Usucapião

15/06/2023 às 11:35
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USUCAPIÃO POR ABANDONO FAMILIAR – A INSEGURANÇA E OS REQUISITOS LEGISLATIVOS

CLAUDIA LOTURCO

RESUMO

O presente artigo científico tem como objetivo estudar os limites processuais do instituto Usucapião Familiar, como meio de garantir os direitos daquele que sofreu o abandono.

Trata-se de uma discussão acerca do Usucapião familiar e quais requisitos são necessários para sua fixação e aceitaçao jurídica, bem como demonstrar a importancia do entendimento do Codigo Civil em seu artigo 1240 A.

DA USUCAPIÃO

Usucapião é um modo de pertencimento de uma propriedade ou de qualquer direito real, que se dá pela posse alongada da coisa.

Para se dar como exercida a consumação da Usucapião é necessário o preenchimento de alguns requisitos legais, como a coisa hábil ou suscetível de usucapião, a posse, o decurso de tempo, o justo título e a boa-fé.

Podem ser objeto de usucapião todos os bens móveis e imóveis, este artigo ressaltará os bens imóveis.

Previsto como um direito originário de aquisição de propriedade, a usucapião só pode ser requisitada se não houver relação de um sujeito para com o outro, não deve haver nenhuma relação jurídica entre o proprietário e aquele que está em posse do imóvel, exceto na Usucapião Familiar, ponto alto deste artigo e que será apresentada a seguir.

A Usucapião é o direito que todo indivíduo conquista em relação a posse de um bem, seja ele imóvel ou móvel devido a utilização por um determinado tempo contínuo.

Institui o Código Civil em seus artigos de 1238 a 1244, que, quem tiver a posse do imóvel por determinado tempo conquistará o bem.

Para a autora Maria Helena Diniz:

A posse é o fato objetivo, e o tempo, a força que opera a transformação do fato em direito... O fundamento desse instituto é garantir a estabilidade e segurança da propriedade, fixando um prazo, além do qual não se podem mais levantar dúvidas ou contestações a respeito e sanar a ausência de título do possuidor, bem como os vícios intrínsecos do título que esse mesmo possuidor, porventura, tiver. (DINIZ, 2011)

A Constituição Federal do Brasil de 1988 relaciona em seus artigos 183 e 191 o instituto de Usucapião:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

 § 1º O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil

§ 2º Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

§ 3º Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.(CFRB,1988)

A nossa Constituição Federal dá ao proprietário de imóvel o direito de modo ilimitado a sua propriedade desde que ele dê ao seu imóvel uma destinação social e econômica que toda propriedade deve possuir, se isso não ocorrer o proprietário poderá ser penalizado e perder a mesma.

O instituto da Usucapião tem por intenção, beneficiar quem fez proveito do bem, o sujeito que passou um período da vida utilizando a propriedade de maneira que atendeu a função social do mesmo, isso quando o proprietário não se indispôs e deixou que outra pessoa o utilizasse.

E Diniz completa:

A usucapião é um direito novo, autônomo, independentemente de qualquer ato negocial provindo de um possível proprietário, tanto que o transmissor da coisa objeto da usucapião não é o antecessor, o primitivo proprietário, mas a autoridade judiciária que reconhece e declara por sentença a aquisição por usucapião. Pela usucapião o legislador permite uma determinada situação de fato que se estendeu por um certo intervalo de tempo, previsto em lei, se converta em situação jurídica. (DINIZ, 2011)

Para que o direito de Usucapião seja reconhecido são necessários alguns requisitos determinados pela Lei, em específico no Código Civil e na Constituição Brasileira, o possuidor tem que estar realmente residindo no imóvel, e fazendo uso desse, explorando o bem sem qualquer subordinação a outrem, tem que estar como se proprietário fosse, que esta posse não seja escondida e muito menos mediante o uso da violência sendo então a utilização do bem de forma mansa, pacífica e contínua.

