Neste artigo, cabe trazer a distinção entre o Capital Social e o Patrimônio Social para que não haja dúvidas em artigos posteriores em relação ao assunto da Desconsideração da Personalidade Jurídica e ainda é um ponto que muitos acabam se confundido na prática.
Pois bem, o Capital Social possui um conceito simples, porém um pouco místico para sua criação. Hoje para uma pessoa mais leiga no assunto, um simples sujeito que vai abrir a sua empresa e pensa que o Capital Social a ser colocado no Contrato Social e enviado para a Junta Comercial, seria o valor total investido para abrir sua empresa.
Cabe uma breve ressalva que, ao se analisar algumas empresas e verificar no site da Receita Federal, o Capital Social colocado nunca irá se refletir no que realmente há de patrimônio, salvo em alguns casos onde o negócio é pequeno. Então a pergunta que fica é, qual o sentido do instituto do Capital Social se hoje, após a lei da liberdade econômica, possibilita a constituição de uma sociedade empresária com R$1.000,00 (mil reais) ou menos? Ou melhor, a entrada de um sócio no quadro societário da empresa com apenas incríveis R$1,00 (um real)?
Se for levado em conta que uma das conceituações mais aceitas do Capital Social é de que ele é uma referência do porte da empresa, não se pode levar em conta, por exemplo, um Capital Social no valor de R$10.000,00 (dez mil reais) e um Patrimônio Social de mais de R$1.000,000.00 (um milhão de reais), em uma hipótese que essa sociedade seja no regime limitada (LTDA) e contraia uma dívida superior ao seu patrimônio e no fim acabe sendo apenas responsabilizada no valor do Capital Social alocado, porque a Lei determina assim.
Você pode questionar, "Mas há a desconsideração da personalidade quando há fraude ou confusão patrimonial". Porém me diga meu caro e bom leitor, onde está a fraude ou a confusão patrimonial aqui? Se a Junta Comercial deferiu o pedido de abertura de empresa e a Receita Federal deu o CNPJ, isso quer dizer que no decorrer de todo o trâmite administrativo não houve e nem foi achado mínimos indícios para que o pedido fosse indeferido.
Segundo o autor Ivens Henrique Hubert (HUBERT, 2012, p. 50-56), o conceito de capital social nas sociedades comerciais é apenas um elemento da estruturação legal que, como mencionado acima, embora indicado, não é eficaz. Cumpre ressaltar que, o Capital Social informado é nada mais do que o valor que o sócio ou os sócios aportam na sociedade com uma expectativa de lucro futuramente, pois logicamente ninguém investiria em um negócio fadado ao fracasso. E também há uma outra possibilidade de que a sociedade seja inteiramente financiada com capital e recursos de terceiros, e que isso seja incluído no Capital Social.
Em palavras do saudosismo autor Fábio Ulhoa Coelho: “as sociedades têm, basicamente, dois meios de obter os recursos de que necessitam, a capitalização e o financiamento. No primeiro caso, recebe dos sócios recursos que ela não tem o dever de restituir ou remunerar, embora possa fazê-lo, se atendidos certos pressupostos econômicos e jurídicos. No segundo caso, seja o financiamento bancário, seja o efetivado por securitização (emissão de debêntures ou comercial papper), ela se torna devedora dos prestadores de recursos, ou seja, tem a obrigação de restituir o valor destes, com os acréscimos remuneratórios”. (COELHO, 2002, p. 156)
As debêntures que o autor cita, é um título de dívida que gera um direito de crédito ao investidor. Ou seja, o mesmo terá direito a receber uma remuneração do emissor (geralmente juros) e periodicamente ou quando no vencimento do título receberá de volta o valor investido (principal). No Brasil, as debêntures constituem uma das formas mais antigas de captação de recursos por meio de títulos. Então as debêntures é como se fosse uma espécie de empréstimo que ela faz com pessoas jurídicas ou físicas na B3 BOVESPA, onde esses sujeitos compram esses papéis de título privado através de uma corretora de valores, e recebem juros do valor total investido após o tempo que a empresa emissora da debênture estipulou para vencimento.
Voltando para o Capital Social, no entendimento dos autores do projeto de Lei 6.404/76, em sua Exposição de Motivos, o Capital Social seria: “O montante de capital financeiro de propriedade da companhia que os acionistas vinculam ao seu patrimônio como recursos próprios destinados de modo permanente à realização do objeto social” (BATALHA, 1977, p. 108) e (MAGALHÃES, 1977, p. 106).
Com o Capital Social em todas as sociedades empresariais, algumas tarefas societárias são configuradas como resultado da integração do conceito de autonomia patrimonial no direito moderno, como assinala Jorge Lobo: “Consagrado, depois de lenta evolução, o princípio excepcional da responsabilidade limitada dos acionistas das anônimas e admitida a constituição do patrimônio separado, consequência direta do reconhecimento da personalidade jurídica das companhias, que impede a execução dos bens dos sócios por dívidas da sociedade, foi necessário elaborar um conceito de capital, definir lhe as funções e instituir normas para garantir a sua integridade”. (LOBO, 1988, p. 55)
Isso apresenta um certo inconveniente quando estamos lidando com LTDA’s, pois não é muito coerente quando o sócio ou sócios assinam o valor da dívida, e as leis nesses casos apenas exigem que eles sejam responsáveis dentro de seu Capital Social.
Adiante com a conceituação teórica do capital social, Carvalho de Mendonça ensinava, em sua doutrina do início do século XX, que: “o capital social é um fundo originário e essencial da sociedade, fixado pela vontade dos sócios; é o monte constituído para a base das operações” (CARVALHO DE MENDONÇA, 1963, p. 29)
Já o autor mais recente, Fábio Ulhoa Coelho possui uma caracterização um pouco diferente sobre o assunto: “o capital social de uma sociedade pode ser compreendido como uma medida da contribuição dos sócios, e acaba servindo de referência à sua força econômica”. (COELHO, 2002, p. 157)
Como é visto, o conceito do primeiro demandante será um princípio do nascimento da sociedade, um valor digital que começa a funcionar, mas após analisar alguns CNPJ na receita federal e validar as alocações de capital social. No consenso comum, a conceituação do segundo autor está mais próxima da realidade, não dizendo quem está certo e quem está errado, mas o entendimento de que o capital social acaba se tornando referência da situação econômica está mais próximo da realidade atual.
Agora aqui se faz a seguinte analogia: um sujeito que resolve abrir uma pequena panificadora precisará fazer todo o trâmite que qualquer outra sociedade precisa fazer para se regular tanto na Junta Comercial, quanto na Receita Federal, logo hoje com a possibilidade da sociedade unipessoal, esse sujeito logicamente irá colocar o Capital Social em R$ 1.000,00 ou um pouco mais dependendo da situação. Em um segundo caso que esse sujeito vá abrir um posto de combustível, ele poderia também colocar o Capital Social em R$ 1.000,00.
É um tanto quanto curioso ao se pensar que o Capital Social de uma pequena Panificadora, em alguns casos, pode se deparar com o mesmo Capital Social de um Posto de Combustível. Antes do ano de 2019 se uma sociedade quisesse se enquadrar com responsabilização limitada, a melhor opção era EIRELI, porém hoje no ano de 2023 podemos começar a ver nos próximos anos, bizarrices como a da analogia feita.
Prosseguindo para a seara do Patrimônio Social, de modo geral é um conjunto de valores de conteúdo econômico, positivos e negativos, vinculados a uma pessoa. Em outras palavras, todo sócio que contrai para si, dívidas, lucros, obrigações e bens, estamos falando de patrimônio social, é um complexo de relações jurídicas, demonstrações contábeis e seus passivos são divididos em dois grupos: exigíveis, correspondentes a dívidas à companhia e a terceiros; caso contrário, inexigível, no caso do patrimônio líquido (PL). O PL inclui a conta do patrimônio líquido e o detalhamento do valor efetivamente integralizado. O capital de terceiros, que representa por outros meios de aquisição de recursos em nome da empresa, não faz parte do PL, mas está incluído no passivo (exigível) da empresa.
A demonstração contábil inexigível para Comparato é: “Registra as quantias que caberiam aos sócios, na liquidação da sociedade, depois de pagas as dívidas sociais” (COMPARATO, 1995, p. 132).
Sendo o Patrimônio Social um elemento essencial em qualquer sociedade quando se fala que a constitui em extensão da personalidade jurídica.
Para Ivens Henrique Hubert em seu livro Sociedade Empresária e Capital Social, cita que: “Todavia, nas sociedades anônimas e nas sociedades limitadas, o capital social é um elemento imprescindível, na medida em que nelas ele exerce, de modo geral, todas as funções a que se destina. Através dele, define-se uma situação de equilíbrio e distribuição de prerrogativas na sociedade e atribui-se, nos termos das regras definidas para a sociedade, o poder relativo de cada sócio (ou grupo de sócios).” (HUBERT, 2012, p. 56)
É compreensível que para o Autor, nas sociedades limitadas o Capital Social seria um ponto de partida para atribuição de funções dentro da sociedade, como por exemplo, quem será o sócio administrador e responsável pelos atos que os outros sócios possam a vir cometer. No entanto é visto que isso poderia se resolver com um simples acordo ou contrato firmado à parte, pois nem sempre quem integraliza mais capital, possui o interesse de administrar, e nesses casos acabam escolhendo um terceiro para exercer a função de administrador para eles.
E nesse ponto onde não é visto a necessidade em Sociedades Limitadas de haver a comprovação do Capital Social e pior ainda quando na Lei é descrito que nessas sociedades, os sócios apenas irão responder pela cifra denominada no Contrato Social com a integralização do Capital pelo sócio(s).