A teratológica redação do art. 35 da Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991

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Direto:

LEI N° 8.245, DE 18 DE OUTUBRO DE 1991

Art. 35. Salvo expressa disposição contratual em contrário, as benfeitorias necessárias introduzidas pelo locatário, ainda que não autorizadas pelo locador, bem como as úteis, desde que autorizadas, serão indenizáveis e permitem o exercício do direito de retenção.

Existiam calorosas discussões sobre o direito de indenização para o locatário quando este fazia benfeitoria necessária no imóvel do locador. Sem a indenização do locador ao locatário, o enriquecimento ilícito daquele.

Por expressão menção da norma do Art. 35, a indenização ao locatário não se realizará quando houve cláusula contratual isentando o locador: Salvo expressa disposição contratual em contrário. Deflui dessa ideia, de não indenização ao locatário, de que o mesmo irá se beneficiar da benfeitoria.

Não tem choro, o Supremo Tribunal Federal bateu o martelo (1):

SÚMULA N°. 335

Nos contratos de locação, é válida a cláusula de renúncia à indenização das benfeitorias e ao direito de retenção.

Referência:

Lei n. 8.245/1991, art. 35

DA REALIDADE

Bolsa Família, ou quaisquer outros nomes sobre a miserabilidade da dignidade de milhões de brasileiros, não condiz com a essência da norma do Art. 3°, da CRFB de 1988. Historicamente, no Brasil, a propriedade é exclusiva para pouquíssimos brasileiros sejam por motivos de presentes da coroa portuguesa, das terras conquistadas dos povos indígenas, pelas bênçãos de Deus (europeu), já que os deuses dos povos indígenas não tiveram tanta força para impedirem que as terras dos povos indígenas fosses usurpadas pelos civilizados.

E os ex-escravos? Abolição da escravatura, pela Lei Áurea. A liberdade somente se deu pelas retiradas das correntes, de seus pés, de seus braços e de seus pescoços, no entanto, a liberdade era um ideal, no mundo das ideias. Os ex-escravos viviam na Cidade dos Homens, enquanto os não ex-escravos vivia na Cidade de Deus. Talvez Santo Agostinho pensasse assim sobre as condições das realidades entre brancos e negros, ex-escravocratas e ex-escravos. Da condição de chicotada no lombo ou trabalho para liberdade no limite de nosso entendimento — entendimento dos brasileiros com pensamentos ainda de racismo estrutural aos negros —, os vagabundos eram problemáticos.

A História do Brasil de Amor:

LEI DE 16 DE DEZEMBRO DE 1830 (Código Criminal)

Art. 295. Não tomar qualquer pessoa uma ocupação honesta, e util, de que passa subsistir, depois de advertido pelo Juiz de Paz, não tendo renda suficiente.

Pena - de prisão com trabalho por oito a vinte e quatro dias.

Art. 296. Andar mendigando:

1º Nos lugares, em que existem estabelecimentos publicos para os mendigos, ou havendo pessoa, que se offereça a sustental-os.

2º Quando os que mendigarem estiverem em termos de trabalhar, ainda que nos lugares não hajam os ditos estabelecimentos.

3º Quando fingirem chagas, ou outras enfermidades.

4º Quando mesmo invalidos mendigarem em reunião de quatro, ou mais, não sendo pai, e filhos, e não se incluindo tambem no numero dos quatro as mulheres, que acompanharem seus maridos, e os moços, que guiarem os cégos.

Penas - de prisão simples, ou com trabalho, segundo o estado das forças do mendigo, por oito dias a um mês.

DECRETO-LEI Nº 3.688, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941

Art. 59. Entregar-se alguém habitualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios bastantes de subsistência, ou prover à própria subsistência mediante ocupação ilícita:

Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses.

Parágrafo único. A aquisição superveniente de renda, que assegure ao condenado meios bastantes de subsistência, extingue a pena.

Art. 60. Mendigar, por ociosidade ou cupidez: (Revogado pela Lei nº 11.983, de 2009)

Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses. (Revogado pela Lei nº 11.983, de 2009)

Parágrafo único. Aumenta-se a pena de um sexto a um terço, se a contravenção é praticada: (Revogado pela Lei nº 11.983, de 2009)

a) de modo vexatório, ameaçador ou fraudulento. (Revogado pela Lei nº 11.983, de 2009)

b) mediante simulação de moléstia ou deformidade; (Revogado pela Lei nº 11.983, de 2009)

c) em companhia de alienado ou de menor de dezoito anos. (Revogado pela Lei nº 11.983, de 2009)

Art. 61. Importunar alguém, em lugar público ou acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor: (Revogado pela Lei nº 13.718, de 2018)

Pena – multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis. (Revogado pela Lei nº 13.718, de 2018)

Bons tempos, diria a Velha Rundle:

"Longa conversa com a velha Rundle (née Maxwell) sobre o Brasil do meado do século XI. A velhinha deve ter nascido por volta de 1840. Terá agora seus oitenta e tal anos. Está lúcida. É um encanto de velhinha. Inteligente e fidalga.

