Breves considerações acerca dos princípios do direito tributário

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INTRODUÇÃO

Os princípios no Direito Tributário desempenham um papel fundamental na definição das bases que norteiam as normas e a aplicação das leis fiscais em um determinado país ou sistema jurídico. Eles constituem os fundamentos essenciais que visam garantir a justiça, a equidade, a legalidade e a eficiência da tributação em uma sociedade. A importância desses princípios é inegável, pois eles fornecem diretrizes para a criação, interpretação e implementação das normas tributárias, promovendo a segurança jurídica e a estabilidade das relações entre os contribuintes e o Estado.

            A observância dessas normas no âmbito do Direito Tributário garante a previsibilidade e a consistência das decisões e dos procedimentos fiscais. A clareza e a coerência que os princípios proporcionam ao sistema fiscal evitam discrepâncias e favorecem a correta aplicação das leis, reduzindo assim a margem para arbitrariedades por parte da administração pública, o que resulta, por sua vez, em um ambiente mais seguro e confiável para os contribuintes.

            Tais princípios também têm uma importante função na promoção da justiça fiscal. Através da equidade e da capacidade contributiva, esses princípios buscam distribuir os encargos tributários de forma mais justa e proporcional entre os contribuintes, levando em consideração as diferenças de renda e riqueza. Dessa forma, a tributação se torna um instrumento de políticas públicas que pode contribuir para reduzir as desigualdades sociais e promover uma sociedade mais inclusiva.

            Portanto, é de extrema importância expor e aprofundar a discussão relativa aos princípios do direito tributário, tendo em vista que são eles que representam a base da matéria e possibilitam a mais correta aplicação da lei. 

Princípio da Legalidade

            O princípio da legalidade no direito tributário é uma garantia constitucional que visa proteger os contribuintes de arbitrariedades e abusos por parte do Estado na cobrança de tributos. Tal princípio está previsto no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, o qual dispõe que: 

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - Exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; 

            A finalidade do princípio da legalidade tributária é assegurar a segurança jurídica, a previsibilidade, a transparência e a participação democrática na definição da política tributária. Por meio desse princípio, o legislador constituinte limitou o poder de tributar dos entes federativos, submetendo-os ao princípio da reserva legal. Isso significa que somente a lei em sentido estrito (lei ordinária ou lei complementar) pode criar ou modificar tributos, definindo seus elementos essenciais, como fato gerador, base de cálculo, alíquota e sujeitos passivo e ativo. 

Princípio da Isonomia

            Disposto no artigo 150, inciso II, da Constituição Federal, tal princípio busca garantir um tratamento igualitário aos contribuintes que se encontram em situações equivalentes, bem como um tratamento diferenciado aos que se encontram em situações desiguais, na medida de suas desigualdades. Lê-se. 

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[…]

II - Instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos; 

            O princípio da isonomia tem origem no princípio da igualdade, consagrado no artigo 5º da Constituição Federal, que estabelece que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. No entanto, a igualdade formal não é suficiente para garantir a justiça social, à vista de que existem diferenças econômicas, sociais e culturais entre os indivíduos e os grupos sociais. Por isso, o princípio da isonomia busca realizar a igualdade material, que consiste em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam.

            No âmbito do direito tributário, o princípio da isonomia tem duas dimensões: a horizontal e a vertical. A dimensão horizontal diz respeito ao tratamento igualitário entre os contribuintes que se encontram em situações equivalentes, ou seja, que possuem a mesma capacidade contributiva. A capacidade contributiva é a aptidão para suportar o ônus tributário, de acordo com a manifestação de riqueza do contribuinte. Assim, o princípio da isonomia horizontal impede que a lei tributária estabeleça distinções arbitrárias ou injustificadas entre contribuintes que possuem o mesmo nível de renda, patrimônio ou consumo.

