Inviolabilidade de domicílio perante o flagrante delito do crime de tráfico de drogas

15/05/2023 às 09:33
Leia nesta página:

AUTORAS:

Beatriz Cristina da Silva Dantas;

Emilly Cristina de Medeiros Campelo;

Karoline Patrícia de Araújo;

Marília Fernanda dos Santos Souza.

ORIENTADOR: Prof. Dr. h. c. Rilawilson Azevedo.

RESUMO: Este trabalho tem como objetivo principal coletar o número de ocorrências do Crime de Tráfico de Drogas, nos meses de Janeiro a Dezembro de 2022, na cidade de Caicó no estado do Rio Grande do Norte. Portanto, foram analisados os dados coletados para identificar quais dessas ocorrências geraram Inquéritos Policiais, que posteriormente terminaram em uma Operação Policial ou cumprimento de Mandado, que necessitou a violação da residência do indivíduo. Para isso, foram utilizados para a elaboração da pesquisa, dados fornecidos pelas instituições públicas da área da Segurança Pública da cidade. A partir da análise, foi identificado o número de ocorrências do crime de Tráfico de Drogas; o número de indivíduos supostamente envolvidos no crime; o mês com maior incidência do crime; e quantas residências foram violadas para cumprimento de Mandado Judicial.

PALAVRAS- CHAVES: Tráfico de Drogas; Operação Policial; Mandado Judicial e Violação da Residência.

ABSTRACT: The main objective of this work is to collect the number of occurrences of the Crime of Drug Trafficking, from January to December 2022, in the city of Caicó in the state of Rio Grande do Norte. Therefore, the collected data were analyzed to identify which of these occurrences generated Police Inquiries, which later ended in a Police Operation or execution of a Warrant, which required the violation of the individual's residence. For this, data provided by public institutions in the area of Public Security in the city were used for the elaboration of the research. From the analysis, the number of occurrences of the crime of Drug Trafficking was identified; the number of individuals allegedly involved in the crime; the month with the highest incidence of crime; and how many residences were violated to comply with a court order.

KEYWORDS: Drug Trafficking; Police Operation; Judicial Warrant and Violation of Residence.

1 INTRODUÇÃO

É notório que com o passar do tempo o Direito se aperfeiçoa as mudanças do mundo. Dessa forma, traz cada vez mais em seu rol: direitos, garantias e valores essenciais aos seres humanos. Pode-se verificar muitos deles presentes no Artigo 5° da Magna Carta de 1988. Um dos quais, foco principal deste artigo, que é a inviolabilidade do domicílio.

O Art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal de 1988, versa sobre o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, quando diz que: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”, garantindo assim, que a privacidade e a intimidade do indivíduo sejam preservadas.

Ao observar a redação do artigo supracitado, podemos identificar que este direito não é absoluto, podendo existir situações em que o agente poderá adentrar em propriedades de outrem, sem que isso acarrete violação a um direito fundamental, ou seja, utilizando justificativas lícitas e fundamentadas para a violação de domicílio.

Diante do que foi exposto, esse artigo visa discutir a Inviolabilidade do Domicílio perante o Flagrante Delito do Crime de Tráfico de Drogas se justificando pelo fato de ser uma área de estudo importante para os estudiosos do Direito e também para os profissionais da área de Segurança Pública, que apesar de conviverem diariamente com esse tipo de ocorrência e ainda cometem muitos erros que os levam a responder por tais atos praticados.

Dessa forma, esse trabalho possui a seguinte problemática: Quantas ocorrências do Crime de Tráfico de Drogas, na cidade de Caicó-RN, geraram um Inquérito Policial, no qual foi necessário a violação do domicílio de um indivíduo?

Como objetivo principal, esse trabalho busca coletar a quantidade de ocorrências do crime de Tráfico de Drogas, na cidade de Caicó-RN, nos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2022. Tendo como objetivo específico, analisar quantas dessas ocorrências policiais gerou um Inquérito Policial, que findaram em uma Operação Policial ou em Mandado de Busca e Apreensão, no qual foi necessário adentrar a residência do indivíduo investigado.

