"Só é dono quem registra" mas eu moro aqui há 15 anos sem Escritura e sem Registro. E agora? Qual meu direito?

31/05/2023 às 11:43
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Uma verdade perene que não pode ser ignorada no DIREITO IMOBILIÁRIO está contida no ditado que revelando muito sobre o DIREITO REGISTRAL assim decreta: "SÓ É DONO QUEM REGISTRA". Tal ditado por certo embasa o preceito que está contido hoje no par.1º do artigo 1.245 do Código Civil de 2002 mas que também já estava no Código Civil de 1916 (par. único do art. 860) - todavia, não se desconhece que em situações como na USUCAPIÃO a propriedade imobiliária poderá ser adquirida sem mesmo constar qualquer registro em nome do USUCAPIENTE no Cartório do Registro de Imóveis.

Rezam o artigo 1.245 e seu parágrafo primeiro do atual Código Civil:

Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1º. Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel".

A bem da verdade, muito comum nessas situações será o imóvel no Cartório constar em nome de alguma pessoa física (muita vezes já falecida inclusive) ou mesmo de uma Pessoa Jurídica. Fato é, como já falamos diversas vezes aqui, que a Usucapião pode ocorrer sem mesmo que o interessado tenha qualquer documento de" aquisição "do imóvel, e também sem qualquer documento registrado. Bastarão estar presentes e devidamente comprovados os requisitos que a Lei exige para a concretização da prescrição aquisitiva ("Usucapião"). Uma vez preenchidos os requisitos exigidos pela Lei, consolidar-se-á em favor do adquirente (interessado na Usucapião) a aquisição da propriedade o a realização do procedimento - seja ele pela via JUDICIAL ou pela via EXTRAJUDICIAL - se mostra necessário para que o mesmo possa regularizar junto ao Cartório de Imóveis sua aquisição/propriedade, ostentando com isso legítima e legalmente PUBLICIDADE, DISPONIBILIDADE e OPONIBILIDADE - atributos que só o Registro em Cartório pode conferir.

A modalidade de Usucapião que dispensa TÍTULO e BOA-FÉ é aquela do art. 1.238 do Código Civil, também conhecida como USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA:

"Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, INDEPENDENTEMENTE DE TÍTULO E BOA-FÉ; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis".

A redação do art. 1.238 do Código Civil de 2002 por certo falou apenas em"podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença"haja vista que naquela altura ainda não tínhamos a USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL - possibilidade que surgiu apenas em 2015 com o Novo Código de Processo Civil que introduziu o art. 216-A na Lei de Registros Publicos permitindo a regularização da aquisição por USUCAPIÃO direto em Cartório, com assistência obrigatória de Advogado mas sem a necessidade de Processo Judicial.

Tal procedimento tem regulamentação local conforme o Estado onde se pretenda o procedimento e conta também com uma regulamentação de nível nacional através do PROVIMENTO 65/2017 editado pelo CONSELHO NACIONAL DA JUSTIÇA.

É importante ressaltar que o requisito do PRAZO na Usucapião Extraordinária pode ser reduzido para DEZ ANOS caso o interessado nele estabelecido sua MORADIA HABITUAL ou realizado obras ou serviços de caráter produtivo. Outras modalidades estão contempladas pela Constituição Federal, pelo Código Civil e outras Leis Ordinárias, sendo certo que a análise pelo Advogado Especialista é o primeiro passo para um procedimento de regularização com maiores chances de êxito já que - como em qualquer outro procedimento/processo judicial ou extrajudicial - não é possível ao Advogado garantir resultado, porém a análise inicial pode corrigir deficiências como por exemplo no que diz respeito à PRODUÇÃO DE PROVAS nesse tipo de demanda onde as provas são essenciais.

POR FIM, o costumeiro acerto da decisão do TJMG que reformando a decisão do Juízo da primeira instância reconheceu a propriedade em favor do ocupante através da Usucapião Extraordinária que justamente dispensa a exigência de qualquer TÍTULO e BOA-FÉ - deixando clara a lição de que, em se tratando de USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA a questão deve ser apreciada considerando os seguintes requisitos: tempo; posse mansa, pacífica e continua; e animus domini:

"TJMG. 10000220112106001. J. em: 24/08/2022. APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA - TEMPO; POSSE MANSA, PACÍFICA E ININTERRUPTA; E ANIMUS DOMINI - REQUISITOS COMPROVADOS - JUSTO TÍTULO E BOA-FÉ - DISPENSADOS - PRESCRIÇÃO AQUISITIVA - RECONHECIMENTO. - Três requisitos são essenciais a qualquer modalidade de usucapião em nosso ordenamento jurídico: o tempo, a posse mansa e pacífica e o "animus domini". E, tratando-se de usucapião extraordinária, dispensa-se o justo título e a boa-fé".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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