            A dimensão vertical do princípio da isonomia diz respeito ao tratamento diferenciado entre os contribuintes que se encontram em situações desiguais, ou seja, que possuem capacidades contributivas distintas. Nesse caso, o princípio da isonomia vertical visa realizar a progressividade tributária, que consiste em estabelecer alíquotas maiores para os contribuintes que possuem maior capacidade contributiva e alíquotas menores para os que possuem menor capacidade contributiva. A progressividade tributária tem como objetivo reduzir as desigualdades sociais e econômicas e promover a redistribuição de renda.

            O princípio da isonomia no direito tributário é, portanto, um instrumento de realização dos valores constitucionais da dignidade da pessoa humana, da solidariedade social e da justiça fiscal. Por isso, ele deve servir como orientação da atividade legislativa e administrativa do Estado na instituição e na cobrança dos tributos. Além disso, ele deve ser observado pelos contribuintes no cumprimento de suas obrigações tributárias. Dessa forma, o princípio da isonomia no direito tributário contribui para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e democrática. 

Princípio da Capacidade Contributiva

            Segundo esse princípio, os tributos devem ser cobrados de acordo com a possibilidade econômica de cada um, ou seja, quem tem mais deve pagar mais, e quem tem menos deve pagar menos.

            No Brasil, o princípio da capacidade contributiva foi consagrado na Constituição Federal de 1988, que estabelece no artigo 145, § 1º que: 

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. 

            A capacidade contributiva pode ser analisada sob duas perspectivas: objetiva e subjetiva. A perspectiva objetiva diz respeito à escolha dos fatos geradores dos tributos pelo legislador. Segundo essa perspectiva, o legislador deve eleger apenas manifestações de riqueza ou de potencialidade econômica para compor as hipóteses de incidência das normas tributárias. Por exemplo, não se pode tributar o simples fato de existir ou de respirar, pois isso não revela capacidade econômica alguma.

            Já a perspectiva subjetiva diz respeito à quantificação dos tributos pelo legislador. Segundo essa perspectiva, o legislador deve levar em conta as características pessoais do contribuinte na definição das bases de cálculo e das alíquotas dos tributos. Por exemplo, não se pode cobrar o mesmo valor de IR de uma pessoa que ganha um salário mínimo por mês e de uma pessoa que ganha dez salários mínimos por mês.

            O princípio da capacidade contributiva se aplica plenamente aos impostos, pois eles são tributos não vinculados a uma contraprestação estatal, e devem refletir a capacidade econômica do contribuinte. Já as taxas e as contribuições de melhoria são tributos vinculados a uma contraprestação estatal, e devem refletir o custo ou o benefício da atividade ou da obra pública para o contribuinte. Portanto, o princípio da capacidade contributiva se aplica de forma mitigada a esses tributos, pois eles devem obedecer ao princípio da proporcionalidade.         

Princípio do Não-Confisco

            Previsto no artigo 150, inciso IV, da Constituição Federal, esse princípio visa proteger o patrimônio e a dignidade dos contribuintes, impedindo que o Estado se aproprie indevidamente de seus bens ou rendas por meio da cobrança de tributos excessivos ou desproporcionais, e se caracterizando de um limite imposto pela Constituição Federal ao poder de tributar do ente estatal. 

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

IV - Utilizar tributo com efeito de confisco; 

            A aplicação do princípio da vedação ao confisco no direito tributário envolve algumas questões complexas e controvertidas, tais como: Como identificar e mensurar o efeito confiscatório de um tributo? Quais são os critérios e os parâmetros para aferir a razoabilidade e a proporcionalidade da carga tributária? Quais são os limites e as exceções ao princípio da vedação ao confisco? Como conciliar o princípio da vedação ao confisco com outros princípios constitucionais, como o da capacidade contributiva, o da igualdade, o da progressividade e o da seletividade?

            A doutrina e a jurisprudência têm buscado responder a essas questões com base em diferentes conceitos, teorias e métodos. Alguns autores defendem que o confisco deve ser analisado sob uma perspectiva global, considerando a carga tributária total suportada pelo contribuinte em relação à sua renda ou patrimônio. Outros autores sustentam que o confisco deve ser verificado sob uma perspectiva específica, levando em conta a natureza, a finalidade e a incidência de cada tributo isoladamente. Há ainda aqueles que propõem uma abordagem mista, combinando os aspectos globais e específicos na avaliação do confisco.

