PALAVRAS-CHAVE: Artigo científico. Direito Constitucional. Execução.
1 Introdução
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por ocasião do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5941, que o artigo 139, IV, do Código de Processo Civil (CPC) é constitucional e autoriza o juiz a determinar medidas coercitivas necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, como a apreensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e de passaporte, ou ainda, a suspensão do direito de dirigir e a proibição de participação em concurso e licitação pública.
Trata-se de decisão que discorreu sobre a aplicabilidade do art. 139, IV do CPC/2015, e definiu os limites das medidas executivas atípicas na execução por quantia certa no sistema jurídico pátrio.
2 Do Controle de Constitucionalidade
De acordo com Alexandre de Moraes, “a ideia de controle de constitucionalidade está ligada à Supremacia da Constituição sobre todo o ordenamento jurídico e, também, à de rigidez constitucional e proteção dos direitos fundamentais”. (2014, p. 721)
Desta forma, através do controle de constitucionalidade, o direito processual constitucional é usado para garantir o disposto na Carta Magna, ou seja, é a maneira utilizada quando da iminência de violação à Lei Maior, de forma a defender o disposto pelo legislador constituinte.
Assim, o controle de constitucionalidade nada mais é que a análise de regularidade de lei infraconstitucional quer seja em seus requisitos formais, quer seja em seus requisitos materiais.
Segundo Luís Roberto Barroso, “o ordenamento jurídico é um sistema. Um sistema pressupõe ordem e unidade, devendo suas partes conviver de maneira harmoniosa. A quebra dessa harmonia deverá deflagrar mecanismos de correção destinados a restabelecê-la. O controle de constitucionalidade é um desses mecanismos, provavelmente o mais importante, consistindo na verificação da compatibilidade entre uma lei ou qualquer ato normativo infraconstitucional e a Constituição”.
Nessa toada, a norma que é incompatível com os preceitos constitucionais é inconstitucional, e assim deve ser expurgada do ordenamento jurídico brasileiro, por ser nula desde o seu nascimento.
Assim, em nosso ordenamento jurídico temos duas formas de controle de constitucionalidade: o controle difuso e o controle concentrado. Definimos como controle difuso, aquele em que se analisa a constitucionalidade de lei de forma incidental, no curso de um processo, em que a causa de pedir não é propriamente a decretação de inconstitucionalidade, mas essa análise ocorre pela via da exceção a depender do litígio.
Segundo entendimento de Alexandre de Morais, na verificação de constitucionalidade por meio da via de exceção, a pronúncia do judiciário, sobre a inconstitucionalidade, não é feita enquanto manifestação sobre o objeto principal da lide, mas sim sobre questão prévia, indispensável ao julgamento do mérito. Nesta via, o que é outorgado ao interessado é obter a declaração de inconstitucionalidade somente para o efeito de isentá-lo, no caso concreto, do cumprimento da lei ou ato, produzidos em desacordo com a Lei maior. Entretanto, este ato ou lei permanecem válidos no que se refere à sua força obrigatória com relação a terceiros.
Em contraponto, temos no controle concentrado, ação judicial própria proposta especificamente com este objetivo, cujo objetivo da ação é justamente a análise da constitucionalidade da lei, questionando-se diretamente a compatibilidade da legislação com a Carta Magna.
Daí a nomenclatura utilizada de “controle concentrado” pois concentra sua apreciação em um único tribunal.
Assim sendo, “a declaração de inconstitucionalidade, portanto, é o objeto principal da ação, da mesma forma que ocorre nas Cortes Constitucionais europeias, diferentemente do ocorrido no controle difuso.” (MORAES, p. 748)
3 Da Ação Direta de Inconstitucionalidade
A Ação Direta de Inconstitucionalidade é o remédio processual a ser realizado por meio de controle concentrado, que questiona de maneira objetiva a lei ou ato normativo que se mostrem incompatíveis com o texto constitucional.
Segundo ensinamento do saudoso constitucionalista Pedro Lenza, “o que se busca com a ADI genérica é o controle de constitucionalidade de ato normativo em tese, abstrato, marcado pela generalidade, impessoalidade e abstração.” (...) “o que se busca saber, portanto, é se a lei (lato sensu) é inconstitucional ou não, manifestando-se o Judiciário de forma específica sobre o aludido objeto.” (2014, p. 328-329).
