NÃO ADIANTA TER VÁRIOS IMÓVEIS e não cuidar de todos eles, exercendo principalmente sobre eles os atributos da propriedade, como estatuído em Lei (art. 1.228 do CCB). Quando o proprietário por sua desídia permite que outrem sobre o bem imóvel exerça posse qualificada, reunindo e demonstrando todos os demais requisitos que a Lei exige para o aparelhamento da PRESCRIÇÃO AQUISITIVA o resultado não será outro senão a perda da propriedade em favor daquele que comprovar os requisitos da USUCAPIÃO. Não se imagine com isso que exista qualquer "transmissão" ou "entrega" sobre o bem das mãos de um para o outro, como ocorre na compra e venda, por exemplo. Na Usucapião a aquisição é originária, como já falamos diversas vezes.
Há no procedimento da Usucapião uma participação passiva, digamos assim, por parte do titular registral que por conta do seu descuido permite que outrem se arvore na possibilidade de preencher os requisitos para adquirir seu imóvel legitimamente, como a Lei e a Constituição permitem.
É interessante sempre observar na sistemática da Usucapião que enquanto um interessado adquire a propriedade, outro a perde. A aquisição pela usucapião é LEGÍTIMA e plenamente reconhecida em Lei, havendo diversas modalidades deste instituto. Como sabemos, desde 2015, por ocasião da inclusão do art. 216-A à Lei de Registros Publicos promovida pelo Novo Código de Processo Civil tornou-se possível o RECONHECIMENTO EXTRAJUDICIAL da aquisição de imóveis por USUCAPIÃO, sem necessidade de qualquer intervenção judicial. O procedimento está plenamente regulado pelo Provimento CNJ 65/2017, suas atualizações e também conta com a regulamentação local que deve ser observada conforme o Estado onde se pretenda a regularização imobiliária por esta via - devendo sempre ser recordado que é OBRIGATÓRIA A PRESENÇA DE ADVOGADO neste procedimento.
Um ponto importante que merece análise diz respeito à possibilidade do titular registral interromper a prescrição aquisitiva para, atacando-a, defender e manter sua propriedade. O citado artigo 1.228 é claro quando legitima o proprietário a reaver seu imóvel "do poder de quem quer que injustamente o possua ou detenha". Antes de tudo merece igualmente destaque o conteúdo do seu par. primeiro que sentencia:
"O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas FINALIDADES ECONÔMICAS E SOCIAIS e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas".
Reza o caput do artigo 1.228:
"Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha".
Na prática sabemos que o proprietário do imóvel (aquele que consta no RGI) deverá integrar o polo passivo de eventual Ação de Usucapião (ou procedimento Extrajudicial) sob pena de nulidade. Nesse ponto, muito importante as informações que constam da certidão do RGI já que esta demonstrará quem é efetivamente o titular registral - cf. art. 1.245 do CCB - que perderá o imóvel no procedimento de Usucapião em favor de quem demonstrar seus requisitos. O mesmo vale na via extrajudicial, como se observa do Provimento CNJ 65/2017 - sendo certo que o fato de não ser localizado não impedirá o prosseguimento do procedimento já que a NOTIFICAÇÃO POR EDITAL (art. 11 do Provimento)é admitida na via extrajudicial tal como a CITAÇÃO POR EDITAL (art. 256 do CPC)é pacificamente permitida na via judicial.
Temos que efetivamente se o titular registral exercer todos os atributos da propriedade não deverá JAMAIS temer a Usucapião, todavia, é lição ainda dos bancos acadêmicos que "o direito não socorre os que dormem". Em outras palavras, usucapião não ocorrerá se o proprietário registral do seu imóvel cuidar, exercendo sobre ele principalmente o seu direito de propriedade, não permitindo que outrem sobre ele semeiem e frutifiquem todos os requisitos necessários à usucapião. A oposição do titular registral deve ser efetiva e TEMPESTIVA. Ora, não adianta reclamar a propriedade quando o usucapiente já tiver preenchido os requisitos para a Usucapião. Basta lembrar, como enfatizamos diversas vezes, que a USUCAPIÃO ocorre com o mero preenchimento dos requisitos legais. Não são sentença ou registro requisitos para seu nascimento. Esses só operam efeitos declaratórios (e não constitutivos) sobre esse instituto, como reconhece pacificamente a massiva jurisprudência dos tribunais.
A oposição pelo titular registral para evitar a aquisição por Usucapião - obviamente - precisa ser exercida ANTES da consolidação da aquisição e muito bem focada no PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS, como aponta a inafastável doutrina exarada pelo Desembargador Aposentado e especialista no assunto, Dr. BENEDITO SILVÉRIO (Tratado de Usucapião. 2012):
"A interrupção do prazo prescricional somente é possível quando ainda em curso e não quando já completado, pois qualquer oposição ocorrente após a consumação do prazo à configuração da prescrição será INOPERANTE, uma vez que não se interrompe o que já se consumou".
A jurisprudência dos tribunais é no mesmo sentido, como aponta jurisprudência do TJRS:
"TJRS. 70081045213. J. em: 15/05/2019. APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO (BENS IMÓVEIS). AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. ART. 1.238, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CCB (DEZ ANOS). LAPSO TEMPORAL. COMPROVADO. IMÓVEL DESTINADO À MORADIA DOS AUTORES. DOIS LOTES. CASA E GALPÃO CONSTRUÍDOS EM CIMA DE AMBOS OS TERRENOS. OPOSIÇÃO TARDIA. NÃO INTERRUPÇÃO DO PRAZO. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS A CONVERSÃO DA POSSE EM PROPRIEDADE NOS DOIS LOTES. 1. Requisitos para aquisição do domínio. Art. 1.238, parágrafo único, do CC. No caso vertente, decorrido mais de dez anos, sem que a parte demandada tenha adotado qualquer medida efetiva para opor-se a posse dos autores e, exercendo esses, posse mansa, pacífica, ininterrupta, com animus domini, tornando o imóvel próprio para moradia familiar, impõe-se o reconhecimento da prescrição, na forma do art. 1.238, parágrafo único, do CCB. Casa e galpão construídos em cima dos dois terrenos (lotes). Declaração de propriedade que alcança os dois lotes. 2. Notificação extrajudicial. A notificação extrajudicial realizada de forma tardia, a saber, quando já implementado o prazo prescricional não agrega efeito sobre a posse dos autores, posto que não se interrompe o que já se consumou. Doutrina e jurisprudência. APELAÇÃO PROVIDA".