Discussões sobre a legítima defesa pré ordenada

Resumo:


  • O tema abordado é a legítima defesa preordenada no ordenamento jurídico brasileiro e suas particularidades.

  • Serão apresentadas hipóteses de legítima defesa preordenada, como os ofendículos, discutindo se configuram exercício regular do direito ou legítima defesa preordenada.

  • Um caso específico de legítima defesa prévia em sistemas penitenciários será analisado, concluindo com a opinião do autor sobre o tema.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

RESUMO

O tema escolhido é sobre a legítima defesa preordenada aplicada no ordenamento jurídico brasileiro e suas particularidades. Serão elencadas algumas hipóteses de legítima defesa preordenada como os ofendículos. Será também discutido se os ofendículos são legítima defesa preordenada ou exercício regular do direito. Será analisado um caso específico de legítima defesa prévia ou preventiva que ocorre nos sistemas penitenciários e por fim concluiremos o trabalho com a nossa opinião sobre o tema.

PALAVRAS-CHAVE: Legítima defesa, legítima defesa pré ordenada, exercício regular do direito e inexibilidade de conduta diversa

ABSTRACT:

The chosen theme is about preordained self-defense applied in the Brazilian legal system and its particularities. Some hypotheses of preordained self-defense will be listed, such as offenses. It will also be discussed whether the offenses are preordained self-defense or regular exercise of the right. A specific case of prior or preventive legitimate defense that occurs in penitentiary systems will be analyzed and, finally, we will conclude the work with our opinion on the subject.

KEYWORDS: Self-defence, pre-ordered self-defence, regular exercise of the right and non-existence of different conduct

INTRODUÇÃO

1.1 CONCEITO

Legítima defesa preordenada é um conceito doutrinário na qual existe uma defesa antecipada a uma agressão injusta, futura e certa. Também conhecida como legítima defesa prévia, predisposta ou preventiva. É chamada de legítima defesa, pois seria uma reação a uma agressão e por não estar elencada no ordenamento jurídico, seria uma excludente de ilicitude supralegal. A agressão sofrida deverá ser humana. O instrumento utilizado para defender este ataque é que não será necessariamente força humana, podendo ser outro instrumento.

1.2 FUNDAMENTO

Para fundamentar a legítima defesa preordenada, só teremos a doutrina, pois trata-se de uma construção doutrinária, sendo causa supra legal de excludente de ilicitude.

O que temos no ordenamento jurídico é a legítima defesa. Esta é uma excludente de ilicitude, elencada no artigo 23 do Código Penal:

“Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:

I - em estado de necessidade;

II - em legítima defesa;

III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.”

O próprio ordenamento no artigo 25 do Código Penal conceituou a legítima defesa:

“Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)”

A legítima defesa, nos termos em que é proposta pelo nosso Código Penal, exige a presença simultânea dos elementos: agressão injusta, atual ou iminente; direito (bem jurídico) próprio ou alheio; meios necessários usados moderadamente.

Ocorre que na legítima defesa preordenada exige: agressão injusta futura e certa. A repulsa é antecipada ao mal futuro, não ocorrendo a agressão atual ou iminente, conforme o Código Penal.

Serão analisados os exemplos e hipóteses de legítima defesa preordenada nos capítulos seguintes.

2 LEGÍTIMA DEFESA PREORDENADA

2.1 HIPÓTESES

A hipótese de legítima defesa preordenada mais comentada na jusrisprudência e doutrina é a do ofendículos.

Os ofendículos são obstáculos, impedimentos colocados em grande parte para proteger o seu patrimônio. Em sentido jurídico, significa aparato para proteger o patrimônio, o domicílio ou qualquer bem jurídico de ataque ou ameaça como, por exemplo, cacos de vidro no muro, ponta de lança na amurada, armas de fogo que disparam mediante dispositivo predisposto, corrente elétrica na cerca, células fotoelétricas que acendem luzes e automaticamente fecham portas.

No art. 1297 do Código Civil, primeira parte, há previsão dos ofendículos para proteção da posse, há o direito do proprietário de cercar, murar, tapar, entre outros.

Art. 1.297. O proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural, e pode constranger o seu confinante a proceder com ele à demarcação entre os dois prédios, a aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as respectivas despesas.

Conforme dito anteriormente, nessa hipótese a doutrina é divergente sobre a natureza jurídica dos ofendículos, havendo duas posições: a) a de que configuram o exercício regular do direito, sob o prisma de que os obstáculos instalados na propriedade constituem o uso legítimo de um direito e; b) a de que configuram a chamada legítima defesa preordenada, pois entende-se que o aparato é colocado em uma propriedade para funcionar no momento em que esse local é invadido contra a vontade do morador.

No código civil no artigo 1297 é possível perceber que os ofendículos são exercício regular do direito, no próprio artigo o legislador deixa claro: “o proprietário tem direito...”

César Roberto Bitencourt (TRATADO DIREITO PENAL 1, PARTE GERAL, p. 129, 2018) tentando esclarecer diz:

“… acreditamos que a decisão de instalar os ofendículos constitui exercício regular de direito, isto é, exercício do direito de autoproteger-se. No entanto, quando reage ao ataque esperado, inegavelmente, constitui legítima defesa preordenada. Adotamos esse entendimento uma vez que oferece melhores recursos para análise de cada caso concreto, diante da necessidade dos diversos requisitos da legítima defesa. ”

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Conforme Aníbal Bruno (citado por GRECO, ROGÉRIO, Curso Direito Penal, parte 1, 2017, p. 471), este defende a ideia de defesa preordenada:

“… essa mesma categoria de exercício de um direito pertence o ato do indivíduo que, para defender a sua propriedade, cerca-se vários meios de proteção, as chamadas defesas predispostas...”

Cabe esclarecer que os ofendículos não poderão ser colocados sem regras, sem racionalidade. Caso o proprietário de uma casa não respeite a altura limite, regrada pela localidade, para colocar cerca elétrica e caso uma criança tente entrar na sua residência para pegar uma bola, o proprietário será responsabilizado por eventuais lesões venha sofrer esta criança. A isto dizemos ser uso moderados dos meios necessários, presente no artigo 25 do Código Penal ao conceituar a legítima defesa.

A outra hipótese na qual a doutrina cita como exemplo de legítima defesa preordenada na qual suscita mais dúvidas a respeito da sua natureza jurídica.

O exemplo será o que foi mencionado pelo doutrinador Rogério Greco (Curso Direito Penal, parte 1, 2017, p. 454), na qual durante uma rebelião carcerária, os presos reivindicam exigências suas e se não fossem cumpridas estas, ocorreria a “ciranda da morte”. A medida que o tempo passa os presos mais fracos seriam mortos, seguindo um código de ética da cadeia. O estuprador sabendo que a sua morte seria questão de tempo, resolve matar o líder da rebelião. E o doutrinador pergunta: houve legítima defesa?

O doutrinador, diz que neste caso não há que se falar em legítima defesa, pois houve agressão futura e não iminente e portanto não seria caso de legítima defesa, embora possa ser excluído o crime pela inexibilidade de conduta diversa, pois não cabia ao agente outra conduta senão aquela.

O doutrinador William Douglas, (citado por GRECO, ROGÉRIO, Curso Direito Penal, parte 1, 2017, p.455) diz que neste caso seria hipótese de legítima defesa, mas preordenada, pois existe uma agressão futura. O evento é certo e futuro, a certeza decorre de cada caso e neste caso era certo a morte do estuprador diante da negação do Estado em atender as exigências.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluindo o tema legítima defesa preordenada, considerando o que foi dito e estudado acredito que nas hipóteses dos ofendículos a melhor doutrina seria encampar a ideia de que estes seriam um exercício regular do direito, pois ao colocar a sua proteção ao patrimônio, não se sabe qual o momento que irá ocorrer a sua ofensa, portanto a agressão será futura e incerta, distanciando portanto do conceito da legítima defesa preordenada que é uma repulsa a uma agressão futura e certa.

Sobre a hipótese levantada pelo doutrinador Rogério Greco, sobre a “ciranda da morte”, ouso discordar do brilhante doutrinador e concordar com o doutrinador William Douglas, acreditando existir portanto uma legítima defesa preordenada. Conhecendo as histórias narradas por jornais e participando muito das vezes dela no serviço público, presenciei relatos dos mais diversos sobre a “vida na cadeia”. A lei que manda não é a ditada pelo Estado, mas a lei das facções, dos líderes carcerários. Vendo por este prisma, fica fácil analisar a legítima defesa preordenada praticada pelo estuprador, diante do líder da rebelião, a sua morte era certa, pois diante da inércia do Estado. Portanto se enquadra nos elementos da legítima defesa preordenada a repulsa a agressão injusta, futura e certa.

4 REFERÊNCIAS

César Roberto Bitencourt (TRATADO DIREITO PENAL 1, PARTE GERAL)

Rogério Greco (Curso Direito Penal, parte 1, 2017)

Sobre os autores
Bruno Silva Lemos

Pós graduado em Direito Penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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