PALAVRAS-CHAVE: Artigo científico. Multa pessoal. Advocacia Pública
1 Introdução
Sabe-se que o descumprimento de decisão judicial pode acarretar, nos termos do artigo 77 do CPC, aplicação de multa por ato atentatório ao exercício da jurisdição, praticado pelas partes e por todos aqueles que de qualquer forma participam do processo.
No entanto, o advogado público, no exercício da representação judicial do ente da Administração Pública, não pode ser responsabilizado pelo cumprimento de decisões judiciais que impliquem na prática de atos de competência dos servidores que integram a administração.
2 Da Impossibilidade de aplicação de multa pessoal ao Advogado Público
Inobstante as diversas decisões em sentido contrário, fato é que diversos juízes aplicam multa pessoal ao advogado público, em decorrência do descumprimento de decisões judiciais.
Em recente julgamento, o ministro Luís Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal (STF) anulou decisão proferida pela Justiça do Trabalho no Rio Grande do Sul que aplicou uma multa pessoal ao procurador do Município de Sapucaia do Sul (RS) por não cumprir decisão judicial no prazo fixado.
Nos termos da decisão proferida pelo Ministro, essa penalidade contradiz a jurisprudência de mais de duas décadas do STF, e afronta o Código de Processo Civil (CPC) de 2015.
A multa foi aplicada em decorrência da ausência de inclusão de registros de ponto e os contracheques de um ex-servidor que havia ganhado na Justiça o direito a horas extras e adicional de periculosidade, com supedâneo no parágrafo segundo, do artigo 77 do CPC.
Qualquer decisão que aplique penalidade ao advogado público, afronta o acórdão proferido pelo plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.652/DF, rel. Min. Maurício Corrêa, que porta a seguinte ementa:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. IMPUGNAÇÃO AO PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 14 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI 10.358/2001. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. 1. Impugnação ao parágrafo único do artigo 14 do Código de Processo Civil, na parte em que ressalva ´os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB´ da imposição de multa por obstrução à Justiça. Discriminação em relação aos advogados vinculados a entes estatais, que estão submetidos a regime estatutário próprio da entidade. Violação ao princípio da isonomia e ao da inviolabilidade no exercício da profissão. Interpretação adequada, para afastar o injustificado discrímen. 2. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente para, sem redução de texto, dar interpretação ao parágrafo único do artigo 14 do Código de Processo Civil conforme a Constituição Federal e declarar que a ressalva contida na parte inicial desse artigo alcança todos os advogados, com esse título atuando em juízo, independentemente de estarem sujeitos também a outros regimes jurídicos.” (grifos nossos).
Na verdade, a norma, que apresenta inequívoco cunho moralizador relacionado à conduta processual das partes e de todos aqueles que participam do processo, estabeleceu, que todos cumpram as decisões judiciais sem criar embaraço.
Em sua decisão, o Ministro Luís Roberto Barroso enfatizou que o artigo 77 do CPC de 2015, não diferencia os advogados públicos e privados, diferentemente do que previa o artigo 14 do Código de Processo Civil de 1973.
Desta forma, não há lugar no regramento processual para interpretações que conduzam para a responsabilidade pessoal do advogado, passando a proibir explicitamente a imposição de multas a advogados públicos ou privados, bem como aos membros da Defensoria Pública e do Ministério Público.
3 Conclusão
Não cabe ao advogado público que atua como representante processual do ente da Administração Pública a responsabilidade pelo cumprimento de decisões judiciais que impliquem na prática de atos de competência de outros servidores públicos.
Portanto, relevante frisar a impossibilidade de se fixar pena processual aos advogados, públicos ou privados, por contempt of court, consonante com a interpretação constitucional vinculante do tema procedida pelo STF ao julgar a ADI nº2.652/DF.
4 Referências
Superior Tribunal de Justiça - MIN. ROBERTO BARROSO - RECLAMAÇÃO 61.245 RIO GRANDE DO SUL