Usucapião Extrajudicial: titulares falecidos e herdeiros com paradeiro desconhecido.

E agora? Como prosseguir?

24/04/2023 às 16:05
Leia nesta página:

POR INCRÍVEL QUE PAREÇA muito comum são os casos de Usucapião onde na busca da regularização imobiliária descobrimos que os proprietários registrais são falecidos. Muito fácil presumir o falecimento considerando a hipotética idade dos titulares hoje (a partir da análise dos últimos registros feitos na matrícula) porém só a presunção socorrerá o requerente. É preciso analisar mais a fundo, investigar e considerar especialmente o que a legislação aparelha para a solução nesses casos.

Na via extrajudicial - onde a Usucapião será resolvida sem a necessidade de um processo judicial - a hipótese do falecimento dos titulares registrais evidentemente também será muito comum como sempre aconteceu na via JUDICIAL. Aqui no Rio de Janeiro uma importante ferramenta disponibilizada pelo TJRJ permite gratuitamente localizar informações sobre óbitos (acessível no link https://www4.tjrj.jus.br/Portal-Extrajudicial/CNO/) o que será muito útil nesse tipo de regularização imobiliária.

Para as hipóteses de falecimento do titular registral já aponta o PROVIMENTO CNJ 65/2017 (que regulamenta a Usucapião Extrajudicial) o início do caminho para a solução:

"Art. 12. Na hipótese de algum titular de direitos reais e de outros direitos registrados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula do imóvel confinante ter falecido, poderão assinar a planta e memorial descritivo os herdeiros legais, desde que apresentem escritura pública declaratória de únicos herdeiros com nomeação do inventariante".

Como se percebe, a solução do Provimento do CNJ (reprisada em diversos Códigos de Normas Extrajudiciais Estaduais como do Rio e São Paulo) aponta para os casos onde os herdeiros são localizados. Mas e quando não forem localizados?

A solução está também no mesmo Provimento: regra do art. 11 que permite a NOTIFICAÇÃO POR EDITAL, que inclusive pode ser feita pelo MEIO ELETRÔNICO desde que regulamentado pelo respectivo Tribunal. No Rio de Janeiro tal regulamentação há muito tempo já existe, em razão do PROVIMENTO CGJ/RJ 56/2018 (D.O. de 13/12/2018) - sendo feita através do site https://www.registrodeimoveis.org.br/.

A respeito da solução pela VIA EDITALÍCIA para notificação de eventuais herdeiros de titulares falecidos, muito pertinente a lição do Mestre BENEDITO SILVÉRIO RIBEIRO (Tratado de Usucapião. 2012. Vol. 2) sobre as cautelas que devem anteceder a citação por edital, plenamente aplicável ao procedimento Extrajudicial:

"É cediço que a citação editalícia constitui EXCEÇÃO ao princípio de que o réu deve ser citado em sua própria pessoa, já que a citação é elemento primordial de toda demanda (" citatio est fundamentum totius judicii "), prevendo a lei a sua efetivação por edital quando isso não seja possível. (...) Assim, mesmo que o autor peça a citação por edital desde logo, deverá ser tentada a citação pessoal, no caso, por exemplo, de constar endereço em algum documento inserto nos autos, como escritura, compromisso, correspondência, certidão ou informe do registro imobiliário etc. Isso é que significa ESGOTAR OS MEIOS à localização do citando. (...) Nas comarcas de pequeno movimento é comum a verificação do endereço do citando na lista telefônica, no cartório eleitoral, na Delegacia de Polícia, na Prefeitura Municipal, com pessoas de nomes semelhantes junto a parentes. É SALUTAR, no entanto, que se tomem providências indicativas de uma plausível tentativa, o que, em contrapartida, NÃO PODERÁ PREJUDICAR O ANDAMENTO do processo e a sua eternização".

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Como se vê, não bastará requerer o EDITAL: é preciso antes, esgotar as tentativas de localização dos notificandos. Cabe ao Registrador primar pela observação de tais regras, podendo inclusive - mediante solicitação do Advogado, com base no art. 17 c/c art. 11 do Provimento - requisitar informações quanto ao paradeiro dos interessados junto à Receita Federal ou até mesmo Concessionárias de Serviços Públicos - tal como pode ocorrer na via judicial.

A jurisprudência especializada do TJSP destaca com o costumeiro acerto a necessidade de esgotar as tentativas de localização antes da promoção da notificação por EDITAL inclusive na Usucapião Extrajudicial. Do referido julgado vale extrair os seguintes excertos:

"TJSP. Proc. 1035196-05.2023.8.26.0100. J. em 12/04/2023. RGI. Usucapião extrajudicial. Notificação por edital - titulares de domínio - falecimento. herdeiros desconhecidos. (...) Caso os herdeiros não manifestem sua anuência, deverão ser notificados pelo Oficial registrador. Para tanto, identificação e localização necessitam ser fornecidas. A notificação por edital, por sua vez, é autorizada em apenas duas hipóteses no procedimento administrativo: para ciência de terceiros eventualmente interessados e para ciência de notificandos que não tenham sido encontrados pessoalmente ou que estejam em lugar incerto ou não sabido. (...) Há necessidade de concordância ou notificação dos titulares de direitos registrados. Caso falecidos e na falta de anuência pela via adequada, então seus herdeiros deverão ser notificados. Para isso, deverão ser perfeitamente identificados e sua localização deve ser informada. Desconhecido seu paradeiro, devem ser ESGOTADAS AS PROVIDÊNCIAS possíveis para localização. Somente se não forem encontrados nos endereços alcançados para notificação pessoal ou se estiverem em lugar incerto ou não sabido será possível notificação por edital".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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