Sendo assim, este artigo se divide em quatro seções. A primeira uma breve introdução. A segunda, um desenvolvimento onde será exposta a pesquisa referencial - a partir de conceitos de inviolabilidade de domicílio e dignidade da pessoa humana, análise de tipos de flagrante delito, análise das justificativas da violação do domicílio – e os materiais e métodos utilizados na pesquisa. A terceira é o estudo de caso realizado na cidade de Caicó - RN, a análise de dados e a discursão dos resultados. E por fim, a conclusão do trabalho, na quinta seção.

2 DESENVOLVIMENTO

A Inviolabilidade de Domicílio é quando não pode haver ingresso forçado nas residências; mas, em alguns casos excepcionais podem ocorrer como: no caso de flagrante delito, prestação de socorro, desastres.

É necessário entender que a violação de domicilio desencadeia outras violações, como a do direito à propriedade e direito a privacidade. Desse modo é necessário que o agente tenha permissão para adentrar em uma residência, para que não viole um direito fundamental.

Logo, a Inviolabilidade de Domicílio trata-se, sobretudo, de uma forma de resguardar as atuações policiais errôneas. Porém não é voltado apenas para aqueles que nos protegem, mas sim, para todos aqueles que invadem as residências sem autorização. É importante frisar que a inviolabilidade domiciliar é uma forma de garantir aos indivíduos privacidade e intimidade, respeitando assim os seus direitos perante a Constituição Federal.

  1. INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Lira (2020) escreveu um artigo “A Inviolabilidade de Domicílio perante o flagrante delito nos crimes relacionados à prática do tráfico ilícito de drogas”, no qual analisa o princípio da Inviolabilidade de Domicílio no ingresso forçado em casos de tráfico de drogas, pelos agentes da Segurança Pública. E também analisa as jurisprudências usadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O mesmo ainda cita que o tráfico de drogas é o crime que mais encarceram brasileiros e diz que o grande traficante é beneficiado pelos policiais corruptos, e quem sofre as consequências dessas ações são os jovens pobres e periféricos. Trás, em seu ponto de vista, argumentos frágeis como: fugar ao visualizar a polícia e denúncias anônimas, sem justa causa e sem mandado de busca e apreensão.

O objetivo principal do artigo de Lira (2020) é mostrar os procedimentos utilizados pelos agentes de segurança, visando mostrar que a proporcionalidade e a legitimidade da violação do domicílio, e mostrar que o que torna ilícita, muitas vezes, a apreensão e o cumprimento da pena por tráfico de drogas é a ilicitude da ação pelo agente que representa o Estado.

Existem dois princípios que norteiam o Código Penal Brasileiro: a Inviolabilidade de Domicílio e a Dignidade da Pessoa Humana. O primeiro é elencado na Constituição Federal de 1988 no seu art. 5° inciso XI - citado anteriormente - que trás a casa como um asilo inviolável. O segundo trata de um direito do indivíduo de ter dignidade, justiça e proteção perante os julgamentos e ações praticadas contra ele.

Para melhor compreensão, entende-se como “casa” um espaço que é utilizado por um indivíduo para habitar. Complementando, o STF entende que as habitações coletivas e o local que se exerce as atividades profissionais, também é considerado casa. Com isso, está previsto em lei que para a proteção, julgamento e melhor interpretação dos fatos ocorridos contra o indivíduo; à lei precisa ser aplicada de forma correta, preservando a intimidade e a vida privada da pessoa.

Para tanto, existe casos previstos na Constituição Federal, em que agentes de Segurança Pública não violam a privacidade no indivíduo ao adentrar a sua casa sem o seu consentimento, que são: em caso de desastre, prestar socorro, ou durante o dia por determinação judicial.

A Determinação Judicial não necessita de testemunha para da o seu procedimento, pois já é uma ordem autorizada pelo juiz, dentro da lei e após uma vasta analise e investigação. Já o desastre e a prestação de socorro são necessários que haja uma testemunha ocular para ter a proteção e não violar a vida privada do indivíduo. No caso da prestação de socorro, o agente tem que ter a certeza, confirmada, que a pessoa que precisa da ajuda não pode se comunicar de uma maneira que expresse a negação da ajuda.

Contudo, para se entender o fato da Inviolabilidade de Domicílio perante o crime de tráfico de drogas, é preciso entender a diferença de usuário de drogas e traficante de drogas. O usuário é quando a figura da pessoa utiliza a droga apenas para consumo próprio, se tratando assim de um delito de menor potencial ofensivo. Já o traficante ele comete o crime de tráfico de drogas, que é um crime associado ao mercado, a retorno monetário, e é considerado um crime de maior potencial ofensivo.

