O Testamento Público é realmente melhor e mais vantajoso que o Testamento Particular?

28/08/2023 às 11:30
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O TESTAMENTO é o instrumento muito útil para exercitar de fato o poder de disposição patrimonial por parte de quem deseja, dentro do que lei permite, dar melhor destinação a seu patrimônio para depois da sua morte. É bem verdade que o testamento também pode ter outras utilidades, como inclusive reconhecer a filiação (art. 1.609, inc. III do CCB e art. 26 do ECA). Segundo o mestre LUIZ GUILHERME LOUREIRO (Registros Públicos - Teoria e Prática. 2023),

"TESTAMENTO é o ato solene e revogável pelo qual alguém, observando as disposições legais, dispõe, no todo ou em parte, do seu patrimônio para depois de sua morte. É um ato solene pelo qual o indivíduo faz disposições de caráter patrimonial e mesmo não patrimonial, para que sejam observadas e cumpridas após a sua morte".

Pois bem, em nossa legislação o TESTAMENTO tem suas formas dispostas no Código Civil, sendo certo que dentre as formas ordinárias (art. 1.862), além do Testamento Cerrado estão o TESTAMENTO PÚBLICO e o TESTAMENTO PARTICULAR.

Quando falamos em Testamento é sempre importante esclarecer que a simples realização do Testamento não transfere desde já o patrimônio em favor dos beneficiários. Muita gente pensa que basta a realização do Testamento e a transferência já está concretizada. Ledo engano. A transferência efetiva só se dará depois da ocorrência do evento morte e depois que o testamento for devidamente aberto, registrado e cumprido (arts. 735, 736 e 737 do CPC) seguido da realização do Inventário Judicial ou Extrajudicial que formalizará a distribuição patrimonial guiada pelas disposições testamentárias - que nesse caso terão superado, inclusive, qualquer intenção de anulação por parte de quem se julgue "prejudicado" pelas disposições...

Como sabemos, o Testamento Público é aquele que tem base legal atualmente no artigo 1.864 do CCB e que possui como requisitos essenciais ser escrito por TABELIÃO ou por seu substituto legal, devendo ser lido em voz alta pelo Oficial ao Testador e a duas testemunhas a um só tempo, ou ainda, pelo testador, se o quiser, na presença das referidas testemunhas e do Oficial, devendo ser, em seguida à sua leitura, assinado por todos (Testador, Testemunhas e o Tabelião).

A outra hipótese bem comum é o Testamento Particular, que tem base no artigo 1.876 do mesmo Código Civil Brasileiro, que esclarece que o mesmo deve ser escrito de próprio punho ou mediante processo mecânico (ou eletrônico, inclusive), sendo que, se escrito de próprio punho, deve ser lido e assinado por quem o escreveu, na presença de pelo menos TRÊS testemunhas, que o devem subscrever - e, se elaborado por processo mecânico (ou eletrônico), não poderá conter rasuras ou espaços em branco, devendo ser assinado pelo testador, depois de o ter lido na presença de pelo menos TRÊS testemunhas, que também deverão subscrevê-lo. Não há necessidade no Testamento Particular de reconhecer as firmas dos signatários e nem mesmo providenciar seu arquivamento em Registro Público (RTD), porém são sugestões muito interessantes considerando as peculiaridades desse tipo de disposição.

Como sempre deixamos claro, nossa melhor sugestão em termos de Testamento, seja ele público ou particular, é que seja feito sempre com a orientação de Advogado Especialista já que nem sempre, especialmente em se tratando de Testamento Particular, o testador conhece das complexas regras de direito sucessório e principalmente tudo que a Lei lhe faculta em termos de disposições testamentárias. Da mesma forma, ainda que o Testamento Público seja feito por TABELIÃO ou seu Substituto Legal, é também verdade que esses profissionais do Direito não podem fazer as vezes do Advogado que é o único profissional autorizado por Lei a prestar consultoria e assessoria jurídica (inc. II do art. do Estauto da Advocacia - Lei Federal 8.906/94), que inclusive lhe é privativa.

Oportuno sempre recordar que as ATIVIDADES NOTARIAIS E DE REGISTRO são incompatíveis com o EXERCÍCIO DA ADVOCACIA, nos termos do inciso IV do art. 28 do mesmo Diploma Legal.

Nesse cenário, seria melhor e/ou mais vantajosa a realização das disposições testamentárias através de TESTAMENTO PÚBLICO em vez de TESTAMENTO PARTICULAR, como a Lei permite?

A bem da verdade, tanto uma forma quanto a outra deverão atender à finalidade desenhada por Lei, qual seja, dar destinação patrimonial para depois do falecimento do autor da herança - mas tudo isso é claro se de fato forem observadas as disposições legais. Nesse passo fica claro que há muito mais chance de êxito se o Testamento for feito com toda a assessoria jurídica necessária (através de Advogado) contando com toda a segurança jurídica de um ato lavrado por TABELIÃO DE NOTAS, sendo importante não esquecer que diferentemente do Testamento Particular, o Testamento Público automaticamente permanecerá arquivado nas Notas do Tabelião de modo que jamais poderá ser "esquecido", principalmente depois da edição do PROVIMENTO CNJ Nº. 56/2016 que determina a obrigatoriedade de consulta ao Registro Central de Testamentos On-Line (RCTO) para processar os Inventários e Partilhas JUDICIAIS e também para a lavratura de Escrituras Públicas de Inventários EXTRAJUDICIAIS. O Testamento Particular não aparecerá nessas consultas, infelizmente.

