Casei e aceitei construir no terreno da sogra. E agora? Como fica a partilha da nossa casa na hora do Divórcio?

02/05/2023 às 15:56
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"QUEM CASA QUER CASA" - esse é um ditado muito antigo mas que ao que parece nunca perderá sua validade e sabedoria. Se muitos casais o seguissem à risca muitos problemas poderiam ser evitados, no entanto, a realidade mostra que mesmo considerando o acerto dessa premissa muitos são os casais que ainda assim acabam por unir alianças (seja em Casamento, seja em União Estável) aceitando a "doce proposta" de parentes dela ou dele para levantar sua casa no terreno da SOGRA ou do SOGRO... aí é que pode começar o problema...

Por Lei, tal situação deverá ser analisada à luz do instituto da ACESSÃO. As regras são dos arts. 1.253 e 1.255 do Código Reale, verbis:

"Art. 1.253. Toda CONSTRUÇÃO ou plantação existente em um terreno presume-se feita pelo proprietário e à sua custa, até que se prove o contrário.

Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou EDIFICA EM TERRENO ALHEIO perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização".

A "acessão" aqui segue a linha da regra basilar de direito de que "o acessório segue o principal". Não por outra razão trata-se de uma forma de aquisição da propriedade, com fundamento no inciso V do art. 1.248 do CCB. A doutrina festejada da Desembargadora Aposentada, hoje Advogada, Dra. MARIA BERENICE DIAS (Manual de Direito das Famílias. 2020) esclarece bem a questão:

"Situação bastante recorrente é quando o casal constrói sua residência em imóvel de terceiros. Normalmente os pais de um deles. Movidos pelo desejo de ajudar o jovem casal, permitem que eles construam o lar em seu terreno. Claro que, por ocasião da separação, o filho do dono é quem permanecerá na posse do imóvel, buscando o outro ressarcimento do valor do bem. (...) Como não é possível a DIVISÃO do bem, para evitar o enriquecimento sem causa do titular do domínio, cabível pretensão INDENIZATÓRIA contra o mesmo, a ser formulada em ação própria".

Efetivamente, como destaca a Lei, haverá presunção em favor do titular do terreno quanto à propriedade da construção feita. Na situação relatada a construção incorporar-se-á ao terreno, cabendo, sob pena de enriquecimento sem causa, indenização por parte do titular da terra em favor de quem efetivamente levantou a construção, observado o art. 1.255. Dessa forma, em sede de divórcio o que se partilha não é o imóvel propriamente dito mas sim os "direitos decorrentes da edificação" que em sede própria (em face dos titulares do terreno) darão ensejo à indenização de que trata o referido artigo 1.255, como inclusive já apontou o STJ ( REsp 1327652/RS. J. em 17/10/2017):

"4. É possível a partilha dos direitos decorrentes da edificação da casa de alvenaria, que nada mais é do que patrimônio construído com a participação de ambos, cabendo ao magistrado, na situação em concreto, avaliar a melhor forma da efetivação desta divisão.

5. Em regra, não poderá haver a partilha do imóvel propriamente dito, não se constando direito real sobre o bem, pois a construção incorpora-se ao terreno, passando a pertencer ao proprietário do imóvel ( CC, art. 1.255), cabendo aos ex-companheiros, em ação própria, a pretensão indenizatória correspondente, evitando-se o enriquecimento sem causa do titular do domínio".

Por óbvio não se pode esquecer de analisar a questão também sob o viés de eventual PACTO ou CONTRATO que verse sobre questões patrimoniais (regime de bens) no relacionamento em enfoque, seja ele um Casamento ou uma União Estável. POR FIM, é preciso destacar que o direito de requerer tal indenização também está sujeito à PRESCRIÇÃO - e nesse ponto os interessados não podem vacilar - como aponta com clareza a decisão do TJSC:

"TJSC. 0022730-60.2008.8.24.0008. J. em: 16/05/2017. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - INDENIZAÇÃO POR ACESSÃO CONSTRUÍDA EM TERRENO ALHEIO - PRESCRIÇÃO RECONHECIDA EM SENTENÇA - INCONFORMISMO DO AUTOR - 1. PRESCRIÇÃO DECENAL - ACOLHIMENTO - AÇÃO COM FUNDAMENTO NO ART. 1.255 DO CC - AUSÊNCIA DE PRAZO ESPECÍFICO - APLICABILIDADE DO PRAZO DE 10 ANOS DO ART. 205 DO CC - 2. CONSTRUÇÃO DE BOA-FÉ DEMONSTRADA - INDENIZAÇÃO DEVIDA - SENTENÇA REFORMADA - APELO PROVIDO. 1. Prescreve em dez anos a pretensão indenizatória pela acessão construída em terreno alheio, com fundamento no art. 1.255 do CC. 2. Comprovado pelo autor que construiu de boa-fé em terreno de propriedade alheia, cabe à proprietária pagar a indenização correspondente ao valor da acessão, sob pena de enriquecimento sem causa".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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