Como o crime de tráfico de drogas é o que mais cresce no Brasil, isso causa a superlotação nos presídios. Para isso, os juízes utilizam alguns critérios para julgar se o ato é de consumo ou tráfico de drogas. Alguns desses critérios são os locais da apreensão, antecedentes criminais, circunstâncias sociais e pessoais, entre outros critérios que venha a compor o caso.

Para mais, O STF assegura que o agente de Segurança Pública, mesmo que não obtenha o flagrante ao adentrar o domicílio, mas que por meio de uma razão explícita e plausível ele justifique a violação, não será responsabilizado penalmente. Por outro lado, se o agente violar a residência e não apresentar uma justificativa, mesmo encontrando o flagrante, ele poderá ser penalizado por Abuso de Autoridade, Lei n° 13.869 de 05 de setembro de 2019, art. 22, §1°, incisos I e III, e no § 2°.

Art. 22.  Invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele permanecer nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora das condições estabelecidas em lei:

Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

§ 1º  Incorre na mesma pena, na forma prevista no caput deste artigo, quem:

I - coage alguém, mediante violência ou grave ameaça, a franquear-lhe o acesso a imóvel ou suas dependências;

II - (VETADO);

III - cumpre mandado de busca e apreensão domiciliar após as 21h (vinte e uma horas) ou antes das 5h (cinco horas).

§ 2º  Não haverá crime se o ingresso for para prestar socorro, ou quando houver fundados indícios que indiquem a necessidade do ingresso em razão de situação de flagrante delito ou de desastre.

Vale salientar, que o ingresso de policiais nas residências, diante de informações anônimas ou não, somente é permitida se o agente tiver a certeza do flagrante, caso contrário é considerado um “flagrante imaginário” e também é considerado Abuso de Autoridade.

O Relator, o ministro Edson Fachin concedeu no dia 11 de abril de 2023 um HC 175.038, o qual citou: “conceder a ordem de habeas corpus e declarar ilícita a invasão domiciliar levada a cabo pelos policiais militares, bem como determinar a exclusão deste material probatório obtido ilicitamente e por eles contaminados”.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Os tipos de Inviolabilidade de Domicílio podem ser de duas maneiras, segundo Gilmar Mendes (2016, p.21, apud LIRA, 2020, p.16): A priori, que é antes da medida judicial e a posterirori, que ocorre após a medida judicial. Para ocorrer à violação da residência sem o mandado de busca e apreensão, é necessário que o policial tenha a certeza visual do flagrante. Se não tiver essa certeza, é necessário ter provas e argumentos concretos para a invasão.

A denúncia anônima por si só é considerada nula quanto a provas, portanto, não legitima a violação do domicílio. Porém, se for associada a escutas telefônicas, procedimentos policiais, entre outras provas lícitas, ela se torna uma prova admissível. Logo, os policiais devem ter cautela ao adentrar ou pensar em adentrar um domicílio, podendo ser enquadrado em Abuso de Autoridade por violar o Direito da Dignidade Pessoa Humana de ter a sua privacidade protegida.

  1. TIPOS DE FLAGRANTE DELITO

Couto e Pereira (2021) escreveram um artigo “A Inviolabilidade de Domicílio e os Limites Impostos pela Legislação em Casos de Flagrante Delito”, que tem como objetivo principal mostrar a utilização indevida no flagrante delito por policiais, através de práticas abusivas e ferindo os Direitos elencados na Constituição Federal.

Primeiro precisa-se entender o que é uma prisão em flagrante. Nada mais é do que uma prisão provisória de um indivíduo que é acusado de cometer um crime, o qual visa manter a ordem na sociedade e a preservação de provas. Um fato importante, é que qualquer pessoa, mesmo sem ser policial, pode efetuar a prisão em flagrante, segundo o art. 301 do Código Processual Penal (CPP): “Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”.

Com isso, existem sete tipos de Flagrante Delito, são eles: Flagrante Próprio, Flagrante Impróprio, Flagrante Presumido, Flagrante Preparado ou Provocado, Flagrante Esperado, Flagrante Prorrogado e o Flagrante Forjado.