Mostra-me fotografia antiga do palacete dos Maxwell no Rio: vasto palacete. Belo arvoredo. Aspecto de grandeza. Fala-me com saudade do Rio do tempo de Pedro II ainda moço. Ela frequentava os melhores salões da corte brasileira, filha que era de Maxwell, o então rei do café. Quem lê os livros e jornais da época encontra referências numerosas ao nome desse famoso escocês abrasileirado. Era na verdade um nababo: imensamente rico. Escocês encantado pela natureza do Brasil e pelas maneiras, pelos costumes e me diz a velha Rundle que muito particularmente pelos doces e bolos brasileiros. E ao contrário dos escoceses típicos, um perdulário. Sua era uma das melhores carruagens do Rio no meado do século XIX. Seus pajens e escravos primavam pelos belos trajos. Suas mucamas, também. A velha Rundle cresceu como uma autêntica sinhazinha: ninada, mimada, servida por mucamas, negrinhas, negras velhas que lhe faziam todas as vontades. “Como não ter saudades de um Brasil onde fui tão feliz?”, pergunta-me ela servindo-me vinho do Porto. “E por que não voltou ao Brasil?”, pergunto-lhe eu. Mas não insisti na pergunta: a velhinha chorava. Chorava seu Paraíso Perdido, e esse Paraíso Perdido foi o Rio de 1850 – com todos os seus horrores; mas a que entretanto não faltavam grandes encantos. São assim as épocas: todas têm seus encantos e não apenas horrores de epidemias, imundície, crueldade". (FREYRE, Gilberto. Tempo morto e outros tempos. Trechos de um diário de adolescência e primeira mocidade 1915-1930. Apresentação de Maria Lúcia Garcia Pallares-Burke Biobibliografia de Edson Nery da Fonseca. 1ª edição digital. São Paulo. 2012, p. 129)

O Brasil é: a Máquina Antropofágica. É moer de pessoas que não estão na condição de defenderem suas dignidades pelos sistemas legais (positivismo; legalidade). E é perceptível nas normas acima.

Somente em 2014 o Brasil saiu do Mapa Mundial da Fome (2 ). Tudo bem, o relatório é de políticas internacionais em direitos humanos, algo novo, na humanidade. Assim dirão alguns leitores. Libertos, os ex-escravos foram deixados A Deus dará. Como não era, em tese, tirar outra vida humana, seja pelo direito natural e pela lei natural, dos libertários clássico, ou pela crença religiosa, de que só Deus pode tirar uma vida humana, apesar das contradições no período escravocrata, os livres tiveram que sobreviver , como podiam. Não se tratava de punição aos moldes do Império Romano. Nesse, o condenado era poupado em sua vida física, mas teria que sair do Império, sem ajuda nenhuma, enquanto estivesse dentro dos territórios de Roma. E eram muitíssimos extensos. Era morrer de fome e de sede. Felizmente, os negros não tiveram tamanha crueldade romana. Ironia, claro.

O problema de terra é de séculos no Brasil. Latifundiários enriqueciam, enquanto os servos trabalhavam em suas terras. Sim, um sistema feudal Made in Brazil. Trabalhou, comeu, tem alojamento. Poderia até sair com algumas posses, bem modestas; outras situações, nada de mala e cuia. E os nordestinos? Alguns com mala e cuia quando iam para a Terra Prometida: a Região Sudeste. Para ser exato, o estado de São Paulo, pelas oportunidades de melhorias de vida. Só não avisaram aos nordestinos do racismo estrutural aos próprios nordestinos.

Percebe-se, sem muito esforço, o quanto é teratológica a redação do art. 35 da Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991. Quando se pensa em liberdade, deve se pensar além das aparências externas. O simples ato de deambular pelas vias públicas pode parecer liberdade. Há as regras de trânsito terrestre, logo, a liberdade não é o hedonismo pessoal. Continuo na questão da legislação de trânsito terrestre. Se o proprietário do automóvel entregar o automotor ao funcionário, sem o sistema de freio funcionando corretamente, e o funcionário cometer acidente de trânsito, sem que esteja em velocidade acima da permitida pela sinalização de trânsito, sem dirigir sem a devida atenção (Art. 169, do CTB), enfim, dirige obediente à legislação de trânsito terrestre, a culpa pelo acidente será exclusivamente do proprietário do automotor:

LEI Nº 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

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Depreende-se, é o proprietário do automotor, e não o condutor funcionário, responsável pelas condições de segurança do automotor. Teratológico pensar que o funcionário tenha a responsabilidade de providenciar manutenção e conserto do sistema de freio, pois a vida do funcionário depende das condições do sistema de freio. Ou seja, o funcionário trabalha na empresa pela sua livre autonomia privada. Se o automotor tem o sistema de freio inoperante ou ineficiente, e o empregador comunicou, previamente, o interessado para a função de transportador, o risco assumido é exclusivamente de quem aceitou o emprego.