Não restam dúvidas, todavia, que o Testamento Particular é uma forma muito mais SIMPLES e menos ONEROSA de dispor sobre o patrimônio já que diferentemente do Testamento Público, não terá o interessado que arcar com os Emolumentos do Tabelião de Notas para sua realização - especialmente quando temos, como acontece aqui no Rio de Janeiro, regra curiosa como a da observação 30 da Tabela 07 da Portaria de Custas que a partir do ano de 2023 modificou a forma de cobrança para a lavratura dos Testamentos:

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"30ª) O testador deverá declarar, por ocasião da lavratura do testamento, o valor do seu patrimônio, para os fins previstos no Item 5, II. Não o fazendo, aplica-se o valor previsto no item 5, II, b, ato sem valor".

A compreensão da regra é fácil porém não são poucos os colegas que já se depararam com a absurda interpretação adotada por alguns Tabelionatos (que por certo será alvo de questionamento nas instâncias superiores) que teimam por obrigar que o usuário declare sempre o valor do seu patrimônio - o que necessariamente faz com que sejam cobrados emolumentos de forma ainda mais gravosa, onerando sobremaneira a lavratura, quando é possível - veja-se a parte final da disposição - não declarar o valor do patrimônio, o que faz com que os emolumentos praticados sejam os referentes a um "Ato sem valor" - muito mais barato na imensa maioria dos casos.

De toda forma, toda a cautela deve circundar a realização de um Testamento seja ele particular ou público para que o mesmo não seja anulado e com isso seja desprezado o mais importante do referido documento que é o RESPEITO à vontade do testador, como destaca a jurisprudência:

"REsp 1583314/MG. J. em: 21/08/2018. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA DE CONFIRMAÇÃO DE TESTAMENTO. FLEXIBILIZAÇÃO DAS FORMALIDADES EXIGIDAS EM TESTAMENTO PARTICULAR. POSSIBILIDADE. CRITÉRIOS. VÍCIOS MENOS GRAVES, PURAMENTE FORMAIS E QUE NÃO ATINGEM A SUBSTÂNCIA DO ATO DE DISPOSIÇÃO. LEITURA DO TESTAMENTO NA PRESENÇA DE TESTEMUNHAS EM NÚMERO INFERIOR AO MÍNIMO LEGAL. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO GRAVE APTO A INVALIDAR O TESTAMENTO. AUSÊNCIA, ADEMAIS, DE DÚVIDAS ACERCA DA CAPACIDADE CIVIL DO TESTADOR OU DE SUA VONTADE DE DISPOR. FLEXIBILIZAÇÃO ADMISSÍVEL. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO. (...). 2- O propósito recursal é definir se o vício formal consubstanciado na leitura do testamento particular apenas a duas testemunhas é suficiente para invalidá-lo diante da regra legal que determina que a leitura ocorra, ao menos, na presença de três testemunhas. 3- A jurisprudência desta Corte se consolidou no sentido de que, para preservar a VONTADE DO TESTADOR, são admissíveis determinadas flexibilizações nas formalidades legais exigidas para a validade do testamento particular, a depender da gravidade do vício de que padece o ato de disposição. Precedentes. 4- São suscetíveis de superação os vícios de menor gravidade, que podem ser denominados de PURAMENTE FORMAIS e que se relacionam essencialmente com ASPECTOS EXTERNOS do testamento particular, ao passo que vícios de maior gravidade, que podem ser chamados de FORMAIS-MATERIAIS porque transcendem a forma do ato e contaminam o seu próprio CONTEÚDO, acarretam a invalidade do testamento lavrado sem a observância das formalidades que servem para conferir EXATIDÃO à vontade do testador. 5- Na hipótese, o vício que impediu a confirmação do testamento consiste apenas no fato de que a declaração de vontade da testadora não foi realizada na presença de TRÊS, mas, sim, de somente DUAS TESTEMUNHAS, espécie de vício puramente formal incapaz de, por si só, invalidar o testamento, especialmente quando inexistentes dúvidas ou questionamentos relacionados à capacidade civil do testador, nem tampouco sobre a sua real vontade de dispor dos seus bens na forma constante no documento. 6- A ausência de cotejo analítico entre o acórdão recorrido e os julgados colacionados como paradigma impede o conhecimento do recurso especial interposto pela divergência jurisprudencial. 7- Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido".

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POR FIM, não podemos nos esquecer que hoje em dia mesmo com Testamento (Público ou Particular) o Inventário pode ser resolvido, se preenchidos os demais requisitos, pela via Extrajudicial, diretamente em qualquer Cartório de Notas, com assistência de Advogado, sem a necessidade de Processo Judicial - tudo na forma da Lei 11.441/2007 e do CPC/2015.

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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