O Flagrante Próprio é quando o autor do crime é preso no momento em que realiza o ato delituoso, ou quando acaba de cometer o crime. Exemplo, o agente do crime acaba de cometer o crime de Roubo, que é empregado com violência, e foi avistado cometendo o delito por populares, os quais, o seguraram até a chegada da polícia.

O Flagrante Impróprio (Imperfeito) acontece quando o agente é perseguido por alguém (vítima, testemunha, policial), no qual se presume que aquele é o autor do fato. Exemplo, a Central de Atendimento da Polícia recebe uma ligação de que acabou de acontecer um Roubo em determinado lugar, com isso passa as características dos acusados para a Guarnição de Polícia mais próxima, e a mesma começa as diligências para encontrar o acusado. Pouco tempo depois encontra indivíduos com as características semelhantes e os conduz para a delegacia para esclarecimento e averiguação.

O Flagrante Presumido é quando o infrator é surpreendido com os objetos do delito. Nesse caso, um exemplo prático, é quando a polícia fazendo o seu patrulhamento de rotina e observa um indivíduo que possui as características do suspeito de ter praticado um roubo. E ao avistar a Guarnição da Polícia se aproximando, evadiu-se do local. Mesmo assim, a polícia conseguiu chegar ao suspeito, e com ele, encontrou produtos do delito.

O Flagrante Preparado ou Provocado, acontece quando o Agente da Segurança Pública provoca que o autor cometa o crime. Esse tipo de flagrante não é aceito pelo STF segundo a Súmula 145, que diz: “Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”.

O Flagrante Esperado é quando o policial recebe uma informação de que um crime irá acontecer e “espera” que ele aconteça para prender o autor do fato. Exemplo, a investigação da Polícia obtém informações que um crime irá acontecer naquele local, em um determinado horário. Porém, no lugar de agir para que não aconteça, ele deixa acontecer para prender em Flagrante Delito.

O Flagrante Prorrogado é um pouco diferente do Flagrante esperado, ele acontece quando o policial sabe do cometimento do crime, mas retarda a sua ação de prender o acusado para fins de investigação criminal. Exemplo disso é a polícia está em acompanhamento a um veículo que possivelmente está envolvido em um crime. Porém, precisa retardar as suas diligências para que a ação de prender o acusado, não atrapalhe uma linha investigativa que já está sendo desenvolvida.

O Flagrante Forjado acontece quando se é criada provas contra uma pessoa a fim de incrimina-la. Também é considerado um flagrante ilícito, pois a pessoa presa jamais pensou em cometer tal crime. Sendo assim, se não existe a intenção, não existe a ação.

  1. JUSTIFICATIVAS DE VIOLAÇÃO DO DOMICÍLIO

O Art. 302 do Código Processual Penal diz que o Flagrante Delito é:

Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem:

I - está cometendo a infração penal;

II - acaba de cometê-la;

III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;

IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

E o Art. 303 da mesma lei, complementa que o Flagrante Delito existe enquanto não cessar com as diligências: “Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência”.

Dentre essa exposição, tem várias ideias e opiniões de doutrinadores a respeito da violação do domicílio perante o crime de Tráfico de Drogas. Alguns consideram que a violação do domicílio no caso de um indivíduo guardar em sua casa drogas para a venda, configurando o tráfico de drogas, não é necessário o mandado de judicial, tornando a violação do domicílio legal. Já outros, defendem que para ser dado o flagrante, o agente de Segurança Pública necessita ter a certeza absoluta que naquela residência contém drogas em depósito. Por essas e outras razões, é exigido dos policiais, argumentos concretos para a entrada no domicílio do acusado, correndo o risco de responder por crime de Abuso de Autoridade.

O STF possui raciocínios a respeito da Inviolabilidade de Domicílio. Primeiro, afirma que nos casos de flagrante de crime permanente (Tráfico de Drogas), não é necessária a autorização judicial para adentrar a residência. Já por outro lado, reconhece que o ingresso nesses casos devem ser justificados, ainda que o mandado venha posteriormente. Pois, mesmo encontrado o flagrante dentro da residência, sem uma justificativa plausível, não configura prova lícita para o andamento do processo. Como cita o Relator Gilmar Mendes em um Recurso Extraordinário - RE 603.616, o seguinte:

A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do
agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados.

