É possível Usucapião de Imóvel residencial com apenas cinco anos de tempo de posse, sem processo judicial?

09/06/2023 às 16:05
Leia nesta página:

A modalidade USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA é uma das mais importantes espécies de Usucapião disponíveis no ordenamento jurídico brasileiro e podemos destacá-la não só como uma das que possuem MENOR PRAZO necessário como também por sua exemplar finalidade social. À toda evidência carrega em si a chamada "função social" sempre tratada nas questões relativas à moradia e Usucapião, prestigiando o disposto na Constituição Federal (inc. XXIII do art. 5º) e nela também possui sua base legal, sem prejuízo da previsão assentada também no Código Civil (art. 1.240). Segundo a Carta de 1988,

"Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural".

É importante destacar que essa espécie exige PRAZO DE CINCO ANOS de posse e a inexistência de outros imóveis - rurais ou urbanos - em nome do interessado. Além disso o imóvel urbando pretendido não pode ter área maior que 250 metros quadrados e deve ser utilizado para sua moradia ou de sua família. Sobre essa modalidade acrescentam os ilustres professores FARIAS e ROSENVALD (Curso de Direito Civil. 2023):

"A usucapião especial é uma das mais claras demonstrações do princípio da FUNÇÃO SOCIAL da posse na Constituição de 1988, pois homenageia aqueles que, com animus domini, residem e/ou trabalham no imóvel em regime familiar, reduzindo os períodos aquisitivos de usucapião para CINCO ANOS. Tanto a usucapião urbana como a rural seriam espécies de MINIUSUCAPIÕES EXTRAORDINÁRIAS, já que ambas dispensam os requisitos do justo título e boa-fé, contentando-se com a posse com animus domini, mansa e pacífica".

Como apontam os ilustres doutrinadores aqui também não se exige nem JUSTO TÍTULO nem BOA-FÉ, a exemplo do que ocorre com a matriz da Usucapião Extraordinária (art. 1.238 do CCB). Os referidos mestres alertam ainda que nessa modalidade - também conhecida como USUCAPIÃO PRO MORADIA - esse será também seu traço marcante, sendo certo que a habitação efetiva no mesmo é necessária para sua caracterização, não valendo a utilização/ocupação eventual (para esses casos outra modalidade poderá atender, conforme o caso). Da mesma forma, por ser necessária a moradia também se trata de uma modalidade que não antederá às pretensões destinadas à aquisição de terreno, desprovido de qualquer construção. A posse aqui também - ensinam os referidos mestres - deve ser PESSOAL, ou seja, não pode ter sido recebida de outrem (por exemplo, através de uma Cessão de Posse - "acessio possessionis"), sendo todavia aceita caso o pretendente seja por exemplo um dos herdeiros que coabitava com quem já tinha ou estava a completar o tempo necessário e agora faleceu (sucessio possessionis)- porém desde que complete o tempo exigido, como se viu.

A jurisprudência do TJSP chancela a melhor doutrina admitindo nessa espécie, para fins de contagem do prazo, a transmissão pela via sucessória do tempo da posse (sucessio possessionis) a despeito de - pelo menos nela - não se admitir a transmissão de posse entre vivos (acessio possessionis) para essa finalidade:

"TJSP. 0014553-41.2011.8.26.0269. J. em: 24/10/2013. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA. Requisitos do art. 183 da Constituição Federal, reproduzidos no art. 1.240 do Código Civil, foram devidamente preenchidos pelos autores. Posse mansa, pacífica e contínua sobre o bem há mais de cinco anos, para fins de moradia, sendo o imóvel o único do demandante. Prova dos autos a indicar que se num primeiro momento o imóvel foi ocupado pela AVÓ DO AUTOR a título de comodato, posteriormente houve INTERVESIO POSSESSIONIS. Um dos próprios requeridos admitiu em depoimento pessoal que o bem foi possuído pela avó do apelante como sendo de sua propriedade, além do que o imóvel sequer foi arrolado no inventário dos seus falecidos genitores. SUCESSIO POSSESSIONIS admitida na usucapião constitucional, fazendo com que a posse da falecida se transmita a seus herdeiros com as mesmas características. Ação corretamente julgada procedente. Recurso não provido".

Necessário por fim pontuar que a posse, sem prejuizo da saisine que determina se transmita esta a todos os herdeiros (art. 1.784), não será "qualquer dos herdeiros que continuará a posse do falecido, mas apenas os sucessores que compunham o NÚCLEO FAMILIAR que efetivamente possuía o imóvel ao tempo do óbito" como alerta a acolhida e citada doutrina. Daí se verifica desde já quem estará legitimado a ingressar com o pedido na modalidade ora analisada. Ademais, essa é apenas uma das variadas modalidades de USUCAPIÃO que podem ser resolvidas pela VIA EXTRAJUDICIAL, sem processo judicial, nos moldes do art. 216-A da Lei de Registros Publicos, regulamentado pelo Provimento CNJ 65/2017.

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos