Dilma Rousseff na Rússia: ex-presidente do Brasil ou presidente do NDB?

31/07/2023 às 05:33

A visita de Dilma Rousseff à Rússia como presidente do banco dos Brics visa manter canais de comunicação abertos e promover a cooperação, mas pode complicar as negociações do acordo UE-Mercosul.

Dilma Rousseff, ex-presidente do Brasil e atual presidente do banco dos Brics (Novo Banco de Desenvolvimento - NDB), recentemente fez uma visita diplomática à Rússia, onde se encontrou com o presidente Vladimir Putin. Durante a reunião, Rousseff esclareceu que o banco do BRICS, ou NDB, do qual ela é a presidente, não considerará novos projetos na Rússia devido às sanções relacionadas à guerra com a Ucrânia.

Entretanto, é importante ter em mente que a visita de Rousseff ocorre em um momento em que Putin está sendo excluído de eventos internacionais, como a próxima cúpula do BRICS em Agosto, devido a mandados de prisão emitidos contra ele pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes de guerra na Ucrânia.

Todavia, a posição de Rousseff como presidente do NDB oferece um contexto diferente para sua visita. Como tal, Rousseff tem a responsabilidade de representar e defender os interesses do grupo, que inclui a Rússia, além do Brasil, Índia, China e África do Sul.

Nesse sentido, a visita de Dilma pode ser vista menos como um endosso das ações da Rússia e mais como um esforço para manter canais de comunicação abertos e promover a cooperação dentro do grupo BRICS, e isso é particularmente relevante dado o papel do NDB em financiar projetos de desenvolvimento nos países membros do bloco.

Desse modo, é importante considerar como essa ação pode ser percebida pelo Ocidente. Visto que Dilma Rousseff, como ex-presidente do Brasil, carrega consigo o peso da representatividade do país.

Sua posição como figura política de destaque pode levar a percepções de que ela ainda representa os interesses do Brasil, mesmo em uma visita que ocorra no âmbito do NDB. Consequentemente, essa associação pode resultar em uma visão negativa do Brasil, especialmente se a visita for interpretada como um endosso das ações da Rússia na Ucrânia.

Isso é particularmente relevante quando se considera o acordo entre a União Europeia e o Mercosul. Este acordo, que visa criar uma das maiores áreas de livre comércio do mundo, já enfrenta obstáculos devido a preocupações ambientais e de direitos humanos. Como resultado, o encontro de Dilma com Putin, apesar das controvérsias em torno de sua conduta na Ucrânia, pode complicar ainda mais as negociações.

Isso fica ainda mais evidente se levarmos em conta que durante o governo Bolsonaro, a imagem do Brasil na União Europeia sofreu um impacto significativo, principalmente devido a questões ambientais e de direitos humanos.

Naquela época, a política ambiental de Bolsonaro levou a um aumento no desmatamento da Amazônia. Isso gerou críticas internacionais e levou a questionamentos sobre o compromisso do Brasil com os objetivos de sustentabilidade, que são uma parte importante do acordo UE-Mercosul.

Cabe destacar que, poucos dias antes do início da guerra na Ucrânia, o então presidente Jair Bolsonaro também fez uma visita à Rússia. Essa visita, que ocorreu em um momento de tensões crescentes entre a Rússia e a Ucrânia, já havia levantado questões sobre a posição do Brasil em relação ao conflito iminente.

Como resultado, a visita de Bolsonaro à Rússia foi vista por muitos como um sinal de apoio ao governo de Putin, apesar das crescentes preocupações internacionais sobre um possível ataque da Rússia à Ucrânia.

Logo, o conjunto de fatores recentes, incluindo a visita do chanceler russo ao Brasil, as declarações do presidente Lula sobre a Ucrânia, e a busca por um mundo multipolar, estão criando um cenário complexo para a política externa brasileira. Embora cada um desses elementos possa ser justificado individualmente, juntos, eles podem ser mal interpretados.

É perceptível que posição tradicionalmente imparcial do Brasil em questões internacionais tem sido uma de suas forças na diplomacia global e que isso permitiu ao Brasil manter relações com uma ampla gama de países, desempenhando um papel de mediador em várias questões internacionais. No entanto, a recente série de eventos pode colocar essa imparcialidade em questão.

Embora seja importante para o Brasil manter relações fortes com uma variedade de nações, também é crucial considerar como essas ações são percebidas no cenário global. A visita pode ter sido feita com as melhores intenções para as relações internacionais do Brasil, mas as repercussões potenciais não devem ser subestimadas.

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Sobre o autor
Pedro Vitor Serodio de Abreu

LL.M. em Direito Econômico Europeu, Comércio Exterior e Investimento pela Universität des Saarlandes. Legal Assistant na MarketVector Indexes.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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