Alguns argumentos muito utilizados por equipes policiais para justificar a entrada no domicílio de um individuo, sem prévia autorização judicial, ou sem autorização do morador, é a fuga do indivíduo ao avistar a guarnição de polícia se aproximando. Não configura justificativa se não existir outros fatos que justifique a violação.

Outro caso são as denúncias anônimas. O STF só considera legítimas se as denúncias anônimas tiverem passado por uma linha de investigação, a qual gerou provas concretas do envolvimento do indivíduo com o crime. Caso contrário, a violação do domicílio é ilegítima.

Também acontecem casos de que o indivíduo após ser flagrado cometendo o crime informa o local de sua residência, com isso os policias adentram o domicílio na expectativa de coletar mais provas do crime. Essa justificativa ela é aceita, desde que os policiais não utilizem de ameaças ou da força para conseguir o aceite do morador, ou seja, a autorização do morador tem que vir de livre e espontânea vontade.

Portanto, observa-se que para se tornar legítima a violação do domicílio, o policial precisa apresentar argumentos plausíveis que justifique a entrada sem mandado judicial na casa dos suspeitos do crime de tráfico de drogas.

De acordo com a Carta Magna de 1988, alguém pode invadir ou adentrar nas residências alheias, independente do consentimento do morador, caso eles possuam a ordem judicial. É de suma importância lembrar que o abuso de poder é empregado fora da lei, é preciso ter razões para adentrar dentro das casas. É notório também lembrar que os agentes são a nossa proteção; e não é justo ele ser apenas o responsabilizado pela inviolabilidade domiciliar, tendo em vista que eles trabalham em coletividade com a lei e assumem o risco dessa profissão.

2.4 MATERIAL E MÉTODO

O presente estudo buscou analisar o Flagrante Delito dos Crimes de Tráfico de Drogas, ocorridos na cidade de Caicó, no estado do Rio Grande do Norte. Foram coletados dados junto ao 6° Batalhão de Polícia Militar do Estado do Rio Grande do Norte – 6° BPM-RN e com a 3° Delegacia Regional de Polícia do Estado do Rio Grande do Norte – 3° DRP-RN, ambos localizados na cidade de Caicó – RN.

Sendo assim, para atingir o objetivo deste trabalho foram realizadas pesquisas literárias, as quais possuem uma natureza aplicada, tendo uma abordagem quantitativa de quantas ocorrências foram atendidas pela Polícia Militar e, por sua vez, quantas dessas ocorrências geraram Inquérito Policial que culminaram em uma violação do domicílio de um indivíduo. Com isso, foi realizado um estudo de caso na cidade de Caicó-RN, com os dados fornecidos pelas duas entidades procuradas. Além disso, foi utilizado o método dedutivo, o qual busca analisar quais das ocorrências de Tráfico de Drogas precisou adentrar o domicílio de um indivíduo.

Os dados coletados foram dos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2022. Com o 6° BPM-RN foram à quantidade de ocorrências relacionadas ao Crime de Tráfico de Drogas; e, junto a 3° DRP-RN foram analisadas quantas dessas ocorrências foi gerado Inquérito Policial que gerou um Mandado de Busca e Apreensão, ou uma Operação, no qual foi necessária a violação do domicílio do indivíduo.

Esses dados foram organizados em Gráficos e Tabelas. Nessa organização foi analisado o número de ocorrências registrado pela Polícia Militar, o número de indivíduos conduzidos para a Delegacia de Polícia Civil, os meses que mais teve ocorrências na cidade, deste crime; e quantas dessas ocorrências geraram Inquéritos Policiais e consequentemente uma Violação do Domicílio do Indivíduo.

3 ANÁLISE DE DADOS

Levando em consideração os princípios e as causas de Inviolabilidade de Domicílio perante o crime de Tráfico de Drogas, foi realizada uma pesquisa no âmbito da cidade de Caicó, no estado do Rio Grande do Norte. Os dados foram coletados junto ao 6° Batalhão de Polícia Militar do Estado do Rio Grande do Norte – 6° BPM- RN e com a 3° Delegacia de Regional de Polícia do estado do Rio Grande do Norte – 3° DRP- RN localizadas na cidade de Caicó- RN.

