As famílias multiespécies na sociedade pós-contemporânea
Por família no sentido popular da palavra, entende-se ser o grupo de pessoas vinculadas por consanguinidade e união. Juridicamente família são pessoas unidas por laços de parentesco, sejam eles os civis, naturais ou por afinidade.
Nos dias atuais muitos casais tem optado por não terem filhos, porém tem “abraçado” a ideia de terem os pets como sendo não somente seus bichinhos de estimação, mas seus “filhinhos de companhia. ”
Famílias multiespécies ou ainda núcleos familiares pluriespécies, são formados por pessoas e seus bichinhos de estimação, também carinhosamente denominados de “filhinhos de patinhas ou de pêlos”, enfim, na sociedade pós-contemporânea é crescente o número de composições familiares baseadas na multiespécie.
Inegavelmente com o decorrer dos tempos não só o conceito como também a composição das famílias foi passando por transformações que contribuíram significativamente para inúmeras pessoas, principalmente no campo emocional, com a inserção dos bichinhos de estimação no seio familiar.
Os animaizinhos de estimação não devem pois, serem vistos como coisas ou objetos, mas sim como entes da família, como realmente são: seres vivos, dotados consequentemente de sentimentos como alegria, euforia, tristeza, cansaço, sede, fome, frio dentre outros.
Fato é que os bichinhos por contribuírem e muito emocionalmente na vida de muitas pessoas, não devem mais serem vistos pela legislação como semoventes. As famílias atuais são compostas por amor e afinidades e isso ocorre entre as pessoas e também entre as pessoas e os animais, daí o nascimento da família multiespécie.
Acompanhando todo esse processo significativo o Direito das Famílias tem “defendido” consideravelmente a situação dos bichinhos nas famílias multiespécies, como por exemplo, nos divórcios já existe a aplicabilidade de dias vinculados à guarda, visitação e até pensão alimentícia.
Por pensão alimentícia para os bichos, entende-se a divisão de gastos com banho, tosa, remédios, compra de alimentos que devem ser divididos entre os guardiões do animalzinho, que sofre também quando há a ruptura do casal e uma das partes não mais convive ali com ele também, como antes rotineiramente acontecia. Em relação à guarda, em caso de dissolução de união estável ou divórcio, é importante que o magistrado analise alguns fatores como quem dos tutores tem maior disponibilidade de tempo, se o ambiente de moradia do animal será o mesmo ou se havendo mudança, se o ambiente é adequado para o convívio com o pet e a questão da melhor afinidade com um dos tutores, podendo assim ser estabelecida a guarda unilateral ou ainda a compartilhada.
Alguns animais adoecem inclusive, quando são privados da companhia de seus tutores, desenvolvendo tristeza, queda de pêlos, apatia, ausência de apetite e outros até apresentam quadros de agressividade e isolamento, perdem a vontade de brincar, quadros de ansiedade perceptíveis quando o animal manifesta vocalizações excessivas, lambedura persistente das patas, comportamento destrutivo e tendem a emocionalmente enfraquecerem cada vez mais. Acontecem também a queda de pêlos generalizada, problemas vinculados a hipotireoidismo em decorrência da pouca liberação de hormônios da tireóide. O estado emocional não só dos humanos, mas também dos animais altera todo o metabolismo do corpo e afeta a questão psicológica, são as denominadas doenças de ordem psicossomáticas, o sofrimento psicológico transforma-se em sofrimento físico! A presença e participação dos tutores ou não na vida dos bichinhos podem contribuir de forma positiva ou negativa para a vida deles.
Devem, pois, serem compreendidos irrefutavelmente como “sui generis”, ou seja, não são seres humanos, mas são seres vivos e tem sentimentos, desenvolvem apegos e também traumas, refletem inclusive estados emocionais de seus tutores, possuem sensibilidade auditiva e olfativa e são capazes de auxiliar as pessoas nas mais diversas situações, são dotados de inteligência, absorvem as emoções de seus guardiães e também conseguem aprender celeremente os ensinamentos de seus tutores. Os bichinhos de estimação ou companhia inegavelmente possuem cada vez mais valores únicos e extremamente peculiares e diante de fatos tão notórios a legislação não poderia esquivar-se de reconhecer a relação de proximidade e afeto estabelecida entre os tutores e seus pets.
Os pets não são mais apenas e tão somente o melhor amigo do homem ou aquele bichinho para “espantar” pessoas estranhas que se aproximassem da casa por exemplo, quando em um passado remoto os cachorros tinham com veemência essa finalidade, mas também foram inseridos na qualidade de “filhos de companhia”, principalmente o cachorro e o gato e sendo assim é nitidamente reconhecível o exercício da chamada parentalidade, uma vez que ao tratarem os bichinhos como seres humanos, colocando-lhes roupinhas, chupetas, sapatinhos desenvolvem sentimentos de pais e mães.
E ainda à luz de Nossa Magna Carta, em seu artigo 225, parágrafo 1º, inciso VII a proteção é devida aos animais, estendendo-a à preservação do meio ambiente e a Lei 9605/98 também “abraça com carinho” a referida proteção, pois tipifica crimes contra a fauna e flora e tem o direito de serem protegidos pois fazem parte da fauna.
O assunto indubitavelmente é de muita relevância para o Direito Brasileiro e os diálogos a respeito do tema podem contribuir para muitas mudanças positivas. Os animais merecem respeito e proteção e não podem ser excluídos dos seios familiares, sendo justa a sua descoisificação!
Referências Bibliográficas
Código Civil Brasileiro
Disponível em http://www.planalto.gov.br
Constituição Federal do Brasil
Disponível em http://www.planalto.gov.br
LAAN Laboratório de Anatomia Animal
Doenças de pele de origem comportamental
Disponível em laan.jatai.ufg.br
Lei 9605/98
Disponível em http://www.planalto.gov.br
Autoria:
Kelly Moura Oliveira Lisita.Advogada. Membro da Comissão de Direito das Famílias da OAB GO. Docente Universitária nas áreas de Direito Penal e Direito Civil. Tutora em Ead.Articulista.