            Diante desse cenário, pode-se concluir que o princípio da vedação ao confisco no direito tributário não possui um conteúdo fixo e definitivo, mas sim um conteúdo dinâmico e relativo, que depende de uma interpretação sistemática e teleológica da Constituição, bem como de uma ponderação de valores e interesses em cada caso concreto. Assim, cabe ao legislador, ao administrador e ao juiz observar esse princípio com prudência e equilíbrio, buscando harmonizar os objetivos da arrecadação fiscal com os direitos dos contribuintes. 

Princípio da Irretroatividade

            O fundamento constitucional desse princípio está no artigo 150, inciso III, alínea a, da Constituição Federal de 1988, que veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios cobrar tributos em relação a fatos geradores anteriores à lei que os instituiu ou aumentou. 

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Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[...]

III - cobrar tributos:

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado; 

            O CTN, por sua vez, regulamenta o princípio da irretroatividade no artigo 105, que estabelece que a legislação tributária se aplica imediatamente aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início mas não esteja completa nos termos do artigo 116. 

Art. 105. A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início mas não esteja completa nos termos do artigo 116.

[...]

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:

I - Tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios;

II - Tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável. 

            No entanto, o próprio CTN prevê duas exceções ao princípio da irretroatividade no artigo 106 (incisos I e II). A primeira é quando a lei tributária for expressamente interpretativa, ou seja, quando ela apenas esclarecer o sentido e o alcance de uma lei anterior. 

Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:

I - Em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados; 

Nesse caso, a lei interpretativa poderá retroagir para alcançar os fatos geradores ocorridos sob a vigência da lei interpretada, desde que não implique em aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados.

            A segunda exceção é quando a lei tributária tratar de ato não definitivamente julgado, isto é, quando ainda houver possibilidade de recurso administrativo ou judicial contra a exigência do tributo. 

Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:

II - Tratando-se de ato não definitivamente julgado:

a) quando deixe de defini-lo como infração;

b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo;

c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática. 

Assim, a lei tributária nova poderá retroagir para beneficiar o contribuinte nas seguintes hipóteses: quando deixar de definir um ato como infração; quando deixar de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo; ou quando lhe cominar penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática.

            Essas exceções visam respeitar o princípio da retroatividade benigna ou favorável ao contribuinte, que é um corolário do princípio da legalidade tributária. Esse princípio determina que nenhum tributo será cobrado ou aumentado sem lei que o estabeleça. Logo, se uma lei nova reduzir ou extinguir um tributo ou uma penalidade, ela deverá ser aplicada aos fatos anteriores que ainda não foram definitivamente julgados.

            Portanto, pode-se concluir que o princípio da irretroatividade no direito tributário é uma garantia constitucional do contribuinte contra as alterações legislativas que possam prejudicar os seus direitos e interesses. Esse princípio só admite exceções quando a lei tributária nova for interpretativa ou favorável ao contribuinte, respeitando-se sempre o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. 

Princípio da Anterioridade

            O princípio da anterioridade no direito tributário é uma garantia constitucional que visa proteger o contribuinte de cobranças ou aumentos de tributos de forma imprevista e abrupta. Esse princípio limita o poder do Estado de instituir ou majorar tributos, exigindo que se respeite um intervalo de tempo entre a publicação da lei que cria ou altera o tributo e a sua efetiva cobrança.

            Existem dois tipos de anterioridade no direito tributário: a anterioridade de exercício e a anterioridade nonagesimal. A anterioridade de exercício, prevista no art. 150, III, b, da Constituição Federal, determina que nenhum tributo pode ser cobrado no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou. Isso significa que se uma lei for publicada em 2023, por exemplo, o tributo só poderá ser cobrado a partir de 2024. Essa regra visa garantir um planejamento financeiro adequado ao contribuinte, que terá um ano para se adaptar à nova carga tributária.