Os dados da coleta foi uma amostra dos meses de Janeiro a Dezembro do ano de 2022. Foram observados 15 Ocorrências de Tráfico de Drogas. Conforme demonstra o Gráfico 01, as ocorrências foram divididas por Zonas, as quais são cinco, sendo elas: Zona Norte, Oeste, Leste, Central e Rural.

Essas Zonas se subdividem em bairros. A Zona Oeste é composta pelos seguintes Bairros: Adjunto Dias, Barra Nova, Distrito Industrial, João Paulo II, João XXIII, Paulo VI, Soledade, Walfredo Gurgel. A Zona Norte são os Bairros: Alto da Boa Vista, Boa Passagem, Darcy Fonseca, Nova Caicó, Recreio, Salviano Santos, Samanaú, Serrote Branco e Vila do Príncipe. Zona Leste: Canutos e Filhos, Castelo Branco, IPE, Itans, Maynard, Nova Descoberta, Penedo, Santa Clara, Santa Costa, Jardim de Alah, Bento VI, Vila Altiva.

GRAFICO 01- OCORRÊNCIAS DE TRÁFICO DE DROGAS POR ZONA

[Gráfico 01]

FONTE: NAE/COPOM – 6° BPM - RN

Pode-se observar no Gráfico 01, que a Zona que possui a maior incidência do Crime de Tráfico de Drogas é a Zona Oeste, liderando com oito casos. Seguida da Zona Norte, com quatro casos; Zona Central, dois casos; e, Zona Rural, com um caso. Observa-se que no ano de 2022 a Zona Leste da cidade não apresentou casos relacionados ao crime de Tráfico de Drogas.

Dessa forma, também foram coletados os dados do Crime de Tráfico de drogas em cada Bairro. Conforme o Gráfico 02.

GRÁFICO 02- OCORRÊNCIA DE TRÁFICO POR BAIRROS

[Gráfico 02]

FONTE: NAE/COPOM – 6° BPM - RN

No Gráfico 02, observa-se que os Bairros com maior incidência do crime são os Bairros do João XXIII e Boa Passagem, localizados na Zona Oeste e Norte, respectivamente, da cidade Caicó-RN, seguidos do Bairro Centro e Paulo VI, localizados respectivamente na Zona Central e Zona Oeste da Cidade.

Vale salientar, que o Bairro João XXIII e Paulo VI estão localizados na Zona Oeste, que foi a zona que mais liderou as ocorrências com esse crime. E o Bairro Boa Passagem, esta localizado na Zona Norte que foi a segunda Zona com mais incidência, seguida do Centro, que está na área Central, que foi a terceira colocada na incidência deste crime.

Após essa análise, foi feita um gráfico com a faixa etária dos indivíduos que cometeram esse crime. Conforme o Gráfico 03. Foram analisados que das 15 ocorrências do Crime de Tráfico de Drogas, foram conduzidos à delegacia 24 indivíduos, de diferentes faixas etárias.

GRÁFICO 03- FAIXA ETÁRIA DOS ACUSADOS POR TRÁFICOS DE DROGAS

[Gráfico 03]

FONTE: NAE/COPOM – 6° BPM - RN

Neste Gráfico é possível observar que a faixa etária dos indivíduos que cometem esse crime ainda é muito presente entre adultos dos 18 a 25 anos de idade, sendo 13 indivíduos conduzidos à delegacia. Mas, pode-se observar que a faixa etária de 0 a 17 anos só cresce. No ano de 2022, foram 05 adolescentes conduzidos à delegacia por serem suspeitos do crime de Tráfico de Drogas. Apenas um indivíduo a menos que a faixa etária de 26 a 40 anos, que foram 06 conduzidos.

Também foi analisada a incidência do crime durante os meses do ano de 2022, como mostrado no Gráfico 04, das ocorrências por meses.

GRÁFICO 04- OCORRÊNCIA POR MESES

[Gráfico 04]

FONTE: NAE/COPOM – 6° BPM- RN

Neste Gráfico 04, pode-se observar que o mês de maior incidência é o mês de Julho. Feito a analise, foi visto que nesse mês acontece na cidade de Caicó- RN, uma festa muito popular e conhecida da Região e no Estado, a Festa de Sant’Ana.