O doutrinador Caio Pereira confirma:

Usucapião é a aquisição da propriedade ou outro direito real pelo decurso do tempo estabelecido e com a observância dos requisitos instituídos em lei. Mais simplificadamente, tendo em vista ser a posse que, no decurso do tempo e associada às outras exigências, se converte em domínio, podemos repetir, embora com a cautela de atentar para a circunstância de que não é qualquer posse senão a qualificada: Usucapião é a aquisição do domínio pela posse prolongada. (PEREIRA, 2007, pg 32)

Utilizado em várias modalidades a Usucapião, é o instituto que dá o direito de posse ao indivíduo em decorrência da utilização do bem por determinado período poderá ser solicitado em algumas modalidades como a Usucapião extraordinária, Usucapião Ordinária, Rural, Urbana, Coletiva e o foco principal deste trabalho, a Usucapião Familiar, uma espécie de aquisição da propriedade que se viveu por dois anos ininterruptamente com posse direta, e outros requisitos detalhados a seguir.

Usucapião familiar é a variedade de Usucapião contra o ex-cônjuge ou o ex-companheiro que deixou o lar, que abandonou a família e deixou de cumprir com os deveres financeiros e despesas do imóvel o qual tinha copropriedade.

Segundo Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald:

A nova modalidade de usucapião especial urbana – ou pro moradia – requer a configuração conjunta de três requisitos: a) a existência de um único imóvel urbano ou rural comum; b) o abandono do lar por parte de um dos cônjuges ou companheiro; c) o transcurso do prazo de dois anos. ( 2015, pg 48)

No instituto da Usucapião Familiar, a família é estabelecida como prioridade, o conceito é sempre a defesa dos indivíduos, sempre prevalecer a moradia daquela família.

Inserido no ordenamento jurídico pela Lei 12.424 de 16 de junho de 2011, visou garantir ao cônjuge ou companheiro que permaneceu na residência, no lar, o direito de posse.

A norma da Usucapião Familiar pode ser encontrada no Código Civil em seu artigo:

Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m2 (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 1o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. (VADE MECUM, 2018)

O cônjuge que manteve o cuidado, que permaneceu no imóvel zelando pelo mesmo, que arcou com as despesas financeiras e rotineiras daquele imóvel tem direito a sua posse integral através da Usucapião Familiar.

De acordo com Mário Delgado, presidente da Comissão de Assuntos Legislativos do IBDFAM:

A usucapião familiar tem dois objetivos: salvaguardar o direito à moradia daquele cônjuge ou companheiro que permaneceu no imóvel e também proteger a família que foi abandonada. (DELGADO 2015).

A Usucapião Familiar é uma ferramenta que propicia o retorno da dignidade das pessoas, assegura àquele que ficou no imóvel, aquele que foi abandonado, o direito a moradia, para isto alguns requisitos devem estar presentes.

A perda do imóvel por Usucapião Familiar se caracteriza pelo abandono efetivo do lar, o ex-cônjuge deve sair, deve realmente abandonar o imóvel e a família, a simples separação de fato, quando o cônjuge afastado continua a cumprir com os deveres materiais e imateriais, como, por exemplo, o convívio com a família persiste ou o pagamento da pensão alimentícia se mantém àquela família não se caracterizará a Usucapião Familiar.

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Os requisitos para a caracterização de Usucapião Familiar são, quanto ao prazo, bem menor de que outras modalidades, nesta modalidade são de dois anos como visto na Lei, a posse deve ser exercida de forma mansa, pacífica e contínua e aquele que abandonou o lar não se faça presença fisicamente ou por meio de zelo ao imóvel.

O Autor Adriano Ferriani discursa sobre o prazo:

Outra quebra de paradigma diz respeito ao exíguo prazo para a usucapião: apenas dois anos. Não havia no ordenamento jurídico absolutamente nenhum tipo de usucapião com prazo tão diminuto. O menor prazo, até então, era de cinco anos para bens imóveis, Com relação aos bens móveis, mesmo que o possuidor tenha justo título e boa-fé, não se usucape antes de três anos. (FERRIANI, 2018)

Outros requisitos para a consumação da Usucapião Familiar é que existe a necessidade de o imóvel pertencer aos dois cônjuges, ainda que a metragem do imóvel não supere 250 m2, que seja imóvel urbano e que o cônjuge que ficou em posse do imóvel não possua outro imóvel e se utilize aquele bem da solicitação de Usucapião como moradia de sua família.