Quanto a competência para o exame da ação direta de inconstitucionalidade, temos que o órgão competente para julgamento é o Supremo Tribunal Federal, conforme disposto na Constituição Federal, em seu artigo 102, inciso I, alínea ‘’a’’, cuja petição inicial deve ser direcionada ao Ministro Presidente do órgão Supremo.
4 Do Julgamento da ADI nº 5941
O Partido dos Trabalhadores (PT), inconformado com texto do artigo 139, IV, do CPC/15, que autoriza o magistrado a determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária, propôs, em 11 de maio de 2018, perante o Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade questionando o artigo 139, inciso IV, da Lei 13.105 de 2015.
Tal ação foi autuada sob o número 5941 e distribuída ao gabinete do Ministro Relator Luiz Fux, e, em síntese, se insurge contra a validade do mencionado dispositivo legal.
Neste contexto, no que toca à possibilidade de o juiz determinar medidas excepcionais para a consecução de ordem judicial. Sabe-se que a ordem constitucional fundada em 1988 garantiu a proteção dos direitos fundamentais como uma das diretrizes fundamentais ao Estado Democrático de Direito.
Assim, a controvérsia analisada pelo STF, consistiu na análise do dispositivo que autoriza medidas como a apreensão de passaporte e CNH dos executados, à luz dos princípios da responsabilidade patrimonial, e o dever de adimplemento de suas obrigações às custas de sua liberdade.
No julgamento da ADI n. 5941, em controle concentrado de constitucionalidade, o STF, nos termos do voto do Min. Relator Luiz Fux, proclamou: "constitucional dispositivo do Código de Processo Civil (CPC) que autoriza o juiz a determinar medidas coercitivas necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, como a apreensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e de passaporte, a suspensão do direito de dirigir e a proibição de participação em concurso e licitação pública. A maioria do Plenário acompanhou o voto do relator, ministro Luiz Fux, para quem a aplicação concreta das medidas atípicas previstas no artigo 139, inciso IV, do CPC, é válida, desde que não avance sobre direitos fundamentais e observe os princípios da proporcionalidade e razoabilidade (...). Ao votar pela improcedência do pedido, o relator ressaltou que a autorização genérica contida no artigo representa o dever do magistrado de dar efetividade às decisões e não amplia de forma excessiva a discricionariedade judicial. É inconcebível, a seu ver, que o Poder Judiciário, destinado à solução de litígios, não tenha a prerrogativa de fazer valer os seus julgados. Ele destacou, contudo, que o juiz, ao aplicar as técnicas, deve obedecer aos valores especificados no próprio ordenamento jurídico de resguardar e promover a dignidade da pessoa humana. Também deve observar a proporcionalidade e a razoabilidade da medida e aplicá-la de modo menos gravoso ao executado. Segundo Fux, a adequação da medida deve ser analisada caso a caso, e qualquer abuso na sua aplicação poderá ser coibido mediante recurso".
Sendo assim, foi reconhecida a compatibilidade do artigo 139, inciso IV, do CPC com a Constituição Federal, tornando-o constitucional a possibilidade de medidas excepcionais pelo magistrado para viabilizar o cumprimento de ordem judicial.
5 Conclusão
Diante do exposto, após o julgamento da ADI nº 5941, são constitucionais as medidas coercitivas atípicas, ou seja, aquelas cuja estrita aplicabilidade não se encontra estampada na legislação, mas se dá a critério do magistrado, que elege os métodos que acredita adequados ao caso concreto, com vistas à satisfação do credor.
Conclui-se assim que, quando concede o Magistrado defere medidas eivadas de caráter atípico, não está agindo em desconformidade com a lei, ou seja, o ato do juiz, consagrado pelo Código de Processo Civil, não é ilegal, nem tampouco inconstitucional.
Por fim, vale salientar que eventuais medidas porventura determinadas pelo Magistrado que violem direitos e garantias fundamentais previstos na Carta Magna, podem ser revistos através da via recursal, em respeito ao devido processo legal.
6 Referências
Ação Direta de Inconstitucionalidade No 5941, proposta perante o Supremo Tribunal Federal
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, Senado, 1988.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 30ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2014.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 18ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2014.