Direito Real de Habitação. Aspectos Legais e Jurisprudenciais.

25/06/2023 às 21:35
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DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. ASPECTOS LEGAIS E JURISPRUDENCIAIS.

Wagner da Silva Serra

Status: on-line

Wagner da Silva Serra

Advogado na Cidade do Rio de Janeiro.

Advocacia Cível e Imobiliária.

Pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil.

INTRODUÇÃO

O objetivo desse estudo é demonstrar o conceito do direito real de habitação. As suas devidas características. Os seus fundamentos legais e constitucionais. O seu assento legal nos Códigos Civis de 1916 e 2002 assim como na Lei 9278/96. As formas pelas quais será possível renunciar o direito real de habitação. A distinção entre direito real de habitação e usufruto. A impossibilidade do direito real de habitação no usufruto. O atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto. A conclusão do tema e as devidas referências legislativas.

CONCEITO

É o direito conferido ao cônjuge/companheiro sobrevivente, independentemente do regime de bens adotado pelo então casal, de residir no imóvel familiar, desde que seja o único dessa natureza a inventariar, ainda que hajam filhos comuns do casal ou de filhos exclusivos do falecido.

CARACTERÍSTICAS

Trata-se, portanto, de um direito GRATUITO, pois o seu titular só tem o direito de ali residir; e os herdeiros, por sua vez, não podem exigir o pagamento pela ocupação e tampouco promover a alienação do bem.

É um direito VITALÍCIO porque perdura até a morte do seu titular.

É também um direito PERSONALÍSSIMO conferido ao cônjuge sobrevivente; não se transmitindo, assim, a terceiro estranho à sucessão. Se, por exemplo, o cônjuge vier a contra novas núpcias e posteriormente falecer, o seu companheiro não terá o direito de habitar nesse imóvel; sob pena de ferir o direito de propriedade dos demais herdeiros (artigo 50, inciso XXII, CRFB/88).

FUNDAMENTOS LEGAIS E CONSTITUCIONAIS

O direito real de habitação tem o seu fundamento constitucional no princípio da dignidade da pessoa humana e no direito social à moradia (arts. 10, inciso III e 60, caput, CRFB/88).

O seu fundamento legal está ínsito no artigo 1415 do CC/2002 (747 CC/1916) que assim dispõe ´´Se o direito real de habitação for conferido a mais de uma pessoa, qualquer delas que sozinha habite a casa não terá de pagar aluguel a outra, ou a outras, mas não as pode inibir de exercerem, querendo, o direito, que também lhes compete, de habitá-la``.

O DIREITO REAL DE HABITAÇÃO NO CÓDIGO CIVIL DE 1916, NA LEI 9278/96 E NO CÓDIGO CIVIL 2002

O artigo 1611, §20 do CC/1916 dizia que ´´Ao cônjuge sobrevivente casado sob o regime da comunhão universal, enquanto viver e permanecer viúvo, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único bem daquela natureza a inventariar``.

No mesmo sentido, assim é a redação do artigo 70, parágrafo único da Lei 9278/96 ´´Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família``.

Por outro lado, diferentemente das disposições legais citadas, o CC/2002 no seu art. 1831 trata do direito real de habitação nos seguintes termos ´´Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar``.

Cabe aqui destacar que no CC atual o cônjuge/companheiro supérstite terá o direito de residir no imóvel familiar, independentemente do regime de bens escolhido pelos então conviventes e da condição do sobrevivente de permanecer viúvo e de contrair nova união; assim como, que aquele bem imóvel seja o único a inventariar e que sirva, exclusivamente, para moradia.

RENÚNCIA

O cônjuge/companheiro sobrevivente pode renunciar o direito real de habitação nos autos do inventário ou por escritura pública, sem prejuízo da sua participação na herança (Enunciado 271 da III Jornada de Direito Civil).

DISTINÇÃO ENTRE USUFRUTO E DIREITO REAL DE HABITAÇÃO

No usufruto o usufrutuário tem o direito à posse ao uso, a administração dos bens e a percepção dos frutos, ou seja, o usufrutuário pode alugar o bem ou dar em comodato. Por outro lado, no direito real de habitação o ocupante tem o direito de usar e habitar o bem; ficando impedido de alugar e emprestar o bem. (arts. 1394, 1412/1416 do Código Civil).

DIREITO REAL DE HABITAÇÃO NO USUFRUTO

É incabível. Pois, ocorrendo a morte do usufrutuário extingue-se o usufruto; vale dizer, não é possível herdar usufruto (artigos. 1410, inciso I, segunda parte e 1784 do Código Civil a contrario sensu).

ASPECTOS JURISPRUDENCIAIS

Sobre o referido tema, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o direito real de habitação pode ser invocado em qualquer demanda possessória (ex.:manutenção e reintegração de posse, interdito proibitório) pelo companheiro sobrevivente, ainda que esse não tenha buscado em ação própria o reconhecimento da união estável.

Cabe ao companheiro supérstite o direito real de habitação sobre o imóvel no qual convivia com o falecido, ainda que silente o art. 1831 do CC/2002. Isso porque o Código atual, no artigo em comento, não fez menção expressa ao companheiro. Sendo assim, por analogia, ao companheiro também é conferido esse direito.

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No mesmo sentido, assim dispõe o Enunciado 117 da I Jornada de Direito Civil ´´Art. 1831: O direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro, seja por não ter sido revogada a previsão da Lei 9278/96, seja em razão da interpretação analógica do art. 1831, informado pelo art. 60, caput, da CRFB/88``.

Por outro lado, não subsiste o direito real de habitação se houver copropriedade sobre o imóvel antes da abertura da sucessão (morte) ou se àquele tempo, o falecido era mero usufrutuário do bem. (Superior Tribunal de Justiça. Jurisprudência em Teses Edição n0. 50. União Estável

CONCLUSÃO

Em razão da evolução legislativa e jurisprudencial, assim como do reconhecimento da união estável como entidade familiar (art. 226, §30 da Constituição da República Federativa do Brasil), será conferido ao cônjuge/companheiro sobrevivente, independentemente do regime de bens adotado, o direito de residir no imóvel familiar.

Portanto, para que ocorra a referida aprovação, é necessário que o bem imóvel seja o único daquela natureza a inventariar. Além disso também será concedida tal aclamação, ainda que existam filhos comuns do casal ou de filhos exclusivos do falecido.

Ainda assim, para ser contemplado com o direito real de habitação, não é necessário que o cônjuge sobrevivente permaneça viúvo e impedido de contrair novas núpcias; observando-se que o referido direito, em razão do seu caráter personalíssimo não será transmitido a terceiro estranho à sucessão.

O direito real de habitação também pode ser utilizado como matéria de defesa em qualquer demanda possessória.

Em sentido contrário, não será reconhecido o direito real de habitação se o falecido era usufrutuário do bem; já que a morte extingue o usufruto, assim como se o de cujus era coproprietário do bem imóvel na data da abertura da sucessão (falecimento). Sob pena de ocorrer verdadeira violação ao direito de propriedade dos demais herdeiros.

O cônjuge/companheiro pode renunciar o direito de habitação nos autos do inventário ou através de escritura pública.

Por outro lado, enquanto no usufruto o usufrutuário na administração do bem pode alugar ou dar em comodato, no direito real de habitação o ocupante tem apenas o direito de usar e habitar o bem; ficando impedido de alugá-lo ou emprestá-lo.

Por fim, é incabível o direito real de habitação no usufruto; já que, com a morte do usufrutuário extingue-se o usufruto.

REFERÊNCIAS

Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988.

Código Civil de 1916. Lei 3071, de 1 janeiro de 1916.

Código Civil de 2002. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

Conselho da Justiça Federal. Enunciados das Jornadas de Direito Civil.

Enunciados das Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal – CJF.

Superior Tribunal de Justiça. Jurisprudência em Teses Edição n0 50. União Estável.

Sobre o autor
Wagner da Silva Serra

Advogado formado pela Faculdade Brasileira de Ciências Jurídicas-SUESC 1998. Pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil pela ESA/OAB-RJ e SUESC em 2006.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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