COMO JÁ ALERTAMOS diversas vezes aqui, é real a possibilidade de Usucapião sobre imóveis objeto de HERANÇA e infelizmente esse é um dos sérios riscos da não realização do Inventário e da partilha - que pode inclusive ocasionar a perda do bem. A regularização dos bens através do Inventário serve para, depois de pagas as dívidas do morto (art. 1.997 do CCB), entregar a quem de direito, de acordo com as regras da Lei (art. 1.829 e seguintes), o seu quinhão hereditário sobre a herança deixada.
Usucapião como sabemos, surge independentemente de pronunciamento e reconhecimento judicial ou mesmo do reconhecimento extrajudicial facultado pela Lei (art. 216-A da LRP). Bastará para essa forma de aquisição originária da propriedade o preenchimento dos requisitos legais, que variando de acordo com cada espécie de usucapião, sempre partirão da matriz: COISA hábil, POSSE qualificada (dotada de "animus domini"), exercida pelo TEMPO exigido em Lei.
De fato, como aponta a Lei, a partilha porá fim ao estado de indivisão da herança (art. 1.791, par. único) extinguindo a figura do Espólio. Sobre o tema comenta o festejado autor ARNALDO RIZZARDO (Direito das Sucessões. 2019):
"Procura-se estabelecer, com a partilha, o FIM DA COMUNHÃO HEREDITÁRIA 'pro indiviso'. Deixa de existir o espólio, ou simplesmente um acervo, um montante. Surgem partes especificadas, com a individuação da titularidade. Este, talvez, o efeito prático mais importante, ou seja, a atribuição de cada parte dos bens aos herdeiros. (...) Um outro efeito aparece: concretizar ou materializar a POSSE de cada herdeiro nos bens".
Como alerta o elevado Jurista pode ser possível partilha mantendo-se a co-propriedade de herdeiros sobre determinado (s) bem (ns) - e de fato, isso é plenamente possível, como inclusive se pode ver dos artigos 648 e 649 do CPC/2015. Como alerta o ilustre doutrinador, temos que nesses casos de bens de herança compartilhados entre herdeiros com o julgamento da partilha "(...) cessa apenas a COMUNHÃO HEREDITÁRIA, mantendo-se a COMUNHÃO DE FATO".
Cessaria, com o julgamento da PARTILHA em sede de inventário, também o risco de quaisquer dos herdeiros de perder seu patrimônio em favor de outro herdeiro também co-proprietário e possuidor?
A resposta nos parece ser claramente NEGATIVA e isso com base na melhor doutrina e na jurisprudência.
Segundo lição do Desembargador Aposentado do TJMG, hoje Advogado e especialista no assunto, Dr. BENEDITO SILVÉRIO, a usucapião sobre bens da herança assim como de bens mantidos em condomínio (co-propriedade) é plenamente possível:
"(...) Poderá, também, o CONDÔMINO intentar a ação de usucapião para o reconhecimento da propriedade sobre todas as partes, excluindo os demais comunheiros. A posse sobre o todo precisa restar cumpridamente provada, sendo indispensável a observância dos demais requisitos legais, especialmente o 'animus domini'. (...) O herdeiro ou condômino que pretender usucapir contra os consortes precisa alegar e provar que cessou de fato a COMPOSSE, estabelecendo-se POSSE EXCLUSIVA pelo TEMPO necessário à usucapião extraordinária, com os demais REQUISITOS que esta requer".
Percebe-se, portanto, que tanto na questão dos bens da herança (iniciado ou não o inventário) quanto nos bens já regularizados em co-propriedade (regime de condomínio) será plenamente possível a pretensão da aquisição mediante USUCAPIÃO, sendo o êxito da demanda ligado diretamente à comprovação da reunião dos requisitos legais - principalmente à POSSE EXCLUSIVA e sem OPOSIÇÃO dos demais.
Como aponta a acertada jurisprudência do TJSP é plenamente possível a Usucapião de um co-proprietário de um bem contra os demais visando a aquisição da propriedade inteira, com base no exercício da posse exclusiva sem oposição dos demais. Não por outra razão, embasada em precedentes do STJ a sentença do juízo de primeira instância foi cassada:
"TJSP. 1018834-44.2020.8.26.0451. J. em: 05/10/2022. USUCAPIÃO. ALEGAÇÃO DE POSSE EXCLUSIVA SOBRE O IMÓVEL. POSSIBILIDADE DE USUCAPIR CONTRA DEMAIS CONDÔMINOS. PRECEDENTES. SENTENÇA REVOGADA. RECURSO PROVIDO. Reconhecimento de domínio pela usucapião. Alegação de posse exclusiva sobre o imóvel. Possibilidade de usucapião contra demais condôminos. Precedentes do Egrégio Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal. Revogação da sentença para que ao feito seja dada continuidade. Recurso provido".