exercício da atividade privada para proteger o interesse coletivo sobre o interesse privado - revela-se a supremacia do interesse público sobre o privado. Em sentido estrito se resume à atividade de regulamentar e executar leis restritivas de direitos, incluindo as sanções decorrentes da atividade faltosa. O STF definiu assim: "toda e qualquer ação restritiva do Estado em relação aos direitos individuais".

Inicia-se pela previsão legal que cria um dever, um controle, ou reduz um direito. Pode se concretizar preventivamente, como consentimento (licença e autorização), ou repressivamente, como sanção. E ao centro estará o potencial de fiscalização.

Daí a separação, segundo o STJ, em quatro fases:

  1. Legislação;

  2. Consentimento;

  3. Fiscalização;

  4. Sanção.

Já o STF assim as chama:

  1. Ordem de polícia,

  2. Consentimento de polícia,

  3. Fiscalização de polícia

  4. Sanção de polícia.

Os itens 1 e 3 estarão sempre presentes no ato administrativo (da administração pública), visto que os atos devem ser legais e fiscalizados como prerrogativa de existência do poder de polícia. Sem órgão fiscalizador o poder de polícia carece de agente administrativo para atuar. Sem lei o poder de polícia carece de validade. Contudo, nem sempre haverá necessidade de consentimento, e tampouco de sanção (fases 2 e 4).

Não é exercido o poder de polícia quando há atuação disciplinar ou hierárquica, o que estabelece que o poder de polícia se dá fora da relação de emprego ou contrato. Por exemplo, um aluno de universidade pública federal que receba sanção baseada nessa relação universitária não está sob alvo do poder de polícia. Já um aluno de universidade pública que solicita carteira de habilitação para dirigir, fato que não se relaciona com o vínculo universitário público, está sob a atuação do poder de polícia.

E não se trata dos policiais, previstos no art. 144 da Constituição, muito confundido com o poder de polícia. Policiais atuam na segurança pública. A segurança pública usa o poder de polícia em alguns atos, mas não em todos - não usa, por exemplo, quando reprime o crime. Assim, a atividade privada que é regulada pelo poder de polícia é a atividade lícita, e não a penal.

A fiscalização, por sua vez, possui dois aspectos: a) verificação de fatos, como por exemplo transitar em alta velocidade, para fins de multa; e b) apurar a infração, que se confunde com a fase sancionadora.

A jurisprudência nacional apresentou divergência quanto à possibilidade de delegação do poder de polícia para entidades de direito público da administração indireta, ou se caberia também às entidades de direito privado da administração indireta (Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista, como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil).

E também surgiu divergência entre os tribunais superiores quanto a quais atos, ou fases de atos, seriam delegáveis.

Entidades a quem se pode delegar

 

Para o STF, em 2022: "não se mostra cabível transferir à iniciativa privada atividade tipicamente estatal a envolver poder de polícia, a exemplo da fiscalização direta, permanente e exclusiva de inspeção sanitária de produtos de origem animal". ARE 1331661 AgR, Publicação: 13/09/2022.

O Tema 532 da repercussão geral teve tese fixada: “É constitucional a delegação do poder de polícia, por meio de lei, a pessoas jurídicas de direito privado integrantes da Administração Pública indireta de capital social majoritariamente público que prestem exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial”.

Com isso o STF limita, e somente é possível delegar para:

  1. entidades públicas, a exemplo do Conselhos de Fiscalização Profissional;

  2. entidade privada, da Administração Pública indireta de capital social majoritariamente público que prestem exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial;

E o STJ? Não interessa, já que o STF decidiu com aplicação geral, em repercussão geral. Entendia, porém, que seriam delegáveis inclusive para a Administração Pública Indireta Privada (Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista).

 

Que fases podem ser delegadas?

Para o STF, pode ser delegado inclusive a aplicação de multas (RE 633782 - Publicação: 25/11/2020), desde que seja para as entidades acima citadas. Por exemplo a ANVISA regulamenta, consente, fiscaliza, e sanciona. No entanto, a doutrina tem se posicionado a entender que este tipo de regulamentação não consiste na fase 1, que continuaria indelegável.

O STJ tende a se unir ao STF, porém, enquanto não o faz, citemos a decisão de que ao Inmetro "nos termos do art. 4º, §§ 1º e 2º, da Lei 9.933/1999, somente os atos relativos ao consentimento e à fiscalização são delegáveis, pois aqueles referentes ao sancionamento e e à normatização derivam do poder de coerção do Poder Público." (REsp 1658399 / CE RECURSO ESPECIAL 2017/0049205-7 DJe 12/09/2017).

Sendo assim, para o STJ são delegáveis as fases 2 e 3. No REsp 817534 / MG, em 2006, o STJ decidiu que Sociedade de Economia Mista não pode aplicar sanção pecuniária em fiscalização de trânsito. E justificou: "Somente o atos relativos ao consentimento e à fiscalização são delegáveis, pois aqueles referentes à legislação e à sanção derivam do poder de coerção do Poder Público."

E, ainda nas palavras do STJ: "No que tange aos atos de sanção, o bom desenvolvimento por particulares estaria, inclusive, comprometido pela busca do lucro - aplicação de multas para aumentar a arrecadação".

Sobre o autor
Ramon Brescovici

Graduado em Direito pela UFSC, com especialização em Direito Tributário. Advogado, Empresário, Fiscal de Tributos e Concurseiro.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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