Nessa festa é comemorada a Padroeira da cidade, e reuni diversos turistas durante o mês de Julho. No mês de Julho, além da parte religiosa, acontecem também festas privadas e públicas (vias públicas), atraindo um grande público heterogêneo de diversas idades e classes sociais. Logo, a cidade dobra com o número de pessoas, o que facilita o comércio das Drogas.

Sendo assim, a Tabela 01 mostra o número de ocorrências, comparada ao número de conduzidos, por mês.

TABELA 01: OCORRÊNCIAS X N° DE CONDUZIDOS

MESES

N° DE CONDUZIDOS

OCORRÊNCIAS

PORCENTAGENS (%)

Janeiro

01

01

6,6

Fevereiro

00

00

0,0

Março

00

00

0,0

Abril

00

00

0,0

Maio

00

00

0,0

Junho

01

01

6,6

Julho

11

07

47,0

Agosto

05

03

20,0

Setembro

02

01

6,6

Outubro

02

01

6,6

Novembro

00

00

0,0

Dezembro

02

01

6,6

FONTE: NAE/COPOM – 6° BPM – RN

É nítido na Tabela e só confirma que 47% das ocorrências no ano de 2022, foi no mês de julho, totalizando a condução de 11 indivíduos a Delegacia de Polícia; seguidos do mês de Agosto com 20% do número de ocorrência, sendo 05 indivíduos conduzidos a Delegacia pelo crime de Tráfico de Drogas.

Após essa análise realizada das ocorrências feita pela Polícia Militar do 6° BPM-RN, foram coletados os dados de quantas dessas ocorrências foi aberto um Inquérito Policial para possíveis Operações ou cumprimento de Mandando de Busca e Apreensão, que precisou adentrar o imóvel de um indivíduo. Assim como mostra a Tabela 02.

TABELA 02- OCORRÊNCIAS QUE LEVARAM A VIOLAÇÃO DO DOMICÍLIO

N° DE OCORRÊNCIAS

Inquérito Policial

04

Operação Policial

01

Mandado de Busca e Apreensão

08

Consumo de Drogas

02

FONTE: 3° DRP-RN

Como apresenta a Tabela 02, após serem analisadas as 15 ocorrências levadas pela Polícia Militar do 6° BPM-RN, duas delas foram consideradas como Consumo de Drogas, e não Tráfico de Drogas. Portanto, foram abertos 13 Inquéritos Policiais, sendo assim distribuídos: quatro desses Inquéritos, até a coleta dos dados, ainda não haviam gerado nenhum Mandado de Busca e Apreensão para os Indivíduos relacionados com a ocorrência; oito desses Inquéritos geraram Mandado de Busca e Apreensão, no qual foi necessário adentrar a residência do indivíduo; e, apenas um Inquérito, gerou uma Operação Policial, realizada pela Polícia Civil da Cidade de Caicó-RN, em conjunto com a Polícia Militar, da mesma cidade.

3.1 DISCURSÃO DOS RESULTADOS

A partir dos dados coletados observou-se que o número de incidência do Crime de Tráfico de Drogas é no mês de Julho, período esse que possui um grande evento na cidade.

Na cidade de Caicó-RN também acontece um outro grande evento, que é o Carnaval, realizado no mês de Fevereiro. Porém, no ano de 2022, devido ao quadro de Pandemia, não foi realizado o Carnaval na cidade. Portanto, ficando essa análise de comparação para outro possível trabalho.

Observou-se também que o número de adolescentes menores de 18 anos cresce a cada dia, chegando quase a igualar com a faixa etária de adultos maiores de 25 anos. E confirma-se que a faixa etária que possui maior índice de incidência continua sendo os indivíduos entre 18 e 25 anos de idade.

Também pode observar que a Zona Oeste e a Zona Norte da cidade de Caicó-RN, são as zonas que mais tem incidência desse crime. Podendo ser confirmada com o Gráfico 02, que mostra as Ocorrências por bairro.

E por fim, observou-se que das 15 ocorrências, que teve como condução para a delegacia o número de 24 indivíduos, sendo 23 homens e 01 mulher; duas dessas quinze ocorrências foram consideradas, pela Polícia Civil, apenas Consumo de Drogas, consequentemente não gerando um Inquérito Policial.