            A anterioridade nonagesimal, prevista no art. 150, III, c, da Constituição Federal, determina que nenhum tributo pode ser cobrado antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou. Isso significa que se uma lei for publicada em 1º de janeiro de 2024, por exemplo, o tributo só poderá ser cobrado a partir de 1º de abril de 2024. Essa regra visa garantir um mínimo de segurança jurídica ao contribuinte, que terá um prazo razoável para conhecer e cumprir suas obrigações tributárias.

            Os dois tipos de anterioridade são cumulativos, ou seja, devem ser observados simultaneamente pelo legislador e pelo Fisco. Assim, um tributo só poderá ser cobrado após o transcurso do prazo nonagesimal e após o início do exercício financeiro seguinte ao da publicação da lei. Porém, existem algumas exceções a esse princípio, previstas na própria Constituição Federal ou em outras leis complementares. Algumas dessas exceções são:

            - Imposto sobre importação e exportação: esses impostos podem ser alterados por decreto do Poder Executivo, sem necessidade de lei, e podem ter sua alíquota variada em função da política cambial ou comercial do país.

            - Imposto sobre operações financeiras: esse imposto pode ser alterado por decreto do Poder Executivo, sem necessidade de lei, e pode ter sua alíquota reduzida ou restabelecida por ato do Conselho Monetário Nacional.

            - Imposto extraordinário de guerra: esse imposto pode ser instituído por lei ordinária em caso de guerra externa ou sua iminência, e pode ser cobrado imediatamente após a sua publicação.

            - Empréstimo compulsório: esse tributo pode ser instituído por lei complementar em caso de guerra externa ou sua iminência, calamidade pública ou investimento público de caráter urgente e relevante, e pode ser cobrado imediatamente após a sua publicação.

Imposto sobre produtos industrializados: esse imposto pode ter sua alíquota alterada por decreto do Poder Executivo, sem necessidade de lei, mas deve respeitar o prazo nonagesimal para sua cobrança.

            O princípio da anterioridade no direito tributário é uma importante limitação ao poder de tributar do Estado, que visa assegurar ao contribuinte o direito de não ser surpreendido por novas exigências fiscais sem um período adequado para se preparar. Esse princípio reflete os valores da segurança jurídica, da previsibilidade e da capacidade contributiva, que são fundamentais para uma relação tributária justa e equilibrada entre o Estado e os cidadãos. 

Princípio da uniformidade Geográfica

            O princípio da uniformidade geográfica no direito tributário é um dos princípios que regem a competência tributária da União, visando garantir a igualdade e a harmonia entre os entes federativos. Esse princípio está previsto no artigo 151, I, da Constituição Federal de 1988, que dispõe: 

Art. 151. É vedado à União:

I - Instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do País; 

            A uniformidade geográfica implica que a União deve tratar todos os contribuintes de forma igualitária, sem discriminar ou favorecer determinadas regiões ou localidades. Assim, a União não pode criar tributos com alíquotas, bases de cálculo, fatos geradores ou formas de arrecadação diferentes em função do local onde o contribuinte reside ou exerce sua atividade econômica. Por exemplo, a União não pode estabelecer uma alíquota maior do imposto de renda para os contribuintes que moram no Nordeste e uma alíquota menor para os que moram no Sul.

            O princípio da uniformidade geográfica visa preservar o equilíbrio federativo e o pacto federativo, evitando que a União interfira na autonomia dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, ou que crie desigualdades regionais ou sociais. Além disso, esse princípio busca assegurar a segurança jurídica e a previsibilidade dos contribuintes, que devem conhecer as regras tributárias aplicáveis em todo o território nacional, sem surpresas ou arbitrariedades.

            No entanto, o princípio da uniformidade geográfica não é absoluto e admite exceções. A própria Constituição Federal autoriza a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do país. Esses incentivos fiscais consistem em reduções ou isenções de tributos federais para estimular atividades econômicas em áreas menos desenvolvidas ou estratégicas. Um exemplo de incentivo fiscal é o concedido à Zona Franca de Manaus, que tem como objetivo fomentar o polo industrial e comercial da região Norte.

            Outra exceção ao princípio da uniformidade geográfica é a possibilidade de instituir impostos seletivos em função da essencialidade das mercadorias ou dos serviços. Esses impostos têm uma finalidade extrafiscal, ou seja, não visam apenas arrecadar recursos para o Estado, mas também regular o consumo e a produção de bens e serviços que tenham impacto social, ambiental ou econômico. Um exemplo de imposto seletivo é o imposto sobre produtos industrializados (IPI), que pode ter alíquotas maiores para produtos considerados supérfluos ou prejudiciais à saúde, como cigarros e bebidas alcoólicas.

            Portanto, o princípio da uniformidade geográfica no direito tributário é um princípio que limita a competência tributária da União, buscando garantir a igualdade e a harmonia entre os entes federativos, bem como a segurança jurídica e a previsibilidade dos contribuintes. No entanto, esse princípio não é absoluto e admite exceções que visam atender a outros valores constitucionais, como o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as regiões do país e a regulação do consumo e da produção de bens e serviços essenciais ou nocivos. 

Princípio da liberdade de tráfego

            O princípio da liberdade de tráfego é um dos princípios constitucionais tributários vigentes no Brasil, que visa garantir a livre circulação de pessoas e bens entre as unidades federativas e os municípios, sem que haja restrições ou discriminações por meio de tributos. Esse princípio está previsto no artigo 150, inciso V, da Constituição Federal de 1988, que dispõe: 

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

V - Estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público; 

            Esse princípio tem como fundamentos a liberdade de locomoção (de pessoas ou de bens), a liberdade de comércio e o princípio federativo. A liberdade de locomoção é um direito fundamental previsto no artigo 5º, inciso XV, da Constituição Federal, que assegura a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país o direito de ir e vir dentro do território nacional. A liberdade de comércio é uma decorrência do princípio da livre iniciativa, que está consagrado no artigo 170 da Constituição Federal, como um dos fundamentos da ordem econômica. O princípio federativo é um dos pilares do Estado brasileiro, que se organiza em uma federação composta pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, todos autônomos nos termos da Constituição Federal (artigo 1º).

            A aplicação desse princípio implica que os tributos não podem ter como fato gerador a simples transposição de fronteiras interestaduais ou intermunicipais. Isso significa que não se pode cobrar impostos sobre a entrada ou saída de pessoas ou bens de um Estado ou Município para outro. Por exemplo, não se pode cobrar ICMS sobre a entrada de mercadorias provenientes de outro Estado ou Município no território do Estado ou Município destinatário. O ICMS só pode incidir sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (artigo 155, inciso II, da Constituição Federal). Nesse caso, o fato gerador do ICMS não é a transposição de fronteiras, mas a transferência da titularidade das mercadorias ou a prestação dos serviços.

            O princípio da liberdade de tráfego tem uma grande importância para o desenvolvimento econômico e social do país, pois estimula a integração nacional e a livre concorrência entre os agentes econômicos. Além disso, esse princípio protege os contribuintes de possíveis abusos ou arbitrariedades por parte dos entes tributantes, que poderiam utilizar os tributos como instrumentos de coerção ou discriminação. 

Princípio da transparência

            O princípio da transparência no direito tributário é um dos princípios constitucionais que regem a atividade tributária do Estado. Esse princípio visa garantir que os contribuintes tenham acesso à informação clara e adequada sobre os tributos que incidem sobre as operações econômicas que realizam ou participam, bem como sobre os recursos arrecadados e a sua destinação.

            O princípio da transparência no direito tributário está previsto no artigo 150, §5º, da Constituição Federal de 1988, que determina: 

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

§ 5º - A lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços. 

            O princípio da transparência no direito tributário também se relaciona com outros princípios constitucionais, como o da legalidade, o da anterioridade, o da irretroatividade, o da igualdade, o da uniformidade geográfica, o da vedação de confisco, o da não-cumulatividade e o da liberdade de tráfego. Todos esses princípios visam limitar o poder de tributar do Estado e proteger os direitos e garantias dos contribuintes.

            A importância do princípio da transparência está em assegurar que os contribuintes possam exercer o seu direito de fiscalizar a atuação do Estado na área tributária, bem como de planejar as suas atividades econômicas de acordo com a carga tributária vigente. Além disso, esse princípio contribui para a educação fiscal dos cidadãos, para a conscientização sobre a função social dos tributos e para a prevenção de conflitos e litígios tributários.

            Portanto, tal preceito se mostra como instrumento de democracia participativa, de controle social e de justiça fiscal. Ele representa um valor jurídico que deve orientar e vincular a criação e a interpretação das normas tributárias, garantindo a segurança e a confiança nas relações entre o Estado e os contribuintes. 

Princípio da não-cumulatividade

O princípio da não-cumulatividade é uma limitação constitucional ao poder de tributar, que visa evitar a incidência repetida de um mesmo tributo sobre uma cadeia de operações ou fatos geradores. Esse princípio busca garantir a neutralidade tributária, ou seja, que o tributo não interfira na livre concorrência e na formação de preços dos produtos e serviços.

            No Brasil, o princípio da não-cumulatividade está previsto na Constituição Federal de 1988 para os seguintes tributos: Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Contribuição para o Programa de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS).

            A aplicação do princípio da não-cumulatividade varia conforme o tributo e a legislação infraconstitucional que o regulamenta. Em geral, o princípio permite que o contribuinte se credite do valor do tributo pago nas operações ou fatos geradores anteriores, compensando-o com o valor do tributo devido nas operações ou fatos geradores posteriores. Assim, o tributo incide apenas sobre o valor agregado em cada etapa da cadeia produtiva ou econômica.

            No entanto, existem algumas exceções e restrições ao princípio da não-cumulatividade, que podem gerar situações de cumulatividade parcial ou total. Por exemplo, no caso do ICMS, a Constituição Federal prevê que a não-cumulatividade será observada em relação às operações anteriores realizadas no mesmo Estado ou no Distrito Federal, mas não em relação às operações interestaduais. Além disso, a Constituição Federal autoriza os Estados e o Distrito Federal a concederem benefícios fiscais unilaterais, sem a aprovação do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), para as operações que destinem mercadorias ou serviços a consumidor final localizado em outro Estado, desde que o destinatário seja contribuinte do ICMS. Essas situações podem gerar uma guerra fiscal entre os Estados e o Distrito Federal, bem como uma distorção na repartição das receitas tributárias entre eles.

            No caso do IPI, a Constituição Federal estabelece que a não-cumulatividade será observada em relação ao imposto incidente sobre matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem adquiridos de pessoa jurídica domiciliada no País. No entanto, a legislação infraconstitucional prevê algumas hipóteses de vedação ao crédito do IPI, como por exemplo, nas operações com produtos isentos ou não tributados, nas saídas de produtos para exportação e nas entradas de produtos importados por pessoa física ou jurídica não contribuinte do imposto. Essas hipóteses podem gerar uma cumulatividade indireta do IPI, onerando os custos dos produtos finais.

            No caso do PIS/PASEP e da COFINS, a Constituição Federal prevê que essas contribuições poderão ser não-cumulativas, conforme definido em lei. A legislação infraconstitucional criou dois regimes de incidência dessas contribuições: o regime cumulativo e o regime não-cumulativo. O regime cumulativo aplica-se às pessoas jurídicas optantes pelo Simples Nacional e às pessoas jurídicas tributadas pelo Imposto de Renda com base no lucro presumido ou arbitrado. Nesse regime, as alíquotas são menores (0,65% para o PIS/PASEP e 3% para a COFINS), mas não há direito ao crédito das contribuições pagas nas etapas anteriores da cadeia produtiva ou econômica. O regime não-cumulativo aplica-se às pessoas jurídicas tributadas pelo Imposto de Renda com base no lucro real. Nesse regime, as alíquotas são maiores (1,65% para o PIS/PASEP e 7,6% para a COFINS), mas há direito ao crédito das contribuições pagas nas etapas anteriores da cadeia produtiva ou econômica, observados os critérios e as limitações estabelecidos em lei.

            A não-cumulatividade do PIS/PASEP e da COFINS, no entanto, não segue o mesmo modelo do IPI e do ICMS, que se baseiam no crédito físico, ou seja, no valor efetivamente pago pelo contribuinte na aquisição de insumos ou bens destinados à revenda. O PIS/PASEP e a COFINS adotam o modelo do crédito financeiro, que permite o creditamento de despesas que não se relacionam diretamente com a produção ou a comercialização dos bens e serviços, como por exemplo, as despesas com energia elétrica, aluguéis, fretes, seguros etc. Esse modelo é mais amplo e abrangente, mas também mais complexo e sujeito a controvérsias.

            Portanto, o princípio da não-cumulatividade no direito tributário brasileiro é um tema relevante e desafiador, que envolve aspectos constitucionais, legais, econômicos e sociais. O seu estudo requer uma análise crítica e comparativa dos diferentes tributos que adotam esse princípio, bem como dos benefícios e dos problemas que ele pode gerar para os contribuintes, para o Estado e para a sociedade. 

Princípio da seletividade

            O princípio da seletividade no direito tributário é um princípio constitucional que visa a adequar a carga tributária dos produtos, mercadorias e serviços à sua essencialidade para a vida humana. Segundo esse princípio, quanto mais essencial for o bem ou o serviço, menor deve ser a tributação sobre ele, e vice-versa. Assim, busca-se promover a justiça fiscal e a proteção da dignidade da pessoa humana.

            O princípio da seletividade está previsto na Constituição Federal de 1988, nos artigos 153, § 3º, I, e 155, § 2º, III. Esses artigos determinam que o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) será seletivo, em função da essencialidade do produto, e que o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços.

            A diferença entre o “será” e o “poderá” indica que o princípio da seletividade é obrigatório para o IPI e facultativo para o ICMS. No entanto, alguns autores defendem que a seletividade também deve ser observada no ICMS, em razão do princípio da capacidade contributiva, que impõe que cada um contribua nos limites de sua riqueza. Como a tributação sobre o consumo é repassada ao consumidor final, é necessário levar em conta a sua condição econômica e social na definição das alíquotas. 

CONCLUSÃO

            Ao longo deste ensaio, adentramos o universo complexo e dinâmico dos princípios do direito tributário, explorando suas bases fundamentais e sua relevância para o ordenamento jurídico. Fica evidente que tais princípios não apenas norteiam a atuação dos entes estatais na arrecadação de recursos, mas também resguardam os direitos e garantias dos contribuintes, proporcionando equilíbrio e justiça nas relações tributárias.

            Contudo, é importante ressaltar que a lista de princípios não se encerra nesses pontos, pois a doutrina e a jurisprudência têm se mostrado propensas a reconhecer novos princípios à medida que novas questões surgem. Portanto, o direito tributário é uma área em constante desenvolvimento e, como tal, afigura-se fundamental que os operadores do direito e os legisladores estejam atentos às transformações sociais e econômicas para promover a harmonia entre o Fisco e os contribuintes.

            Deste modo, conclui-se que os princípios do direito tributário desempenham um papel crucial na fundamentação e interpretação das normas fiscais, todavia, seu rol não é exaustivo. À medida que a sociedade avança e novas situações emergem, é imprescindível a continuidade da análise e incorporação de princípios que reflitam os anseios da coletividade, buscando sempre o equilíbrio entre a arrecadação estatal e a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos. Somente assim, poderemos construir uma base sólida para o sistema tributário, assegurando a efetivação dos princípios da justiça fiscal e da segurança jurídica. 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 20 maio. 2022.

BRASIL. Decreto nº 5143, de 20 de outubro de 1966. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5143.htm. Acesso em: 20 maio 2023.

Sobre o autor
Luis Roberto de Vasconcelos Maia

Acadêmico de Direito. Pesquisador pelo CNPq. Realizou aperfeiçoamento em Análise Estratégica de Negócios, em Compliance Regulatório e em Avaliação dos fatores de ESG.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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