Podemos pensar também na questão da função social da propriedade. Em tempos de Aedes aegypti , o proprietário é obrigado, por interesse público, ainda que não queira, cuidar (prevenção) de sua propriedade quanto ao mosquito transmissor da Aedes aegypti . Do contrário, isto é, deixar acúmulo de água parada, em vasos, em pneus etc., o ato ilícito (Art. 186, do CC). Comparando com a redação da norma do Art. 35, da Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991. Os outros condôminos que limpem suas residências, pois eles mesmos beneficiar-se-ão.

Não há enriquecimento ilícito para o empregador quando deixa para o empregado se responsabilizar pela manutenção, ou conserto, do sistema de freio, já que o próprio empregado tem interesse de continuar dirigindo para ter o seu sustento pessoal e familiar.

Retorno para a questão da cláusula expressa de isenção de indenização por benfeitoria, necessária, feita pelo inquilino. Como demostrado, o problema de habitação no Brasil tem origem no Deus dará para os ex-escravos e seus descendentes. Somam-se, ainda, os conceitos das pseudociências, do darwinismo social e da eugenia. Independentemente se branco, pardo ou preto, segundo classificação atual do IBGE, se não é superior, em si, a tal da meritocracia, a desgraça da vida terrena. Isso decorre da construção romana, muito presente no século XXI, da meritocracia, pessoal, pela frase Veni, vidi, vici ("Vim, vi e venci"). Ou seja, se a pessoa não conseguiu ter propriedade — ser proprietário — para morar, não teve garra, determinação, coragem, ousadia.

Pensemos em 2020, no auge da pandemia pelo vírus da Covid-19. A classe média, a antiga classe, atualmente existe a Nova Classe Média, mostrou sua realidade, já que a maioria não tem propriedade, mas a posse, temporária, como inquilino, da propriedade. Logo, Vim e não venci!

Podemos pensar também nos proprietários. IPTU caríssimo, pela especulação imobiliária, por questões ideológicas de nós e o povão (3). Ter ou não ter propriedade, rural ou urbana, é questão de divisões entre brasileiros: uns com mais dignidade do que outros; ou poucos com dignidade, quanto muito sem nenhuma dignidade. Podemos ver essa premissa de nós e o povão no documentário Documento Especial: Os pobres voltam à praia - Band, 12/01/1998 - YouTube.

Os guetos se formam — Guetos no Brasil são das classes média e alta —, para se diferenciarem quanto à dignidade — Os pobres voltam à praia — e sua mensuração. Não há um fim em si mesmo, como idealizou Immanuel Kant.

Inquilino não tem propriedade, mas busca algum teto sobre sua cabeça, e de sua família, para proteção contra intempéries, assaltos, ratos etc. O poder econômico determinará o local da residência. Poder econômico não somente de ter economia, mas o poder econômico de ter que mudar de região pela necessidade da empresa, e não pela liberdade de querer ou não do funcionário. O funcionário, por determinação da empresa, deve mudar de local de residência (ART. 469, § 3°, da CLT). Há benefício para o funcionário, o adicional de transferência. A despesas para o funcionário serão de responsabilidade do empregador (Art. 470, da CLT). Pensemos. A troca de localidade, por necessidade da empresa, poderá melhorar às condições da localidade. Uma região com poucos habitantes, mas de grande interesse para a empresa. As residências são antigas, muitas necessitam de reparos estruturais. O empregado da empresa em questão, por necessidade, faz benfeitorias necessárias. Isso parece ter justificativa pela literalidade da norma do Art. 35, da Lei do Inquilinato. O inquilino paga pelas benfeitorias e se beneficia delas. O proprietário se beneficia por ter sua edificação melhorada. Como se trata de região de poucas economias pessoais, o ressarcimento do proprietário ao inquilino, pelas benfeitorias feitas por este, poderá sair mais caro do que o montante dos aluguéis pagos pelo inquilino.

Quero dizer, a redação expressa pela norma do Art. 35, da Lei do Inquilinato, deve ser analisada caso a caso, e não de forma genérica.

NOTAS:

(1) — BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF).Lei do Inquilinato - Súmula nº 335. Disponível em: https://www.stj.jus.br/docs_internet/revista/eletronica/stj-revista-sumulas-2012_28_capSumula335.pdf

(2) — _____. Casa Civil. Relatório indica que Brasil saiu do Mapa Mundial da Fome em 2014 — Casa Civil (www.gov.br)

(3) — Folha de S.Paulo - Cinema: Guetos no Brasil são das classes média e alta, diz sociólogo francês - 22/04/2001 (uol.com.br)

Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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