Das 13 Ocorrências que restaram, foram gerados Inquéritos Policiais. Deles, 08 foram cumprido Mandado de Busca e Apreensão e 01 foi realizado uma Operação da Polícia Civil em conjunto com a Polícia Militar da cidade de Caicó-RN, os quais foram necessária a violação da residência dos indivíduos investigados. Os outros 04 Inquéritos, até o momento da coleta, ainda não haviam sido gerados Mandados de Busca e Apreensão, nem outro meio que fosse necessário à violação do indivíduo.

  1. CONCLUSÃO

Diante do exposto, em suma sobre o direito a Inviolabilidade do Domicílio, pode-se concluir que é um direito inerente ao ser humano, pois, busca assegurar a intimidade e a privacidade. Apesar disto, como já mencionado, não é um direito absoluto, podendo ser violado em algumas hipóteses previstas em lei, de forma que essas hipóteses não sejam utilizadas, sob pretensão, de má fé.

Dessa forma, podemos dizer que apesar de alguns direitos serem fundamentais, esses podem ser violados, desde que seja em prol do bem comum ou de interesse justificável.

Neste contexto, é necessário que o agente policial deva agir com cautela nas situações que precisará violar esse direito. Estar ciente sobre o que pode e o que não pode, ajudará o agente a não cometer deslizes, o que faz muitas vezes com que o processo se perca a partir da Teoria do Fruto da Árvore Envenenada.

Logo, esse trabalho teve como foco principal analisar as ocorrências do crime de Tráfico de Drogas na cidade de Caicó-RN. Após isso, analisar quais dessas ocorrências levaram a geração de um Inquérito Policial e quais desses Inquéritos geraram um Mandado Judicial ou uma Operação Policial, que foi necessário à violação da residência de um indivíduo.

A partir dos dados apresentados nesse trabalho, pode-se observar que se a violação deste direito fundamental for feito da forma correta com fundamentos, poderá ajudar a combater o crime organizado, contribuindo assim para o bem comum da população.

  1. REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Ed. administrativa. Brasília: Senado Federal, 2022.

BRASIL. Lei n° 13.869 de 05 de setembro de 2019. Dispõe sobre os Crimes de Abuso de Autoridade. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13869.htm> Acesso em: 22 abr. 2023.

BRASIL. Decreto-Lei n° 3.689 de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm> Acesso em: 22 abr. 2023.

BRASIL. Decreto-Lei n° 2.848 de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm> Acesso em: 23 abr. 2023.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Súmula 145. Disponível em: <
https://portal.stf.jus.br/jurisprudencia/sumariosumulas.asp?base=30&sumula=2119#:~:text=Não%20há%20crime%2C%20quando%20a,torna%20impossível%20a%20sua%20consumação.> Acesso em: 23 abr. 2023.

COUTO, F.R; PEREIRA, R.R; A Inviolabilidade do Domicílio e os Limites Impostos pela Legislação em Casos de Flagrante Delito. In: Revista Anima Educação: 2021. Anais Eletrônicos... Disponível em: < https://repositorio.animaeducacao.com.br/handle/ANIMA/18744> Acesso em: 01 mai. 2023.

LIRA, M. T. D; A inviolabilidade do domicílio perante o flagrante delito nos
crimes relacionados à prática do tráfico ilícito de drogas.
Orientador: Prof. Esp. Bruce Flávio de Jesus Gomes. 2020. 27 f. TCC (Graduação) – Curso de Direito, Centro Universitário do Planalto Central Apparecido dos Santos, Gama, 2020. Disponível em: <https://dspace.uniceplac.edu.br/bitstream/123456789/445/1/Maria%20Teresa%20Dias%20Lira_0004518.pdf> Acesso em: 01 mai. 2023.

RELATOR MINISTRO EDSON FACHIN. Superior Tribunal de Justiça. HC 175.038.

RELATOR MINISTRO GILMAR MENDES. Supremo Tribunal Federal. RE 603.616.

Sobre o autor
Rilawilson José de Azevedo

Dr. Honoris Causa em Ciências Jurídicas pela Federação Brasileira de Ciências e Artes. Mestrando em Direito Público pela UNEATLANTICO. Licenciado e Bacharel em História pela UFRN e Bacharel em Direito pela UFRN. Pós graduando em Direito Administrativo. Policial Militar do Rio Grande do Norte e detentor de 19 curso de aperfeiçoamento em Segurança Pública oferecido pela Secretaria Nacional de Segurança Pública.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos