Contexto e cenário que ensejam na contratação
De início, é importante reconhecer que a preocupação da Administração em reforçar a segurança nas escolas não é infundada. O momento social provoca esse tipo de reação da Administração, prestadora e organizadora dos serviços públicos de educação, e que assiste inúmeros ataques e invasões tendo como alvo escolas e creches da rede de ensino do país, em diversos locais, com indícios de que sejam ondas organizadas.
É com base nesse fato social [de ampla repercussão nas mídias ], imprevisível, muitas vezes aproveitando da baixa condição de segurança das escolas, que tanto a Administração, como os pais e responsáveis dos alunos , além dos profissionais da educação, refletem sobre medidas de mitigação ou combate a ocorrência de tragédias. Nesse cenário, a contratação de empresa de segurança/vigilância, é a solução imediata que busca assegurar o mínimo de segurança para que os alunos continuem frequentando o ensino [que lhes é direito] , para que os profissionais da educação continuem lecionando com segurança e dignidade, e para que a sociedade em geral e os responsáveis/pais dos alunos sintam a resposta do Estado frente às ameaças constantes e especulações de novos ataques.
A contratação de vigilância/segurança especializada é necessária pela complexidade do risco, já que, é preciso que os profissionais sejam treinados para atuarem frente às diferentes formas de ataque às quais as redes municipais estão sujeitas, tendo em vista que já foram praticadas em outras localidades ações com o emprego de armas de fogo, outras com armas brancas, com invasão por muros, e diferentes formas de atuação. Assim, os profissionais da empresa contratada são hábeis a atuar diante de diferentes cenários.
As unidades das redes municipais de ensino não são estruturadas para situações similares, embora reúnam grande concentração de pessoas, e em sua maioria incapazes, ou relativamente, as redes de educação possuem estrutura de manutenção dos alunos nos prédios e profissionais que zelam e auxiliam os alunos em suas atividades diárias, essa estrutura, que é própria para o ensino, foi desenvolvida por anos para esse fim, está vulnerável diante da articulação e belicosidade dos recentes ataques, isso reforça a necessidade de, mais do que criar protocolos, estabelecer proteção definitiva nos ambientes que hoje são o alvo principal.
O Estado de São Paulo e a União também articulam ações nesse sentido.
Outras hipóteses e reforços: Polícia militar, protocolos, câmeras, cercas e o uso da Guarda Municipal
Em alguns municípios, tem-se realizado reuniões junto a Polícia Militar para verificação das ações de combate aos ataques e até mesmo para ampliação das rondas e ajustes de segurança.
Há também a hipótese de uso de guardas municipais, para os entes que possuem a instituição, reforçando a segurança patrimonial das escolas.
A reestruturação dos ambientes escolares com instalação de câmeras de segurança e reforço dos muros, são alternativas adotadas em algumas localidades.
É importante que, até mesmo em conjunto com a Polícia Militar, sejam definidos protocolos de segurança e que os diretores e servidores/empregados sejam instruídos sobre esses procedimentos, a manutenção dos portões trancados, canal de atendimento da Polícia, procedimento de proteção dos alunos, enfim, meios locais de se prevenir situações de risco.
Da justificativa
Nesse sentido, a justificativa para esse reforço de segurança nas escolas deve partir da Secretaria de Educação, um ofício da Pasta deve relatar as condições de segurança das escolas, o temor dos alunos, as manifestações preocupadas de seus responsáveis e o risco de evasão escolar pela precariedade de segurança e depoimentos dos profissionais de educação, tudo isso será válido como justificativa da contratação.
Ainda que não tenham ocorridos ataques nos limites do Município, é importante destacar que experiências externas funcionam como alerta geral, como um incentivo ao melhoramento da condição atual, o que está sendo pretendido com essa contratação, o reforço da segurança na rede municipal de ensino. As forças de segurança pertencem necessárias e importantes, todavia, com a segurança posta e imediata em cada unidade de ensino, o intuito é barrar ou reduzir o tempo de reação aos ataques, já que, muitas vezes e a depender dos meios da atuação criminosa, o tempo pode representar vidas.
Além disso, a organização do ensino é competência do Município [Artigos 8º, 11 e 12 , todos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação], e a opção pela contratação de segurança privada para atuar nos prédios públicos de ensino inclui-se no universo de escolhas de conveniência e oportunidade do Gestor.
Inclusive, a contratação se fundamenta pela eventual responsabilidade da Administração pela segurança dos alunos na prestação dos serviços de educação, já que os alunos desde o transporte estão sob a responsabilidade pública, e nos termos do art. 37, §6º, da Constituição Federal, há responsabilidade objetiva do Estado nestes casos. Ainda, existe o risco de imputação da responsabilidade objetiva por omissão decorrente da aplicação da teoria do risco criado, já que a Administração está ciente do perigo e das ameaças envolvendo escolas Brasil a fora, e ao reunir os alunos para exercer sua competência de prestar os serviços de ensino, acaba assumindo, naturalmente, riscos, é o que Matheus Carvalho trata em sua obra “Manual de Direito Administrativo” [pg 378 e 379].
Em resumo, o setor requisitante, a Secretaria de Educação, deverá relatar as justificativas da contratação nesse sentido, na necessidade de assegurar mais segurança às escolas, aos alunos frequentadores do ensino, aos responsáveis que confiam os alunos ao sistema de ensino e aos profissionais que laboram nesses ambientes. Evitando riscos e evasão escolar, tornando o ambiente escolar mais seguro.
PROCESSO DE CONTRATAÇÃO
Avançando para o processamento da contratação, já que os quesitos de necessidade e conveniência foram destacados, é possível que seja realizado certame licitatório para contratar os serviços de segurança/vigilância nas escolas, já que a tendência é que se tornem serviços regulares.
Mas, em vista dos valores a serem contratados e até mesmo da necessidade emergente de que as unidades já contem com os serviços de segurança, existe a possibilidade de que seja feita a contratação por dispensa, seja pelo valor, seja em função da situação emergencial, provisoriamente, até que seja concluído o devido processo licitatório.
As duas hipóteses serão tratadas separadamente.
Sobre a dispensa emergencial
A regra das compras e contratações públicas é sempre pela licitação, todavia, a própria Lei dispensa situações dessa regra. É o que o inciso IV, art. 75, da Nova Lei de Licitações prevê [e o art. 24, IV, da Lei Federal nº 8.666/93, já previa]:
Art. 75. É dispensável a licitação:
[...]
VIII - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a continuidade dos serviços públicos ou a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para aquisição dos bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de
obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 1 (um) ano, contado da data de ocorrência da emergência ou da calamidade, vedadas a prorrogação dos respectivos contratos e a recontratação de empresa já contratada com base no disposto neste inciso;
Nesse caso, bastará que a Secretaria de Educação justifique essa contratação como medida de segurança, para evitar evasão escolar, e pela conveniência Administrativa, poderá ser realizada a contratação, por período necessário, até que seja concluído certame licitatório ou concurso público, pois a ideia é assegurar de imediato a segurança nas escolas, e com a conclusão natural da licitação, que esses serviços sejam continuados de maneira planejada. Afinal, esperar os meses necessários para a promoção de uma licitação, na conjuntura atual, pode trazer riscos e manter o estado de pânico nos alunos e seus responsáveis, em flagrante prejuízo ao ensino.
Sobre a dispensa por valor
Outra hipótese, a depender do valor da contratação, é que a dispensa seja fundamentada no inciso II, art. 75 [na Lei de 1993, o inciso II, do art. 24]:
Art. 75. É dispensável a licitação:
[...]
II - para contratação que envolva valores inferiores a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), no caso de outros serviços e compras; [R$ 57.208,33 (cinquenta e sete mil duzentos e oito reais e trinta e três centavos) atualizados em 2022]
O rito da dispensa Nova Lei de Licitações
O rito processual da dispensa de licitação está prescrito no art. 72, constando:
Art. 72. O processo de contratação direta, que compreende os casos de inexigibilidade e de dispensa de licitação, deverá ser instruído com os seguintes documentos:
I - documento de formalização de demanda e, se for o caso, estudo técnico preliminar, análise de riscos, termo de referência, projeto básico ou projeto executivo;
II - estimativa de despesa, que deverá ser calculada na forma estabelecida no art. 23 desta Lei;
III - parecer jurídico e pareceres técnicos, se for o caso, que demonstrem o atendimento dos requisitos exigidos;
IV - demonstração da compatibilidade da previsão de recursos orçamentários com o compromisso a ser assumido;
V - comprovação de que o contratado preenche os requisitos de habilitação e qualificação mínima necessária;
VI - razão da escolha do contratado;
VII - justificativa de preço;
VIII - autorização da autoridade competente.
Parágrafo único. O ato que autoriza a contratação direta ou o extrato decorrente do contrato deverá ser divulgado e mantido à disposição do público em sítio eletrônico oficial.
Conclui-se que é conveniência da Administração Pública reforçar a segurança nas escolas, por se tratar de serviço organizado por entes públicos, e diante dos reflexos das recentes ondas de ataques à escolas de diferentes regiões do Brasil, é possível que as secretarias de educação justifiquem a contratação nesse sentido, relatando o temor dos responsáveis pelos alunos e a fragilidade estrutural e de segurança dos prédios de ensino da rede municipal, por exemplo, desse modo, a contratação poderá ser feita: 1- via dispensa, a depender, por valor [art. 75, II, Lei 14.133/21 ou Art. 24, II, Lei 8.666/93], ou, 2- se for o caso de estabelecer as medidas de segurança com urgência, poderá ser realizada dispensa emergencial [art. 75, VIII, Lei 14.133/21 ou art. 24, III, Lei 8.666/93], pelo período necessário para realização da licitação ou conclusão do concurso público.
Existem outras medidas estruturais [exemplo: muros, cercas, equipamentos de controle de entrada, detectores e câmeras] ou operacionais [exemplo: criação de protocolos de segurança e uso da guarda municipal] que podem contribuir para a segurança das escolas.
Referências
https://www.youtube.com/watch?v=_ncFw4npElA
Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino.
[...]
Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;
II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas;
III - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;
IV - autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino;
V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.
VI - assumir o transporte escolar dos alunos da rede municipal. (Incluído pela Lei nº 10.709, de 31.7.2003)
Parágrafo único. Os Municípios poderão optar, ainda, por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor com ele um sistema único de educação básica.
Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:
I - elaborar e executar sua proposta pedagógica;
II - administrar seu pessoal e seus recursos materiais e financeiros;
III - assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-aula estabelecidas;
IV - velar pelo cumprimento do plano de trabalho de cada docente;
V - prover meios para a recuperação dos alunos de menor rendimento;
VI - articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola;
VII - informar pai e mãe, conviventes ou não com seus filhos, e, se for o caso, os responsáveis legais, sobre a frequência e rendimento dos alunos, bem como sobre a execução da proposta pedagógica da escola; (Redação dada pela Lei nº 12.013, de 2009)
VIII – notificar ao Conselho Tutelar do Município a relação dos alunos que apresentem quantidade de faltas acima de 30% (trinta por cento) do percentual permitido em lei; (Redação dada pela Lei nº 13.803, de 2019)
IX - promover medidas de conscientização, de prevenção e de combate a todos os tipos de violência, especialmente a intimidação sistemática (bullying), no âmbito das escolas; (Incluído pela Lei nº 13.663, de 2018)
X - estabelecer ações destinadas a promover a cultura de paz nas escolas. (Incluído pela Lei nº 13.663, de 2018)
XI - promover ambiente escolar seguro, adotando estratégias de prevenção e enfrentamento ao uso ou dependência de drogas.
CARVALHO, Matheus. Manual de Direito Administrativo. 10 ed. São Paulo: JusPODIVM, 2022. p 378 e 379