Ainda, o requisito imposto pelo artigo 1240 A do Código Civil, como abandono de lar, deve estar explicito na convivência familiar.

Neste sentido, ja se posicionou o STF, a Usucapião Familiar só pode ocorrer em virtude de implemento de seus pressupostos anteriormente ao divórcio.

Precedente do Superior Tribunal de Justiça (Resp. n. 139.126/PE e Resp. n. 725222/MT)”. No recurso extraordinário sustenta-se violação do(s) art.(s) 1º, inciso III, e 183 da Constituição Federal. Decido. Analisados os autos, colhe-se do voto condutor do acórdão atacado a seguinte fundamentação: "(...) O art. 1.240-A da Lei n. 10.406/2002 (Código Civil), incluído pela Lei n. 12.424/2011, estabelece os critérios necessários para o reconhecimento da usucapião familiar, in verbis...( (STF, ARE 1272377, Relator(a): PRESIDENTE, , Decisão Monocrática, Julgado em: 25/10/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 25/10/2021 PUBLIC 26/10/2021)

O Enunciado 499, aprovado durante a V jornada de Direito Civil no ano de 2015 contribui para a interpretação do que seja o requisito “ abandono de lar”

Ministro Ruy Rosado de Aguiar

Comissão de Trabalho

Direito das Coisas

Coordenador da Comissão de Trabalho

Otávio Luiz Rodrigues

Número

499

Enunciado

A aquisição da propriedade na modalidade de usucapião prevista no art. 1.240-A do Código Civil só pode ocorrer em virtude de implemento de seus pressupostos anteriormente ao divórcio. O requisito "abandono do lar" deve ser interpretado de maneira cautelosa, mediante a verificação de que o afastamento do lar conjugal representa descumprimento simultâneo de outros deveres conjugais, tais como assistência material e sustento do lar, onerando desigualmente aquele que se manteve na residência familiar e que se responsabiliza unilateralmente pelas despesas oriundas da manutenção da família e do próprio imóvel, o que justifica a perda da propriedade e a alteração do regime de bens quanto ao imóvel objeto de usucapião.

Até então o termo abandono de lar deixava dúvidas quanto ao que especificamente seria, o Enunciado acima tem-se uma interpretação mais clara , se trata do abandono familiar com as obrigações e deveres ao cônjuge que deixou a família.

O abandono familiar se caracteriza também com a falta de assistência material e afetiva aos familiares que ficaram naquele lar.

Trata-se daquele que deixou o lar opta por abandonar os que ali ficaram, um total desamparo daquele que deveria prover, inclusive quanto as obrigações advindas daquele imóvel.

CONCLUSÃO

A Usucapião é um direito daquele que está em posse do bem, seguindo requisitos específicos como a forma pacifica e de boa fé, e em casos mais específicos como no caso da Usucapião Familiar o abandono do lar , trata-se de um direito das coisas um direito real.

Através de uma ação o sujeito merecedor, consegue para si a posse definitiva de bem, legitimamente reconhecida e registrada.

Mais detalhado mostra este artigo os requisitos para uma garantia ao Usucapião familiar, assunto pouco debatido e não muito comum encontrar na defesa da garantia de esposas e filhos abandonados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DINIZ, Maria Helena – Curso de Direito Civil Brasileiro 4. Direito das Coisas – 26a edição – Editora Saraiva – São Paulo – 2011

FARIAS Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson - Curso de direito civil: reais - 8ª edição - Editoras Juspodvm – Salvador - 2015.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Direitos Reais. Volume IV - 19ª edição - Editora Forense - Rio de Janeiro - 2007.

VADE MECUM – Saraiva - Consulta a Constituição Federal Brasileira 1988 e Consulta ao Código Civil - 2022

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